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Disponibilidade, antes de qualquer coisa, liga-se diretamente ao direito de propriedade. Não há uma expectativa de direito ou direito de terceiros à sua guarda.

É algo definitivo que o indivíduo pode usar, gozar e dispor107. Mais ainda, disponibilidade é a resultante de uma série de reduções patrimoniais, quando confrontadas com os ingressos, as quais se caracterizam como os esforços para

106 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Tributário Constitucional Tributário. 24 ed. São Paulo: Malheiros

Editores, 2011, p. 737.

107

Art. 1228 do Código Civil: “O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.

§ 2º São defesos os atos que não trazem ao proprietário qualquer comodidade, ou utilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar outrem.

obtenção e manutenção dessa propriedade. Esse é o conceito de propriedade que confere os devidos pilares à sustentação da disponibilidade jurídica, ou seja, somente há propriedade quando o detentor do bem possa dele dispor.

Disponibilidade econômica, por seu lado, é o próprio recurso disponível ao indivíduo.

O ponto será melhor aprofundado, mas já oferecemos alguns comentários, quando avaliamos o tema da disponibilidade da investida quanto aos dividendos de suas subsidiárias. Tomemos como exemplo uma empresa lucrativa, mas que não disponibiliza dividendos para seus acionistas. Se a investida resolver por realizar a distribuição desses dividendos, o acionista não terá como dispor de um direito que ainda não existe, portanto não há o que tratar de disponibilidade jurídica.

Nesse sentido, pensa Maria Helena Diniz:

5) Quanto ao modo de gozar os direitos: (…) Impossível é o exercício direto porque depende do consentimento da outra parte, pois limita sua liberdade. Já o direito real supõe o exercício direto entre o titular e a coisa, desde que a mesma possa estar a sua disposição.108

Dispor da coisa é a qualidade primeira para a determinação da propriedade, e foi este o caminho adotado pelo legislador para a determinação do sujeito passivo do imposto de renda, nos termos do artigo 45 do Código Tributário Nacional.

Art. 45. Contribuinte do imposto é o titular da disponibilidade a que se refere o artigo 43, sem prejuízo de atribuir a lei essa condição ao possuidor, a qualquer título, dos bens produtores de renda ou dos proventos tributáveis.

Ser titular de um direito pressupõe a prerrogativa de disposição desse bem. Daí que se os lucros não estiverem disponíveis para o beneficiário, seja em função da legislação local, seja por interesse dos administradores em reter parte ou todo o lucro, não há o que se falar em titularidade.

Repetimos as palavras de Ricardo Mariz de Oliveira sobre o tema:

Destarte, quando um novo direito — a uma renda ou a um provento de qualquer natureza — se integra a esse patrimônio, ele carrega consigo os atributos do seu proprietário, de dele usar, gozar e dispor, além de protegê-lo contra terceiros. Não é à toa, portanto, que o art. 45 do CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL prescreve com precisão que "contribuinte do imposto é o titular da disponibilidade a que se refere o artigo 43", ou seja, o titular do patrimônio aumentado pela aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica da renda ou do provento de qualquer natureza, eis que tal disponibilidade é ínsita ao direito de propriedade, e este não tem existência distinta da existência de patrimônio, ainda que seja constituído por apenas um único direito de propriedade.109

A existência de recursos, ou seja, o caixa, valores em pecúnia, é também relevante para o Imposto de Renda, dado que é nesse contexto que temos a disponibilidade econômica para fins de incidência do tributo quando o contribuinte opta pelo regime de apuração pelo lucro presumido, ou a pessoa natural em relação ao seu sistema de tributação, vista pelo aspecto do tempo, dado que ambos os sistemas firmam-se em recursos efetivamente recebidos, baseados, então, no regime de caixa.

Isso porque a disponibilidade jurídica já ocorreu. Disponibilidade jurídica é o título líquido, certo e exigível, de onde caiba certeza de seu recebimento por parte daquele que o recebeu.

Esse tema nos parece de enorme importância para fins deste trabalho, pois a tributação das rendas auferidas no exterior deverá passar, necessariamente, pelo crivo da disponibilidade.

Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica:

§ 2o Na hipótese de receita ou de rendimento oriundos do exterior, a lei estabelecerá as condições e o momento em que se dará sua

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disponibilidade, para fins de incidência do imposto referido neste artigo.110

Claro que qualquer disponibilidade será sempre, no primeiro momento, jurídica, haja vista que não se podem gravar rendas que não estejam inseridas no sistema jurídico.

Para que se possa gravar uma determinada renda, esta precisa percorrer os caminhos determinados pela lei. Rendas econômicas não são suficientes para desencadear uma relação jurídica entre um determinado sujeito passivo e o sujeito ativo. Inexistirá nexo de causalidade de forma a fazer nascer uma obrigação.

Disponibilidade econômica representa qualquer entrada de recursos para uma determinada pessoa, o que é irrelevante para fins jurídicos. Pode ser o pagamento de uma indenização, valores registrados como de terceiros, mas em poder deste como depositário; enfim, são entradas que não servem para serem consideradas como aumentos patrimoniais definitivos frutos do capital ou trabalho, rendas ou proventos.

São estas as lições do prof. José Eduardo Soares de Melo:

A disponibilidade financeira corresponde ao ingresso de dinheiro no patrimônio particular, que nem sempre constitui fato gerador do imposto. Os regimes de apuração dos resultados são os seguintes: a) econômico ou jurídico (competência), que toma em consideração as receitas ingressadas no patrimônio do contribuinte, independente da realização em moeda, os custos e as despesas incorridas juridicamente, independentemente de seu pagamento. O valor correspondentemente ao preço de venda de mercadorias será considerado renda, independentemente de ter sido pago o seu preço, pela circunstância de as mesmas já terem sido entregues ao comprador. O frete relativo ao transporte das mercadorias será considerado como despesa, independentemente de ter sido pago, pelo fato de haver sido efetuada a respectiva prestação de serviços; b) financeiro (caixa), que leva em conta, exclusivamente o dinheiro ingressado ou saído do patrimônio. É fácil inferir que, em regra, o fluxo de dinheiro (ingressos e saídas de numerário) do patrimônio do contribuinte pode revelar-se indiferente para caracterizar a disponibilidade econômica ou jurídica de renda/proventos. Com

efeito, nem todas as receitas ou rendimentos se realizam em dinheiro, e os gastos — muitas vezes — são pagos em bens de natureza diversa (móveis, imóveis, cessão de créditos).111

Pela alteração imposta pela Lei complementar 104, de 2001, houve a possibilidade de se alterar o momento da incidência do tributo quando a receita ou o rendimento for resultante de operações do exterior, ou seja, quando poderá determinar como ocorrida a disponibilidade de tais lucros para fins de incidência tributária.

A incidência rege-se pela determinação legal do momento que se considera ocorrido o fato para fins tributários, pois o sistema jurídico apoia-se sempre na descrição pormenorizada da hipótese de incidência. É nesse campo hipotético que se definem os contornos abstratos da norma jurídica.

Teremos, então, a descrição dos fatos hipotéticos, em que momento dá-se por ocorrida a incidência e em que lugar físico tal fato deverá se dar. Essa determinação hipotética completa fica no aguardo da ocorrência de um fato justo, nos termos da descrição dessa hipótese, para que a norma possa incidir.

Quando da incidência da norma, deverá ser o momento do nascimento de uma relação tributária, pois o fato ocorreu dentro de um espaço de tempo e dentro de certos limites territoriais determinados.

O legislador houve por bem, ao aprovar o parágrafo 2º da Lei Complementar 104, delegar à lei a possibilidade da determinação do momento que se deve tomar como ocorrida a disponibilidade dos lucros.

A disponibilidade aqui tratada será sempre a econômica ou jurídica determinada no caput desse artigo. Assim, tal competência dada ao legislador ordinário repousa em um limite tênue. Fixa suas balizas na disponibilização efetiva dos resultados. Daí as palavras de Paulo Ayres Barreto sobre o tema:

111

Veio a lume, então, a Lei Complementar 104/2001, para acrescer o § 2º ao artigo 43 do CTN e estabelecer que, na hipótese de receita ou rendimento oriundo do Exterior, a lei estabelecerá as condições e o momento em que se dará sua disponibilidade.

Qual a inerpretação lógica, razoável e coerente que se faz desse dispositivo? Pode a lei escolher vários momentos para estabelecer a ocorrência da disponibilidade: desde que o momento exato em que ela efetivamente ocorre até qualquer momento posterior a isso, mas jamais antes de a disponibilidade efetiva ocorrer.112

Daí a primeira questão em que nos prenderemos para este estudo. O legislador poderia atribuir ao rito ordinário uma competência exclusiva determinada pela Constituição Federal? Isso porque a letra a do inciso III do artigo 146 da Constituição Federal prescreve que para a determinação dos fatos geradores há necessidade de quorum especializado.

Art. 146. Cabe à lei complementar:

III – estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:

a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes;113

O tema é polêmico e merece maior profundidade, porque há duas correntes doutrinárias que se colocam: a corrente dicotômica e a corrente tricotômica.