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Elaboração, regulamentação e aplicação de leis

ESCOLHA DO PLANO PROGRAMAÇÃO DO PLANO

8.3 Elaboração, regulamentação e aplicação de leis

O desenvolvimento de uma gestão adequada dos recursos hídricos presume a exigência de um ou mais diplomas legais básicos que fundamentem todas as conseqüentes ações de gestão, ou seja, de leis que definam as bases de enquadramento da gestão. A aplicação de tal legislação implica a elaboração de regulamentos em vários domínios, constituindo tal atividade uma das ações próprias da gestão das águas.

Entre os domínios onde há lugar para o estabelecimento de regulamentos, destacam-se os seguintes:

- definição do elenco de utilizações possíveis dos vários trechos dos cursos de água; - classificação de águas em função das suas utilizações;

- fixação de caudais mínimos a garantir nos cursos de água;

- definição dos limites admissíveis de poluição nos meios receptores; - estabelecimento de normas gerais de qualidade para os efluentes; - licenciamento das utilizações de águas;

- definição de taxas de captação de água e de rejeição de efluentes; - fixação de multas e outras penalidades.

Conforme já vimos, são várias as utilizações da água, e cada uma delas pressupõe determinadas condições de qualidade e de quantidade.

Com base na relação entre a qualidade e a quantidade das águas dos meios receptores e as utilizações que delas se podem fazer, é possível regulamentar os critérios que permitem averiguar se uma água, cujas características se conhecem, pode ser utilizada para determinado fim. Além disso, conhecido também o grau de poluição que os meios receptores apresentam em dada situação de partida e fixados os objetivos de qualidade a atingir de acordo com o planejamento econômico-social, é possível regulamentar não só as características de qualidade a preservar ou a recuperar nos meios receptores, de modo a garantir certas utilizações, mas também as condições a que devem obedecer as rejeições de efluentes.

Essa regulamentação traduz-se, em termos práticos, na classificação dos meios receptores em função das suas utilizações desejáveis e na fixação de normas gerais e para os efluentes.

Variadas razões poderão concorrer para, em certos casos, se fixarem valores mínimos de caudal a garantir nos cursos de água. Destacam-se, entre elas, as seguintes:

- manutenção do equilíbrio ecológico do meio aquático;

- defesa da salubridade do ambiente, evitando-se a estagnação da água e a insuficiente diluição de resíduos provenientes de habitações dispersas e do solo em geral;

- satisfação de certas utilizações das águas, marcadamente dependentes da existência dos caudais mínimos.

Numa correta perspectiva de gestão de recursos hídricos, na qual necessariamente se envolve a possibilidade de tirar partido da capacidade de autodepuração dos meios receptores, não se justifica impor em todos os casos que os efluentes satisfaçam os mesmos valores dos vários parâmetros de qualidade. Consequentemente, as correspondentes normas gerais incluirão apenas os limites condicionantes da defesa da saúde pública e da proteção das condições ecológicas. Isso quer dizer que, além da regulamentação genérica, no âmbito da gestão das águas, há que serem regulamentadas, em cada caso concreto, as condições de rejeição de efluentes.

Os princípios de autorização prévia por parte do Estado para qualquer utilização da água e de pagamento dessa utilização deverão ser consignados na lei, havendo toda uma série de circunstâncias que podem condicionar as utilizações a autorizar e os correspondentes pagamentos a fixar. Assim, por exemplo, no que diz respeito a captação de água, motivos de ordem econômica e social podem implicar que os caudais captados e os preços cobrados não sejam uniformes, mas dependam das disponibilidades locais de água e da sua variação ao longo das estações do ano, das prioridades que se estabelecerem para as diferentes utilizações, das quantidades de água realmente consumidas e das parcelas devolvidas à origem após utilização. O esquema tarifário e o de caudais captáveis podem ainda evoluir ao longo dos anos em conformidade com a estratégia dos planos de desenvolvimento regional no que se refere às taxas de poluição, isto é, às que são devidas pela utilização dos meios receptores para rejeição de resíduos. Diversas circunstâncias podem condicionar, também, os valores a pagar, como por exemplo, do maior ou menor grau de depuração a que foram sujeitos os efluentes antes do lançamento, das condições do meio para onde são rejeitados, e outras condições.

Dentro dos limites de poluição admissíveis fixados, a taxa a pagar por um dado poluidor poderá ser maior ou menor consoante o grau de utilização que ele faz e da capacidade de autodepuração do meio receptor.

Ultrapassados aqueles limites, já não há lugar para o pagamento de taxas, mas sim para aplicação de penalidades, em particular de multas, uma vez que o poluidor se colocou em situação ilegal. Os valores poderão variar em função de vários fatores, matéria que também exige regulamentação.

A Conferência de Caracas, promovida em 1976 pela Associação Internacional de Direito das Águas (AIDA 1976), recomenda como princípios fundamentais a serem considerados na elaboração de legislação básica relativa a águas, os seguintes:

- estabelecer a estrutura administrativa encarregada de definir a política de águas e de controlar a sua utilização;

- centralizar o planejamento no âmbito das bacias ou regiões hidrográficas de gestão das águas e confiar os aspectos executivos às entidades públicas ou privadas responsáveis pelas diversas utilizações;

- adotar a bacia hidrográfica como unidade de gestão dos recursos hídricos, sem prejuízo da existência de unidades político-geográficas de gestão (relacionadas, por exemplo, com o desenvolvimento econômico), mais amplas ou não coincidentes com as bacias hidrográficas e;

Relativamente à legislação é preciso elaborar e implementar para dar execução a uma política de gestão dos recursos hídricos, a Conferência da Água de 1977, das Nações Unidas, refere que:

"Todos os países deveriam analisar e manter em processo de permanente atualização as suas estruturas legislativas e administrativas relacionadas com a gestão das águas e, à luz da sua experiência mútua, promulgar, quando conveniente, legislação completa destinada a uma atuação coordenada no planejamento dos recursos hídricos; poderá ser desejável que as disposições adaptadas relativamente à gestão, à conservação e à proteção contra a poluição dos recursos hídricos sejam reunidas num único instrumento jurídico, no caso de a estrutura constitucional do país o permitir; a legislação deveria ainda definir o estatuto da propriedade pública das águas e das grandes obras hidráulicas, e incluir disposições relativas aos problemas de propriedade do solo e aos conflitos que deles podem resultar; deveria ainda ser suficientemente flexível para se adaptar à evolução das prioridades e das perspectivas adaptadas em relação aos problemas da água."

Na Conferência da Água de 1977 das Nações Unidas foram elaboradas ainda as seguintes recomendações, dirigidas aos países membros:

- devem ser sistematicamente efetuados o inventário e o exame crítico das regras (escritas ou não), dos regulamentos, dos decretos, das portarias e das medidas jurídicas e legislativas no domínio dos recursos hídricos;

- a legislação em vigor deve ser revista para ser aperfeiçoada e adaptada de maneira a englobar todas as questões relativas à gestão dos recursos hídricos, proteção da sua qualidade, prevenção da poluição, penalidades aplicáveis às rejeições de efluentes nocivos, concessões, captações, direitos de propriedade, e outros aspectos;

- ainda que, de modo geral, se pretenda que a legislação seja muito completa, deve-se procurar que ela seja concebida da forma mais simples possível, dada a necessidade de serem definidas as atribuições e as competências dos organismos públicos, e estabelecidos os meios de assegurar aos particulares o direito à utilização da água;

- a legislação deve permitir aplicação fácil das decisões a se tomar no interesse coletivo, protegendo, simultaneamente, os interesses legítimos dos particulares;

- a legislação deve definir o estatuto da propriedade pública dos aproveitamentos hidráulicos, assim como os direitos, obrigações e responsabilidades dos organismos públicos competentes, salientando o papel destes em relação ao controle de quantidade e qualidade da água; deve também especificar os organismos administrativos encarregados de exercer tal controle e de estabelecer e executar os programas de desenvolvimento dos recursos hídricos, e dotar esses organismos dos poderes necessários ao exercício das suas atribuições; a legislação deve ainda, nas leis básicas e nos regulamentos de execução, definir os processos administrativos necessários para que, não só o controle e a gestão dos recursos hídricos, em todos os seus aspectos, mas também a resolução dos problemas de utilização do solo, e dos conflitos que destes podem resultar, sejam efetivados de forma concertada, eqüitativa e eficaz;

- seria conveniente que os diferentes países documentassem e compartilhassem as respectivas experiências, objetivando um possível aperfeiçoamento das suas legislações; - seria conveniente atribuir prioridade à efetiva aplicação das disposições da legislação em

vigor, reforçando e tornando mais eficazes, com esse objetivo, e quando necessário, os dispositivos administrativos e outros.