• Nenhum resultado encontrado

6 Desafios para as diferentes tipologias de welfare State na Europa

Nos países da União Europeia, as diferenças entre o conjunto de políticas sociais que estão na base do Estado- -Providência são, de tal forma, significativas, que não é possível falar de um único modelo europeu. Abordar-se-ão as estruturas

39

específicas que os países abrangidos por diferentes tipologias de welfare state têm preparadas para responder aos desafios que lhes são colocados. Esping-Andersen (1996) distinguiu três modelos ou regimes de Estado-Providência:

Modelos de Estado- -Providência

Dimensões

típicas Países Riscos sociais associados resposta à criseEstratégias de

Conservador ou continental Regime de protecção segundo o estatuto profissional; protecção social dos funcionários públicos elevada. Áustria, Bélgica, França, Alemanha, Holanda, Luxemburgo. Encargos sociais com a mão de obra elevados; dificuldade em responder a níveis elevados de desemprego. Indução de saída precoce do mercado de trabalho; custo elevado da mão de obra; protecções sociais de desemprego e de reforma antecipada elevadas. Liberal ou anglo-saxónico Prestações sujeitas a condições de recursos; importância do sector privado. Reino Unido, Irlanda. Aumento da desigualdade social e da pobreza; trabalhadores pouco qualificados e baixos salários. Desregulação do mercado de trabalho; flexibilidade salarial; redução do valor dos salários mais baixos; redução de programas sociais. Social- -democrata ou escandinavo Acesso universal; prestações igualitárias. Dinamarca, Finlândia e Suécia. Dificuldade de financiamento; limites do emprego no sector público. Expansão dos serviços sociais, com criação de emprego público; desenvolvimento de medidas activas de inserção no mercado de trabalho.

Quadro 1 – Modelos de Estado-Providência.

40

Uma das características dos sistemas do modelo social democrata de Segurança Social dos nórdico-escandinavos é a sua elevada carga fiscal. Contudo, se este modelo permite gerar uma “rede de segurança” sólida ao nível das receitas, funda- mental na cobertura dos vários riscos sociais, poderá enfren- tar problemas devido a esse mesmo fator. Esse modelo assenta essencialmente na verificação de uma situação de crescimento econômico e de pleno emprego. Quando tal não sucede, o mode- lo é posto à prova, pois está dependente da capacidade de cobrar impostos à classe média, fortemente afetada em períodos de recessão. Será, portanto, no sentido de diminuir a vulnerabili- dade dos esquemas de proteção social face ao desempenho da economia que os países nórdicos deverão se precaver, de modo a continuar a garantir o sucesso do seu modelo.

Em países europeus, como a Irlanda ou o Reino Unido, onde vigora o modelo liberal ou anglo-saxónico de welfare, as soluções de mercado, ao nível da proteção social, são incen- tivadas em detrimento da iniciativa pública, procurando-se maior equilíbrio das contas públicas. A capacidade desses países em conduzir políticas sociais eficazes e abrangentes torna-se diminuta em comparação com outros regimes. As suas despe- sas públicas com proteção social não são muito elevadas, o mesmo acontecendo com as receitas, devido ao forte incenti- vo à privatização. Sendo os benefícios da intervenção estatal crescentemente reduzidos, será natural que as populações (nomeadamente a classe média, principal impulsionadora destes sistemas) sintam ser pouco útil o pagamento de impostos elevados, podendo gerar tensões sociais crescentes e eventuais situações de evasão fiscal.

Relativamente às especificidades do modelo continental e corporativo europeu (Holanda, Áustria, França, Alemanha,

41

Espanha e Itália), os seus desafios principais prendem-se com a sua sustentabilidade no longo prazo e a sua (in)capacidade de responder a evoluções demográficas e da estrutura de emprego da economia. É um modelo altamente vulnerável ao envelhe- cimento populacional e a elevadas taxas de desemprego, em virtude do forte impacto assumido pelas pensões e os direitos constitucionalizados. Colocam-se assim várias questões relati- vamente a esse modelo: Qual a solução de longo prazo para os países que o adotam? Como podem responder aos problemas econômicos com que se deparam atualmente? Acabar com o Estado Social é solução?

A tipologia de Esping-Andersen diz-nos pouco sobre os países do sul da Europa. Diversos autores, nomeadamente Ferrera (1996) e Ferrera et al. (2000), têm procurado respon- der às especificidades destes países, propondo um conjunto de dimensões típicas do Estado-Providência dos países do sul da Europa, nomeadamente Portugal, Espanha, Grécia e Itália (SILVA, 2000, p. 53):

Algumas dimensões típicas Fatores específicos

Protecção dualizada baseada em transferências monetárias

Sobre protecção dos núcleos centrais da força de trabalho;

prestações baixas aos trabalhadores irregulares ou da economia informal. Baixo grau de penetração das instituições

públicas de protecção social Indefinição de funções entre actores públicos e privados. Particularismo institucional Pressões particularistas e clientelares.

Baixa eficácia dos serviços Insatisfação dos utentes; baixa qualificação dos agentes.

42

Repartição desigual dos custos segundo os grupos profissionais

Disparidades de regras; fuga e fraude fiscal na economia informal.

Quadro 2 – O Estado-Providência do sul da Europa.

Fonte: Adaptado de Silva (2000); Ramos (2003, p. 345).

Nesses países, nomeadamente devido ao seu desenvol- vimento tardio, criou-se um modelo particular de Estado- -Providência, com características que o diferenciam dos outros países europeus (SANTOS, 1985, 1993). Portu gal apresenta singularidades, com um Estado de Bem-Estar criado tardiamen- te em face de outros países europeus. Nesse país, as formas de Estado-Providência nunca foram tão percetíveis como noutros países do norte e centro da Europa, tendo-se desenvolvido, por compensação, formas correlativas de “sociedade-providência”:

Ao lado de um Estado-Providência fraco, temos vindo também a identificar a presença de uma sociedade-providência forte, assentando em redes de relações de interconhecimento, de reconhecimento mútuo e de entre-ajuda baseada em laços de parentesco e de vizinhança, através das quais pequenos grupos sociais trocam bens e serviços numa base não mercantil e com uma lógica de reciprocidade (SANTOS; FERREIRA, 1998, p. 52).

Esse contexto desenvolve-se a partir de grupos sociais e das suas instituições, núcleos de vizinhança ou formas complementares de organização paralela ao Estado, como as mutualidades, as várias instituições ligadas à Igreja e o associa- tivismo local, organizações com múltiplas finalidades, incluí- das na economia social (RAMOS, 2003, 2011, 2013) e alicerçadas

43

em princípios fundamentais: “participação, responsabiliza- ção, democracia e solidariedade” (SANTOS et al., 1998, p. 29). A Constituição da República Portuguesa de 1976 destaca o papel das instituições particulares de solidariedade social (IPSS), regulamentadas por lei e sujeitas à fiscalização do Estado.

Em Portugal, foi importante a influência da Igreja Católica no desenho das políticas sociais, o papel da família patriarcal na provisão do bem-estar, o papel assistencial do Estado e os princípios e práticas das instituições de mutualida- de e de caridade. “O Estado Providência, em Portugal, foi uma criação recente e tem manifestado dificuldades em superar a matriz assistencialista” (RAMOS, 2003, p. 69). O país apresenta especificidades que se prendem com o mercado de trabalho e a distribuição dos rendimentos: taxas elevadas de emprego feminino; importância do emprego a tempo inteiro; taxa de emprego no setor agrícola superior à média comunitária; peso significativo do trabalho independente; importância dos traba- lhadores de baixos salários etc. (RAMOS, 2003, 2007).

7 Reformas atuais dos sistemas de segurança