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Diferentes olhares sobre a recepção de um texto literário

1.7 A ESTÉTICA DA RECEPÇÃO

1.7.1 Diferentes olhares sobre a recepção de um texto literário

Muitos são os autores que discorreram sobre a literatura a partir do enfoque recep- cional valorizando a figura do leitor, fazendo da leitura um dos mecanismos ou atividades que ela pressupõe uma forma de desvendamento do texto literário e de compreensão da literatura, entre eles podemos citar: Roman Ingarden, A obra de arte literária (1931); Roland Barthes em O prazer do texto (1937); Hans Robert Jauss, A história da literatura como desafio à teo-

ria literária (1967); Umberto Eco, Leitura do texto literário (1979); Wolfgang Iser, O ato da leitura: uma teoria do efeito estético (1976); Stanley Fish, Is there a text in this class? (1980);

Robert Escarpit, Sociologia da literatura (1958) e mais atualmente Roger Chartier com A

ordem dos livros (1992).

Ainda pode-se dividir em algumas linhas, as abordagens teóricas que propõe a fi- gura dos receptores/leitores e mesmo o ato da leitura, como elementos fundamentais para a caracterização do fato literário.

1 – Nos domínios norte-americanos, os representantes mais difundidos são Stan- ley Fish (1980) e Wolfgang Iser (1999). O que esses teóricos têm em comum parece ser o fato de pensarem mais especificamente nos efeitos que os textos desencadeiam em seu leitor. Con- trapondo-se radicalmente à idéia de que o texto é uma estrutura de onde emana um sentido, esses autores consideram que o texto só ganha existência no momento da leitura e os “resulta- dos” ou “efeitos” dessa leitura são fundamentais para que se pense seu sentido. Para Fish a leitura não é a descoberta do que significa o texto, mas um processo de sentir o que ele nos faz. Sua noção de linguagem é pragmática. Tudo no texto – sua gramática, seus significados, suas unidades formais – é produto da interpretação, e de modo algum constituem algo dotado de uma realidade factual.

Para Iser, a obra literária mais eficiente é aquela que força o leitor a uma nova cons- ciência crítica de seus códigos e expectativas habituais. A obra interroga e transfor-

ma as crenças implícitas com as quais a abordamos, “desconfirma” nossos hábitos rotineiros de percepção e com isso nos força a reconhecê-los, pela primeira vez, co- mo realmente são. Em lugar de simplesmente reforçar as percepções que temos, a obra literária, quando valiosa, violenta ou transgride esses modos normativos de ver e com isso nos ensina novos códigos de entendimento... a teoria da recepção de Iser baseia-se, de fato, em uma ideologia liberal humanista: na convicção de que na leitu- ra devemos ser flexíveis e ter a mente aberta, preparados para questionar nossas crenças e deixar que sejam modificadas (EAGLETON, 2003, p.108-109).

2 – A Sociologia da leitura também foi caracterizada como teoria recepcional e os seus principais representantes Robert Escarpit (1969) e Roger Chartier (1997) já trazem as indicações principais da direção que seguem os estudos da recepção. Para esses autores, o estudo da literatura é feito por via dos elementos que dão base e sustentação para que ela exis- ta, a saber, o público (leitores), o próprio livro e a leitura. Escarpit entende a literatura não a partir de seus elementos textuais, mas como um tipo de leitura que é feita por gratuidade e que permite a evasão, o que exclui de suas pesquisas o aspecto estético. Chartier, por sua vez, vol- ta-se mais especificamente à história do livro e da leitura, bem como a “materialidade”dos textos enquanto aspecto que exerce influência direta sobre a(s) leitura(s) que se pode(m) fazer de um texto.

3 – A abordagem que o crítico francês Roland Barthes faz em O prazer do texto (1974), é a que mais se difere da abordagem de Iser. Barthes oferece uma explicação bastante contrastante da leitura ao enfocar o texto modernista, que dissolve todos os significados preci- sos num jogo livre de palavras, que parece desfazer os sistemas de pensamento repressivos com uma incessante oscilação da linguagem. A leitura se assemelha a um laboratório é ao mesmo tempo uma benção e um orgasmo sexual. A literatura é uma mensagem da significa- ção das coisas e não o significado das coisas. Para Barthes, “Texto de prazer: aquele que con- tenta, enche, dá euforia; aquele que vem da cultura, não rompe com ela, está ligado a uma prática confortável de leitura. Texto de fruição: aquele que coloca em situação de perda, aque- le que desconforta, faz vacilar as bases históricas, culturais, psicológicas do leitor, a consis- tência dos seus gostos, dos seus valores e das suas recordações, faz entrar em crise a sua rela- ção com a linguagem”(1974, p.56-57).

4 – Um estudo histórico mais detalhado da recepção literária é Que é a literatura? (1993), escrita por Jean-Paul Sartre. Esse livro deixa claro que a recepção de uma obra nunca é apenas um fato exterior a ela, é uma dimensão construtiva da própria obra. Todo texto literá- rio é construído a partir de um certo sentimento em relação ao seu público potencial, e inclui

uma imagem daqueles a quem se destina. O estudo de Sartre propõe-se, por isso a formular a pergunta “Para quem se escreve?”

5 – Jauss (1978;1994) aparece como um dos mais significativos entre os que colo- cam o leitor e a leitura como elementos privilegiados dos estudos literários. Além de pensar o caráter artístico de um texto em razão do efeito que este gera em seus leitores, Jauss também propõe uma nova abordagem da história literária pautada também no aspecto recepcional. Sua proposta de história literária articula tanto a recepção atual de um texto – aspecto sincrônico – quanto sua recepção ao longo da história – aspecto diacrônico – e ainda a relação da literatura com o processo de construção da experiência de vida do leitor. Assim, os textos são passíveis de diferentes recepções porque lidos por públicos diferentes no tempo e no espaço, o status desses textos também se modifica, o que força certa reformulação dos critérios que estabele- cem o que é e o que não é literatura.

Considerando-se que, tanto em seu caráter artístico quanto em sua historicidade, a obra literária é condicionada primordialmente pela relação dialógica entre literatura e leitor, (...) há de ser possível, no âmbito de uma história da literatura, embasar nes- sa mesma relação o nexo entre as obras literárias. E isso porque a relação entre lite- ratura e leitor possui implicações tanto estéticas quanto históricas (JAUSS, 1994, p.23).