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Perante os desafios referidos anteriormente e outros associados a crises em países desenvolvidos, discute-se, no presente, a sustentabilidade dos esquemas de Segurança Social, no sentido de pensar o futuro do Estado Social e as necessárias mudanças. Segundo Pierson (2001), os Estados- providência enfrentam pressões financeiras sem precedentes, essencialmente relacionadas com um conjunto de mudanças “pós-industriais”, nas democracias industriais avançadas, tais como o perfil do emprego, o envelhecimento da população e as alterações radicais nas estruturas familiares.

Em Portugal, país a ser internacionalmente interven- cionado e sob grande pressão para cumprir metas financeiras, discutem-se atualmente reformas estruturais neste âmbito. Apesar de algumas reformas estruturais no quadro do memo-

rando/entendimento com a troika ou no caso de soluções de muito

curto-prazo, a resistência a perdas de benefícios existe e nalguns casos o impeditivo de alterações vem mesmo do Tribunal Constitucional. Acresce a essa resistência a preconização de um conjunto de direitos sociais alcançados pelos trabalhadores após a revolução de 25 de abril de 1974 (RAMOS, 2003) e estabelecidos na Constituição, pelo que, por exemplo, os cortes nas pensões possuem um efeito recessivo e socialmente insustentável.

Levantam-se, inevitavelmente, algumas questões, como: medidas de fomento do crescimento econômico ou medidas de austeridade – qual a abordagem que permite chegar a um resultado socialmente mais satisfatório e justo?; a que outros riscos estão a Segurança Social e a sua sustentabilidade

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sujeitas? Um exemplo da recessão em Portugal, em 2012, foi a queda das contribuições de 5% e o agravamento de 25% das despesas de desemprego. A precariedade laboral tem signifi- cativas repercussões na família, sendo também um dos prin- cipais fatores de aumento da pobreza. Se Portugal enfrenta um grande desafio demográfico com repercussões ao nível da sustentabilidade do sistema público de segurança social, será também decisivo encorajar no âmbito laboral medidas de apoio à família que permitam aos trabalhadores conciliar a vida familiar com o trabalho.

A fragilização do Estado Social português já começou, o que é grave, uma vez que é dos mais modestos da Europa. Mais de um quarto de século após a adesão à Comunidade Europeia, Portugal vê-se confrontado com um conjunto de fatores que ameaçam a herança de convergência europeia no domínio das políticas sociais. Ao tributar ainda mais os traba- lhadores e as classes médias, retirando-lhes simultaneamente benefícios do Estado Social, conduz-se a que sejam incentivados a optar pela oferta privada de saúde, de educação e de seguran- ça social. Está em causa um conflito entre dois modelos globais de reforma da proteção social: o modelo neoliberal, que defende uma redução drástica da proteção social do Estado, e o modelo social europeu, fortemente comprometido com uma proteção social ampla e universalista. Santos e Ferreira (2001) assinalam duas formas de globalização nas políticas e nas transforma- ções dos sistemas. A de tendência neoliberal, em 1994, imposta pelo Banco Mundial, e a social democrata, adotada pela União Europeia por iniciativa de Jacques Delors, o chamado modelo social europeu.

Em Portugal, a política social global imposta por agên- cias transnacionais afirma os seus modelos e instrumentos de

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política social no campo da segurança social, não obstante as especificidades econômicas, sociais e culturais que distinguem esse Estado de outros países europeus.

Em suma, não há Estado de bem-estar verdadeiramente sustentável sem algumas condições fundamentais, nomeada- mente o crescimento econômico forte com ganhos de produti- vidade e baixos níveis de desemprego e a fundamentação ética, baseada na equidade entre as gerações, de todos os sistemas e mecanismos de proteção social a preservar para nós e para as gerações vindouras. A preservação da coesão social exige espe- cial atenção à equidade na distribuição de custos e benefícios da proteção social entre as diferentes gerações. O agravamen- to das desigualdades sociais, associado à emergência de novas formas de pobreza, não encontrando uma solução nos quadros de intervenção constituídos, é uma ameaça à coesão social e põe à prova o Estado social e os seus meios de ação.

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