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3.1 Fundamentos Microeconômicos

3.1.2 Medidas de bem-estar

3.1.2.2 Medidas Hicksianas

3.1.2.2.3 Decomposicao Hicksiana – Equação de Slutsky

Uma importante questão que emerge no modelo de comportamento do consumidor é quando se tenta entender: Como a quantidade demandada muda quandos os preços mudam? O movimento de um ponto de equilíbrio do consumidor para outro pode provocar um efeito substituição e um efeito renda.

Quando ocorre alteração no preço de determinado bem, há pelo menos duas razões que buscam explicar o porque dessas mudanças na quantidade demandada.

A primeira razão remete ao efeito substituição (ES), onde as alterações na quantidade demandada de um bem ocorrem por mudanças nos preços relativos de outras mercadorias, mantendo-se o nível de utilidade constante. Ou seja, se o preço de uma mercadoria cai, o indivíduo substitui esta mercadoria por outra (que permaneceu com o preço inalterado).

A segunda, diz respeito ao efeito renda (ER) onde as mudanças na quantidade demandada de um bem ocorrem pelo fato de ser promovida uma alteração na renda real, originada pela queda do preço do bem. O efeito renda pode ser expresso da seguinte forma: se o preço de uma mercadoria cai (ceteris paribus), o poder aquisitivo do indivíduo com renda constante sobe.

O efeito total (ET) é a soma do efeito substituição e do efeito renda.

O modelo analítico proposto por Hicks (1939) estabelece uma relação entre o efeito total, o efeito substituição e o efeito renda, ou seja, decompõe o efeito total em efeito de substituição e efeito renda. Esta relação é demonstrada pela chamada equação de Slutsky.

Para derivar a equação de Slutsky, parte-se da relação estabelecida entre a função demanda hicksiana e a função demanda marshallina. Para qualquer preço e um nível de utilidade u* a relação é dada por:

xh (p,u*) = xi[p, e(p,u*)] (30)

A relação acima diz que a demanda hicksiana, a qualquer preço “p” e nível de utilidade “u” é igual a demanda marshaliana, a um preço “p” e um nível de renda “e”, onde “e(p,u) representa a despesa mínima necessária para atingir o nível de utilidade “u”. Como essa relação se mantém pra qualquer “p” >>0, torna-se possível diferenciar ambos os lados com relação a pi e conservar a igualdade. Desta forma, a

equação de Slutsky pode ser representa da seguinte forma:

∂x

i

(p,y)= ∂x

h

(p,u*) - ∂ x

i

(p,y) x

J

(p.y)

(31)

∂p

i

∂p

i

∂y

A equação de Slutsky possibilita a explicação, de forma analítica, do efeito total sobre a demanda de uma dada mudança nos preços dos bens. Decompõe-se um efeito total observável em efeito renda observável e efeito substituição não observável.

O efeito substituição expressa a inclinação da função de demanda hicksiana, e a curva de demanda hicksiana xh(p,u), por depender de uma parâmetro não observável (utilidade), não é diretamente observável.

Embora a função de demanda hicksiana não seja diretamente observável, em razão de possuir como parâmetro o nível de utilidade do consumidor, o efeito substituição pode ser calculado a partir da função de demanda marshaliana x(p,y), cujos parâmetros podem ser observados.

A seguir, derivação da equação de Slutsky para mudanças no preço do próprio bem, ou seja, a variação da quantidade demandada pelo bem xi, quando o

preço do próprio bem varia.

∂x*i(p,u*)<0, bens complementares. (32)

∂pJ

Efeito Substituição

∂x*i(p,u*) > 0, bens substitutos. (33)

∂pi

Efeito Substitutição

∂xi(p,y)xi(p , y) > 0 para bens normais. (34)

∂y

Efeito Renda

∂x1( p, y)xj(p , y) < 0 para bens inferiores. (35)

∂y

Derivação da equação de Slutsky para alterações nos preços dos outros bens, isto é, a variação da demanda pelo be, “xi” quando o preço do j (pj) varia.

∂x1(p,y)= ∂xh(p,u*) - ∂ x1(p,y) xJ (p.y) (36)

∂pJ ∂pJ ∂y

Efeito Total Efeito Substituição Efeito Renda

∂xh

1(p,u*) < 0, conforme estabelece a “lei da demanda”. (37)

∂pJ

Efeito Substituição

∂x1( p , y)xj(p , y) > 0 para bens normais. (38)

∂y

Efeito Renda

∂x1( p, y)xj(p , y) < 0 para bens inferiores. (39)

∂y

Graficamente tem-se:

Gráfico 10– Decomposição Hicksiana de Mudança de preços

Fonte: Adaptado de Varian (2006)

3.1.2.3 Mudança de bem-estar para mudanças nas quantidades de bens ambientais - Excedente Compensatório e Excedente Equivalente

Em termos gerais, vê-se até o momento que quando os consumidores não estão restringidos às quantidades que podem adquirir e que estão associadas às variações de preços, as medidas pertinentes de seu bem-estar serão a variação compensatória e a variação equivalente. Em termos de definição pode-se afirmar que a variação compensada mede a máxima disposição ao pagamento dos benefícios, enquanto a variação equivalente mede a mínima compensação requerida para renunciar a um benefício. Entretanto, muitas políticas públicas envolvem mudanças nas quantidades ou nos parâmetros de qualidade de bens públicos ou

X2 X2 (P1, p2, y) X2 (P11, p2, y) X2*(P*1, p2, y) A B C U2 U1 X1 X1 X´1 AP1 P1 P*1 X1 (P1, p2, y) X1 *(P11, p2, y) x11 (P11, p2, y) X1 (P1, p2, y) X1 h (P11, p2, y) ES ER ET

mesmo bens e serviços ambientais, os quais são exógenos para o consumidor, que conseqüentemente, fica restringido a consumir uma quantidade fixa desses bens e serviços e a efetuar escolhas e racionalizar seu gasto dentre as demais cestas disponíveis e passíveis de consumo no mercado, com vistas à maximização de sua satisfação. Neste caso, as medidas de bem-estar indicadas seriam o Excedente Compensatório (ECq) e o Excedente Equivalente (EEq).(HANLEY; SPASH, 1993;FARIA, 1998; NOGUEIRA; MEDEIROS; ARRUDA, 2000; FREEMAN III, 2003).

No intuito de melhor explicitarmos os conceitos de Excedente Compensatório e Excedente Equivalente recorre-se ao modelo básico de maximização de utilidade formalizado em Freeman III (2003) para o caso de bens públicos, que são ofertados aos consumidores em quantidades fixadas. Destaca-se que uma das características dos ativos ambientais reside no fato de que a maioria encontra-se disponibilizada de forma fixa.

Suponha um indivíduo que está para maximizar uma função utilidade representada por:

U = U(X, Q), (40)

Onde X é um vetor de quantidades debens e serviços privados (X1,X2,X3,...,Xn) e Q é um vetor de fluxos de serviços e de recursos ambientais

fixados para o indivíduo (Q1, Q2,Q3,...,Qn). Em geral, os preços dos bens públicos e

mesmo os ambientais por não possuírem mercado são iguais a zero. Entretanto, consideram-se a existência de vetor de preços R positivos para estes bens de tal forma que R ≥ 0.De acordo com a teoria do consumidor o indivíduo busca maximizar a sua utilidade sujeita a uma restrição monetária dada por:

PX + RQ = M, (41)

Onde P é o vetor de preços do bem X (P1,P2,P3,...,Pn), R é o vetor de preços

para os bens e serviços ambientais, em caso de haver alguma cobrança (R1,R2,R3,...,Rn) , Q é um vetor de quantidades de recursos e serviços ambientais

(Q=Q1, Q2, Q3,...,Qn) e M é a renda monetária disponível. Nas condições

quantidades Q são impostas a ele13. Sendo assim, a solução desses problemas de maximização gera um conjunto de demandas Marshalianas condicionais (função de demanda ordinária), ou seja, gera uma função de demanda pelos bens privados condicional ao ativo ambiental Q, uma vez que a referida quantidade não pode ser influenciada/escolhida pelos indivíduos e são definidas como segue:

Q) RQ, - M (P, X = Xi i (42)

Substituindo-se a função de demanda marshaliana condicionada (42) na função utilidade (40), obtém-se a função utilidade indireta condicional (FUIC), ou seja, a utilidade em função do preço e da renda, dada por:

v = v(P, M - RQ, Q) (43) Invertendo a FUIC (43) para o termo M-RQ obtém-se a função dispêndio condicional, que é justamente a despesa mínima nos bens de mercado requerida para atingir o nível de utilidade U1, representada da seguinte forma:

) U Q, (P, e = RQ - M 1 * (44)

De outro lado, o problema dual ao da maximização de utilidade sujeito a uma restrição orçamentária pode ser expresso pela minimização dos gastos, isto é, Min (PX + RQ), de forma a manter o nível de utilidade estabelecido. Por conseguinte, deriva-se a função de demanda hicksiana, que ao ser substituído na restrição orçamentária PX + RQ, produz a função dispêndio restrita – FDR como segue:

) U Q, R, e(P, = e 1 (45)

A função dispêndio restrita – FDR representa o dispêndio total mínimo do indivíduo (inclusive os bens e serviços ambientais) para obter o nível de utilidade U1

estabelecido. Desta forma, a relação existente entre a função dispêndio restrita e a condicional é a seguinte: RQ + e = e * (46) 13

Por simplificação, o vetor Q é considerado como um conjunto de bens e serviçosque produzem utilidade somente, ou seja, ∂

∂ U(X, Q)

sendo que e = e* quando todos os preços dos bens e serviços ambientais fixos forem iguais a zero, isto é, R = 0.

Segundo Freeman III (2003), existe várias maneiras de apresentar as medidas de Excedente Compensatório e Equivalente em razão de variações na quantidade de bens restritos. Na seqüência apresenta-se uma dessas maneiras.

Como modo de simplificação, será considerado apenas um bem privado x1e um bem ambiental fixo q1, cujos preços são p1e z1, respectivamente. Desse modo, a FUIC definida na expressão (43) pode ser rescrita da seguinte forma:

) , z - M , (p v = v

q

q

0 1 0 1 1 1 (47) ondeq10 representa a quantidade inicial do bem ou serviços ambiental imposta ao

indivíduo e

q

0 1 1

z é a parcela da renda gasta com o referido bem. O consumidor ao

ser questionado acerca de quanto estaria disposto a pagar para garantir um aumento acréscimo na provisão do recurso ambiental de q10 para q11, este valor que o indivíduo estaria disposto a pagar é o Excedente Compensatório e encontra-se representado na equação abaixo:

) , z - M , (p v

q

q

0 1 0 1 1 1 = v(p ,M-z

q

-EC ,

q

) 1 1 1 1 1 1 (48) O lado esquerdo da equação representa o máximo nível de utilidade obtido pelo indivíduo, dado pela do bem ambiental é q10. O lado direito representa o

máximo de utilidade que o indivíduo pode obter quando a quantidade do bem é q11. O excedente compensatório - EC é o valor da renda que o indivíduo deve compensar pelo acréscimo de q10 para q11, de maneira que seja mantido o nível inicial de utilidade, bem como, a igualdade entre os dois termos da expressão acima. De forma similar, se o indivíduo é indagado sobre o mínimo de renda requerido por ele para abrir mão do acréscimo de q10 para q11 e, portanto, de atingir

um novo nível de utilidadeU1, estar-se-á referindo ao excedente equivalente, que pode ser apresentado conforme expressão a seguir:

) , EE + z - M , (p v

q

q

0 1 0 1 1 1 = v(p ,M-z

q

,

q

) 1 1 1 1 1 1 (49)

O lado esquerdo equação (49) representa a máxima utilidade que o indivíduo obtém quando não ocorre o aumento de q10 para q11. Já o lado direito da equação (49) indica a máxima utilidade obtida quando a quantidade do bem fixo aumenta de

1 0

q para q11. Logo, para que os dois da equação sejam igualados, faz-se necessário que o indivíduo tenha sua renda incrementada correspondente ao EE.

Outra forma de definir estas medidas de variações de bem-estar é por meio da função dispêndio como apresentada na expressão (45). A partir de então, o Excedente Compensatório pode ser definido como segue:

) U , , R , P ( e - ) U , , R , P ( e = EC 1 0 1 1 1 0 0 1 1 1

q

q

(50) ) U , , R , P ( - M = EC 1 0 1 1 1

q

O primeiro termo do lado esquerdo da equação (50) refere-se ao dispêndio mínimo necessário para o indivíduo obter o nível de utilidade U0. O segundo termo do lado direito representa o dispêndio mínimo necessário para que o indivíduo obtenha o mesmo nível de utilidade U0 dado um acréscimo de q10 para q11.

Logo, para que o indivíduo permaneça no mesmo nível de utilidade inicial é preciso que esteja disposto a pagar uma quantia de dinheiro para compensar o aumento de q10para q11. O gráfico 11 ilustra essa definição.

Gráfico 11 - Medida do Excedente Compensatório para um incremento em q

Fonte: Freeman III (2003, p.78) M A B C x q M - EC D E 0

EC

A partir do gráfico11, estabelece-se por suposição que a situação inicial de equilíbrio do indivíduo encontra-se no ponto A, em que ele dispõe de uma quantidade dada de q10, de bens e serviços ambientais (fixos), e x0 de bens de

mercado, com um nível de utilidade U0. Supondo a ocorrência de um aumento de

1 0

q para q11, o indivíduo se deslocaria para um novo ponto de equilíbrio, o ponto B,

com nível de utilidade U1 e consumo de x1 unidades do bem x. Ocorre, portanto uma alteração na utilidade. Mas o que fazer para que o indivíduo permaneça no mesmo nível de utilidade e manter o consumo da nova quantidade q11? O consumidor deve compensar a situação, pagando uma quantia para garantir o acréscimo na provisão dos bens e serviços ambientais de q10 para q11, e a permanência no mesmo nível de utilidade inicial. Este valor que o indivíduo está disposto a pagar é o Excedente Compensatório – EC que se encontra representado no eixo da coordenada x da Figura.

No que tange ao Excedente Equivalente, um aumento de q10para q11 é representado pela seguinte equação:

) U , , R , P ( e - ) U , , R , P ( e = EE 0 0 1 1 1 1 0 1 1 1

q

q

. (51) M - ) U , , R , P ( e = EE 0 1 1 1 1

q

O primeiro termo do lado direito da equação (51) representa o dispêndio mínimo efetuado para obter-se o nível de utilidade U1, quando não há acréscimos de q10para q11. O segundo termo do lado direito da equação (51) indica o dispêndio

mínimo do indivíduo para obter o nível de utilidade U0. Logo, para que o indivíduo

abra mão do benefício gerado pelo acréscimo de q, bem como, permaneça no mesmo nível de utilidade inicial, faz-se necessário compensá-lo por meio de acréscimo extra na renda, dado pelo Excedente Equivalente – EE. O gráfico 12 ilustra essa situação.

Gráfico 12- Medida do Excedente Equivalente para um incremento em q

Fonte: Freeman III (2003, p.79)

A partir do gráfico 12, estabelece-se por suposição que a situação inicial de equilíbrio do indivíduo encontra-se no ponto A, consumindo q10 e obtendo o nível de

utilidade U0. Com o aumento da provisão ambiental de q10 para q11, o ponto de

consumo ótimo seria no ponto B a um nível de utilidade U1. Então, para que o indivíduo possa permanecer no nível de utilidade U1e renunciar ao benefício originado pelo acréscimo de q, necessário se faz compensá-lo com um acréscimo de renda dado pelo Excedente Equivalente – EE.

Em resumo, todas as medidas de bem-estar podem ser utilizadas na avaliação contingente de bens e serviços ambientais, de acordo com o objetivo que se quer alcançar.

No entanto, Faria (1998) destaca que as medidas mais utilizadas em questões ambientais são o Excedente Compensatório e o Excedente Equivalente, uma vez que grande parte dos bens ou serviços ambientais encontra-se disponíveis em quantidades fixas. Ressalta ainda FARIA (1998) que para casos de bens quase- privados ou quase-públicos, em que é possível excluir o indivíduo do seu consumo, as medidas de bem-estar apropriadas são o Excedente do Consumidor e as Variações Compensatória e Equivalente de Hicks.

M + EE A B C x q 0

EE M

Nogueira, Medeiros e Arruda (2000), destacam que a disposição máxima a pagar por um indivíduo para eliminar um determinado dano ambiental ou por uma melhora ambiental pode ser interpretado como o Excedente Compensatório (EC).

Destacam ainda que se o questionário conseguir captar da disposição a pagar, bem como, outras variáveis socioeconômicas como renda, grau de instrução, pode-se estimar uma curva de demanda pelo ativo ambiental em questão e, com isso, o benefício alcançado pelo indivíduo à mudança ambiental por meio do cálculo do EC. Ressaltam ainda que outra questão passível de elaboração diz respeito a disposição do indivíduo a receber determinada quantia monetária para renunciar a um benefício a ser gerado pelos bens e serviços ambientais e que corresponde ao Excedente Equivalente – EE à suposta melhora ambiental.

Para Hanley e Spash (1993), as medidas de excedente (ECq e EEq) são aplicadas nos casos em que os preços variam, porém as quantidades consumidas são mantidas fixas. Por outro lado, as medidas de variação (VC e VE) se aplicam quando o consumidor é livre para ajustar as suas quantidades após mudança de preços.

No presente estudo, o conceito relevante a ser utilizado será o de excedente de compensação, uma vez que se buscou o valor que o indivíduo estaria disposto a pagar pela recuperação e preservação das áreas afetadas diretamente pela construção das pequenas centrais hidroelétricas – PCH Kotzian e Dreher. Assim, conforme destacou Freeman III (2003), o valor do Excedente Compensatório - ECq corresponde à seguinte pergunta:

- Você estaria disposto a pagar R$ X para conservar e preservar a provisão dos recursos ambientais existentes na área de influência direta das Pequenas Centrais? Ou seja, o excedente compensatório é quanto o indivíduo está disposto a pagar para manter seu nível de satisfação.