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Segundo Macedo (2006), a preocupação em distinguir o currículo formal (prescrito) do currículo em ação surge como forma de contraposição à noção burocratizada que teorias mais tradicionais do campo atribuíam ao currículo, focalizando seus estudos em documentos legais e políticas institucionais. A

valorização das experiências dos educandos e das vivências no cotidiano escolar e o reconhecimento da comunidade escolar enquanto ativa e dinâmica põem em xeque a ideia de que o currículo prescrito é implementado no chão da escola. Percebe-se que, nesta perspectiva, o currículo em ação é então pensado sob a consideração de que professores e alunos não são consumidores passivos de prescrições e propostas curriculares, mas que agem e reagem sobre o currículo, incorporando a ele novos significados, reconstruindo-o e concretizando-o com marcas e propostas nem sempre consideradas anteriormente. O currículo em ação se realiza em função de condicionantes sociais, institucionais e estruturais que variam entre escolas e entre equipes de trabalho. Para Pacheco, o currículo em ação

[...] caracteriza-se pela interacção professor/alunos e alunos/alunos que se estabelece num quadro global de relação pedagógica, com preponderância para a criação de um ambiente de aprendizagem, de um clima relacional e para a distribuição dos alunos nos espaços existentes. (PACHECO, 1996, p.124).

Quando uma proposta curricular adentra os muros da escola, não encontra ali um ambiente estático, aguardando que as ideias exteriores se apresentem para dar um ordenamento a suas ações. Ao chegar, uma proposta curricular se depara com propostas anteriores e com a prática educativa já em movimento, constituindo-se com base em experiências e vivências dos sujeitos que fazem parte do ambiente escolar. Dentre esses sujeitos, a literatura destaca o papel do professor como o principal agente no processo de reconstrução curricular. No entanto, parece que, nos processos de elaboração das políticas curriculares, essa “posição” tem sido tomada mais em termos de colonização da prática, conforme discute Lopes (2010), onde o docente é tido como executor das propostas curriculares do que como agente criativo, capaz de fazer parte dessa elaboração do currículo.

Oliveira (2012, p.96) considera os professores sujeitos “praticantespensantes” de currículos “pensadospraticados”, que são “[...] integrados por redes de convicções e crenças, de possibilidades e limites, de conhecimentos e ignorâncias múltiplas.” Argumenta a autora que os “praticantespensantes” criam, na sua atividade cotidiana,

[...] currículos com aquilo que sabem, desejam e em que acreditam, por meio de negociações de sentidos e possibilidades com a dinâmica das turmas, dos conhecimentos, das trajetórias sociais e culturais dos alunos, com as circunstâncias móveis e imprevisíveis de cada dia de trabalho, sem necessariamente criarem coerência com modelos de práticas. Nesse sentido, a criação dos currículos nos cotidianos das escolas precisa ser compreendida como dependentes de normas, conhecimentos e convicções, e também, das possibilidades daqueles que as desenvolvem e das circunstâncias nas quais estão envolvidos. (OLIVEIRA, 2012, p. 97).

Sendo o docente elemento de primeira ordem na concretização curricular, fazem-se pertinentes as observações de Sacristán (2000) com relação aos aspectos relacionados ao trabalho docente, os quais incidem de maneira significativa no processo através do qual os professores apropriam-se do currículo. Os significados que os docentes atribuem aos conteúdos curriculares a respeito do valor cognitivo dos mesmos e de sua importância educativa são um desses aspectos. Esses significados são adquiridos nos processos de formação e nas vivências profissionais e pessoais dos docentes, e propor uma inovação implica uma alteração de bases conceituais, de mecanismos de segurança pessoal e do próprio autoconceito dos professores. (SACRISTÁN, 2000). Segundo o autor, a incorporação de ideias prescritas no currículo passa pela introjeção do professor em seus esquemas de pensamento e comportamento. Neste processo de adaptação interna, o resultado reflete a transação entre os significados do professor e o que a nova proposta sugere.

Outro aspecto são as concepções epistemológicas que o professor detém, “responsáveis por atribuir ao currículo significados concretos na aula” (SACRISTÁN, 2000, p. 181). Esclarece o autor:

Essas perspectivas epistemológicas não se referem, obviamente, a um nível filosófico, em sentido estrito, mas sim a concepções globais, preferências pessoais, conjuntos complexos de argumentações não de todo coerentemente explicitadas, nem ordenadas, nem com uma estrutura hierarquizada entre os diferentes elementos que as compõem. (SACRISTÁN, 2000, p. 181).

Entende-se que essas concepções conectam-se às posições pedagógicas assumidas pelos docentes, às atitudes do professor para lidar com questões muito presentes na prática educativa, tais como aquelas relacionadas às abordagens dos conteúdos, às formas de lidar com o erro do aluno e aos processos avaliativos. Outro aspecto discutido por Sacristán (2000) diz respeito às dimensões do

conhecimento na perspectiva do professor. Vejamos aqui alguns exemplos das dimensões apontadas pelo autor. A primeira delas relaciona-se à utilidade dos conteúdos para entender problemas pessoais e sociais; outra diz respeito ao fato de o professor valorizar a experiência pessoal do aluno ou dar um valor absoluto ao conteúdo; a visão de conhecimento como algo objetivo em contraposição à perspectivas relativistas, históricas e construtivistas é outra dimensão apontada pelo autor, que trata ainda da ordenação de conteúdos em unidades mais ou menos integradoras, que se contrapõe à ordenação mais especializada, por disciplinas. Essas e outras dimensões apontadas pelo autor constituem-se, em sua opinião, em filtros decisivos na hora do professor ponderar, selecionar, distribuir conteúdos, selecionar atividades de aprendizagem e estabelecer seus critérios de valorização. (SACRISTÁN, 2000).

A estrutura social do trabalho docente e seu poder de mediação no currículo é outro aspecto apresentado por Sacristán em sua discussão sobre o desenvolvimento do currículo no chão da escola.

Entender a profissionalização como um exercício profissional individual ou compartilhado tem consequências não apenas no tipo de mediação possível que o professorado pode introduzir no desenvolvimento do currículo, como também no cultivo de certas competências profissionais. (SACRISTÁN, 2000, p. 194).

Ainda que os aspectos anteriores tratem da mediação curricular subjetiva individual dos professores, o autor explica que esta está mediatizada por relações profissionais. Assim, “a socialização profissional produzida pelos próprios companheiros é um fator de disseminação de atitudes e crenças sobre o currículo, o conhecimento, a avaliação, os comportamentos frente aos alunos, etc.” (SACRISTÁN, 2000, p. 194). O autor fundamenta esse argumento a partir de três fatores: o alcance de certas metas do currículo depende de sua abordagem em conjunto pelos grupos de professores, tendo em vista que os resultados mais decisivos na educação relacionam-se a objetivos em relação aos quais todos deveriam se ocupar, independente da disciplina; muitas variáveis da organização escolar são competências da coletividade, ou seja, exigem decisões coletivas entre os pares; se a instituição escolar, ao relacionar-se com a comunidade na qual está inserida, construir um projeto educativo que dialogue com o projeto cultural desta comunidade, o currículo não poderá centrar-se apenas em competências individuais,

devendo tratar também da interação entre todos os envolvidos. Sacristán (2000) acredita que o currículo tem maior poder de transformação social quando a sua recriação em uma instituição ocorre em um espaço de profissionalização compartilhada entre os professores. Nesta pesquisa foi possível observar um impacto positivo do trabalho coletivo para as práticas pedagógicas vivenciadas na Escola Arco-íris. A garantia de momentos coletivos para a discussão de planejamentos e projetos realizados na escola foi um ponto destacado pela maioria das professoras, favorecendo maior compreensão das Proposições Curriculares pela troca de experiências e interpretações e pelo compartilhamento de dúvidas e angústias, diminuindo, assim, a sensação de insegurança inicialmente observada em relação ao currículo proposto.

As considerações de Sacristán (2000) permitem algumas reflexões sobre as relações entre o currículo e o trabalho docente. Este implica no estabelecimento de um processo de negociação dos sentidos daquele, cujo resultado pode diferir completamente da proposta original, o que marca o papel do professor como um sujeito ativo na implementação curricular, e não apenas como um receptor e executor passivo. Segundo Silva (2009), o currículo não deve ser concebido como uma proposta onde os conhecimentos e a cultura incorporados sejam considerados apenas como “coisas” a serem transportadas de uma cabeça a outra. Para o autor, ao agirmos sobre os materiais recebidos, podemos desviá-los, refratá-los, subvertê- los, parodiá-los, carnavalizá-los ou contestá-los, ações que variam de acordo com as épocas e situações. Desta forma, um dos sentidos do caráter produtivo do currículo está no que fazemos com essas “coisas”. É nesta possibilidade que reside o caráter político e histórico do currículo (SILVA, 2009) e, na minha opinião, do trabalho docente.

Em síntese, o currículo encontra, no ambiente escolar, múltiplos determinantes, relacionados às condições de trabalho, às concepções dos educadores, à organização da instituição escolar, ao perfil dos alunos, aos recursos físicos e materiais, às tradições pedagógicas; elementos estes que incidem sobre o currículo e com os quais o professor lida simultânea e cotidianamente. Sacristán (2000) argumenta que

O currículo na ação é a última expressão de seu valor, pois, enfim, é na prática que todo projeto, toda ideia, toda intenção se faz realidade de uma

forma ou outra; se manifesta, adquire significação e valor, independente de declarações e propósitos de partida. (SACRISTÁN, 2000, p. 201).

Corroborando o que escreve Sacristán (2000) quanto à ineficácia do controle curricular, Pacheco (1996) reconhece a autonomia do professor, uma vez que este goza, em termos curriculares, “de uma autonomia de orientação dentro de referenciais que lhe são impostos, mas que jamais determinam liminarmente a sua acção e o seu pensamento.” (PACHECO, 1996, p. 101). O autor analisa ainda o grau de autonomia docente em relação aos seguintes elementos de operacionalização do currículo: objetivos, conteúdos, atividades, recursos, manuais e livros de texto e avaliação. No primeiro caso, o professor goza de autonomia na formulação dos objetivos de aprendizagem no nível da turma, de acordo com o referencial definido para o ciclo. Quanto aos conteúdos, Pacheco (1996) analisa que o professor não tem tanta autonomia para defini-los, devido à existência de programas traçados em nível nacional, mas dispõe de total autonomia para determinar a sequência e a extensão do material abordado. A esse respeito, o autor salienta que “o grau de liberdade com que o professor ‘dá’ os conteúdos faz parte integrante de uma autonomia subjectiva que é um dos aspectos fundamentais do currículo oculto, mesmo perante a obrigatoriedade ou não de cumprir o programa.” (PACHECO, 1996, p. 102). Essa autonomia em relação aos conteúdos pode ser verificada em maior grau na rede municipal de Belo Horizonte, que, desde a metade da década de 1990, vem defendendo propostas curriculares menos diretivas, a fim de possibilitar que a definição de conteúdos seja pautada também nas experiências da comunidade local onde a instituição escolar está inserida. No entanto, esse foi e tem sido um aspecto problemático, por motivos que serão abordados no capítulo 6, levando, em muitos casos, ao esvaziamento do ensino de conteúdos disciplinares na rede ou à sua definição em função exclusivamente do livro didático.

Em relação às atividades e recursos didáticos, Pacheco (1996) argumenta que os professores possuem ampla autonomia, uma vez que fazem a gestão do tempo de aprendizagem sem se submeterem a um referencial prescritivo. Sobre a escolha de manuais e livros de textos, Pacheco (1996) discute a autonomia compartilhada, uma vez que essa decisão parte de um grupo e torna-se um material de uso obrigatório (atualmente, nem tanto). Por outro lado, o grau e as formas de utilização dos livros de textos variam de acordo com a turma, e não impedem a produção de outros materiais curriculares. Quanto à avaliação, o professor dispõe de

uma autonomia na observação de modalidades e procedimentos, bem como na aplicação dos critérios pelos quais avalia.

As possibilidades de intervenção do professor no campo da prática podem ser analisadas também com base na discussão de Bernstein (1996) sobre as relações de poder e a educação, que implica na regulação dos discursos pedagógicos por diferentes formas de controle. O processo de produção e reprodução desses discursos tem sua base na divisão social do trabalho, que, na escola, se refere ao conjunto de categorias de transmissores (currículo, professores) e adquirentes (alunos) e, nas relações sociais, às práticas desenvolvidas entre professores- professores, professores-alunos, alunos-alunos. (BERNSTEIN, 1996). A discussão do autor sobre classificação e enquadramento é então muito pertinente para esse estudo.

A classificação diz respeito à relação entre categorias (discursos, sujeitos, ocupação) e não “àquilo que é classificado” ou que recebe um atributo ou critério (Bernstein, 1996; SANTOS, 2003). Neste estudo, categoria pode ser entendida como as disciplinas que compõem a proposta curricular. Segundo Bersntein (1996), a especialização da categoria relaciona-se ao seu grau de isolamento, ou seja, à conservação de um caráter especial, específico, que a distingue das outras. Desta forma, categorias especializadas, com identidades e fronteiras específicas, produzem uma “classificação forte”, garantida pelo grau de isolamento da categoria em relação às outras. Em contrapartida, se há menos especialização nos discursos, nas identidades, e se há fronteiras menos delimitadas, há uma “classificação fraca”. Em ambos os casos, observa-se que a classificação está relacionada com as relações de poder que estabelecem a “voz” de uma categoria. (BERNSTEIN, 1996).

Em função da discussão realizada nesta pesquisa sobre o currículo e o trabalho docente, poderíamos dizer, então, que um currículo que conserva e delimita claramente a especialização das disciplinas e seus conteúdos indicaria uma “classificação forte” entre as áreas de conhecimento (categorias), reduzindo, desta forma, a autonomia dos professores em relação à definição e às formas de transmissão de conteúdos aos alunos. Bernstein identifica essa forma de organização curricular como “currículo coleção”, pois há uma nitidez nas fronteiras das disciplinas (BERNSTEIN, 1996 apud SANTOS, 2003).23 Nesses currículos há

23 BERNSTEIN, B. Pedagogy, symbolic control and identity: theory, research, critique. Londres: Taylor

um progresso gradativo de conteúdos disciplinares, partindo de um conhecimento concreto e mais simples até princípios mais complexos e abstratos, conhecimento adquirido em níveis cada vez mais avançados de escolarização. (SANTOS, 2003). Já a possibilidade de trabalho com eixos temáticos, onde o conteúdo seria selecionado e organizado a partir das vivências da turma, às quais seriam integrados diferentes conteúdos, sem a divisão disciplinar, representaria uma “classificação fraca” do currículo, e ampliaria as possibilidades de atuação do docente em função da realidade local. Essa forma de organização pode ser identificada com o que o autor denomina de “currículo integrado”, em que as fronteiras das disciplinas são pouco nítidas (BERNSTEIN, 1996 apud SANTOS, 2003).

As práticas pedagógicas são entendidas como realização das categorias, decorrendo da classificação. Categorias especializadas geram práticas especializadas. O enquadramento é o conceito utilizado por Bernstein (1996) para analisar as variações dos princípios de comunicação gerados através das práticas pedagógicas24, definindo-o como “o princípio que regula as práticas comunicativas das relações sociais no interior da reprodução de recursos discursivos, isto é, entre transmissores e adquirentes.” (BERNSTEIN, 1996, p.59). O enquadramento relaciona-se, então, com o modo de transmissão da mensagem considerada legítima. A relação entre o enquadramento e os princípios de comunicação estabelece formas de enquadramento forte ou fraco. No “enquadramento forte”, o transmissor (no nosso caso o professor) “controla a seleção, a organização, o compassamento, os critérios da comunicação e da posição, a postura e a vestimenta dos comunicantes [...]” e quando o enquadramento é fraco, o adquirente (no nosso caso o aluno) tem mais controle sobre esses elementos. (BERNSTEIN, 1996, p. 60). “Quando o enquadramento é forte, os alunos são rotulados em termos de atenção, interesse, cuidado e esforço, enquanto no caso de um fraco enquadramento, os aprendizes são vistos a partir de seu interesse em ser criativos, interativos e autônomos.” (BERNSTEIN, 1996, apud SANTOS, 2003, p. 29). No entanto, argumenta Bernstein que qualquer forma de enquadramento guarda possibilidades de contestação e de mudanças das categorias legitimadas.

24 Conforme observa Santos (2003), para o autor, o conceito de práticas pedagógicas não se reduz

ao interior da escola, mas abrange outras relações, as quais envolvem o processo de reprodução cultural, como as relações entre pais e filhos, médico e paciente, dentre outras.

Em relação a essa discussão sobre classificação e enquadramento, entendo que há uma “classificação forte” no currículo proposto pela rede, organizado por disciplinas e pela definição de capacidades específicas para cada área de conhecimento. Esta classificação estimula, por sua vez, um “enquadramento forte”, verificado na realização de práticas pedagógicas especializadas, as quais se orientam pela elaboração de planejamentos disciplinares, predominando na sala de aula a realização de atividades por disciplina e o controle dos princípios comunicativos pelas docentes, conforme apresentarei no capítulo 7. Esse formato contrapõe a classificação fraca do currículo, observada na implantação da Escola Plural, em que se defendia a proposta de organizar o ensino por projetos de trabalho construídos e avaliados coletivamente por professores e alunos. Conforme nos mostra Amaral (2000), a realização de projetos de trabalho não foi concretizada na rede como se esperava, sendo observada, em algumas situações, a “inclusão” forçada dos conteúdos disciplinares nos temas trabalhados ou a subjugação dos mesmos em nome da valorização da experiência cultural dos alunos. Os eventos que contribuíram para a proposição de um currículo com classificação forte poderão ser compreendidos durante a leitura do capítulo 6, onde discuto o contexto de influência da produção do texto curricular.

Ainda que as Proposições Curriculares apresentem de forma delimitada o trabalho a ser desenvolvido em cada disciplina, há possibilidades de o professor relacionar um mesmo conteúdo a diversas capacidades e habilidades da mesma disciplina ou de disciplinas diferentes, prática essa defendida em algumas passagens do próprio documento. Se considerarmos, por exemplo, o tema “Brinquedos e brincadeiras”, muito recorrente no trabalho com o 1º ciclo, é possível trabalhá-lo com conteúdos e capacidades relacionadas às disciplinas de Língua Portuguesa, Arte, Educação Física, Matemática e História. As práticas desenvolvidas para o estudo da temática necessitariam consideravelmente do interesse e do envolvimento da turma e das experiências trazidas pelos alunos. Entretanto, essa lógica não é facilmente percebida por muitas professoras. A princípio, sinalizo dois fatores que contribuem para isso: o baixo nível de formação nas áreas de conhecimento e a presença forte da lógica do currículo disciplinar em nossas escolas.

Outra questão importante sobre o currículo em ação é a existência do currículo oculto, presente em atitudes, práticas e ritos que não estão explicitados nas

propostas curriculares, mas que contribuem para a formação de determinadas identidades ou negação de tantas outras. Nas palavras de Moreira e Candau, o currículo oculto envolve

[...] atitudes e valores transmitidos, subliminarmente, pelas relações sociais e pelas rotinas do cotidiano escolar. Fazem parte do currículo oculto, assim, rituais e práticas, relações hierárquicas, regras e procedimentos, modos de organizar o espaço e o tempo na escola, modos de distribuir os alunos por agrupamentos e turmas, mensagens implícitas nas falas dos(as) professores(as) e nos livros didáticos. (MOREIRA; CANDAU, 2008, p. 18) Neste estudo a prática escolar é vista enquanto espaço ou ambiente de construção e ressignificação de sentidos, e professores e alunos, enquanto sujeitos ativos nesse processo, sujeitos “praticantespensantes”. Corroborando o que diz Pacheco, entende-se que

por mais cumpridores que os professores sejam, digamos que existe sempre um espaço reservado para o currículo informal ou para o currículo oculto – que não fazia parte do currículo oficial -, já que professores e alunos modelam a organização do processo de ensino e aprendizagem pelas suas crenças, atitudes e saberes. (PACHECO, 1996, p. 126).

Considerando o exposto, entende-se que o currículo em ação é forjado pela construção de valores, identidades e subjetividades, num processo conflituoso e constantemente ressignificado pelo trabalho do professor. Sendo assim, a pesquisa sobre o currículo em ação implica investigar o trabalho docente na sua interação com os fatores de diversas ordens que interferem em sua constituição profissional e com a “cultura escolar” e a “cultura da escola”; a primeira entendida como a didatização dos conteúdos cognitivos e simbólicos para uma transmissão deliberada no contexto das escolas; e a segunda entendida como características, ritmos, ritos e linguagem próprios da escola. (FORQUIN, 1993, p. 167).

A discussão teórica apresentada neste capítulo traz duas importantes orientações para a realização desta pesquisa. A primeira relaciona-se à interação entre a dimensão prescrita e ativa do currículo para se realizar uma discussão crítica sobre as inter-relações entre currículo e trabalho docente. Segundo Goodson (2011),