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7.1 Propostas de novas políticas públicas pelo lado da oferta

7.1.1 Desoneração fiscal

Muitos agentes que atuam na cadeia de valor do biogás concordam que uma das principais barreiras que inibem uma utilização mais significativa deste energético no Brasil é o alto nível de impostos que incidem sobre esta atividade e que precisariam ser reduzidos. A incidência de impostos em projetos nesta área pode encarecer bastante seus custos.

A concessão de benefícios fiscais pode representar um fator determinante para o sucesso de políticas de fomento à produção de energia elétrica, ou biometano a partir de biogás.

7.1.1.1 Tributos federais

A concessão de benefícios em âmbito federal é a mais adequada e eficiente, comparada com as demais esferas federativas, pelas seguintes razões:

a. Possibilidade de instituir benefícios de abrangência nacional, permitindo atingir um maior número de contribuintes e, também, evitando guerra fiscal entre as unidades federativas. Ao mesmo tempo, é possível que sejam instituídos benefícios a determinada região, que visem corrigir desequilíbrios socioeconômicos;

b. A concessão dos benefícios não depende de anuência dos demais entes federativos, a exemplo do que ocorre com o ICMS, que requer unanimidade para a aprovação de convênio no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz);

c. Maior capacidade de desoneração da cadeia do biogás, decorrente da maior quantidade de tributos federais incidentes sobre os contribuintes (IRPJ/CSLL, PIS/COFINS, IPI, Imposto de Importação, Contribuição Previdenciária, etc.);

d. Maior flexibilidade para direcionar os benefícios. Os diversos tributos federais permitem desonerar todas as etapas da cadeia produtiva, desde a realização de investimentos e aquisição de bens e serviços até a produção e comercialização da energia elétrica gerada, ou do biometano produzido.

Seguem alguns exemplos de benefícios já previstos na legislação (vide Anexo A), dos quais poderiam se valer as empresas geradoras de energia elétrica, ou produtoras de biometano a partir do biogás:

(i) A redução da carga tributária do Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL) pode ser feita por diferentes métodos. Tanto pode haver a redução direta sobre os valores apurados, como pode haver a redução das bases de cálculo, por exemplo, excluindo a tributação sobre determinadas receitas ou, ainda, pela possibilidade de depreciação acelerada de bens.

(ii) Reduções do Imposto de Renda de Pessoa Física (IRPF) podem ser utilizadas como forma de incentivar a captação de investimentos para determinadas áreas de interesse econômico. Projetos de geração de energia elétrica, ou produção de biometano a partir de biogás podem se aproveitar de investimentos por meio de emissão de debêntures, ou por fundos de investimento feitos por pessoa física.

(iii) A desoneração da Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PIS/PASEP) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS) pode atingir diferentes etapas da cadeia de valor do biogás. Pode haver isenção das contribuições incidentes sobre a receita auferida pela comercialização de energia elétrica, ou biometano, sobre a receita da venda de bens e serviços para o ativo ou que sejam insumos, incluindo o biogás, às geradoras de energia elétrica, ou produtora de biometano, ou ainda as contribuições incidentes sobre a importação de bens e serviços pelas geradoras ou produtores de biometano.

(iv) As operações com energia elétrica são imunes à cobrança do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), possíveis benefícios fiscais de IPI podem ser instituídos sobre o

imposto incidente sobre a aquisição de bens para integração do ativo das geradoras de energia elétrica a partir do biogás, seja em operações internas ou em importações.

(v) O Imposto de Importação é um tributo federal de função marcadamente extrafiscal que tem como fato gerador a importação de produtos estrangeiros. A alíquota do Importo de Importação incidente na importação de bens que não tenham similar produzido no país pode ser reduzida pela aplicação do regime ex-tarifário. Coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), este regime consiste na redução temporária de alíquotas de importação de bens de capital, de informática e telecomunicação. Incluir dentro desse regime, não somente os bens de capital de maior volume, mas também as peças de reposição necessárias seria uma das possíveis opções abertas ao governo.

(vi) Isenção do Imposto Territorial Rural (ITR) pode ser concedida como forma de reduzir o ônus sobre a propriedade destinada à geração de energia elétrica, ou produção de biometano a partir do biogás. Esta isenção poderia ser aplicada para privilegiar o investimento em determinadas áreas.

7.1.1.2 Tributos estaduais

O Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços de Transporte Interestadual Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) é um imposto de competência estadual. Ele tem como principal fato gerador a circulação de mercadorias, incluindo a energia elétrica e o biometano, além dos serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação.

Como regra geral, as alíquotas nas operações internas aos estados variam entre 17% e 18% e, nas operações interestaduais podem ser de 12%, 7% ou 4%, dependendo do estado de origem, destino e da procedência da mercadoria. No âmbito estadual, o principal tributo utilizado para conceder estímulos a determinado setor da economia é o ICMS. No entanto, a concessão de benefícios depende de autorização do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), composto pelas Secretarias de Fazenda dos Estados e do Distrito Federal, mediante a celebração de Convênio ICMS, o que requer unanimidade para aprovação.

A utilização do ICMS como ferramenta de estímulo a determinado setor permite relativa flexibilidade para direcionamento dos benefícios concedidos. Com efeito, a desoneração pode ser aplicada, por exemplo, sobre a aquisição de bens para implantação de usinas geradoras de energia elétrica, ou produtoras de biometano, a aquisição do biogás e até a comercialização destes energéticos.

Existem alguns exemplos, no Anexo B, de benefícios concedidos com base em Convênio do Confaz que poderiam ser adotados para a geração de energia elétrica a partir do biogás.

A redução do ICMS permitiria evitar alguns dos efeitos decorrentes da cobrança em cascata do imposto. No caso dos RSU, há cobrança de ICMS sobre a coleta, transporte e aterramento de resíduos, bem como sobre o biogás, o que inviabiliza muitos investimentos nesta área por conta da elevação dos seus custos, em comparação com as receitas obtidas com a venda da energia elétrica, ou do biometano.

No âmbito estadual, a medida mais importante seria a isenção de ICMS para projetos de geração de energia elétrica por biogás por um período de 10 anos, como já acontece em Minas Gerais, São Paulo, Pernambuco e Goiás. O Confaz precisa estar ativamente envolvido para que a prática seja adotada em todo o território brasileiro.

Na prática recente no país, de injeção de eletricidade na rede pública por instalações de micro, ou minigeração de consumidores e a posterior compensação desta geração como crédito na fatura emitida pela concessionária local, alguns estados brasileiros cobram o ICMS sobre o consumo total, sem levar em conta a injeção da geração do consumidor na rede. Dezoito governos estaduais, mais o governo do Distrito Federal, concordaram em taxar com o ICMS só a aquisição líquida de eletricidade pelo consumidor (Convênio Confaz 16/2015). Esta prática deveria ser generalizada para todos os estados, fomentando todas as tecnologias aplicáveis, inclusive a de geração com biogás.

7.1.1.3 Tributos municipais

O Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) incide sobre a prestação onerosa de serviços previstos em lei complementar. Atualmente, a Lei Complementar n° 116/03 traz a lista de serviços tributados pelo ISS.

Como regra geral, o ISS é recolhido ao município em que se encontra o estabelecimento do prestador, exceto nos casos expressamente previstos por lei complementar em que a competência é atribuída ao município do local da prestação do serviço. Suas alíquotas são definidas pela legislação de cada município, de acordo com o serviço prestado, não podendo ser superior a 5% nem inferior a 2%.

A produção e comercialização de energia elétrica, ou biometano não é atividade sujeita à incidência do ISS, principal tributo de competência municipal, o que torna a concessão de

benefícios fiscais municipais menos adequada à instituição de política de estímulo econômico desta atividade.

Uma alternativa seria a redução do ISS incidente sobre serviços prestados aos produtores, ou ainda aplicáveis a contratos de concessão de obra pública ou de parcerias público-privadas que envolvam projetos de geração de energia elétrica, ou produção de biometano a partir do biogás.

Além do ISS, os governos municipais ainda cobram o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) e o Imposto sobre Transmissão de Bens Inter Vivos (ITBI). As municipalidades podem criar incentivos fiscais para desonerar os imóveis utilizados para a geração de energia elétrica, ou a produção de biometano a partir do biogás, seja pela concessão de isenção do IPTU ou do ITBI. O IPTU incide sobre a propridade predial e territorial urbana, enquanto o ITBI incide sobre a transmissão onerosa de bens. Estes impostos têm menor impacto na carga tributária total da empresa geradora de energia elétrica, ou produtora de biometano, mas podem ser utilizados, também, como forma de atração de investimentos para determinada área.