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Discussão dos resultados no envolvimento: análises diferenciais 122

6.1.   Discussão dos resultados 117

6.1.2. Discussão dos resultados no envolvimento: análises diferenciais 122

No ponto anterior do presente capítulo, procedeu-se à discussão dos resultados sobre a distribuição das respostas dos alunos pelas dimensões do EAE. Constou também como objetivo da presente dissertação, o estudo das diferenças no EAE em função das variáveis situação laboral dos pais, coesão familiar e estilos de autoridade dos pais. Propôs-se ainda o estudo da relação entre o EAE e as variáveis: habilitações literárias dos pais, perceção de apoio da família, perceção de apoio dos pais e perceção de direitos na família. Passa-se pois a considerar de seguida a informação fornecida pelos resultados obtidos no envolvimento, em função das variáveis mencionadas.

Diferenças no envolvimento em função da situação laboral dos pais

Na questão de investigação número dois [Q2: “Será que o EAE varia em função da situação laboral dos pais (desemprego vs emprego)?”], pretendeu-se verificar se existiam diferenças significativas no EAE em função da situação laboral dos pais (desemprego vs emprego), o que se observou em alguns dos itens do EAE.

A análise dos resultados mostrou diferenças significativas no EAE, favoráveis aos alunos com pai empregado nos itens 1 (“Quando escrevo os meus trabalhos, começo por fazer um plano para o texto a redigir”) e 19 (“Durante as aulas, intervenho para exprimir as minhas opiniões”), com valores já no limiar da significância estatística. Sublinhou-se ainda o item 2 (“Procuro relacionar o que aprendo numa disciplina com o que aprendi noutras”), que apesar de não poder ser contabilizado para efeitos de significância estatística, posiciona-se perto do limiar da mesma, sugerindo, pelas médias apresentadas, um maior envolvimento no grupo de alunos com pai empregado. Por outro lado, os resultados obtidos no item 5 (“Revejo regularmente os meus apontamentos, mesmo que um teste ainda não esteja próximo”), mostraram-se favoráveis aos alunos com pai desempregado, apesar dos valores apresentados encontrarem-se também já no limiar da significância estatística.

Quanto às diferenças no EAE em função da situação laboral da mãe, o item 8 [“A minha escola é um lugar onde me sinto integrado(a)]” apresentou valores de média

superiores para o grupo com mãe empregada, e o item 13 (“Perturbo a aula propositadamente”) valores de média superiores para o grupo de alunos com mãe desempregada. Apesar destes resultados se encontrarem já no limiar da significância estatística, infere-se que os alunos com mãe empregada sentem-se mais integrados na escola, ao passo que os alunos com mãe desempregada perturbam mais a aula. No item 10 (“A minha escola é um lugar onde me sinto só”), verificaram-se valores de média superiores para o grupo de alunos com mãe desempregada, inferindo-se que estes alunos sentem-se mais sós na escola. Registaram-se ainda diferenças significativas, favoráveis ao grupo de alunos com mãe empregada, no item 16 (“Durante as aulas, coloco questões aos professores”), concluindo-se que, os alunos com mãe empregada colocam questões aos professores durante as aulas, quando comparados com os alunos cujas mães estão desempregadas.

Comparando os resultados obtidos em função das duas variáveis analisadas (situação laboral do pai, situação laboral da mãe), verificou-se ainda que, as diferenças significativas no EAE em função da situação laboral do pai ocorrem nas dimensões cognitiva e agenciativa, enquanto que, considerando a situação laboral da mãe, as diferenças no EAE registam-se ao nível das dimensões afetiva, comportamental e agenciativa. Tais resultados sugerem a necessidade de exploração das razões subjacentes a estes resultados.

Por outro lado, a distribuição relativamente equilibrada do número de diferenças significativas nos itens do EAE entre as duas variáveis independentes, sugere interpretações que não se afastam de outras investigações, ao referirem não existir diferenças dos efeitos do desemprego no bem-estar dos filhos em função do género dos pais (Conger et al.,1992).

Apesar de se encontrarem estudos que associam o nível socioeconómico das famílias e o envolvimento dos alunos (Bradley & Corwyn, 2002), a falta de trabalhos que abordem especificamente a relação entre a situação laboral dos pais e o envolvimento, tal como apurado na revisão da literatura, tornou mais difícil a interpretação dos resultados obtidos. Todavia, é possível pensar que as diferenças significativas observadas se devam ao que é sugerido por alguns autores, a respeito quer dos efeitos negativos do desemprego (Parcel & Menaghan, 1994, cit. por Crouter, 2006), quer dos efeitos positivos da situação de emprego dos pais (Crouter, 2006).

Contrariamente ao que era esperado, os valores obtidos no item 5 (“Revejo regularmente os meus apontamentos, mesmo que um teste ainda não esteja próximo”),

revelaram-se favoráveis aos alunos com pai desempregado, o que contraria alguns estudos que referem que a situação de desemprego dos pais é inibidora do seu envolvimento no cuidado e na educação dos filhos (Brines, 1994, cit. por Kalil & Ziol-Guest, 2008; Parcel & Menaghan, 1994, cit. por Crouter, 2006).

A revisão da literatura conduz à interpretação cautelosa dos resultados apresentados, impedindo que se estabeleça uma relação causal entre as variáveis analisadas. Com efeito, como é sugerido por diversos autores, a associação entre os efeitos da situação laboral dos pais e os níveis de desempenho dos filhos poderá ser mediada por outras variáveis, como os estilos de autoridade ou o nível de habilitações literárias dos pais (Conger & Donnellan, 2007; Stevens & Schaller, 2011). Outras variáveis mediadoras poderão ser invocadas para a explicação das diferenças no EAE em função da situação laboral dos pais. Gutman e Eccles (1999) concluíram, por exemplo, que as preocupações financeiras dos pais desencadeiam efeitos negativos sobre a realização académica dos adolescentes, por diminuírem o envolvimento dos pais na escola, bem como a qualidade das práticas parentais.

Por último, cabe acrescentar que a ausência de diferenças significativas no EAE em função da situação laboral dos pais, poderá ser explicada tanto pela influência de variáveis mediadoras (habilitações literárias dos pais, estilos de autoridade dos pais), como pela eventual discrepância no número de sujeitos dos grupos comparados – fruto do processo de amostragem aleatória.

Diferenças no envolvimento em função da coesão familiar

Na questão de estudo número 3 [Q3: “Será que o envolvimento dos alunos na escola varia em função da coesão familiar (separação/divórcio vs não separação/divórcio dos pais)?”], procurou-se verificar se existiam diferenças significativas no EAE em função da coesão familiar (separação/divórcio vs não separação/divórcio dos pais), não se tendo verificado a existência de diferenças estatisticamente significativas, com exceção do item 15 [“Estou distraído(a) nas aulas”] da dimensão comportamental, e já no limiar da significância estatística, com valores que permitiram inferir que os alunos com pais separados ou divorciados distraem-se mais nas aulas, quando comparados com os alunos cujos pais não estão separados ou divorciados.

Uma vez mais, a ausência de estudos que abordem especificamente a relação entre a coesão familiar e o EAE restringe possíveis interpretações. Ainda assim, é possível situar

os resultados obtidos no âmbito de um considerável conjunto de estudos que estabelecem associações entre a ausência de coesão familiar e problemas de ajustamento social, afetivo e escolar dos alunos (Amato, 1993; Amato, 2000; Beausang et al., 2012; Coleman et al., 2000; Demo & Acock, 1996; Hetherington, 2003; Jeynes, 2000, 2002; McLanahan & Sandefur, 1994; Song et al., 2012; Sun & Li, 2009; Wu et al., 2010). Autores como Gonzalez-DeHass, Willems e Holbein (2005) sugerem, neste contexto, que a estrutura familiar tem reflexos ao nível do envolvimento parental e da motivação académica dos alunos.

Por outro lado, foi notável a ausência de diferenças significativas nos restantes itens do EAE em função da coesão familiar, o que poderá fundamentar-se em diversas razões. Em primeiro lugar, e à semelhança daquilo que foi verificado nos resultados do EAE em função da situação laboral dos pais, registou-se discrepância no número de sujeitos por grupos contrastados.

Uma outra possível explicação poderá ser encontrada na posição refletida por alguns estudos, a propósito da observação de variáveis mediadoras na relação entre a ausência de coesão familiar e os efeitos desta sobre o desenvolvimento psicossocial e bem- estar dos filhos, tais como: as características pessoais e fase desenvolvimental dos adolescentes (Kelly & Emery, 2003); a autorregulação afetiva e comportamental dos adolescentes (Hetherington et al., 1989; Smith & Prior, 1995, cit. por Ruschena et al., 2005); a qualidade das relações entre pais e filhos (Ruschena et. al., 2005); as práticas e estilos de autoridade parental (Hetherington, 2006); a perceção de apoio da família (Veiga & Antunes, 2005); ou ainda, as transições na estrutura familiar ocorridas depois do divórcio/separação dos pais (Walper & Beckh, 2006). Por último, num estudo longitudinal conduzido por Amato (2006), verificou-se que os efeitos do divórcio sobre a realização académica são mais perniciosos nas crianças do que nos adolescentes. Esta diferença surge em virtude de os adolescentes terem já formado o seu autoconceito académico, verificando-se que o divórcio dos pais é menos disruptivo nesta fase etária.

Por último, refira-se que o significado dos valores obtidos não se afasta das conclusões de outras investigações, situando-se igualmente na controvérsia sobre o assunto. Assim, se as informações obtidas poderão encaminhar-se no sentido de que não se verificam diferenças nos resultados do EAE entre os grupos contrastados, a generalização dos resultados obtidos deverá, por outro lado, ser acautelada, sugerindo-se, por essa razão, a eventual inclusão desta questão de estudo em projetos de investigação futura.

Diferenças no envolvimento em função dos estilos de autoridade

Na questão de estudo número quatro (Q4: “Será que o EAE varia em função do estilo de autoridade dos pais?”) procurou-se verificar se existiam diferenças significativas no envolvimento em função dos estilos de autoridade (autoritário vs compreensivo) dos pais, tendo-se observado, tanto na análise da variável estilo de autoridade do pai, como da variável estilo de autoridade da mãe, a existência de diferenças significativas nos índices de envolvimento. Os resultados obtidos foram, conforme esperado, favoráveis ao grupo de filhos com pais compreensivos, inferindo-se que este grupo apresenta níveis mais elevados de envolvimento. Com efeito, verificou-se que o grupo de filhos com pai autoritário afirmaram faltar mais à escola e perturbar mais a aula (dimensão comportamental), apesar destes resultados se terem situado já no limiar da significância estatística. Quanto à variável estilo de autoridade da mãe, concluiu-se a existência de diferenças significativas no envolvimento, favoráveis ao grupo de filhos com mãe compreensiva. Especificamente, o grupo de alunos com mãe autoritária, quando comparados com o grupo de filhos com mãe compreensiva, apresentaram mais comportamentos disruptivos, tendo confirmado perturbar a aula e má-educação para com o professor.

Os resultados obtidos permitiram ainda inferir que o grupo de alunos com mãe compreensiva, procura relacionar matérias diferentes (dimensão cognitiva), quando comparado com o grupo com mãe autoritária. Já no limiar da significância estatística, observou-se que os alunos com mãe autoritária sentem-se sós na escola (dimensão afetiva) e perturbam mais a aula (dimensão comportamental), quando comparados com o grupo de alunos com mãe compreensiva.

Os resultados obtidos situam-se na mesma linha dos encontrados por outras investigações, o que permite inferir que o estilo compreensivo (ou democrático) dos pais potencia um maior envolvimento dos alunos (Abreu et al., 2006; Grolnick & Slowiaczek, 1994; Lamborn et al., 1991; Simons-Morton & Chen, 2009; Spera, 2005; Steinberg et al., 1992; Steinberg et al., 1994; Steinberg et al., 1989, cit. por Halgunseth & Peterson, 2009), particularmente na dimensão cognitiva (Steinberg et al.,1992), como observado no presente estudo, a respeito da variável estilo de autoridade da mãe.

As evidências recolhidas quanto aos baixos níveis de envolvimento no grupo de filhos com pais autoritários, encontram-se também no âmbito de outros estudos congéneres que indicam associações entre o estilo autoritário e o desenvolvimento de estratégias

inadequadas, comportamentos de hostilidade, de rebeldia e de rejeição, baixa autoestima, e hesitação no relacionamento interpessoal (Abreu et al., 2006; Barber, 1996; Hess & McDevitt, 1984; cit. por Aunola et al., 2000; Lamborn et al., 1994; Shute et al., 2011; Steinberg et al., 1994; Veiga & Antunes, 2005).

Cabe acrescentar que, em termos comparativos, observou-se a existência de um maior número de diferenças estatisticamente significativas nos itens do EAE em função do estilo de autoridade da mãe, comparativamente aos resultados obtidos em função do estilo de autoridade do pai, o que deixa algumas dúvidas a respeito da interpretação destes resultados. Num estudo algo congénere (Milevsky et al. 2007), sugeriu-se que os efeitos da permissividade do pai podem não ser tão perniciosos quanto os da permissividade da mãe, colocando-se como hipótese explicativa o exercício diferenciado da parentalidade (Lamb, 1986, cit. por Milevsky et al., 2007). O mesmo raciocínio poderá ser aplicado na explicação dos resultados obtidos neste estudo, sendo porém necessária corroboração empírica.