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Como argumentamos no EPAP616, no presente caso o Estado incorreu em responsabilidade internacional por violar os artigos 3, 4, 5 e 7 da CADH por aquiescência no desaparecimento de Luis Ferreira da Cruz, em conexão com os artigos 1.1, 8 e 25 da CADH, ao não investigar os fatos relacionados ao seu desaparecimento.

Conforme assinalamos no EPAP e comunicação com respostas às perguntas dos juízes de março de 2016, os Representantes só alegam o desaparecimento de Luis Ferreira da Cruz, uma vez que em 2009 foi confirmada a morte de Iron canuto, no ano de 2007 em circunstâncias não relacionadas ao presente caso, e seus familiares apresentaram sua certidão de óbito617.

Por outro lado, o Estado não investigou de forma séria e adequada o desaparecimento de Luis Ferreira, motivo pelo qual – até a presente data – seu paradeiro é desconhecido.

Preliminarmente, reiteramos o arguido no EPAP618 sobre a obrigação do Estado brasileito de prevenir violações de direitos humanos, que consiste em que se tome as medidas razoáveis face a uma denúncia que evidencie que uma pessoa se encontra em risco real e imediato de ter seus direitos violados619.

No caso específico, em 1988, a CPT encaminhou uma denúncia à Polícia Federal pelo desaparecimento de Luis Ferreira da Cruz, com base na informação submetida por seu irmão, Miguel Ferreira da Cruz620. A CPT reencaminhou as denúncias, em 1989, ao Secretário Executivo do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana e, em 1992, ao Subprocurador-Geral da República, Dr. Alvaro Augusto Ribeiro Costa621. Ou seja, o Estado tinha conhecimento da denúncia do

616 EPAP dos representantes, p 138.

617 EPAP dos representantes, p 140; Termo de Declaração de Maria do Socorro Canuto, mãe de Iron Canuto da Silva, SEJUDH, de 17 de fevereiro de 2009 y certidao de obito. Anexo 80 del ESAP.

618 EPAP dos representantes, pp 139-139.

619 Corte IDH. Caso González y otras (“Campo Algodonero”) Vs. México. Exceção Preliminar, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 16 de novembro de 2009. Série C No. 205. Par. 280. Ver também, CIDH. Relatório da CIDH, pars. 151- 153.

620 EPAP dos representantes, p 137; CPT/Araguaia Tocantins e Diocese de Conceição do Araguaia – PA, denúncia encaminhada por telex à Polícia Federal, em 21 de dezembro de 1988. Anexo 74 del ESAP.

621 Carta enviada pela CPT Norte II ao Secretário Executivo do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, em 25 de janeiro de 1989. Anexo 77 del ESAP. Ofício da CPT – Araguaia/Tocantins para o Subprocurador-Geral da República,

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desaparecimento de Luis Ferreira da Cruz desde o ano de 1988. Considerando o contexto de violência que viviam os trabalhadores rurais na região do praá e, especificamente, os trabalhadores submetidos a formas contemporâneas de escravidão e tráfico de pessoas na Fazenda Brasil Verde, bem como o caráter continuado do desaparecimento forçado de pessoas, o Estado tinha a obrigação de tomar medidas adequadas orientadas a prevenir as violações de direitos de Luis Ferreira da Cruz, que se estendem para além de 1998. Contudo, a resposta estatal frente às múltiplas denúncias não foi razoável.

Como manifestamos no EPAP, em um primeiro momento a Polícia Federal demorou dois meses para ir à Fazenda para entrevistar testemunhas622. Nesta ocasião não de investigou se Luis Ferreira realmente teria fugido a outra fazenda da região ou qual era seu possível paradeiro, tampouco houve a abertura de inquérito policial. Esta omissão do Estado continuou para além de 1998, ou seja, dentro da competência temporal desta Honorável Corte.

Posteriormente, em outubro de 2007, ou seja, passados quase 20 anos desde a denúncia inicial, o Diretor da Polícia do Pará solicitou à CPT que lhe remetesse cópia da denúncia sobre o desaparecimento de Iron Canuto da Silva e Luis Ferreira da Cruz para que apoiasse/favorecesse as investigações sobre os fatos623. Em fevereiro de 2009, a Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos do Estado do Pará (SEJUDH) procurou os familiares de Iron Canuto da Silva e Luis Ferreira da Cruz para levantar informações a respeito de seu paradeiro624.

Em razão do exposto, os Representantes alegam que as omissões do Estado face à denúncia de desaparecimento de Luis Ferreira da Cruz, cujos efeitos se estendem até a atualidade, gerou responsabilidade do esatdo por falta de seu dever de garantia processual em prejuízo da vítima. Assim mesmo, o Estado também tem a responsabilidade de investigar efetivamente as violações de direitos humanos625. Sobre o dever de investigar um desaparecimento, esta Corte afirmou:

Además, en casos de desaparición forzada, la investigación tendrá ciertas connotaciones específicas que surgen de la propia naturaleza y complejidad del fenómeno investigado, esto es que, adicionalmente, la investigación debe incluir la realización de todas las acciones necesarias con el objeto de determinar la suerte o destino de la víctima y la localización de su paradero626. El Tribunal ya ha aclarado que el deber de investigar hechos de esta naturaleza subsiste mientras se mantenga la incertidumbre sobre la suerte final de la persona desaparecida, pues el derecho de los familiares de la víctima de conocer cuál fue el destino de ésta y, en su caso, dónde se encuentran

Dr. Alvaro Augusto Ribeiro Costa, em 18 de março de 1992. Anexo 83 del ESAP. Ver também, CIDH. Relatório da CIDH, pars. 75 e 78.

622 EPAP dos representantes, p 140. 623 CIDH. Relatório da CIDH, par. 95.

624 Comunicação do Estado brasileiro datada de 5 de março de 2012. 625 EPAP do respresentantes, p 139.

626 Corte IDH. Caso Ticona Estrada Vs. Bolivia, supra nota 239, par. 80, y Caso Contreras y otros Vs. El Salvador, par. 129.

Caso Trabalhadores da Fazenda Brasil Verde vs. Brasil Alegações Finais Escritas sus restos, representa una justa expectativa que el Estado debe satisfacer con todos los medios a su alcance627.

Durante este processo interamericano, como os Representantes ressaltaram no EPAP628, o Estado manifestou que não tem responsabilidade de estabelecr o paradeiro de Luis Ferreira da Cruz. Em sua Contestação, o Estado apresentou argumentos que novamente mostram sua falta de entendimento de seu dever de investigar de forma séria face a uma denúncia de desaparecimento. Neste sentido, o Estado afirmou que “de qualquer modo, mesmo sem ter sobre si o ônus da prova contra si mesmo, o Estado brasileiro realizou inúmeras diligências ao longo dos anos para localizar o paradeiro de Luis Ferreira da Cruz”629.

A respeito do argumento substantivo que o Estado realizou uma investigação séria, a única prova destas inúmeras diligências que o Estado aportou em sua Contestação foi um ofício da Policía Federal, datado de 4 de agosto de 2015630, no qual consta uma chamada telefônica realizada no mesmo dia às senhoras Maria do Socorro Canuto e Maria Gorete, supostas maãe e irmã de criação de Luis Ferreira respectivamente. Nesta chamada, elas informaram que há aproximadamente 10 anos Luis “foi assassinado”. Contudo, não presenciaram o enterro nem sabem onde está enterrado. Afirmam que não possuem documentos acerca de seu suposto assassinato e informam que ele teria sido enterrado como indigente. Este ofício não esclarece como elas obtiveram estas informações. Assim mesmo, as autoridades não procederam a verificar as declarações. Não realizaram diligências para averiguar se foi confirmada a identidade do cadáver no momento do suposto assassinato. Tampouco realizaram ações para estabelecer o paradeiro dos restos mortais e proceder sua identificação. Ou seja, o Estado assumiu como certo o testemunho das duas supostas familiares, que por outro lado, como assinalamos na seção de fatos, não tinham relação direta com a vítima.

Em suas declarações testemunhais por affidavit, as quais apresentam indícios de fraude como argumentamos supra631, as senhoras indicaram que sabiam que José Teodoro da Silva e Miguel

Ferreira da Cruz haviam denunciado o desaparecimento de Luis e que não haviam recebido respostas632. Assim mesmo, confirmam que seu contato com o Estado sobre o desaparecimento de Luis se limitava à chamada telefônica de agosto de 2015633. Esclarecem que tomaram conhecimento de seu assassinato por meio de uma chamada de um desconhecido e que não sabem onde Luis está enterrado634. Portanro, parte da informação que é submetida ao conhecimento desta Honorável Corte tem origem em uma chamada anônima, sobre a qual não temos qualquer informação adicional.

627 Corte IDH. Caso González Medina y familiares Vs. República Dominicana. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 27 de fevereiro o de 2012 Série C No. 240, Par. 209.

628 EPAP do respresentantes, p 140. 629 Contestação do Estado, par. 859.

630 Ministério da Justica, Departamento de Policía Federal, Informações 03/2015/DASP/CGDI/DICOR/DPF, Anexo 35 da Contestação do Estado.

631 Ver considerações prévias sobre prova.

632 Escrito do Estado brasileiro de 08 de fevereiro de 2016, anexos 6 e 12. 633 Escrito do Estado brasileiro de 08 de fevereiro de 2016, anexos 6 e 12. 634 Escrito do Estado brasileiro de 08 de fevereiro de 2016, anexos 6 e 12.

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Portanto, os Representantes consideram que o Estado não aportou prova alguma que demonstre que as autoridades realizaram uma investigação séria sobre os fatos. A respeito das perguntas do Excentíssimo Juiz Ferrer MacGregor e da Excelentíssima Juíza Elizabeth Odio Benito na audiência, não há restos mortais nem prova de DNA que confirme o paradeiro de Luis Ferreira da Cruz. Portanto, o Estado não identificou a localizçaõ dos restos mortais, se o mesmo existir. Tampouco consta nos autos que o Estado haja realizado exames de DNA nos familiares para proceder uma possível investigação futura.

Assim mesmo, conforme alegado no EPAP, esta Honorável Corte deve considerar que a responsabilidade do Estado brasileiro neste caso é agravada, uma vez que Luis Ferreira da Cruz era adolescente no momento de seu desparecimento e, portanto, tinha direito a uma proteção especial reforçada por parte do Estado635.

Os Representantes consideram que os fatos expostos configuram responsabilidade do Estado por violações aos artigos 3, 4, 5 e 7 da CADH pelo desaparacimento de de Luis Ferreira da Cruz, em conexão com os artigos 1.1, 8 e 25 da CADH, ao não investigar os fatos de seu desaparecimento.

635 EPAP dos representantes, p 141.

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IX. REPARAÇÕES

No decorrer deste processo, os Representantes demonstraram a responsabilidade internacional do Brasil pelas violações aos direitos humanos das vítimas do presente caso. Por isso, respeitosamente solicitam à Corte que ordene ao Estado brasileiro a reparação integral dos danos causados às vítimas como resultado das violações aos direitos consagrados nos artigos 3, 4, 5, 6, 7, 8, 11, 19, 22 e 25 da CADH, em relação com o artigo 1.1 e 24 do mesmo instrumento.

Neste sentido reiteramos os argumentos e pedidos apresentados no Escrito de Petições, Argumentos e Provas, aos quais acrescentamos na sequência alguns argumentos e provas que são necessários e pertinentes a partir das controvérsias e provas documentais, declaratórias, testemunhais e periciais produzidas durante o processamento deste processo perante esta Honorável Corte.

Considerando a jurisprudência consolidada desta Honorável Corte de que as reparações das violações de direitos humanos devem buscar, sempre que possível, a plena restituição da situação anterior àquela da violação (restitutio in integrum)636. Dada a natureza das violações cometidas no presente caso, que fazem com que seja impossível a plena restituição dos direitos lesionados, o Estado brasileiro deve adotar as medidas de satisfação dos diretos violados e garantias de não repetição, assim como medidas compensatórias necessárias para garantir a devida indenização moral e material das vítimas, em conformidade com sua extensa jurisprudência a este respeito.637