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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.3 PERSPECTIVA INSTITUCIONALISTA-EVOLUCIONÁRIA DE DESENVOLVIMENTO

2.3.1 Desenvolvimento Capitalista para Schumpeter

Os maiores legados deixados por Schumpeter (1989) são suas teorias sobre o empreendedorismo, a inovação e sua perspectiva ímpar sobre o modo como ocorre o desenvolvimento econômico. Esses campos de estudo se tornaram requisitos básicos para a compreensão e o estabelecimento de teorias sobre a importância do caráter dinâmico do capitalismo e sobre as funções da microeconomia não ortodoxa.

Para Laplane (1997), Schumpeter (1989) apresenta uma visão peculiar e original da dinâmica econômica do capitalismo, pois destaca o processo de ruptura de rotinas instituídas que transformam as estruturas produtivas existentes por meio de inovações, que, por sua vez, criam a instabilidade no sistema.

O fenômeno fundamental do desenvolvimento econômico ressalta a importância da consideração da história nas análises, principalmente, no que tange às variáveis não econômicas para a compreensão dos ciclos capitalistas. A vida econômica vem sendo compreendida como um fluxo circular que, normalmente, corre pelos mesmos canais todos os anos. No entanto, as mudanças no sistema capitalista não ocorrem progressivamente durante todo o tempo, elas sofrem revoluções produtivas promovidas pela inovação em momentos de desequilíbrio e evolução do sistema (SCHUMPETER, 1989).

De acordo com Laplane (1997), em condições estáticas, o equilíbrio do sistema capitalista não implica na ausência total de mudanças, uma vez que são tolerados determinados tipos e magnitudes de oscilações. Mesmo estável, há transformações no capitalismo que advêm de forças endógenas, quando elas aparecem em forma de inovações que desestabilizam o sistema econômico.

Schumpeter (1989), durante sua obra sobre o pensamento econômico, apresentou uma forma diferenciada de se compreender o capitalismo e o desenvolvimento econômico. O capitalismo é um processo evolutivo impulsionado pelo progresso técnico, por meio das inovações, ―[...] dos novos bens de consumo, dos novos métodos de produção ou transporte, dos novos mercados e das novas formas de organização industrial criada pela empresa capitalista‖ (SCHUMPETER, 1989, p.108). Baseado nessas considerações, Schumpeter (1989) sustenta a importância do empresário e do espírito capitalista dos negócios, tornando-se essencial também, nesse cenário, o crédito bancário.

A inovação é uma tarefa descontínua, exige grandes esforços e gastos até que se apareça algum tipo de retorno para os investimentos realizados. O crédito assume uma função central nesse conjunto explicativo do desenvolvimento econômico, agindo no sentido de deslocar os meios produtivos do fluxo circular e alocá-los em novas combinações. O impulso base que se estabelece e que dá suporte para o sistema capitalista provém de cinco tipos de novas combinações, segundo Schumpeter (1961):

a) Novo produto: um novo tipo de bem que os consumidores ainda não estão familiarizados, ou um atributo inovador de um produto já conhecido.

b) Novo método de produção ou de transporte: um processo produtivo, ou de logística, inovador para a indústria.

c) Novo mercado: a criação de um novo mercado ainda inexiste em certo país.

d) Nova fonte de matérias-primas: a utilização de novos tipos de matérias-primas.

e) Nova organização industrial: mudança no formato de uma indústria, por meio da criação ou da fragmentação de monopólio.

O sistema econômico não é compreendido a partir de um processo linear de melhoria incremental, na verdade, ele está recheado de movimentos contrários e de interrupções. O capital desempenha a função de transferir para os empresários os insumos para que ocorra a produção. Portanto, a garantia do poder de compra para a classe dos empresários é o resultado da soma dos meios de pagamentos que estão disponíveis em determinado momento para que sejam transferidos a eles (SCHUMPETER, 1989).

Nenhum processo terapêutico pode fazer desaparecer o grande processo econômico-social que afeta as empresas, as famílias e as classes sociais. Em uma sociedade com concorrência e propriedade privada esse acontecimento é necessário ao surgimento de novas práticas sociais e econômicas e de rendas reais sempre em ascensão, em todos os níveis sociais. Se houvessem menos flutuações cíclicas esse processo seria amenizado, mas ele não é totalmente dependente dessas mudanças de ciclo. Tais transformações são mais importantes do que a estabilidade econômica almejada pelas análises econômicas tradicionais. Tanto a queda quanto a ascensão cíclica de empresas e de famílias são características fundamentais do sistema capitalista (SCHUMPETER, 1989).

Em seu pensamento, Schumpeter (1989)se afasta da explicação do sistema econômico baseado no fluxo circular. Ele ressalta, portanto, as desestabilizações do sistema capitalista, ao invés, de um crescimento estável e previsível:

O desenvolvimento no sentido que o tomamos, é um fenômeno distinto, inteiramente estranho ao que pode ser observado no fluxo circular ou na tendência para o equilíbrio é uma mudança espontânea e descontínua nos canais de fluxo, perturbação do equilíbrio, que altera e desloca para sempre o estado de equilíbrio previamente

existente. Nossa teoria do desenvolvimento não e nada mais que um modo de tratar esse fenômeno e os processos a ele inerentes. (SCHUMPETER, 1989, p. 47)

O entendimento do processo de desenvolvimento baseado em uma matriz evolucionária considera que o estágio atual de desenvolvimento repousa sobre o precedente, criando pré-requisitos para o posterior. Nesse sentido, o conceito de destruição criadora se tornou central na obra de Schumpeter (1989), nele o processo de inovação é entendido como destruidor de empresas velhas e antigos modelos de negócios. Os empresários e as inovações empunhadas por eles são a força motriz do crescimento econômico sustentado a longo prazo.

O sistema capitalista se autorrevoluciona constantemente por ser mutante, modifica-se de dentro para fora para destruir o antigo e criar novos elementos. Portanto, o capitalismo ocorre em um processo evolutivo, um processo de destruição que cria algo novo a partir de elementos existentes. É esse processo endógeno, basilar do capitalismo, que toda empresa deve compreender a sua estratégia para sobreviver (SCHUMPETER, 1961).

O desenvolvimento, ao ser visto sob a óptica schumpeteriana, relaciona-se a três constatações duais. Schumpeter (1989) afirma que a primeira delas se constitui na relação entre o fluxo circular (tendência para o equilíbrio ou estado estático do sistema), característica em que se constrói a teoria hegemônica neoclássica, frente a um processo de mudança que tem como base os movimentos contrários e as interrupções, em um equilíbrio dinâmico. A segunda dualidade se constrói entre a visão estática (na qual se baseia a teoria hegemônica) e uma concepção dinâmica do sistema capitalista. E, por fim, entre os administradores (que não geram inovações, portanto, operam no fluxo circular) e os empresários (geradores de inovações).

O desenvolvimento é um fenômeno distinto do fluxo circular (que apresenta uma tendência para o equilíbrio) ele é ―[...] uma mudança espontânea e descontínua nos canais do fluxo, perturbação do equilíbrio, que altera e desloca para sempre o estado de equilíbrio previamente existente‖ (SCHUMPETER, 1989, p.47). Ao serem realizadas novas combinações, ou seja, o uso inovador de meios e processo produtivos, são criadas as condições para o momento do crescimento(boom) econômico e, em decorrência disso, surge o desenvolvimento. Para a realização dessas novas combinações, o

financiamento é fundamental, além disso, o sistema de crédito prosperou e cresceu ao financiar tais inovações (SCHUMPETER, 1989).

Dessa maneira, Schumpeter (1989) diferencia os capitalistas (banqueiros) dos empresários (empreendedores), a estes últimos é concedida uma posição de destaque no processo de desenvolvimento capitalista. Isso, pois, mesmo os últimos não sendo os proprietários do dinheiro, são eles que promovem as novas alocações dos fatores produtivos (inovação).

Portanto, o banqueiro não é primariamente tanto um intermediário da mercadoria ―poder de compra‖, mas um produtor dessa mercadoria. Contudo, como toda poupança e fundos de reserva hoje em dia afluem geralmente para ele e nele se concentra a demanda de poder livre de compra, que já exista, que tenha que ser criado, ele substitui os capitalistas privados ou tornou-se o seu agente; tornou-se ele mesmo o capitalista par

excellence. Ele se coloca entre os que desejam

formar combinações novas e os possuidores dos meios produtivos. Ele é essencialmente um fenômeno do desenvolvimento, embora apenas quando nenhuma autoridade central dirige o processo social. Ele torna possível a realização de novas combinações, autoriza as pessoas, por assim dizer, em nome da sociedade, a formá-las. É o éforo da economia de trocas. (SCHUMPETER, 1989, p.53)

Também vale ressaltar o importante papel dos líderes empresariais durante os processos que liberam a economia do fluxo contínuo. É devido mais à vontade do que ao intelecto o motivo pelo qual esses líderes realizam satisfatoriamente a sua função. Esses empreendedores têm que convencer os banqueiros de sua ideia e têm que comprar os fatores produtivos necessários para a condução dos meios de produção a novos canais. O capital é a alavanca com a qual o empresário consegue colocar a seu dispor os bens de que necessita, ou seja, uma forma de direcionar os fatores de produção para novas utilidades. A função dos capitalistas (banqueiros) é obter para o empresário os meios produtivos, fazendo com que o capital se coloque

como um terceiro agente, entre os bens e o empreendedor, em uma economia de trocas. O capital desempenha uma função que deve ser realizada antes que a produção técnica, de fato, possa ser iniciada (SCHUMPETER, 1989).

Para tanto, o crédito pode ser definido como a criação de um poder de compra para que seja transferido ao empresário um capital novo, e não somente a transferência de capital existente. O crédito fornecido funciona como um comando para o sistema econômico se acomodar de acordo com as necessidades do empresário. Somente assim se torna possível que o desenvolvimento econômico possa surgir a partir do fluxo circular em equilíbrio. Assim, após completar o negócio, caso tudo tenha ocorrido bem, o empreendedor enriqueceu a corrente social com mercadorias cujo preço é maior do que o crédito recebido por ele. Dessa maneira, pode-se afirmar que não existe inflação creditícia nessa situação, talvez deflação, mas somente um surgimento não sincrônico de poder de compra e dos produtos a ele correspondentes, fato que produz, temporariamente, o aspecto de inflação. No entanto, essa inflação somente se mantém temporária se as mercadorias, provindas desse poder de compra recém-criado, chegarem ao mercado no tempo correto e se o capitalista intervier com poder de compra provindo do fluxo circular, como poupança, em casos de falência ou processos de longa duração (SCHUMPETER, 1989).

A explosão (boom) e a depressão (bust) são dois momentos que se alternam constantemente no ciclo capitalista. O boom é caracterizado pelo advento de uma grande quantidade de empresários, quase que simultânea, a alguns setores industriais específicos, fazendo com que ocorra um direcionamento de capital para o desenvolvimento de inovações. O tempo que demora até que os novos produtos apareçam no mercado determina a duração do boom. ―Este aparecimento dos novos produtos ocasiona uma queda dos preços, que, por sua vez, põe fim ao

boom, pode levar a uma crise, deve levar a uma depressão e inicia todo o

resto‖ (SCHUMPETER, 1989, p.154).

O pânico generalizado, as epidemias de falências e os colapsos dos sistemas de crédito são características que não devem necessariamente acontecer, mas podem existir nos momentos de depressão, embora esta última, necessariamente, ocorra após períodos de

boom. Se o pânico vier a existir, os erros que acontecem devido a essa

situação ganham maior relevância agravando a crise e criando uma situação anormal de liquidação, que poderia ter sido somente parte do

curso normal do ciclo capitalista. A depressão tanto normal quanto anormal afeta pessoas que não estão relacionadas com o significado de causa do ciclo, principalmente, os trabalhadores. O período de depressão faz o papel de assimilação das inovações, estas últimas se apresentam com um efeito duradouro na economia, enquanto os sintomas e fenômenos percebidos como desagradáveis e inconvenientes são temporários (SCHUMPETER, 1989).

Um achado importante de Nelson e Winter (1982), com base no modelo de competição schumpeteriana, é que existem vencedores e perdedores nos segmentos industriais. A alta lucratividade e intensa produtividade dos vencedores tende a gerar uma distância financeira deles para os perdedores, uma vez que são reinvestidos os excedentes de capital na empresa, reproduzindo o capital mais rapidamente. Com o passar do tempo, isso leva a uma progressiva concentração industrial, portanto, faz-se justificável as políticas públicas que almejem lidar com tal situação.