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Desvantagens do uso múltiplo integrado

3. ASPECTOS CONCEITUAIS DO GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS (*)

4.2.2 Desvantagens do uso múltiplo integrado

As desvantagens do uso múltiplo e integrado dos recursos hídricos são de caráter gerencial. 0 compartilhamento dos recursos hídricos por diversos usuários dever exigir o estabelecimento de regras operacionais, freqüentemente complexas, para que a apropriação da água seja realizada de forma harmônica. Além disso, haverá necessidade de centralização das decisões, com a possibilidade de serem estabelecidas entidades multissetoriais de porte considerável e difícil administração ou de previsão da articulação das políticas de entidades setoriais, através, por exemplo, de colegiados administrativos. Em uma administração pública grandemente centralizada e organizada por setores econômicos, a constituição de tais tipos de arranjos apresenta grandes dificuldades políticas e institucionais.

Não obstante esse aspecto, é importante frisar que o uso dos recursos hídricos não é uma opção que faz o planejador, mas realidade que ele enfrenta com o desenvolvimento econômico. As alternativas existentes são integrar tais usos de forma harmônica, em que pese a complexidade da administração, ou deixá-los de forma desarticulada, enfrentando, como conseqüência, conflitos entre os usuários que comprometerão a eficiência do uso.

1.3 Interdisciplinaridade da gestão de águas

Como mostrado ao longo deste trabalho, o uso da água para diferentes finalidades acarreta, exceto no caso dos usos de preservação, alterações em sua qualidade. Constata-se também, que os vários tipos de práticas do meio social (obras, desmatamento, urbanização e outros tipos) podem influir no ciclo hidrológico.

Os problemas ambientais são por natureza complexos. Essa complexidade se evidencia pelos diferentes aspectos observados quando se analisa um problema ambiental qualquer. Via de regra é raro encontrar um problema ambiental cujas causas não se situem no meio social. Entretanto, no momento em que se busca por exemplo, reparar um problema como desmatamento, poluição do ar, de um rio ou de uma bacia hidrográfica, ou ainda, praticar ações preventivas para que eles não ocorram, necessita-se saber, além das causas relacionadas diretamente com os efeitos observados, aquelas não explicitadas.

A relação de causa e efeito, comumente utilizada para explicação de fenômenos físicos, químicos, geológicos e outros, não tem sido eficaz para a compreensão da questão ambiental. Em sua

análise descobre-se que é no inter-relacionamento das práticas do meio social (ação humana) sobre o meio físico natural que estão as explicações que permitem a compreensão do problema ambiental em sua globalidade.

Diante desses fatos, busca-se como proceder para lidar com os problemas surgidos, o que fazer para compreender, controlar, evitar e solucionar os problemas decorrentes do uso inadequado dos recursos ambientais e que abordagem metodológica deve ser adotada – a unidisciplinar, multidisciplinar ou interdisciplinar.

A visão unidisciplinar do método científico vem conduzindo as ciências a uma crescente especialização, fazendo com que o objeto da pesquisa seja decomposto em partes que sofrem uma análise minuciosa por meio de métodos e técnicas de observação próprios de cada disciplina.

A motivação disciplinar é isolada e se traduz numa visão parcial do universo, levando a um entendimento distorcido do mesmo. Sua contribuição, entretanto, é fundamental no processo do conhecimento, para a identificação e tratamento de variáveis específicas.

A multidisciplinaridade é originária da percepção da interveniência de muitos elementos na explicação do universo considerado. A conceituação heterônoma de um problema define as disciplinas envolvidas que, utilizando-se de seus métodos e técnicas, apresentam contribuições particulares à compreensão do mesmo.

A interdisciplinaridade, por sua vez, é um processo de conhecimento que, utilizando uma estrutura multidisciplinar, procura estabelecer vínculos intencionais na compreensão e explicação do universo da pesquisa, superando dessa forma a excessiva compartimentação científica provocada pela especialização das ciências modernas. Essa integração deve ocorrer em nível de inventário, de modo a produzir conhecimentos e informações integradas e compreensíveis entre si. Nesse processo observa-se um aumento da autonomia na regulação dos conflitos metodológicos, já que a interação entre as disciplinas ocorre sem a presença de uma coordenação que especifique as contribuições individuais. A ação se desenvolve a partir de um entendimento comum das questões criando-se assim as condições necessárias para discussão das diferentes abordagens metodológicas.

Assim, a gestão dos recursos hídricos como parte da questão ambiental, exige esforços de coordenação multidisciplinar e intersetorial, como conseqüência dos atributos e das peculiaridades do recurso que se pretende gerir. É algo fundamental à gestão do recurso hídrico, incontornável, e que independe das normas jurídicas e das instituições que possam existir. Ignorar esse fato é desconhecer a realidade, com sérios riscos de conflitos para o futuro.

O Quadro 4.1 mostra os campos de atividades humanas correlatos aos recursos hídricos, mostrando a necessidade da abordagem interdisciplinar para seu devido aproveitamento.

Quadro 4.1 – Campos de atividades correlatos aos recursos hídricos (Barth, 1987).

1 - Aproveitamento de recursos hídricos Usos com derivação ou extração de água

Abastecimento urbano Abastecimento industrial Irrigação

Abastecimento rural Aqüicultura e piscicultura Usos sem derivação de águas Geração hidrelétrica Navegação fluvial e lacustre

Recreação e esportes náuticos Pesca

Diluição, assimilação e transporte de despejos Usos ecológicos

2 - Controle dos recursos hídricos

Controle do regime Águas superficiais Águas subterrâneas Controle de cheias

Controle de usos consuntivos Controle de Poluição Esgotos urbanos Esgotos industriais

Resíduos da agricultura Escoamento superficial urbano Controle de erosão Solo urbano Solo Rural 3 - Setores usuários Setor primário Agricultura

Extração vegetal e silvicultura Mineração

Setor secundário Industrial Energia Setor terciário

Transportes Comércio

Serviços públicos e privados 4 - Recursos naturais

Recursos minerais Águas subterrâneas Outros recursos minerais

Meio ambiente Meio ambiente biológico

Meio ambiente físico

Solo Solo urbano

Solo agrícola

Seres vivos Fauna

Flora 5 - Outros campos relacionados com

a sociedade Saúde pública Defesa civil Qualidade de vida Meio ambiente Sócio-econômico

O quadro 4.2 apresenta os conhecimentos envolvidos na atividade de gestão de águas, mostrando ser impossível para uma única pessoa, ou mesmo um pequeno grupo de pessoas, ter o domínio necessário dessas disciplinas. Isso leva necessariamente à formação de grupos

interdisciplinares para a execução da gestão de águas. Como conseqüência, surge o problema de inter-relacionamento de profissionais com conhecimentos distintos. Para possibilitar isso, há necessidade de que cada profissional atuante em uma equipe de gestão de águas tenha conhecimentos básicos em diversas outras disciplinas que não aquela que domine. Por exemplo, um especialista na área dos recursos hídricos deve ter boa base em diversas disciplinas técnicas e conhecimentos gerais de várias disciplinas classificadas como não-técnicas ou semi-técnicas.

Quadro 4.2 – Disciplinas do planejamento dos recursos hídricos.

TÉCNICAS SEMI-TÉCNICAS NÃO TÉCNICAS

Planejamento territorial Economia DOMÍNIO PRINCIPAL DOMÍNIO CONEXO

Meteorologia Administração Hidráulica Computação Oceanografia Direito Hidrologia Modelagem matemática Engenharia de Minas Ciências políticas

Saneamento ambiental Análise numérica Geografia Sociologia

Saneamento básico Instrumentação Biologia Psicologia

Estruturas hidráulicas Geoprocessamento Botânica Comunicação

Erosão e sedimentação Sensoreamento remoto Zoologia

Estatística Piscicultura

Análise sistêmica Turismo, recreação e lazer

Saúde pública Antropologia Geologia Agronomia Química Ecologia