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Discursos sobre a vida pessoal/familiar e suas exigências perante o domínio laboral

Parte II – Metodologia

4. A RELAÇÃO TRABALHO/VIDA PESSOAL E O ENVOLVIMENTO COM OS DIFERENTES DOMÍNIOS

4.3. Discursos sobre a vida pessoal/familiar e suas exigências perante o domínio laboral

Falar na relação entre vida pessoal/familiar conduz a discursos espontâneos e emotivos na grande maioria dos inquiridos, o que revela a grande importância deste domínio. Neste ponto são reproduzidos discursos sobre a importância da família e vida pessoal, assim como a forma como os profissionais do Hospital de Braga olham para ela e a cruzam com a vida profissional. Os momentos de opção, ou até mesmo os momentos em que ficam sem alternativa e têm que abdicar da vida profissional para responder às exigências pessoais, são explorados em seguida.

A importância que os colaboradores dão à sua vida pessoal/familiar é claramente evidente:

“A minha família é tudo!” (Enfermeira, casada e com dois filhos)

“A minha família está sempre em primeiro lugar!” (Assistente Operacional, casada, com um filho e em regime de horário flexível atualmente)

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“Atualmente a família é o ponto número um de tudo isto!” (Técnica de Diagnóstico e Terapêutica, casada, com dois filhos e em regime de trabalho em meia jornada atualmente)

“Ah! Muito importante. É uma desgraça não ter família! [risos] é uma desgraça! É uma alegria chegar a casa e saber que tem alguém à espera, jantar, conversar… claro que às vezes há coisas que não batem certo. Mas é tudo!” (Médico, em união de facto e com três filhos, em regime de horário por turnos) “É muita, neste momento é muita! [sorriso]. Agora, pela primeira vez, primeiro está a família, eu acho que pus sempre o trabalho à frente, que nunca deveria ter feito isso, mas agora é a família. Já chega uma filha dizer que nunca esteve comigo!” (Técnica de Diagnóstico e Terapêutica, divorciada, com dois filhos e em regime de horário fixo atualmente).

Considerando a relevância da importância que é dada à família, seria esperável que muitas situações deste domínio influenciassem o trabalho. No entanto, os discursos dos entrevistados revelam que, apesar das exigências da vida familiar e pessoal, estas poucas vezes interferem com o domínio laboral por existir um esforço maior por parte do profissional em garantir as necessárias respostas ao trabalho.

“Tentei que nunca, mesmo em situações complicadas que já estive a nível pessoal, nomeadamente problemas de saúde, mas nunca deixei de estar presente na minha vida profissional.” (Assistente técnica, casada e com dois filhos)

“É assim, neste momento posso dizer nenhum, porque o serviço fica sempre garantido!” (Enfermeira, solteira e com um filho)

Outros entrevistados revelam dificuldades de resposta ao trabalho por motivos da vida pessoal. Aqui é evidenciado o compromisso com a entidade, no sentido de que seria da vontade do profissional fazer um pouco mais pela organização e pelo serviço, mas que este é limitado pelas questões pessoais, mais concretamente pela existência de filhos. Esta opinião é apresentada por grande parte dos entrevistados:

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“Passei a ter menos disponibilidade numa coisa, no poder trocar os turnos. Quando o serviço precisava… ou seja, eu estava sempre aberta para poder gerir o horário, muito mais em função do serviço, ou seja, como não tinha outras obrigações, de não ir buscar ninguém a horas, eu podia facilitar o serviço mais nisso, ou seja a minha disponibilidade em alterações do horário era maior, do que é hoje em dia. […] E outra coisa em termos da formação que nós fazemos no hospital, senti isso nos dois últimos anos, durante a gravidez e depois, que um de nós [do casal] teve que adiar. No meu caso, fui eu, tive que adiar a formação que fazia até mesmo dentro do hospital pós horário laboral, porque não me permite isso, ou seja, como eu tenho de estar sempre disponível para ir buscar a minha filha.” (Enfermeira, em união de facto e com um filho)

“O facto de ter filhos e os horários entre mim e o meu marido não serem muito fáceis, empancou um pouco o meu percurso profissional, até porque tentei tirar mestrado e não terminei.” (Enfermeira, casada, com dois filhos)

“Não consigo, se calhar, ter a mesma disponibilidade […] É assim, disponibilidade total, não posso, não consigo, porque com este tipo de horários também… eu agora estou num horário fixo, mas antes tinha algumas condicionantes, não podia fazer, mesmo a nível de horário, aquilo que às vezes [gostaria de conseguir da resposta] sem me ser pedido eu gostaria.” (Enfermeira, casada e com dois filhos)

“Bem, o que mais me dificulta é o facto de viver longe do meu local de trabalho, o facto de perder muito tempo na distância casa-trabalho, trabalho-casa, claro que isso é um dificultador. Vou tentando remediar consoante o que consigo, mas é o que tenho para já. Outra questão é se um dia vier a ter filhos, certamente que vai dificultar mais a minha carreira, porque os filhos são um grande peso para a vida pessoal, e claro que isso influencia a vida profissional.” (Assistente técnica, solteira e sem filhos)

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“Com a existência de filhos… claro que sim, também afeta, afeta porque aumenta o absentismo, porque não sou eu o único a ficar doente, neste caso, quando os meus dependentes ficam, ou eu ou a minha esposa também tem de ficar a cuidar deles, e consequentemente temos de aumentar o absentismo. Consequentemente quem tem filhos pequenos, se dorme mal de noite, de dia não vai conseguir ter a mesma rentabilidade e outros fatores. Uma coisa tenho a certeza, com o tipo de vida que tenho atualmente, mais filhos é quase que impensável.” (Enfermeiro, casado e com dois filhos, em regime de horário por turnos)

“Claro, sem dúvida. Isso é, digamos, o facto de termos filhos leva logo a que não haja disponibilidade para o serviço, não há disponibilidade profissional, porque enquanto solteira nós fazíamos tudo, aliás o chefe ligava e nós, e nós tínhamos muita disponibilidade. Agora com filhos é difícil porque, por exemplo, a minha filha mais velha, há festinhas, há explicações, aliás nós quando temos os filhos vivemos em função deles. Tudo o que eles vão precisando, a gente vai-se adaptando, e que é difícil, e o que eu noto é que os profissionais de saúde cada vez têm menos filhos, porque não conseguem conciliar a vida profissional com a vida familiar.” (Técnica de Diagnóstico e Terapêutica, divorciada, com dois filhos e em regime de horário fixo atualmente)

“Se calhar sim, não é que os filhos sejam um estorvo na vida de alguém mas dificulta sempre um bocado, temos que ter outro tipo de dedicação, outro tipo de disponibilidade.” (Assistente técnico, solteiro e sem filhos)

4.4. Discursos de entendimento e gestão de fronteiras entre domínios trabalho e vida