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ESQUINAS DO LABIRINTO

3 ACIDADE COMO PODE SER: AS BASES DO PROCESSO TARDIO DE VERTICALIZAÇÃO DE JOINVILLE

3.4 A Dinâmica Demográfica

O crescimento populacional combinado com o desenvolvimento industrial se baseou, em grande medida, na imigração oriunda, principalmente nos anos 1970 e 1980, do interior de Santa Catarina e do sudoeste do Paraná. Atualmente a origem dos migrantes se ampliou.

Figura 20: Evolução da população de Joinville, 1851-2016

Fonte: IPPUJ (2016). Elaboração própria.

Nota: Os dados intercensitários a partir de 2000 são baseados em projeções do IBGE.

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A figura 20 mostra o desempenho do crescimento populacional de Joinville desde a sua fundação até 2016, pautado em informações historiográficas, nos censos demográficos decenais e em projeções do IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, para os anos intercensitários. A curva de crescimento mostra uma mudança na dinâmica demográfica a partir da década de 1950, que assume um comportamento acelerado até a virada do século, entre os anos 1990 e 2000. Desde as duas últimas décadas do século XX o crescimento populacional já demonstrava tendências de um novo ajuste, com a redução significativa da taxa de crescimento anual (Ver quadro 10). Essa tendência continua no século XXI seguindo uma expectativa de estabilização.

Essa perspectiva de baixas taxas de crescimento também é observada na dinâmica demográfica do estado de Santa Catarina e do Brasil como um todo, resultado de alterações que ultrapassam as questões de ordem econômica e avançam sobre a estrutura das famílias e na direção do comportamento individual. Os novos valores sociais e individuais se estabeleceram ao longo das últimas duas décadas e meia já são observáveis na dinâmica do território Essa transição demográficas e refletiria nas novas características do mercado imobiliário, como se verá mais adiante.

Ao longo dos quase cinquenta anos que correspondem ao período do estudo sobre a dinâmica imobiliária urbana extensiva realizado por Santana (1998) - 1949-1996 e nos quase 46 anos agora avançados nesta tese - 1970-2016-, a distribuição da população - Quadro 8 - apresenta uma modificação marcante a partir da década de 40, quando o contingente populacional urbano superou o contingente rural, que perdurava nos anos anteriores.

Quadro 8 - Distribuição da população - 1940/2010, Joinville

ANO URBANA % RURAL % TOTAL %

1940 16.724 55,67 13.316 44,33 30.040 100,00 1950 21.927 50,60 21.407 49,40 43.334 100,00 1960 55.352 78,31 15.335 21,69 70.687 100,00 1970 112.134 89,00 13.924 11,00 126.058 100,00 1980 222.273 94,20 13.539 5,80 235.812 100,00 1991 333.661 96,40 12.464 3,60 346.125 100,00 2000 414.972 96,60 14.632 3,40 429.604 100,00 2010 497.850 96,62 17.438 3,38 515.288 100,00 FONTE: IBGE -SEPLAN/SC, apud PREFEITURA MUNICIPAL DE JOINVILLE. JOINVILLE: Vida & Negócios (1992); Censo Demográfico IBGE 2000 e 2010. Organização própria (2016)

Outro aspecto importante a destacar é que o ritmo do crescimento populacional da cidade de Joinville - Quadro 9 - desde a década de 40, já vinha superando as taxas de crescimento demográfico do estado de Santa Catarina e do Brasil, com exceção para o período de 1950 e 1960. Mas, foi justamente a partir da década de 60 que, impulsionadas pela forte industrialização, as taxas de crescimento populacional de Joinville superaram em mais do que o dobro as taxas verificadas no estado e no país. O diagnóstico socioeconômico do Plano Básico de Urbanismo de 1965 traz um registro impressionante. As taxas de crescimento do emprego industrial (6,38% a.a. entre 1949 e 1959; 15,85% entre 1959 e 1963) cresciam em níveis superiores ao do crescimento demográfico (8,53% a.a. e 13,55% a.a., nos mesmos períodos, respectivamente).

Quadro 9 - Comparativo das taxas anuais de crescimento demográfico Joinville, Santa Catarina e Brasil - 1940/1991

PERÍODO JOINVILLE SANTA CATARINA BRASIL

1940 - 1950 3,74 % 2,92 % 2,39 % 1950 - 1960 2,39 % 4,86 % 2,99 % 1960 - 1970 6,12 % 3,20 % 2,89 % 1970 - 1980 6,46 % 2,26 % 2,48 % 1980 - 1991 3,55 % 2,05 % 1,89 % 1991 - 2000 2,21 % 1,87 % 1,64 % 2000 - 2010 1,69 % 1,55 % 1,17 %

FONTE: IBGE, apud PLANO DIRETOR DE AMPLIAÇÃO DO SISTEMA DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA E ESGOTAMENTO SANITÁRIO DE JOINVILLE, CASAN, 1993 apud Santana (1998); IBGE Censo Demográfico 2000 e 2010; IBGE apud IPPUJ, 2011

O plano se referia a esse fenômeno como “algo excepcional, em termos de cidades industriais brasileiras” e, mais impressionante ainda, pelo fato de que ocorria em um clima de “calma social” (PREFEITURA MUNICIPAL DE JOINVILLE / SERETE / JORGE WILHEIM ARQUITETOS ASSOCIADOS, 1965 apud Santana, 1998). Esse crescimento intenso se manteve durante vinte anos, tendo iniciado uma tendência de queda a partir dos anos 80, quando a atividade industrial, não só a local, manifestou uma retração, consequência de crises econômicas mundiais que já se manifestavam desde os anos 70.

No que diz respeito à sociedade joinvillense, sob o ponto de vista estrutural, o crescimento demográfico nas taxas observadas representou

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uma significativa “ameaça78” à ascendência germânica que predominava na sociedade local, representada pela formação de uma classe operária industrial, totalmente desvinculada da atividade agrícola e também sem ligações culturais com a origem étnica do período colonial. Essa característica se reflete na ocupação do território urbano e que se manifesta através uma diferenciação socioespacial visível, naturalmente aceita e verbalizada através de algumas expressões locais, tais como: “bairros operários”, “região de moradia dos caboclos”. No entanto, isso não impediu que, apesar da diluição do caráter germânico predominante, esta “nova gente” incorporasse muitos traços da cultura “alemã”, em especial aqueles vinculados à valorização do trabalho, marcantes na expressão do “mito fundador” ainda muito presente na sociedade local (SANTANA, 1998).

Quadro 10 – Distribuição relativa das famílias por faixa de renda (Salários Mínimos), 1962, 1972 ,1980 e 2010, Joinville FAIXA DE RENDA (S.M.) 1962 (1) 1972 (2) 1980 (3) 2010 Até 1 0,3 % 9,0 % 4,19 % 4,78 % 1-2 12,9 % 37,0 % 13,63 % 10,78 % 2-3 15,2 % 17,0 % 45,54 % (4) 40,19 %(4) 3-5 20,7 % 20,0 % Mais de 5 50,9 % 17,0 % 34,96 % 44,25 % SOMA 100,00 % 100,00 % 98,32 % (5) 100,00 % FONTES: FGV, SERETE, IBGE

NOTAS: Os dados relativos aos anos de 1962 e 1972 apresentam uma pequena diferença em relação às faixas de renda apresentadas no documento fonte, com vistas à permitir uma leitura comparativa entre os diferentes períodos. O documento utilizado como fonte foi o Plano Diretor do Sistema de Transporte Urbano (PREFEITURA MUNICIPAL DE JOINVILLE/SERETE, 1972, p. 25)

(1)

Fundação Getúlio Vargas, pesquisa sobre orçamentos familiares

(2)

Pesquisa Sócio-Econômica realizada pela SERETE

(3)

Censo Demográfico do IBGE, 1980 - Famílias e Domicílios.

(4)

Este Percentual representa a classe de 2 a 5 Salários Mínimos, pois os dados censitários não apresentam as classes intermediária (2-3 e 3 a 5 S.M.)

(5)

O total não corresponde a 100% pois não estão incluídas as classes “Sem Rendimento” (0,69%) e “Sem Declaração” (0,977%)

78Assim o Plano Básico de Urbanismo se refere às mudanças que a formação socioeconômica local experimentaria com o intenso fluxo migratório que se iniciava.

Sobre a dinâmica populacional e sua relação com o crescimento econômico é importante destacar que a sociedade joinvilense foi formada por um grande contingente populacional com baixos níveis de renda. A pesquisa de Santana (1998) e aqui complementada apresenta composição da população em termos de renda familiar, pela primeira vez destacado no Plano Básico de Urbanismo de 1965, que expôs à sociedade local este tipo de informação. Estudos posteriores e o próprio Censo Demográfico de 1980 revelaram o agravamento dessa situação, conforme demonstra o quadro 10.

O exame do quadro 10aponta uma variação muito grande na distribuição das famílias segundo as classes de renda. O ano de 1972, quando comparado a 1962 apresenta um aumento extraordinário da participação das famílias com rendas nas classes de renda mais baixas, muito próximas do salário mínimo. O grupo de famílias com renda de até 5 salários mínimos, que em 1962 correspondiam a cerca de 49,1% do total pesquisado, passou em 1972, a representar cerca de 83% do total das famílias residentes em Joinville. Muito embora não tenha sido possível encontrar na documentação pesquisada explicações plausíveis para esta mudança tão brusca, pode-se inferir a partir da análise do comportamento das taxas de crescimento populacional - Quadro 10 -, que o complexo industrial em fase de crescimento empregou um grande contingente de trabalhadores vinculados à base do processo produtivo. Tal perfil de renda sugere que a composição do capital das empresas locais, estava fortemente lastreada no trabalho que, pressionado em termos de sua remuneração, permitia as condições mínimas de habitação reveladas na paisagem urbana produzida por um processo analisado discutido por Santana (1998).

O quadro de distribuição de renda apresentou uma melhora significativa para os anos 1980, revelado pela redução da participação das famílias de baixa renda para algo em torno de 63%, o que ainda assim revela um perfil socioeconômico onde predominam famílias com demanda solvável muito baixo, em especial para atender às demandas relativas às condições de habitação, o que explica a predominância dos loteamentos populares e da autoconstrução em desfavor das habitações coletivas, sob a forma de apartamentos, por exemplo.

Da sequência cronológica dos dados apresentados conclui-se que, muito embora tenha havido uma melhora no quadro de distribuição de renda das famílias de Joinville, o contingente de baixa renda ainda é bastante significativo, pois se situa na casa dos 55,75% do total de famílias pesquisadas. Frente a esses dados fica muito claro que, apesar

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dos expressivos valores gerados no processo produtivo local, o nível de concentração da renda ainda se situa em um nível muito alto.

Figura 21: Comparativo da distribuição espacial da predominância da renda familiar em Joinville, 1972 e 1985

1972 1985

Fonte: Para 1972, adaptado de PREFEITURA DE JOINVILLE/SERETE, 1972. Para 1985, adaptado de PREFEITURA MUNICIPAL DE JOINVILLE. SECRETARIA DE PLANEJAMENTO E COORDENAÇÃO, 1987apud Santana (1998). Organização própria.

Tal fato como também comentado no item 4.2 em relação aos loteamentos e à autoconstrução, pode estar na base das explicações para o boom imobiliário vinculado às duas fases do Programa Minha Casa, Minha Vida, em especial das operações realizadas no Âmbito da faixa dois (entre R$ 1.600,00 e R$ 3.100,00 de renda familiar), mas também com participação de unidades destinadas à faixa um (abaixo de R$ 1.600,00 de renda familiar)79.

79Esta situação guarda certa semelhança com a dinâmica verificada em Lisboa (CÂMARA MUNICIPAL DE LISBOA/EPUL, 2004).

A expressão espacial da distribuição da renda segundo o critério da renda familiar, para o início da década de 1970 e meados da década de 1980, pode ser visualizada na figura 21. As duas representações mostram que em ambos recortes temporais havia uma concentração das famílias com renda superior a cinco salários mínimos na área próxima ao Centro da cidade e ao bairro Bucarein, estendendo-se para Oeste, em direção aos bairros Atiradores e Anita Garibaldi, e ainda ao Norte, em direção aos bairros América, Glória, Saguaçu e partes dos bairros Bom Retiro e Santo Antônio. Envolvendo esse núcleo de renda mais elevada, ocorria um cinturão de classes de renda misturadas, formando bolsões de renda média baixa e de renda média alta. A grande, e extensa, periferia ocupava o restante da área urbana, formada exatamente no período da intensa industrialização da cidade, entre 1970 e 1980.

De outra parte, as duas imagens confirmam o diagnóstico que o PLADSTU/72 (PREFEITURA DE JOINVILLE/SERETE, 1972, pp. 25- 26) já apontava, com relação à condição de renda na cidade. O Plano reconhecia que entre 1962 e 1972, houve uma mudança sensível no quadro de distribuição de renda local, resultado da intensa imigração que reforçou o contingente populacional das faixas de renda mais baixas. Assim, o movimento de diluição da renda que se verificou naquele período continuou na década seguinte. A mancha de renda de até 2 salários mínimos predominava em meados da década de 1980.No sentido contrário, das faixas de renda mais baixas.

Infelizmente a mudança nos critérios de demonstração da renda, deixando de ser segundo a família, passando a ser pelo chefe da família e, depois per capita, nos censos demográficos de 1991 em diante, trazem uma grande insegurança para que se possa fazer uma análise comparativa com o período atual. No entanto, tal desventura não impede de deixar muito claro que a condição de renda da população local, marcadamente de baixa renda, não lhe permitia acessar aos programas habitacionais de interesse social que partiam, da faixa de 3 a 5 salários mínimos. Assim, uma parcela significativa na tese que aqui se trata resulta demonstrada, de modo que a condição de solvência do mercado imobiliário local não permitia pensar em verticalização, senão nos loteamentos e na autoconstrução como saída para o problema da moradia.

Como bem salienta a citação a Singer (1979, p.33) na abertura desta tese, em Joinville, tal como é próprio das cidades capitalistas, a distribuição de renda se reflete na forma de produção e de apropriação do espaço urbano. Em 1965 o diagnóstico socioeconômico do Plano Básico de Urbanismo de Joinville já fazia referência a essa

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característica, salientando que tal situação explicava a baixa capacidade de investimento do poder público, ao mesmo tempo em que previa, em função disso, um forte impacto sobre a cidade considerando-se as elevadas taxas de crescimento populacional previstas para os anos seguintes que implicariam “uma mudança qualitativa bastante séria” (PREFEITURA MUNICIPAL DE JOINVILLE/SERETE/JORGE WILHEIM ARQUITETOS ASSOCIADOS, 1965, p. xvi).

As previsões se confirmaram. A intensa migração resultou não só no aumento populacional, em si, como também na diluição do caráter germânico como já frisado. A fisionomia “alemã” típica de 30 anos atrás ou mais, agoras e revela somente em poucos bairros da cidade, notadamente naqueles já tradicionalmente ocupados por pessoas cujas origens étnicas estão vinculadas ao processo colonial, tais como América, Atiradores, Glória, Anita Garibaldi, São Marcos e Saguaçu, além do Distrito de Pirabeiraba e da zona rural. O bairro Centro, em razão de seu caráter cosmopolita, desde há muito tempo já havia perdido o caráter germânico colonial. Já nos bairros ocupados por essa “nova gente” que acabou por configurar novos bairros, predomina outra ordem social, característica das regiões de origem a essa nova população. 3.5 A (Re)produção da cidade de Joinville: Os marcos regulatórios do projeto urbano como condição para a verticalização

Como já comentado anteriormente a Colônia Dona Francisca, gérmen da cidade de Joinville, resultou de um empreendimento colonial de base agrícola, que previa a instalação de propriedades rurais contornando um centro urbano, uma “iniciativa de caráter capitalista, nascida da convergência dos interesses da Corte Imperial brasileira ... como desejo de expansão das fronteiras alemãs” (TERNES, 1993, p. 52).

O processo de ocupação do território apresentou fortes influências dos diversos ciclos econômicos que se sucederam desde a fundação da Colônia Dona Francisca (SOUZA, 1993, p. 25). Assim, a fase inicial da colonização foi marcada pela ocupação extensiva para Oeste a partir do núcleo central, às margens do Rio Cachoeira, com vistas ao assentamento famílias dos colonos em lotes coloniais de 25 a 30 hectares cada.

Figura 22: Representação da tipologia de ocupação do espaço rural alemão conhecida como streusidlung e similar ao ocorrido nas áreas de colonização

germânica em Joinville

Fonte: Weimer (1983)

A tipologia da ocupação territorial inicial - outra manifestação de verticalidade - se assemelhava ao streusidlung80 (Figura 22 e Figura 23), característico da Alemanha rural de meados do século XIX, segundo a qual, as famílias ocupavam lotes com frentes estreitas e com bastante profundidade no qual construíam a unidade de moradia e as instalações de serviços, bem como desenvolviam a prática agrícola. Há que se notar que segundo essa tipologia de ocupação, não havia a formação de vilas (WEIMER, 1983). Contudo, a matriz fundiária colônia exerceu forte influência no desenvolvimento da cidade de Joinville, na medida em que serviu de referência para a orientação do processo de parcelamento do solo o qual, em muitos casos, respondeu aos limites impostos pela orientação da gleba. Essa subordinação foi frequentemente mais efetiva do que os planos urbanísticos, por falta de uma ação mais eficaz de controle urbanístico por parte da municipalidade, marcando uma atitude

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Weimer (1983) revela que em meados do século XIX outras formas típicas de ocupação do território rural alemão eram constituídas pelo Hof isolado, o

Haufendorf, o Strassendorf e o Weiler, os três últimos formando pequenas vilas, de

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que perdurou até quase o final do século XX, por volta da década de 1990.

Figura 23: Reprodução fotográfica do Mapa da Colônia Dona Francisca - 1868, elaborado por Colonisations-Vereinv. 1849 in Hamburg, onde se pode observar

a estrutura fundiária da área central da Colônia Dona Francisca e as vias estruturantes.

Fonte: Arquivo Histórico de Joinville. Acervo próprio.

O ciclo da erva-mate, entre 1860 e 1910, impulsionado pela abertura da estrada Dona Francisca, finalizada em 1872, consolidou o núcleo urbano inicial. Isso porque ali se localizava o cais do Poschaan, onde se fazia o primeiro embarque do produto em direção ao porto de São Francisco do Sul e dali para os mercados externos, Uruguai e Argentina. O cais ocupava a margem direita do rio Cachoeira onde atualmente se localiza o Mercado Municipal.

Figura 24: Evolução da mancha urbanizada de Joinville no período de 1860 a 2011

Fonte: IPPUJ, 2015a

Apesar do dinamismo econômico proporcionado pelo ciclo da erva-mate e, na sequência, da madeira (até 1940/1950), o território ocupado com características urbanas não ultrapassava alguns poucos quilômetros quadrados. Limitado à Leste pelo rio Cachoeira avançava para o norte até o final da Rua Dr. João Colin; para Oeste não ultrapassava as imediações do Cemitério Municipal; e em direção ao Sul não ultrapassava a Estação Ferroviária. Esse território manteve-se estável até o final dos anos 1940, quando então iniciou um período de grande expansão - Figura 24 - por força do dinamismo proveniente do processo de industrialização.

O instrumental normativo urbanístico de Joinville pode ser analisado sob dois aspectos: o primeiro, enquanto um instrumento normativo pura e simplesmente; e o segundo, sob o aspecto da permissividade de índices urbanísticos, em especial, no que diz respeito ao volume construído admitido nas diversas zonas de uso (distribuição

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espacial de gabaritos generosos e CAL - Coeficiente de Aproveitamento do Lote, dimensionado muito além do potencial do mercado imobiliário local).

Na falta de registros documentais precisos, pode-se apenas inferir que a permissividade aludida no parágrafo anterior, tem a ver com a possibilidade de gerar tranquilidade no mercado imobiliário, ainda que precária, no sentido de manter os preços da terra em níveis baixos. A permissividade de edificar em altura em praticamente toda a extensão do perímetro urbano amplia a disponibilidade de potencial construtivo, de modo que os detentores da propriedade da terra, não se sentiriam muito à vontade para exercer plenamente seu poder de monopólio, através da manipulação dos valores do mercado de terras. Essa condição favorece, em princípio, os construtores e incorporadores imobiliários os quais, por interesse negocial direto, necessitam ir ao mercado para fazer seus investimentos ou ainda para formar um estoque de terra para futuros empreendimentos.

Em Joinville, segundo Santana (1998) de 1896 até a década de 1960, a edição das disposições urbanísticas versou, em sua maioria, sobre a regulamentação da ocupação do espaço quase que exclusivamente subordinada às disposições relativas à civilidade. O que se destaca como elemento ordenador do tecido urbano foram as determinações acerca do dimensionamento do sistema viário. Determinações essas que influenciaram sobremaneira o desenho urbano até hoje presente na feição da cidade. Desde 1986, já se exigia vias com largura de caixa variando de 10 a 11 metros. Em 1923 o novo Código de Posturas Municipais, inovou ao introduzir a visão de hierarquia no sistema viário. O esqueleto viário passou a se estruturar sobre um conjunto de vias com 16 metros de largura e avenidas com 25 metros de largura.

Contudo, uma análise mais atenta indica que havia uma certa confiança no fato de que o desenvolvimento se faria de maneira equilibrada por si só. Uma postura do tipo “laissez-faire” bastante liberal. Assim é que esgotado o “acordo” pelo surgimento de novas demandas, o processo de produção exigiu uma nova interferência substancial do Poder Público. No entanto, isso não significa dizer que nesse período as disposições relativas às Posturas Municipais permaneceram inalteradas. A esse respeito Santana (1998) observa que as novas diretrizes já procuravam influenciar no desenho urbano, tal como o tamanho das quadras, as disposições das vias, o alinhamento viário e o nivelamento das vias e limitando a altura dos taludes como resultado de cortes.

Esse último detalhe deveria ter influenciado diretamente o modelado da cidade e a forma de apropriação do relevo, na medida em que sempre prevaleceu o traçado xadrez no desenho das cidades em geral, não tendo sido diferente no caso de Joinville. Contudo, o aumento da capacidade mecânica de remoção dos obstáculos da paisagem natural reduziu o efeito positivo das medidas propostas. Assim prevaleceu a técnica de “arrasa quarteirão” ou bulldozer no processo de parcelamento e ocupação de solo.

No que diz respeito ao procedimento administrativo para a aprovação de projetos de parcelamento do solo, o processo subordinava- se às disposições estabelecidas em nível federal desde 1937 (Decreto- Lei n.º 58), que dispunha sobre a venda de lotes em prestações, tanto urbanos, quanto rurais.

A edição do Decreto-Lei coincidiu com a fase inicial do processo de industrialização do Brasil e de Joinville, de modo que os primeiros