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Propostas de novas políticas de cunho ambiental para a gestão de resíduos

Em relação às políticas de fomento ao tratamento e disposição final adequados para os resíduos sólidos urbanos (RSU), o foco do governo deve ser o cumprimento das exigências estabelecidas na Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), ainda não respeitadas em sua integridade. O país já possui um marco regulatório adequado para este tipo de resíduo, mas são recomendadas metas mais ambiciosas para o aproveitamento energético do biogás, através das diversas tecnologias que podem ser usadas para esse fim. Uma boa parte da contribuição energética dos RSU advém da reciclagem.

Atualmente, uma grande parcela da população brasileira ainda não conta com serviços de coleta e tratamento de esgotos e estes são a principal causa da poluição nos rios do país. Avanços nas políticas públicas de saneamento, nas diversas esferas governamentais, e mais recursos investidos nesta área são essenciais para reduzir esta poluição. A geração de energia elétrica com o biogás produzido nas estações de tratamento de esgotos pode atender ao

consumo interno deste energético nas estações e os excedentes desta geração podem ser vendidos para a rede pública, propiciando uma significativa fonte de receitas.

Na área rural, esterco, outros resíduos da pecuária, e resíduos da agricultura também provocam a poluição de fontes hídricas e emitem gases que causam o efeito estufa (GEEs). O tratamento destes resíduos através da biodigestão e o uso do biogás resultante como combustível, ou para gerar energia elétrica diminuem substancialmente estes problemas ambientais e constituem novas fontes, locais, de suprimento de energia.

Em síntese, grande parte dos diversos tipos de resíduos da biomassa que não estão sendo tratados de alguma forma está causando contaminação dos recursos naturais e/ou problemas de saneamento para a população. Políticas públicas visando uma gestão sustentável destes resíduos trazem não só benefícios ambientais, como, também, oportunidades de se explorar uma significativa fonte renovável de energia: o biogás.

As preocupações crescentes sobre os impactos das mudanças climáticas têm levado países e empresas a adotarem ações cada vez mais agressivas de controle de suas emissões de gases que causam o efeito estufa. Os governos, de maneira unilateral ou conjuntamente, têm estruturado políticas climáticas diversas, incluindo medidas de apoio mútuo, metas de redução de emissões de GEEs e ações de adaptação frente aos impactos climáticos.

O acordo internacional de maior envergadura é a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC no original em inglês), assinado por quase todos os países do mundo, inclusive o Brasil.

O Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) tem tido um papel importante na produção e aproveitamento de biogás no Brasil. Este mecanismo é um dos incentivos internacionais utilizados para que empresários pudessem desenvolver projetos que trouxessem benefícios ambientais, econômicos e sociais para o país. O MDL tem alavancado projetos de aproveitamento energético de biogás proveniente de suinocultura, avicultura e de aterros sanitários.

Qualquer novo acordo climático internacional deverá estruturar mecanismos de apoio mútuo entre os países. Isso levará à criação de novos sistemas internacionais de cap-and-trade (incluindo uma nova fase para o MDL), que poderão beneficiar tanto países desenvolvidos como em desenvolvimento. O Brasil ganhou bastante experiência com os acordos internacionais de clima e suas repercussões nas políticas nacionais. Continuar ativamente nesse processo internacional trará muitos benefícios ao país.

8 CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

O potencial existente no Brasil para geração de biogás a partir de resíduos agropecuários, resíduos agroindustriais, lixo orgânico e esgotos urbanos é substancial.

O crescimento do ainda incipiente mercado de biogás no país pode agregar valor a toda a cadeia produtiva deste energético e minimizar a poluição e a emissão de GEEs associadas à atual gestão inadequada da maioria dos resíduos que servem de substratos para produzir o biogás.

O biogás pode ser consumido como combustível industrial, alimentando caldeiras, fornos e secadores, ou ser utilizado, após alguma purificação, como combustível veicular. Tratamentos mais complexos, que eliminem a umidade e contaminantes e concentrem o seu teor de metano podem transformá-lo em biometano, que substitui, ou complementa o gás natural. Um de seus usos mais difundidos, no Brasil e no mundo, é para gerar energia elétrica. A sua utilização mais adequada em cada circunstância depende de vários fatores, tais como o substrato disponível para a sua produção, seus custos, preços dos energéticos concorrentes e eventuais políticas públicas de fomento a certos usos.

Conforme ilustrado no capítulo 4 desta dissertação, modelos de simulação e de programação matemática são ferramentas essenciais para se estimar o potencial de aproveitamento energético dos resíduos e para auxiliar no dimensionamento econômico e localização ótima dos empreendimentos.

O estabelecimento de parcerias entre os setores público e privado é necessário para diminuir os riscos nos projetos e atrair investidores.

A cadeia de valor da produção e aproveitamento energético do biogás, apresentada no capítulo 6 da dissertação, envolve vários tipos de agentes. Incentivos ao crescimento do mercado do biogás devem atingir, na medida do possível, a maioria destes agentes. Entrevistas com estes vários tipos de agentes, realizadas no contexto de um projeto de P&D da ANEEL e analisadas nesta dissertação, indicaram suas visões sobre as principais barreiras e oportunidades para o crescimento do mercado de biogás no Brasil.

Com base nestas entrevistas, nas atuais políticas do governo brasileiro que afetam o biogás e em políticas públicas bem sucedidas para o biogás em outros países, analisadas no capítulo 5, novas políticas, classificadas em quatro categorias complementares, são propostas no capítulo 7 para alavancar toda a cadeia de valor do biogás no Brasil.

As próximas seções trazem conclusões deste trabalho por tipo de substrato utilizado para a produção do biogás e algumas recomendações para trabalhos futuros.

8.1 Resíduos sólidos urbanos

A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) modificou estruturas viciadas e pouco eficazes de gestão de resíduos sólidos no Brasil. No entanto, há um longo caminho pela frente para se ter sua plena implementação. É mais um caso, no País, de uma legislação avançada que ainda não está sendo cumprida.

Um dos grandes desafios para os RSU é a aplicação da PNRS nas numerosas pequenas cidades do País, que precisam se organizar na forma de consórcios para poderem implantar projetos de escala suficiente que permitam um razoável retorno econômico e consigam financiamento em condições favoráveis.

Projetos abrangentes de tratamento e disposição final de RSU podem obter recursos associados a seus benefícios ambientais, que incluem créditos de carbono, e sua eventual contribuição como fonte renovável de energia.

Tal qual está ocorrendo na China, o Brasil também precisa buscar a iniciativa privada, sobretudo na forma de parcerias público-privadas, para poder implantar, com a rapidez necessária, bons projetos de tratamento e disposição final de RSU, com aproveitamento energético sempre que for viável economicamente.

A diversidade econômica e social das cidades e regiões do Brasil abre espaço para que mais de uma tecnologia de aproveitamento energético de RSU se desenvolva no País, aproveitando, da melhor forma possível, as especificidades locais.

O Brasil não possui atualmente tarifas do tipo “feed in” para incentivar fontes renováveis de energia, em geral, e RSU, em particular, mas tem realizado leilões de energia com tetos de preço diferenciados para fomentar diversas fontes renováveis alternativas. O mecanismo de leilões diferenciados tem algumas vantagens em relação à aplicação de tarifas do tipo “feed in”. O desafio reside em uma especificação adequada dos parâmetros dos leilões, o que depende de um bom conhecimento das ofertas dos competidores e de políticas e metas de longo prazo para estas fontes, hoje inexistentes no País.

Tal qual o Japão, o Brasil também tem legislação sobre responsabilidade estendida do produtor, mas a sua aplicação ainda está restrita a alguns poucos produtos, como pneus,

recipientes de lubrificantes, recipientes de pesticidas agrícolas, pilhas, etc. e com graus de sucesso bastante diferenciados. A experiência do Japão pode ser muito útil ao Brasil tanto para ampliar substancialmente a relação de produtos e embalagens cobertas por este tipo de legislação, como para operacionalizar as práticas associadas.

A coleta seletiva de RSU, seja por parte da população que a produz, ou por recicladoras, ainda é muito limitada no Brasil. Fomentar esta prática, através de legislação e incentivos econômicos, deve ser uma das principais ações futuras da PNRS.