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5. Discussão

5.3. Autismo (Painel P343)

5.4.1. Síndrome de DiGeorge/Velocardiofacial

As síndromes de DiGeorge (OMIM, 188400), Velocardiofacial (OMIM, 192430) e Shprintzen, foram descritas separadamente por diferentes autores, daí as designações específicas

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atribuídas a cada uma. No entanto, avanços nos métodos de diagnóstico revelaram que todas estas síndromes resultam de deleções hemizigóticas na região crítica do cromossoma 22q11.21 e assim, atualmente são denominadas de “síndrome de deleção do 22q11.2”, devido às dificuldades em escolher um único termo (Bittel et al. 2009; Fomin et al. 2010; Halder et al. 2012).

A síndrome de DiGeorge/Velocardiofacial foi inicialmente descrita em 1968 (Fomin et al. 2010) e atualmente representa a síndrome de microdeleção mais comum em humanos, com uma frequência estimada de 1 em cada 4000 nascimentos (Fernández et al. 2005; Bassett et al. 2011; Sedghi et al. 2012). Em 90 % dos pacientes, a microdeleção cobre uma região de 3 Mb com 30 genes associados, enquanto que a microdeleção de 1,5 Mb inclui 24 genes e tem sido identificada em 8 % dos pacientes (Fernández et al. 2005; Bittel et al. 2009; Wozniak et al. 2010). Os restantes 2 % incluem pacientes com outras alterações cromossómicas (por exemplo, deleção da região 10p). Embora, com uma frequência relativamente mais baixa, as deleções/duplicações atípicas na região crítica do cromossoma 22q11.21 também são detetadas (Wozniak et al. 2010). A maioria dos casos de síndrome de deleção do 22q11.21 ocorre de novo, mas em cerca de 10 % verifica-se um padrão de herança autossómica dominante (Wozniak et al. 2010; Bassett et al. 2011; Sedghi et al. 2012).

Esta síndrome apresenta um amplo espectro fenotípico com mais de 180 características clínicas associadas (Wozniak et al. 2010; Sedghi et al. 2012), as quais incluem principalmente: doença cardíaca congénita, anomalias neuromusculares e/ou anatómicas ao nível do palato, faces dismórficas, imunodeficiência, hipocalcemia congénita, defeitos ou anomalias urogenitais e dificuldades na aprendizagem (Wozniak et al. 2010; Breckpot et al. 2012; Sedghi et al. 2012). Para além disso, uma elevada prevalência de perturbações psiquiátricas têm sido reportadas em pacientes adultos. Essas incluem distúrbios psicóticos, especialmente, esquizofrenia e distúrbios do espectro bipolar, bem como distúrbios do espectro do autismo (Bassett et al. 2008; Verhoeven et al. 2011; Sedghi et al. 2012). É de salientar que, a deleção da região crítica do cromossoma 22 (22q11.21) é a principal responsável pela doença cardíaca congénita logo a seguir à síndrome de Down (Bassett et al. 2011), com uma frequência de malformações cardíacas a variar entre os 49 a 83% em pacientes com síndrome de DiGeorge (Fomin et al. 2010). O gene TBX1 (OMIM, 602054) é um dos genes mais relevantes no âmbito das anomalias cardiovasculares associadas com esta síndrome (Fomin et al. 2010; Wozniak et al. 2010; Sedghi et al. 2012). Este gene codifica um fator de transcrição, o qual faz parte da regulação de processos do desenvolvimento. Os diversos mecanismos em que este gene está envolvido, proporcionam muitas alternativas

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possíveis para o desenvolvimento de anomalias causadas por a haploinsuficiência, excesso ou estrutura incorreta do gene TBX1 (Baldini 2006; Wozniak et al. 2010).

Uma das observações mais relevantes em pacientes com deleção na região crítica do cromossoma 22q11.21, é o facto da severidade do fenótipo clínico não estar correlacionada com o tamanho das microdeleções (Yamagishi & Srivastava 2003) e mesmo em indivíduos com uma deleção de tamanho idêntico, pertencentes à mesma família ou em gémeos monozigóticos, são observadas alterações consideráveis na expressão fenotípica (Wozniak et al. 2010; Halder et al. 2012). Esta situação é devida provavelmente à presença de fatores genéticos modificadores (por exemplo, penetrância incompleta) e/ou epigenéticos, os quais encobrem qualquer correlação hipotética entre o fenótipo clínico e o tamanho/localização dessas alterações na região crítica do cromossoma 22q11.2 (Fernández et al. 2009; Ţuţulan-Cuniţă et al. 2012).

A duplicação da região cromossómica que se encontra deletada em pacientes com síndrome de DiGeorge/Velocardiofacial tem sido reportada, estabelecendo uma nova síndrome de duplicação genómica, a “síndrome de duplicação 22q11.21” (OMIM, 608363) (Portnoї 2009). Tal como na síndrome de DiGeorge, a grande maioria dos indivíduos afetados apresentam duplicações idênticas de 3 Mb e os tamanhos das duplicações podem ainda variar entre os 1,5 e 6 Mb (Wentzel et al. 2008; Portnoї 2009).

De uma forma geral, têm sido reportados poucos casos de duplicação na região crítica do cromossoma 22q11.21 comparativamente ao grande número de casos descritos com deleção nesta mesma região, sendo por isso complicado estimar a incidência destas duplicações na população. Esta diferença em termos de casos reportados pode ser explicada pela grande variabilidade fenotípica e em determinadas situações pelos fenótipos ligeiros dos pacientes com duplicação nesta região, que assim oferecem menos motivos para se suspeitar e pesquisar duplicações na região crítica do cromossoma 22q11.2, ou então devido às dificuldades técnicas na deteção de microduplicações por FISH em placas metafásicas. No entanto, com a utilização das técnicas de MLPA e aCGH em diagnóstico, a identificação de pacientes com duplicação na região crítica 22q11.21 tem vindo a aumentar gradualmente (Wentzel et al. 2008).

O fenótipo dos pacientes com esta síndrome é extremamente variável e pode oscilar desde anomalias congénitas múltiplas a ligeiras dificuldades na aprendizagem ou mesmo até uma aparência fenotipicamente normal (Portnoї 2009; Breckpot et al. 2012). As características clínicas reportadas mais frequentemente em pacientes com síndrome de duplicação 22q11.2, são o atraso mental/dificuldades na aprendizagem (97 %), o atraso no desenvolvimento psicomotor (67 %), o atraso no crescimento (63 %) e a hipotonia muscular (43 %). As características

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dismórficas mais comuns incluem o hipertelorismo (70 %), o nariz achatado (53 %), a micrognatia (52 %), a insuficiência velofaríngea (48 %), as orelhas displásicas (45 %), a dobra epicântica (42 %) e a inclinação ínfero das fendas palpebrais (41 %). Outros fenótipos descritos são, a malformação cardíaca congénita, a deficiência visual e auditiva, as convulsões, a microcefalia e as anomalias urogenitais (Wentzel et al. 2008).

No caso das duplicações distais na região crítica 22q11.21 observa-se uma expressão fenotípica variável e penetrância incompleta, o que torna difícil definir a patogenicidade dessas duplicações (Wincent et al. 2010). Consequentemente, não é evidente se a duplicação da região crítica do cromossoma 22 representa um polimorfismo benigno ou uma síndrome com imensa variabilidade clínica e penetrância reduzida (Agergaard et al. 2012). Tal como na síndrome de deleção do cromossoma 22q11.21, Ensenauer e colaboradores (2003) não consideram que exista uma correlação entre o tamanho da duplicação e a severidade do fenótipo. Desta forma, supuseram que em adição à dosagem génica, outros mecanismos genéticos e/ou interações ambientais e possivelmente imprinting, talvez sejam importantes na determinação do fenótipo em pacientes com duplicação na região crítica do cromossoma 22q11.21 (Ensenauer et al. 2003).