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2.4 Focos e Bases do Comprometimento

2.4.3 Demais Enfoques: Normativo, Comportamental e Sociológico

A natureza normativa do comprometimento, acerca da estrutura das atitudes e do seu poder preditivo em relação ao comportamento surge da interação entre a teoria organizacional de Etzioni (1975) e a Psicologia Social, sendo estes últimos os responsáveis pela mensuração do construto, através de escalas coerentes e apropriadas, em uma perspectiva quantitativa.

Esse novo enfoque do comprometimento é referenciado nos trabalhos de Weiner & Vardi (1990), sendo que nesta abordagem, o comprometimento é visto através da internalização ou identificação com os objetivos e valores da organização, na qual os indivíduos se sentem na obrigação de retribuir o que a organização fez ou faz, bem como uma idéia geral de que todo empregado deve ser leal à sua organização e não ficar mudando de uma empresa para a outra 22 (BASTOS; BRITO, 2001; MORAES et al., 1998).

A partir das proposições de alguns autores que estudaram o assunto, percebe-se que indivíduos comprometidos exibem certos comportamentos porque acreditam que é “certo” e moral fazê-lo. Este enfoque destaca que o elemento central na definição do comprometimento - aceitação dos valores e objetivos organizacionais - representa uma forma de controle sobre as ações das pessoas, o qual o autor denomina de normativo-instrumental. Como afirmam Wiener e Vardi (1990, p.300):

Quanto mais forte o comprometimento, maior a predisposição do indivíduo para guiar as suas ações por padrões internalizados, mais do que considerações racionais acerca das conseqüências dessas ações. Assim, indivíduos comprometidos apresentam certos comportamentos não porque eles calculam que em os apresentando obterão benefícios pessoais, mas porque eles acreditam que é certo e moral fazê-lo.

Bastos (1992, 1993, 1994) pressupõe neste construto um conjunto de pressões normativas que foram internalizadas pelo indivíduo, no sentido de orientar seu comportamento de modo congruente com os objetivos e interesses organizacionais, implicando em dizer que as pressões normativas predispõem o indivíduo para se comportarem segundo padrões internalizados e que algumas vezes resultam em persistência, sacrifício e preocupação pessoal.

Wiener e Vardi (1990) trabalham num quadro de referência denominado normativo-instrumental, mediante os conceitos de sistemas cultural e motivacional na determinação do comportamento humano nas organizações. Nesta perspectiva, a cultura organizacional é definida como o conjunto de valores partilhados que produzem pressões normativas sobre os membros, sendo que ela pode atuar diretamente no sentido de produzir membros "comprometidos", exercendo uma influência estável e de longo prazo sobre o comportamento no trabalho. Tais pressões associam-se ao sistema de recompensas (motivação instrumental) para influenciar o comportamento (BASTOS ,1994).

Como antecedentes deste estilo, alicerçado na obrigação moral de permanecer na organização, seria um estado psicológico desencadeado por experiências prévias de socialização presentes no convívio familiar e social, bem como no processo de socialização organizacional, ocorrido após a entrada do empregado na organização (SIQUEIRA; GOMIDE JÚNIOR, 2004).

Já a abordagem comportamental, também denominada de abordagem da “consistência cognitiva” foi fortemente influenciada pela Psicologia Social, que propõe o comprometimento como elo entre o comportamento e as atitudes dos indivíduos. Assim sendo, o comprometimento seria algo cíclico, em que o comportamento geraria determinadas atitudes que, por sua vez, manifestaria em comportamentos futuros.

Na concepção de Bastos (1993, p.58) o comprometimento "[...] pode ser equiparado com sentimentos de auto-responsabilidade por um determinado ato, especialmente se eles são percebidos como livremente escolhidos, públicos e irrevogáveis”. Neste “auto- reforçamento”, o indivíduo se tornaria comprometido a partir de suas ações, ocasionando um lento, porém consistente, crescimento do vínculo comportamental e psicológico do indivíduo com a organização.

Salancik apud Bastos e Borges-Andrade (1999) afirmam que as pessoas se tornam comprometidas pelas implicações de suas próprias ações, existindo para isso uma certa pressão psicológica do seu comportamento prévio, destacando que a volição, reversibilidade e o caráter público determinam os níveis de comprometimento23. A este respeito, Mowday et al.

23 Volição - A livre escolha da ação, faz com que o indivíduo se sinta pessoalmente responsável pelo ato; reversibilidade - A percepção da irreversibilidade ou os altos custos do ato aumenta o seu comprometimento; caráter público ou explícito do ato - a percepção de que outras pessoas tomam conhecimento do ato, aumenta a possibilidade de vir a se comportar de forma congruente.

(1982, p.26) comentam: “[...] o enfoque comportamental refere-se ao processo pelo qual o indivíduo se torna 'prisioneiro' de uma organização e como lida com este problema".

Neste enfoque, o comprometimento extrapolaria as verbalizações dos indivíduos e não poderia ser avaliado pelas escalas de atitudes e opiniões, e sim observável por alguns indicadores e comportamentos que vão além das expectativas normatizadas, a exemplo de assiduidade, pontualidade, desempenho, conflitos, absenteísmo, dentre outros. Complementa, dizendo: “[...] quando os indivíduos são comprometidos com a tarefa ou a organização, eles desenvolvem atitudes mais positivas em relação à tarefa ou organização quando são reduzidas as recompensas extrínsecas" (MOWDAY, 1982, p.38).

Neste sentido, os questionários que avaliam o comprometimento seriam apenas uma das formas de “mensurar” a intensidade, e não a “única” forma, visto que se dizer comprometido não é o mesmo de ser comprometido, sendo necessário, para tanto, pesquisas longitudinais e avaliações de desempenho e comportamento no trabalho, conforme itens sugeridos no parágrafo acima.

O quinto e último enfoque, denominado de sociológico, trata as relações de dominação, autoridade, normatização e burocracia no trabalho - o que pressupõe terem marcas profundas na administração pública. Surge da dicotomia entre valor-capital versus satisfação no trabalho, sendo o primeiro influenciado pelos teóricos marxistas como Edwards e Burrawoy - da teoria econômica, - e o segundo decorrente de uma linha distinta do pensamento sociológico de Becker e Halaby, e Weber com a autoridade no contexto de trabalho (BASTOS, 1994).

Para Halaby (1986), o vínculo do trabalhador com a organização se embasa nas relações de subordinação e autoridade/controle, respectivamente, sendo que os trabalhadores trazem para o contexto de trabalho, além de uma orientação básica para os seus papéis de subordinados, um conjunto de códigos normativos que especificam maneiras moralmente corretas de dominação.

O autor comenta ainda que o attachment24 do trabalhador no emprego se justifica

na percepção da legitimidade da relação autoridade – subordinação e não nos vínculos

24 Apego ao trabalho. Para Halaby e Weaklien (1989) apud Bastos, (1992; 1993; 1994), o apego passou a ser visto sob dois cursos de ação: O interesse de o empregado permanecer no seu emprego ou buscar um novo. Este 'apego', aumentaria proporcionalmente ao controle exercido sobre o trabalho, sendo que a negação deste ampliaria a resistência à dominação, sob a forma de absenteísmo, assiduidade e rotatividade.

afetivos (enfoque atitudinal) tão pouco recompensas e/ou benefícios advindos do trabalho (enfoque instrumental).

Quanto à autoridade e controle na estrutura sócio-organizacional, defendida por Max Weber, é apontado pelo autor que as estratégias de controle foram sendo desenvolvidas coerentemente com as fases distintas do capitalismo, iniciando o controle simples, passando ao técnico, até chegar ao burocrático, sendo que este último almejaria "[...] atrair a lealdade do operário através de sanções positivas e através do estabelecimento de uma hierarquia graduada de benefícios disponíveis para os empregados ‘responsáveis’ e ‘confiáveis’" (RAMALHO apud BASTOS, 1994, p. 49).

Assim sendo, o enfoque sociológico traria em seu bojo a essência da autoridade no contexto de trabalho de Weber que, sendo baseado em procedimentos e normas, diminuiria o peso das estratégias de coerção e resistência, passando a questão do comportamento no trabalho a ser vista como produto de interações entre estratégias de controle, de consenso e de negociação.

Contextualizados os focos e as bases do comprometimento, serão discutidas na próxima seção os determinantes do comprometimento, ou seja, os fatores que levam os indivíduos ao comprometimento. Conhecendo os preditores, a organização terá informações necessárias para conduzir a equipe e organização a um desempenho no trabalho e competitividade desejadas, bem como das decisões inerentes à permanência ou abandono do emprego.