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Em pesquisa com ex-alunos de MBA de Harvard, ocupando posições de média gerência, Costa (2001) procurou verificar o nível de consciência desses profissionais sobre a deterioração da qualidade de vida no trabalho e qual a reação deles. Muitos encaram a organização onde trabalham como uma “oportunidade de curto prazo de acumulação pessoal (seja em termos monetários ou de aprendizagem) com vistas à valorização da empregabilidade” (COSTA, 2001, p. 146-147). Interessante notar que aqueles que têm melhores condições para selecionar um emprego com alta qualidade de vida no trabalho, são os que mais comumente abrem mão dela, por enxergarem posições mutuamente excludentes entre essa qualidade e remuneração.

Seja em razão da atual tecnologia, que permite ao indivíduo estar ligado 24 horas do dia no trabalho, seja em virtude das reengenharias que trouxeram a necessidade de se fazer mais com menos, ou seja ainda pela invasão da mentalidade financista no dia a dia do escritório forçando as empresas a espremerem cada vez mais o “suco da produtividade”, a realidade é que o espaço de vida pessoal do indivíduo reduz-se assombrosamente (COSTA, 2001, p. 90-91).

O avanço tecnológico emerge como uma faca de dois gumes: por um lado aumenta a produtividade e por outro também eleva o estresse. Esse último fenômeno pode ser explicado pela preocupação de perda de dados em meios eletrônicos, novas demandas criadas por causa de tecnologias emergentes e saturação de comunicação com o trabalho (Business Wire, “Technology Increases Workplace Stress, Tipping the Scales of Work-Life Balance”, 1999). O artigo “Welcome to the New Company Town” (USEEM, Jerry. “Welcome to the New Company Town”, Revista Fortune, January 10, 2000, p. 62-70) critica uma série de iniciativas das empresas no sentido de transformar o ambiente de trabalho num espaço total, que viria a suprir a necessidade de hobbies e lazer fora do trabalho. Elas incluem, por exemplo, yoga, sessões de massagem, academias de ginástica, sala de televisão. Por trás do discurso de preocupação com a QVT dos empregados, esconde-se o real motivo de mantê-los mais tempo na organização. O ambiente de trabalho assemelha-se cada vez mais a um “lar”, e mais o lar é invadido pelo trabalho. O tempo livre para o lazer fora da empresa, para refletir sobre a vida, para ficar à toa sem preocupações, passa a ser artigo de luxo (COSTA, 2001).

A informalidade crescente no mercado de trabalho acarreta prejuízos à qualidade de vida do trabalhador. Durante a recente expansão econômica, entre os anos de 2002 e 2007, o Japão experimentou aumento da mão de obra informal, chegando a um terço da população economicamente ativa. A informalidade traz flexibilidade e redução de custos para as empresas, mas deixa os trabalhadores descobertos de seguridade social e diminui os treinamentos corporativos oferecidos, defasando conhecimentos e habilidades. Apesar da produtividade e os lucros por empregado terem crescido 1,8% e 80% respectivamente, os salários encolheram 1%. Participações em resultados, tradicionais nas organizações japonesas, caíram 3% assim como os bônus tornaram-se menos relevantes na remuneração dos trabalhadores, reflexo do aumento de empregos informais, que não pagam bônus (OECD, 2008).

Limongi-França (1996, p. 45) observa uma evolução colossal nas condições de trabalho nos últimos dois séculos, num passado em que a jornada de trabalho podia atingir 18 horas e o salário cobria apenas necessidades de sobrevivência. Entretanto, os desafios se renovam e

problemas inéditos surgem, como sobrecarga emocional, exigência de alta habilidade no convívio social organizacional, prazos apertados e decisões impopulares decorrentes de ênfase excessiva na satisfação de clientes. A autora contextualiza os anos 1970 com excesso de pessoal nas empresas, e os anos 1990 com o problema inverso, escassez de pessoas, consequentemente sobrecarregadas, desigualdades salariais ampliadas e o medo do desemprego.

No Brasil, a chamada “velha exclusão social” – composta pela baixa escolaridade, pobreza absoluta em famílias numerosas e desigualdade de renda – deu lugar à “nova exclusão social”, caracterizada pelo desemprego generalizado e de longa duração, isolamento juvenil, pobreza em famílias monoparentais, ausência de perspectiva para parcela da população com maior escolaridade e explosão da violência (CAMPOS et al., 2004a). Os dois processos amortecedores da tensão social, entre as décadas de 1930 e 1970, rápido crescimento econômico e mobilidade social e espacial, entraram em crise a partir dos anos 1980, diante do esgotamento do modelo de financiamento e, por consequência, do abandono do projeto de desenvolvimento nacional (CAMPOS et al., 2004b).

Após 1980, observaram-se taxas de expansão da economia levemente acima da variação da população e oscilações bruscas nas atividades produtivas (CAMPOS et al., 2004b). A abertura comercial não trouxe o prometido desenvolvimento e a globalização ampliou a desigualdade tanto internamente quanto em relação aos países desenvolvidos (CAMPOS et al., 2004c). Como resultado: aumento do desemprego, desassalariamento (perda de participação do emprego assalariado no total da ocupação) e a geração de postos de trabalho precários, explosão da violência, elevação de gastos com segurança pública e privada, isolamento maior dos ricos (CAMPOS et al., 2004b).

Uma das alternativas para combater o desemprego foi a flexibilização do mercado de trabalho. Entretanto, apesar de reduzir o custo do contrato de trabalho para o empregador, não respondeu adequadamente à expectativa de ampliação do nível do emprego e da formalização, além de reduzir a proteção social do trabalhador (POCHMANN, 2008).

Desde o final da primeira metade da década de 2000 observa-se o surgimento de um novo padrão de mudança social no Brasil, caracterizado pela combinação da expansão da renda nacional per capita com a queda na desigualdade pessoal da renda. Transformações na economia e nas políticas públicas resultaram, para os anos de 2004 a 2010, em crescimento médio anual da renda per capita ao ritmo de 2,9%, enquanto a desigualdade da renda pessoal reduziu 1,5%. “Com isso, observa-se também tanto a redução média anual da taxa de

desemprego (5,2%) e da pobreza (4,8%), como o forte aumento médio anual no valor real do salário mínimo (7,1%), na ocupação (3,2%) e nos anos de escolaridade (3,8%) dos brasileiros.” Essa confluência de mudanças permitiu melhorar a qualidade das ocupações geradas, predominantemente formais. “Entre 2004 e 2009, por exemplo, houve a geração líquida de 8,1 milhões de postos de trabalho formais, enquanto entre 1998 e 2003 foram criados apenas 1,9 milhão de novos empregos assalariados com carteira assinada em todo o Brasil” (POCHMANN, 2010, p. 641/642).

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