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Telescópio do Bom Jesus

No documento Relatório de atividade profissional (páginas 86-88)

2.6 Aplicações de Optometria a outras áreas

2.6.2 Telescópio do Bom Jesus

2.6.2.1 Objetivo

Recuperação da função ótica do Telescópio do Bom Jesus conhecido como “O Canudo”.

2.6.2.2 Introdução

Braga é conhecida pelo dito icónico “Ver Braga por um canudo”. O “Canudo” é o nome carinhoso pelo qual os Bracarenses designam o telescópio colocado na varanda do jardim do Bom Jesus, para visualização da cidade e paisagem.

Devido a um acidente de manipulação e alguns atos de vandalismo, o telescópio perdeu a sua capacidade de focar nitidamente e foi retirado do uso público.

2.6.2.3 Intervenção

No final de 2010, a firma Carlos & Luís Jerónimo, Lda. foi encarregada pela Confraria do Bom Jesus da apresentação de proposta, para restaurar e recuperar o telescópio. Após a análise do meu currículo e proposta de recuperação, fui escolhido como o responsável técnico pela recuperação da funcionalidade ótica.

Nessa qualidade, analisei o estado em que se encontrava o telescópio e procedi à sua desmontagem completa, supervisionando os trabalhos envolvendo componentes óticos. Removemos todos os componentes óticos e mecânicos para análise e elaboração do relatório de danos e intervenção ótico. Ver pág. 146.

Esse relatório contém a descrição pormenorizada dos danos encontrados e sua

consequência para a capacidade ótica do telescópio. Enuncia várias recomendações para a sua recuperação, restauração ou conservação. Também discrimina as unidades de tempo requeridas para cada operação e custo associado.

Com base nesse relatório, a firma Carlos & Luís Jerónimo procedeu à elaboração do orçamento de restauração, recuperação e conservação do “Canudo”. Esse orçamento, em conjunto com o relatório técnico de danos e intervenção ótica e relatório técnico de danos e intervenção mecânica, constituíram a proposta de restauração e recuperação do “Canudo”. A esta proposta foi anexada o meu curriculum vitae, com o fim de atestar da capacidade de me ser confiada a realização dessa tarefa.

Como é do conhecimento público, essa tarefa foi atribuída à empresa Carlos & Luís Jerónimo para que fosse realizada de acordo com a proposta mencionada.

Este telescópio já tinha sido sujeito a algumas intervenções anteriores, de acordo com a memória de funcionários da Confraria do Bom Jesus. Os vestígios dessas intervenções eram visíveis em vários elementos do telescópio, assim como amolgadelas ou elementos com fraturas como, por exemplo, lentes, prisma e desalinhamento. Para além disso, havia sinais de quebras da estrutura metálica reparada por soldagem e reposicionamento dos elementos óticos, que resultaram na incapacidade de utilização. Também foi alvo de

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pinturas e retoques que modificaram o seu aspeto inicial.

Em seguida, apresento um excerto do meu relatório técnico interno da empresa. Mais especificamente, apresento a secção da “Descrição do Estado Inicial da Estrutura Ótica”, onde se descrevo ao pormenor os danos e intervenções anteriores, e a secção da

“Condições Iniciais” onde se priorizam os critérios que orientaram a restauração / recuperação / conservação.

A preparação para os trabalhos de recuperação começou com pesquisa de toda a

informação disponível sobre o telescópio. Também procedi à troca informação com outros restauradores de modelos semelhantes. Foi possível apurar que este telescópio foi

produzido pelo fabricante C. P. Goerz, por volta de 1919. Este fabricante foi absorvido pela Zeiss em 1924, pelo que o telescópio em causa não pode ter uma data de fabrico posterior. O “Canudo” é um telescópio de observação terrestre, com objetiva constituída por um dubleto acromata de 130 mm de diâmetro e 1500 mm de distância focal, um prisma inversor e uma ocular acromata. Não foi possível apurar qual o número total de elementos, ou configuração, da ocular por não se proceder à sua desmontagem.

No momento de desmontagem, devido a pinturas anteriores, não foi possível observar gravações que atualmente se observam em vários pontos do telescópio. Por esse motivo, foi necessário realizar medidas experimentais da distância focal da objetiva do telescópio com recurso a LASER. Nessas medições, determinou-se que a distância focal f, ou Potência de Vértice Posterior para ser mais exato, da objetiva era de 1498,64 mm. O diâmetro total medido foi de 140 mm, do qual 130 mm correspondem ao diâmetro efetivo útil, ou abertura, o que confere a este objetiva uma velocidade f (f/diâmetro) de f/11,53. Essas medidas, posteriormente vieram a ser confirmadas, quer pelas gravações no telescópio, como pelas pesquisas realizadas.

2.6.2.4 Execução

Todos os elementos óticos foram removidos, marcados e fotografados de forma a criar uma memória do estado, posição e esquema de montagem em que se encontravam.

A ocular e o prisma inversor foram sujeitos a uma limpeza de várias fases para remoção de diferentes tipos de sujidade. Devido à extensão de danos da objetiva, e sua consequente degradação da qualidade ótica da imagem, decidiu-se a substituição por um dubleto acromata novo.

Apesar das muitas dificuldades em encontrar um fabricante com capacidade de fabrico de um dubleto com estas caraterísticas particulares, um novo dubleto acromata com as caraterísticas pretendidas foi encomendado a um fabricante indiano e produzido de forma individual.

Após a restauração e conservação dos outros componentes da parte mecânica e protetora do telescópio, todos os elementos óticos foram reinseridos, alinhados e fixados.

O telescópio foi sujeito a uma série de ensaios e avaliação por funcionários da Confraria, que estavam familiarizados com o funcionamento do telescópio. E, após o parecer positivo de todos, foi entregue à Confraria.

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2.6.2.5 Conclusão

Um processo de restauração de um artefacto de elevado valor histórico, nunca é um assunto de abordagem leve. Requer conhecimentos e ponderação, aliados a muita criatividade e engenho.

Este artefacto possui um indiscutível valor para a cidade de Braga e para Portugal, fazendo parte da memória coletiva de “Ser” Português. Para além dessa condição de artefacto histórico, adiciona-se a particularidade de ser um instrumento de observação e precisão destinado a ser utilizado pelo público. Como tal, possui uma função que deve cumprir com um mínimo de qualidade.

Sinto um orgulho enorme em ter sido o responsável pela sua recuperação ótica e devolução da sua condição a um estado funcional. Foram vários os desafios e dificuldades

ultrapassadas, como a determinação das caraterísticas dos elementos ou o seu fabrico. Confesso que por vezes, senti a enorme responsabilidade. Porventura, será por esse motivo que agora sinto enorme orgulho. E fico agradecido pela oportunidade de o poder devolver à cidade de Braga, que tanto me deu, e contribuir para a sua história com o meu pequeno papel. Coincidência, ou não, foi um licenciado em Física Aplicada – Ramo Ótica da Universidade do Minho a restaurar a função ótica do “Canudo” de Braga. E se a função primeira de uma Universidade é formar pessoas e desenvolver recursos para a sociedade, este é o exemplo perfeito do cumprimento exemplar dessa função.

Um telescópio do passado pode fazer-nos ver o futuro, com outros olhos.

2.7 Casos Clínicos

Este capítulo aborda alguns casos clínicos da história da minha prática clínica. O objetivo do capítulo é expor a forma como abordo a generalidade dos casos clínicos, na minha prática corrente de Optometria.

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