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Disponibilidade de Cenário

No documento Relatório de atividade profissional (páginas 59-62)

2.5 Conferências e Workshops

2.5.2 Heurística

2.5.2.2 Disponibilidade de Cenário

Enquanto a Representatividade dá maior probabilidade de existir uma relação entre os dados e os resultados devido à sua semelhança, a Disponibilidade de Cenário dá essa maior probabilidade à facilidade com que um resultado pode ser imaginado a concretizar- se.75 Logo, depende da imaginação da pessoa e da disponibilidade com que esse cenário

surge na sua mente.

Podemos imaginar facilmente algo a correr mal, se conseguirmos imaginar vários fatores de dificuldade a ultrapassar. Em termos populares, o chavão “não estou a ver o que possa correr de mal” ou “estava mesmo a ver que ia correr mal”, é a tradução perfeita do funcionamento deste processo heurístico. Convenhamos que já todos nós vivenciamos situações em que a Disponibilidade já nos safou várias vezes de asneiras, assim como também já fomos surpreendidos por algo que não estávamos a “ver”.

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possível determinar todos os fatores e a sua relação que conduzem ao resultado. Contudo, é um processo, normalmente, muito eficiente e rápido, mas exposto a enviesamento. Esses enviesamentos são devido à Recuperabilidade de Ocorrências, Eficácia da Procura,

Imaginabilidade e Correlação Ilusória.

i. Recuperabilidade de Ocorrências

Na falta de informação completa, tentamos imaginar os resultados possíveis para situações semelhantes. Quanto mais fácil for evocar memórias de ocorrências de um determinado resultado, mais provável esse resultado nos afigura.75 Assim, a Recuperabilidade das

nossas memórias, tanto como pacientes como profissionais, influencia a aparente probabilidade que atribuímos à ocorrência de um determinado evento. Numa linguagem corrente, consideramos que as coisas são possíveis porque já as vimos (recordamos) acontecerem.

A evocação das memórias pode ser facilitada pela Familiaridade que temos com essa memória, ou Ênfase, dessa memória em particular.

Familiaridade

A Familiaridade facilita a evocação porque, é mais fácil evocar memórias que estão muito presentes, por nos envolver de forma direta. No caso do Optometrista, poderá decidir-se por um diagnóstico específico, por ser mais fácil evocar memórias de casos semelhantes que já tenha tratado. Este tipo de enviesamento é dinâmico porque depende do contexto e

circunstâncias que rodeiam o Optometrista. No início da carreira profissional, a

Familiaridade dos casos provém da frequência com que foi abordado na sua formação, do interesse que um determinado caso lhe despertou ou, ainda, do facto de ter realizado alguma pesquisa e apresentação sobre ele. Ao longo da carreira profissional, essa

Familiaridade vai-se alterando com a exposição aos casos clínicos, formação adicional (quer tende a ser específica) ou, até mesmo, por influência da comunicação social.

Ênfase

No caso da Ênfase, o Optometrista evoca com mais intensidade, e logo considera mais provável, um diagnóstico mau de um caso que experienciou em primeira mão do que um que conheceu por literatura. A exuberância, ou carácter extremo de um caso, produz uma memória mais vívida, ou marcante. Também o nosso gosto, ou desgosto, pessoal age sobre a forma como a nossa memória regista um evento. E esses casos clínicos, associados aos seus diagnósticos, destacam-se entre as memórias de outros. Por esse processo, estão mais presentes, no momento do profissional considerar a lista de diagnósticos possíveis, impondo-se como aparente mais “possível”.

Um Optometrista consciente desse enviesamento deve ter consciência do adágio do som de cascos:

“Se ouvires som de cascos atrás de ti, muito provavelmente é de um cavalo.” As zebras são muito pouco comuns na Europa e, claro, não nos devemos esquecer das vacas!

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diagnósticos corrigidos da pré-probabilidade de ocorrerem, antes de decidir sobre esse diagnóstico.

ii. Eficácia da procura

Este processo heurístico tenta determinar qual o número de ocorrências de um determinado possível resultado, para avaliar a sua probabilidade. Para isso, o Optometrista realiza uma procura na sua memória, de elementos que correspondam a cada um dos resultados.75 No

entanto, a procura pode estar enviesada pela forma como a memória catalogou a informação. Como consequência, um resultado com várias instâncias é facilmente recordado, e contabilizado, enquanto a memória tem muita dificuldade em aceder a instâncias de outro resultado. Dessa forma, a probabilidade de ocorrer cada resultado fica deformada.

Na formação do Optometrista, as condições patológicas são indexadas pelo parâmetro característico do diagnóstico. Contudo, há condições que exibem alterações nos mesmos parâmetros, mas cujas alterações nesse parâmetro podem não ser consideradas como decisivas no diagnóstico de uma condição, em detrimento de outra. Por exemplo,

insuficiência ou excesso de convergência como síndrome de visão binocular é mais fácil ser recordado, quando o Optometrista considera problemas do sistema visual, do que excesso ou défice de convergência por lesão da vias supranuclear, como a Síndrome de Parinaud.78

iii. Imaginabilidade

Uma forma de determinar a frequência de um evento é imaginar os possíveis resultados para esse evento, seguindo determinadas regras.75 Estes resultados não estão a ser

recordados, como discutimos até agora, mas sim imaginados entre os possíveis.

Da mesma forma que se passa com as memórias, cenários mais facilmente imaginados são considerados mais prováveis de ocorrer. Contudo, essa forma de determinar a frequência está sujeita a enviesamento, porque há cenários que são mais facilmente imaginados por vários fatores.

A presença de uma pessoa num país recentemente identificado com um surto de Ébola, torna mais fácil imaginar que esteja infetada com essa doença, apesar de apresentar sintomas muito comuns, como por exemplo, gripe. Da mesma forma, que imaginamos mais provável a presença de diplopia, após trauma cerebral, do que por intoxicação alimentar. Cabe ao Optometrista, um pouco mais de imaginação e esforço para verificar os cenários imaginados, e sua frequência, confrontando-os com o quadro clínico, sem nunca perder de vista o tradicional último item de um diagnóstico diferencial: “tudo o que ainda não imaginei”.

iv. Correlação ilusória

Este processo heurístico concede maior probabilidade a dois eventos que coocorram.75 A

semelhança ou associação que podemos imaginar existir entre dois eventos influencia a frequência que acreditamos que os dois eventos possam ter em coocorrência. Todavia, esse processo pode ser enviesado, já que é fácil imaginar uma relação entre os eventos sem que esta exista de facto.

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Por exemplo, se um paciente se apresentar com má postura corporal, devido a deformações físicas, e manifestar queixas visuais, consideramos mais provável um possível diagnóstico de problema visual do que na ausência de deformações.

O mesmo acontece com problemas de aprendizagem e queixas ligadas à visão. Na

verdade, a maior percentagem de problemas de aprendizagem não estão relacionados com a visão.

Para evitar este enviesamento, devemos conhecer a verdadeira ligação entre os eventos, antes de concluirmos pela sua ligação.

No documento Relatório de atividade profissional (páginas 59-62)