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5 Grandes desafios do Estado-Providência no mundo em mudança

A elevada mutabilidade de sociedades crescentemente globalizadas leva a que também a conceção de Estado Social – e, consequentemente, dos esquemas de Segurança Social que lhe são intrínsecos – seja permanentemente posta em causa e a sua existência questionada. Autores como Santos (2001) e Kerstenetzky (2012) apontaram problemas e desafios que, à escala global, regional e nacional, enfrenta a proteção social e, em particular, o papel do Estado. Para Esping-Andersen (1998, p. 18), “a privatização da segurança social não conduz necessa- riamente a uma maior eficiência distributiva”.

Existe uma diversidade de fatores que constituem desafios relevantes para o desenvolvimento sustentável da Segurança Social, principalmente nas últimas duas décadas, impondo-se respostas adequadas por parte das diferentes estruturas governamentais. Há uma necessidade fulcral de manter a adequação dos sistemas – assegurar vida condigna a cada beneficiário, sem deixar de respeitar a relação entre o esforço contributivo passado de cada um e a prestação recebida

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na cessação da atividade (MENDES, 2011) – e, simultaneamente, de assegurar a sua sustentabilidade.

Os obstáculos surgidos, em finais do século XX, à possi- bilidade de conjugação desses dois elementos manifestaram-se em países abrangidos por diferentes tipologias de welfare state. Faremos uma breve contextualização geral desse tipo de desa- fios, recuperando as principais tipologias de welfare regimes e analisando as especificidades nas respostas:

• Globalização das políticas sociais e transformação dos sistemas e internacionalização das economias: países com um Estado menos interventivo cobram menos impostos e são mais atrativos para o investimento estrangeiro, por exemplo.

• Demografia: envelhecimento demográfico cada vez mais acentuado, gerando novos desafios para a sustentabi- lidade dos sistemas de pensões e de saúde. Nos países industriais, a esperança de vida aumenta, os nascimen- tos diminuem, a taxa de fecundidade da população é muito baixa, cresce o número de idosos e diminui a população jovem trabalhadora; a emigração de jovens portugueses tem efeitos demográficos, econômicos e na segurança social; as migrações internacionais contri- buem para o equilíbrio demográfico e da segurança social no país de acolhimento, nomeadamente a curto e médio prazo, pois são constituídas essencialmente por população jovem e ativa.

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• Passagem de uma situação marcada pela solidariedade intergeracional instantânea para um contexto de confli- to geracional.

• Mudanças nas estruturas familiares: divórcios, aumento de famílias monoparentais, entrada massiva da mulher no mercado de trabalho sem suficientes estruturas de apoio etc.

• Alterações na estrutura do trabalho: estão favorecidos os trabalhadores mais qualificados, sendo suprimidos os empregos menos qualificados e mais mal pagos etc. • Crise do sistema capitalista, questionamento dos siste-

mas de proteção social e redução do papel interventivo do Estado.

• Crise econômica pós-2007: veio pôr à prova o Estado- -Providência, dado que com o aumento brutal do desemprego surgiu a necessidade de um Estado mais interventivo e, consequentemente, de maiores despesas e menores receitas. Esse papel interventivo tem sido limi- tado e posto em causa pelas políticas de austeridade dos países desenvolvidos.

• Deterioração das contas públicas por meio do aumento dos gastos afetos à Proteção Social.

• Gestão de tensões sociais e políticas em virtude de medi- das a adotar.

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A demografia é o grande desafio que se coloca na atuali- dade aos sistemas de Segurança Social. Os períodos históricos em que esses foram institucionalizados apresentavam padrões demográficos altamente distintos dos vigentes na atualidade (ESPING-ANDERSEN, 1996, 1998, 2000; FERRERA et al., 2000). Nas últimas décadas, a percentagem das gerações mais velhas na população mundial aumentou significativamente face ao peso das gerações mais novas. Em Portugal, a idade média da população era de 27,8 anos em 1960 e de 42,3 anos em 2012. Esse envelhecimento é significativo a nível europeu, sendo que a idade média da população dos países da UE-27 era de 35,2 anos em 1990, contrastando com o valor de 41,5 anos em 2012 (Eurostat). O último Censo da população em Portugal (2011) registava 129 idosos por cada 100 jovens. No mercado de trabalho, essa evolução traduziu-se num aumento do índice de dependência total, havendo em 2011, 52 dependentes por cada 100 indivíduos em idade ativa (INE). Já em 2002, o Instituto Nacional de Estatística (INE) chamava a atenção para a inten- sidade do envelhecimento em Portugal, e a necessária gestão da idade e integração dos mais velhos na vida laboral e social. As projeções do INE (2009) da população residente em Portugal para 2008-2060 revelam um acentuado envelhecimento ao longo dos anos, tal como na Europa, com aumento da idade média da população residente e envelhecimento da população em idade ativa, fenômeno que em Portugal será massivamente agudizado em 2060.

As taxas de crescimento natural são negativas desde 2007 em Portugal, além de que o crescimento migratório tem segui- do a mesma tendência (embora com taxas de valor superior) (INE). A diminuição do crescimento natural da população em Portugal e na generalidade dos países europeus deve-se, em

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grande parte, à redução acentuada da descendência média por mulher em idade fértil, cada vez mais abaixo do nível teórico de substituição das gerações (2,1). O valor era de aproximadamen- te 2,99, em Portugal, no ano de 1971, tendo atingido, em 2012, um valor de 1,28 (INE), o mais baixo entre os países da União Europeia (Eurostat). Torna-se evidente, nessa evolução demo- gráfica, que o contexto fundacional de solidariedade intergera- cional instantânea, no âmbito dos sistemas de Segurança Social, desvaneceu-se progressivamente, dando lugar a uma situação de conflito intergeracional a gerir pelas entidades governamen- tais e supranacionais.

Para o estudioso da proteção social Esping-Andersen (1998), o Estado-Providência teve declarada a sua crise, desde o seu início, e aponta como causas três impactos exógenos que resultam de mudanças econômicas e sociais: impacto da internacionalização econômica e crise do sistema capitalista, com questionamento nos sistemas de proteção social e desvalorização do papel interventivo do Estado; impactos das mudanças demográficas; e impactos das alterações familiares, com a inserção da mulher no mercado de trabalho, sem o desenvolvimento de estruturas de apoio adequadas, o que se repercute na baixa do índice de fecundidade.

6 Desafios para as diferentes tipologias