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7 RESULTADOS

7.4 Organização do trabalho e fatores psicossociais

7.4.3 Discriminação das tarefas

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Segue-se, em ordem decrescente das freqüências obtidas, a avaliação dos operadores estudados sobre os aspectos relacionados à discriminação das tarefas:

- a exigência de um nível elevado de agilidade para a realização do trabalho foi confirmada por 83,1% dos operadores;

- o caráter repetitivo do trabalho foi confirmado por 80,6% dos operadores;

- a afirmação de que o trabalho leva à necessidade de aprender coisas novas foi confirmada por 79,0%;

- o trabalho oferecendo oportunidade para o desenvolvimento das aptidões dos operadores foi negada por 74,2%;

- a presença de variedade de tarefas no trabalho foi negada por 66,9% dos operadores;

- a afirmação de que o trabalho requer um espírito criativo foi negada por 50,8% dos operadores.

Como se observa, dos seis aspectos avaliados, três apresentam-se como estressores importantes e três como aspectos atenuantes. A exigência de agilidade e criatividade pode ser inferida através do depoimento 35, traduzida pela expressão 'ter jogo de cintura' ou 'ter o feeling'.

Um primeiro aspecto a destacar, em termos de discriminação das tarefas, refere-se à divisão do trabalho entre os Núcleos de atendimento. O atendimento no Núcleo Administrativo foi identificado como uma fonte especial de tensão, por representar maior variabilidade das demandas, maior ambigüidade da tarefa e maior repetitividade e monotonia, quando comparado ao Ambulatorial:

Depoimento 38

"Eu não tô com o estresse que eu fiquei nos seis meses de Administrativo. (...) Entra ligação a todo momento, só que no Ambulatorial você tem pausas leves, vai chamar o médico se você precisa de alguma coisa... Só que no administrativo são informações muito diferentes (...) a pessoa liga, o cara que tá aposentado, e isso e aquilo, e você já tem que ter o argumento pra ficar falando, você não tem nem tempo de falar pra pessoa

165 "Um momento" e procurar na tela... Tem que ir procurando e já ir falando, então a sua cabeça parece que vai explodir! Eu acho que o Administrativo estressa, estafa, mais do que o Ambulatorial... (...) Não, quando começa dia dezoito de setembro e ninguém recebeu o boleto, menina!... É uma atrás da outra! 'Eu não recebi boleto!' 'Boa tarde!' 'Eu não recebi boleto!' 'Boa tarde'... É que parece uma coisa, aí começa... por causa do reajuste... Tem semanas que é só aquilo, só aquilo, e só

aquilo!..." (operadora N; grifos nossos).

Nos primeiros anos do funcionamento da Central, iniciado em 1997, as demandas eram em número menor e menos diversificadas, o que permitia aos operadores atender indistintamente às chamadas e ter breves conversas informais com os colegas. O treinamento era realizado em três dias, e envolvia o estudo de apenas um manual.

A importância adquirida pelo processo de treinamento, diante do crescimento da Central, foi assim referida por uma representante da administração: "Hoje o treinamento é essencial, porque aumentou muito o volume de informação e o número de chamadas, mas sem tempo de intervalo, de fazer perguntas. Por isso a pressão é muito maior".

Durante a pesquisa, o treinamento de novos operadores tinha a duração de 10 a 15 dias, durante 8 horas por dia, constando das seguintes fases: Integração, Formação, Aperfeiçoamento e Desenvolvimento. Após esse período, os novos operadores eram encaminhados ao atendimento, onde permaneciam 'de carona' junto a funcionários mais experientes, seguindo-se então a troca de posições, estes últimos permanecendo 'de carona' para dar suporte aos novatos.

Para os operadores já em atuação era oferecido o 'Programa de Educação Continuada' (PEC), através de sessões semanais, aos sábados, com duração de 30 minutos. Estas sessões incluíam o controle da presença dos operadores.

A Central também formulava um plano anual de treinamento, incluindo eventos internos e externos, que devia ser submetido à aprovação da Sede da empresa X.

O treinamento efetivamente oferecido, entretanto, apresentava inúmeros problemas, tendo sido avaliado como insuficiente por 42,7% dos

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operadores consultados e como suficiente por 35,5%. 21,8% dos sujeitos responderam não saber avaliar esse aspecto.

Depoimento 39

"Foram quinze dias [de treinamento]. Então, foi uma coisa assim, muito, muito... só teórica! A gente teve treinamento de coisas que a gente não precisa saber (...). Perde-se muito tempo nisso! O treinamento é completo, mas na área teórica! (...) Não tem, assim... como resolver os problemas..." (operador S; grifos nossos).

"E não é com o sistema?" (pesquisadora) Depoimento 40

"Não, não, isso até foi uma das sugestões que eu fiz, depois que eu fiz o treinamento, de que fosse colocado um terminal mesmo... Até a prova não é feita disso aqui, a prova é feita verbalmente!... Vai um supervisor, com um médico, e o médico simula um atendimento pra você, mas não é utilizado o terminal... " (operador S; grifo nosso).

Um problema grave foi identificado através da entrevista coletiva, relativamente ao treinamento dos cerca de trinta operadores terceirizados incorporados à Central durante a pesquisa. Para estes, havia sido dado um treinamento de apenas sete dias, uma vez que os gestores haviam estabelecido como pré-requisito, perante a agência de recrutamento, que eles tivessem sido previamente treinados:

Depoimento 41

"Mas hoje eu acho que tá pior ainda, porque eu fiquei semana passada dando suporte pro pessoal da [empresa fornecedora de mão de obra terceirizada] (...): quem tá dando 'carona' já não sabe muita coisa... O que entrou agora, nadinha... não sabe nada... E eles têm que responder, eles estão respondendo, o que me preocupa é que eles estão respondendo sem medo, e cada um diz uma coisa!... (operadora N; grifos nossos).

Depoimento 42

"Olha, eu que tive o treinamento de um mês, a sensação que eu tinha -- tive, quando fui prá central -- era que eu não ia dar conta... Porque era como ela falou, era muita informação! Lógico que, como todo emprego

167 que você entra, é tudo novo, mas aqui era uma gama de informações

muito grande, daí com o tempo você vai se adaptando e fica tudo normal...

Agora, eu fico imaginando esse povo que tá entrando agora..." (operador B; grifos nossos).

A combinação dos aspectos treinamento insuficiente com o grande volume de informações a processar era agravada pela dificuldade de acesso ao supervisor, como se observa nos seguintes depoimentos:

Depoimento 43

"Eu acho que o problema é a busca ao supervisor... Porque se acontece isso hoje [os operadores terem muitas dúvidas sobre como prestar atendimento], é porque a gente não tá tendo uma base... suficiente" (operador B; grifo nosso).

Depoimento 44

"Claro que o ideal é você ou ter todas as informações ou buscar o supervisor" (operador S; grifos nossos).

As entrevistas com representantes da administração permitiram observar ainda outro aspecto problemático do treinamento, relacionado às constantes mudanças que se verificavam nas regras dos planos de saúde. Isto exigia uma atualização constante por parte dos operadores e supervisores, que se via freqüentemente prejudicada pela própria sobrecarga de trabalho a que todos estavam submetidos. Este fato era acentuado pela prática do rodízio de substituição dos coordenadores: os operadores sêniores afastavam-se do atendimento por aproximadamente um mês, o que os obrigava a um intenso período de atualização ao voltarem à função de atendimento.

Outra falha foi apontada pelos operadores pertencentes ao Núcleo Ambulatorial. Estes referiram a necessidade de um treinamento técnico mais aprofundado, para que passassem a ter maior autonomia para a liberação de autorizações para procedimentos simples. A falta desse treinamento fazia com que eles tivessem de recorrer constantemente à orientação dos médicos auditores.

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A alta freqüência com que os operadores do Núcleo Ambulatorial recorriam ao apoio dos médicos foi motivo da seguinte brincadeira por parte de um representante da gerência: 'a cada enxadada, uma minhoca...'.

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