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Da “crise” da escola ao (re) surgimento da educação não formal

No documento Atas ICICSE_IIIESE_Vol I (páginas 48-51)

Os contextos educativos cursos de educação e formação de jovens (CEF) e o projeto “aprender a aprender”: Formal ou não

1. Da “crise” da escola ao (re) surgimento da educação não formal

A partir da literatura sobressaem duas perspetivas que parecem fulcrais para a tentativa de compreensão da educação não formal, não descurando, claro está, a educação formal e informal. Uma das perspetivas diz respeito à “crise da escola” (Coobms e Ahmed, 1968; Almerindo, 2001; Rogers, 2004; Canário, 2006; Palhares, 2009, etc). A outra passa pela visão integrada ou de complementaridade dos sistemas formais, não formais e informais, na medida em que estes podem ocorrer em espaços-tempos diversos, em que as características do formal intersetam o não formal e vice-versa, podendo convergir para o mesmo fim, a educação. (La Belle, 1981; Trilla, 1993; Rogers 2004; Cañelas, 2006).

O debate em torno da concetualização da educação formal e não formal remete- nos para o final dos anos 60 (Coobms e Ahmed, 1968) visivelmente associado à tal “crise mundial da educação” despoleta pelo fato de a escola, de per si, não cumprir o seu papel, nomeadamente no que diz respeito a uma maior democratização, mais desenvolvimento socioeconómico e possivelmente maior liberdade (Palhares, 2012).

Assim, de modo a contextualizar, a educação formal é nos apresentada por Coombs e Ahmed, 1974 como um sistema educativo altamente institucionalizado, cronologicamente gradual e estruturado hierarquicamente desde o nível primário até os níveis mais altos da universidade (como citado em Rogers, 2004). Embora se reclame que o conceito de educação formal nunca tenha sido analisado com detalhe, reconhecendo-se de antemão que todos o conhecem e sabem o que o mesmo significa. (Rogers, 2004).

No que concerne à educação não formal, ao que tudo indica, surgiu para responder a necessidades educativas, sendo que a escola não foi capaz de cumprir os mandatos que há muito lhe foram atribuídos (Afonso, 2001, p. 31), ou seja, foi proveniente do sentimento de que a escola estava a falhar (Rogers, 2004). Representou para muitos, de certa forma, a forma “ideal” de educação até mais do que a educação formal, para outros não passou de uma educação secundária e complementar da educação formal vista como um subsistema de educação, considerada, por alguns, inferior à escolaridade formal e sendo mesmo descrita temporariamente e em situações de crise como “um mal necessário” até que a escolaridade formal possa responder. (Rogers, 2004). Então a educação não formal parece referir-se “a todas aquelas instituições, atividades, meios, âmbitos de educação, que não sendo escolares, terão sido criadas para satisfazer determinados objetivos educativos” (Trilla, 1993, p. 21).

Contudo, e apesar de se verificar falta de consenso, relativamente à concetualização da educação não formal, dado que cada país parece tê-la interpretado de acordo com a sua conveniência, ela implica sobretudo “toda a atividade educacional exterior ou fora do sistema formal”. É uma atividade algo organizada, sistemática levada a cabo fora do sistema formal, de modo a proporcionar tipos de ensino diferenciados e selecionados para subgrupos de uma população particular, que podem ser adultos ou crianças (Rogers, 2004).

Portanto, a terminologia do campo da educação passou a contar com as designações de educação não-formal e educação informal”, estas, por sua vez, passaram a ser utilizadas indistintamente para designar “o amplíssimo e heterogéneo leque de processos educativos não-escolares ou situados à margem do sistema de ensino oficial” (Palhares, 2009, p. 59). Por essa razão é necessário alguma cautela quanto ao uso e significado da terminologia afeta à educação não formal, dado que não existe ainda consenso. Depreende-se que o desejável seria o esforço de repensar o escolar a partir do não-escolar e não o contrário. (Palhares, 2009).

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É possível também constatar, através da literatura, que a educação não formal tem vindo a ganhar terreno na atualidade, principalmente a partir de 2000 tem-se assistido à “ (re) descoberta da educação não-formal (e da educação informal), em grande medida pela sua colagem retórica inerente ao paradigma da aprendizagem ao longo da vida” (Palhares, 2009). Podendo essa valorização do campo da educação não formal significar ou implicar a desvalorização da educação escolar, na medida em que se assiste, em alguns países, a um crescente sentimento antiescola (home-scholling) (Almerindo, 2001, p. 33). Percebemos, na atualidade, uma grande procura/investimento em atividades consideradas educação/aprendizagens não formais, quer como forma de complemento aos sistemas formais (de atividades direcionadas para a escola, o caso das explicações, dos centros educativos), quer atividades ligadas com o desenvolvimento cultural, desportivo etc. Um dos principais argumentos justificativos para essa procura/investimento prende-se com a condicionante familiar em relação às exigências sociais e laborais que, ao que tudo indica, têm contribuído para o aumento do recurso à institucionalização quotidiana de jovens e crianças, quer seja no âmbito da organização escolar, quer de natureza não escolar. (Palhares, 2009, p. 62).

No entanto e, apesar da tentativa de “desformalização das instituições” proposta pelo relatório da Comissão Internacional para o Desenvolvimento da Educação com o título Apprendre à être (Faure et al, 1973), onde se sublinhava que “todas as vias - formais e não-formais, intrainstitucionais e extrainstitucionais – poderiam ser igualmente admitidas em princípio como igualmente válidas” (p. 270) não se ter concretizado, constatou-se o surgimento de uma maior “diversificação” de contextos e de processos de cariz educativo. Todavia, não podemos descurar o papel central que a escola ocupa, ainda hoje, na promoção da excelência, da eficácia, da eficiência, da competitividade, da produtividade, entre outros aspetos da racionalidade económica. (Afonso, 1998)

Atualmente percebe-se que as políticas de educação e formação ocupam, na Europa e particularmente em Portugal, através dos programas implementados pelo Governo, um lugar central no discurso e preocupações sociais e políticas. Essas preocupações resultam, principalmente, da relação que é estabelecida entre a educação e a atividade económica e que “conduz a que políticas de educação e formação sejam uma “tradução” das preocupações de gestão da mão de obra, ou seja, das políticas de emprego.” (Canário, 2003, p. 191). Ao mesmo tempo que tentam resolver o problema do cumprimento da escolaridade obrigatória (o aumento da qualificação dos portugueses), incluindo, para o efeito, contextos de educação formal e não formal.

1.1 As propostas da complementaridade entre a educação formal e não formal

Paralelamente ao que muitos percebem como uma dicotomia (formal e não formal e informal), existem autores que pretendem fazer compreender, através de uma perspetiva holística, que a educação formal e não formal se intersetam durante a aprendizagem ao longo da vida. É o caso de La Belle (1982, p. 162) que nos apresenta a seguinte matriz:

48 Fonte: Adaptado de Thomas La Belle (1982, p. 162) – Os modos e as caraterísticas da educação

A proposta é, adicionando a educação informal (que significa aprendizagem incidental), sugerir que a educação formal usa regularmente abordagens não formais e informais tal como formais, como por exemplo as atividades extracurriculares e grupos de pares (informal). Assim como, os programas de educação não formal possuem regularmente caraterísticas formais (certificados) tal como processos informais (metodologias participativas) e que a educação informal usa regularmente a formal (formação no local de trabalho) e não formal (processos comunitários de aprendizagem tais como educação parental e formação) assim como a aprendizagem informal através da experiência diária. Refere, ainda, que a educação formal possui atividades não formais (fora do campo da definição formal como viagens e visitas a museus, onde a intenção é frequentemente aprender) tal como aprendizagens informais (aquela que surge de situações espontâneas).

Para este autor os programas de educação escolares e não formais tendem a complementar-se, apesar da educação não formal poder ser uma substituta para a escolaridade formal quando as escolas não existem. Ela não é um sistema de fornecimento alternativo para o ensino. Os programas de educação não formal não são escolares porque eles não recebem ou entregam o mesmo meio de troca/permuta – créditos, notas e diplomas – que são reconhecidos e sancionados pelas sociedades mais legitimadas e pelo sistema de ensino aprendizagem formal (La Belle, 1981, p. 315)

Rogers (2004), por sua vez, chama atenção que as barreiras que esbatem os limites entre o formal e o não formal são muito ténues e que a pedra-chave para essa distinção está nas aprendizagens que realizamos ao longo da vida (no continuum da nossa vida).

Assim quando é o individuo a determinar a sua aprendizagem, por exemplo, aprender o que quer, quando quer e parar quando quer, está envolvido em educação informal. Quando inseridos num programa de aprendizagem pré-existente, mas o moldamos às nossas circunstâncias, estamos envolvidos em educação não formal. Por último, quando aceitamos um programa de aprendizagem imposto externamente, sujeitando a nossa autonomia, estamos envolvidos em educação formal. (Rogers, 2004)

Uma outra visão interessante é a de Cañelas (2006) acerca da complementaridade entre o formal e não formal, argumentando que:

49 Nem sequer existem, entre a educação formal e não formal, diferenças significativas de objetivos. Ambas estão para facilitar a vida pessoal, social e cultural do homem em todas as suas dimensões e ao longo da vida. Portanto ambas formam um todo diferenciado mas, ao mesmo tempo, unitário que se conformaria com o sistema educativo idóneo para o homem do nosso tempo. Além disso a educação formal e não formal, apesar da sua distância jurídica, pedagogicamente tendem, cada dia mais, a entrelaçar-se de tal maneira que nem sequer a idade dos educandos será um argumento distintivo entre ambas. (p. 13)

Podemos perceber através da visão destes autores que a educação formal, não formal e informal se parecem complementariar e apesar de possuírem caraterísticas específicas são determinadas e determinantes nos processos de educação e aprendizagem.

No documento Atas ICICSE_IIIESE_Vol I (páginas 48-51)

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