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1. Introdução Teórica

1.1. Diagnóstico citogenético-genómico

1.1.4. Diagnóstico pós-natal

No caso do diagnóstico pós-natal, o tipo de amostra mais utilizada é o sangue periférico, podendo ser solicitado para estudos de cariótipo constitucional, estudos de MLPA e de aCGH

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(array Comparative Genomic Hybridization). No entanto, em determinadas situações pode-se recorrer também a amostras de fibroblastos, como por exemplo, no caso dos fetos malformados ou nados-mortos de etiologia desconhecida.

Em diagnóstico pós-natal, as indicações clínicas principais para o estudo do cariótipo complementado ou não com outras tecnologias, incluem:

 Fenótipo clínico anormal ou dismorfismos;  Anomalias congénitas múltiplas;

 Atraso mental ou atraso do desenvolvimento psicomotor;  Suspeita de síndrome de deleção /duplicação;

 Doenças associadas ao cromossoma X;

 Feto expulso malformado ou nado-morto de etiologia desconhecida;  Presença de uma história familiar significativa de rearranjo cromossómico;  Paciente com amenorreia primária ou secundária ou menopausa precoce;  Azoospermia ou oligospermia severa;

 Alteração clinicamente significativa do crescimento: baixa estatura, crescimento excessivo, microcefalia, macrocefalia;

 Ambiguidade sexual;

 Casais com deteção pré-natal de alteração cromossómica ou variante invulgar;  Filho com alteração cromossómica;

 Infertilidade de etiologia desconhecida;  Três ou mais abortos consecutivos.

De entre todas as indicações para diagnóstico pós-natal, o atraso mental é a que representa maior impacto ao nível socioecónomico, para além de estar presente como uma consequência fenotípica principal na maioria das síndromes/distúrbios genéticos em análise neste trabalho. Por este motivo este distúrbio será abordado numa perspetiva geral, salientando alguns dos tipos de alterações cromossómicas a ele associadas (alterações subteloméricas, microdeleções/microduplicações).

O atraso mental é definido como uma diminuição significativa nas funções cognitivas [quociente de inteligência (QI) inferior a 70] e adaptativas sociais, com início antes dos 18 anos de idade (Wu et al. 2010; Rafati et al. 2012). Baseado no score do QI, o atraso mental pode ser classificado como “borderline”, ligeiro, moderado, severo e profundo (Ferrari 2009). O atraso mental como uma manifestação variável e heterogénea de disfunção do sistema nervoso central (Thuresson et al. 2007) ocorre em 2 a 3% da população, sendo que na maioria dos casos a sua

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causa etiológica é desconhecida (de Vries et al. 2005). O diagnóstico etiológico é um desafio, porque diversos fatores genéticos e ambientais podem contribuir para a sua patogénese (Ropers 2008). Acredita-se que os fatores genéticos estão envolvidos em muitos dos casos não diagnosticados, uma vez que há geralmente um aumento do risco de recorrência em irmãos (Crow & Tolmie 1998) e um grande número de mutações genéticas diferentes são conhecidas por estarem associadas com o atraso mental. Estima-se que 25 a 50% do atraso no desenvolvimento e atraso mental (moderado a profundo) é de etiologia genética (Wu et al. 2010) sendo que, atualmente, cerca de 282 genes humanos são conhecidos como causadores deste distúrbio (Chaudhary 2011). A síndrome do X frágil é a causa mais comum de atraso mental hereditário com uma incidência de aproximadamente 1 em cada 4000 homens e 1 em cada 7000 mulheres (Rejeb et al. 2011). Mutações em genes ligados ao cromossoma X são úteis para explicar a razão pela qual um maior número de homens, comparativamente ao número de mulheres, são severamente afetados pelo atraso mental (Chaudhary 2011).

Para além da síndrome do X frágil, a trissomia do cromossoma 21, os rearranjos subteloméricos e as microdeleções/microduplicações, representam uma fração significativa das alterações cromossómicas conhecidas associadas ao atraso mental (Rooms et al. 2004). As regiões subteloméricas são normalmente ricas em genes, e são mais suscetíveis para rearranjos do que outras regiões cromossómicas (Wu et al. 2010). Embora, os desequilíbrios subteloméricos estejam envolvidos no atraso no desenvolvimento, atraso mental ou em anomalias congénitas múltiplas, a relação causa e efeito não se apresenta bem definida (Shaw- Smith et al. 2004; Di Bella et al. 2006; Roos et al. 2006; Wu et al. 2010). As consequências clínicas são provavelmente determinadas pela localização e tipo de rearranjo, tais como deleções ou duplicações, bem como o tamanho das alterações, incluindo o número e função dos genes envolvidos (Wu et al. 2010). Essas regiões alteradas provavelmente contêm genes candidatos ainda não descritos que estão associados com o atraso no desenvolvimento/atraso mental (Wu et al. 2010). Algumas deleções submicroscópicas nas regiões subteloméricas resultam em síndromes de atraso mental bem definidas, tais como a monossomia 1p36, a síndrome de Wolf- Hirschhorn (4p-) e a síndrome cri-du-chat (5p-), mas para a maioria das alterações subteloméricas não existe um fenótipo característico associado. Por este motivo o screening de todos os subteloméros representa uma ferramenta de diagnóstico valiosa (Koolen et al. 2004).

As síndromes de microdeleção/microduplicação (quadro 1.1) são conhecidas por estarem associadas ao atraso mental, a malformações (Kjaergaard et al. 2010) e a outras anomalias, tais como, defeitos cardíacos (Shuib et al. 2006). As síndromes de microdeleção, são síndromes genéticas associadas a pequenas deleções cromossómicas, as quais usualmente envolvem 1 a 3

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milhões de pares de bases de DNA (Shuib et al. 2006). A variação nas manifestações fenotípicas está relacionada com a quantidade de material genético perdido na deleção cromossómica.

Quadro 1.1 – Síndromes de microdeleção/microduplicação e gene/locus envolvido (s) em cada uma delas, com a respetiva localização cromossómica [adaptado de (Theisen & Shaffer 2010)].

Os fenótipos clínicos de muitas síndromes de microdeleção definidas são variáveis, (Sharp et al. 2008; Buysse et al. 2009), enfatizando o papel de outros fatores genéticos e ambientais na determinação final do fenótipo. Algumas das síndromes de microdeleção mais comuns incluem as síndromes de Prader-Willi, Angelman, Williams, DiGeorge, Miller-Dieker, Kallmann e a síndrome de Smith-Magenis (Shuib et al. 2006). Para a maioria das síndromes de

Síndrome de microdeleção/microduplicação Gene/locus Localização

Microdeleção 1p36 Múltiplos 1p36

Microdeleção 1q21.1 com suscetibilidade para atraso mental, autismo, ou anomalias congénitas

Múltiplos 1q21.1 Microdeleção 3q29 Múltiplos 3q29 Microduplicação 15q11-15q13 Múltiplos 15q11-15q13 Microdeleção 15q13.3 Múltiplos 15q13.3 Microdeleção 16p11.2p12.2 Múltiplos 16p11.2p12.2 Microdeleção 17q21.31 Múltiplos 17q21.31

Microdeleção distal 22q11.2 Múltiplos 22q11.2

Microduplicação 22q11.21 Múltiplos 22q11.21

Angelman UBE3A 15q11.2

Beckwith-Wiedemann, relacionado IGF2 IGF2 11p15.5

Cat eye Múltiplos 22q11.1

Charcot-Marie-Tooth Tipo 1A PMP22 17p12

Cri du chat Múltiplos 5p15.2

DiGeorge I/velocardiofacial HIRA TBX1 22q11.21

DiGeorge 2 Múltiplos 10p14

Distrofia muscular Duchenne DMD Xp21.2-p21.1

Kallmann I KALI Xp22.31 Langer–Giedion TRPS1 EXT1 8q23.3 8q24.11 Miller–Dieker/Lisencefalia 1 PAFAH1B1 (LIS1) 17p13.3

Microduplicação Potocki–Lupski/17p11.2 Múltiplos 17p11.2

Prader–Willi SNRPN 15q11.2 Retinoblastoma/MR RB1 13q14.2 Rubinstein–Taybi CREBBP 16p13.3 Smith–Magenis RAI1 17p11.2 Williams–Beuren ELN 7q11.23 Wolf–Hirschhorn Múltiplos 4p16.3

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deleção, esta causa haploinsuficiência de um ou mais genes na região afetada, no qual a cópia do gene que permanece intacta não produz produto génico suficiente para a função normal. De facto, a haploinsuficiência para genes específicos tem sido identificada em diversas síndromes, incluindo as síndromes de Williams, de Langer-Giedion, de Miller-Dieker e a de DiGeorge/velocardiofacial (Theisen & Shaffer 2010).

As microduplicações genómicas apresentam consequências clínicas menos severas do que as microdeleções (Berg et al. 2010), pois neste caso não há perda de material genético. Visto que as síndromes de microduplicação genómica estão frequentemente associadas a fenótipos variáveis e penetrância incompleta colocam-se dificuldades no aconselhamento em relação às consequências futuras de uma dada microduplicação. Desta forma, a penetrância incompleta das duplicações genómicas e a expressão variável dos fenótipos observada nestes distúrbios, são de grande importância no contexto do DPN, onde as famílias podem ser confrontadas com decisões difíceis em relação à progressão de uma gravidez, uma vez que a informação dada é mais baseada em probabilidades (Berg et al. 2010).