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Mapa 22 – Mapa de conforto físico e ambiental da Avenida Engenheiro

2.4. ATRIBUTOS ESPACIAIS DE HOSPITALIDADE URBANA

2.4.1. Diversidade

O primeiro atributo espacial que se apresenta para essa discussão refere-se à diversidade, que funciona como elemento de atração das pessoas.

“A diversidade é natural às grandes cidades”. Essa frase, oriunda de uma análise de Jacobs (2000, p. 157) sobre a riqueza das listas telefônicas das grandes cidades, revela a imensa gama de oportunidades de encontros, de compras, de negócios desses locais. Considerada uma das pioneiras no assunto, Jacobs (2000), contrária ao zoneamento e à setorização preconizada pela urbanística modernista, acreditava que a diversidade urbana faz com que seus frequentadores tenham um leque maior de opções

de serviços locais, reduzindo assim o custo dos transportes e reforçando o sentido de comunidade, já que redes sociais e econômicas são ali desenvolvidas. A mescla de atividades e de usos é, para Jacobs (2000), uma das condições necessárias para gerar essa diversidade.

Os quatro geradores de diversidade urbana de Jane Jacobs são: diversidade de usos; diversidade de prédios antigos e prédios novos; quadras curtas e necessidade de concentração. Segundo a autora:

Esse princípio onipresente é a necessidade que as cidades têm de uma diversidade de usos mais complexa e densa, que propicie entre elas uma sustentação mútua e constante, tanto econômica quanto social (Jacobs, 2000, p. 13).

Nas ruas mais dinâmicas e com mais vitalidade, as pessoas devem aparecer em horários diversificados, transitando de um lado para o outro o dia inteiro. Isso acontece em trechos urbanos onde há a diversidade de usos e atividades, que fazem com que trabalhadores, moradores, visitantes juntos, consigam gerar mais do que a soma das partes. O total de pessoas que utiliza as ruas e a maneira como essas pessoas se distribuem ao longo do dia são duas

coisas diferentes. O importante é entender que o total, em si, não equivale às pessoas distribuídas ao longo do dia. O significado da distribuição é o equilíbrio entre os horários do dia e da noite.

Quando se passa ao lado de edificações que se abrem para o espaço público, de lojas que mantêm suas vitrines iluminadas durante todo o tempo ou ainda ao lado de lugares que funcionam por um período de 24 horas, a sensação é outra. Com certeza a sensação de acolhimento se torna maior quando se tem a possibilidade de usufruir a cidade por um tempo maior.

Isso pode ser percebido em ruas de comércio popular, como por exemplo no centro de São Paulo (ver Capítulo 3 - o exemplo da Rua São Bento), onde o número de pessoas na rua durante o dia é excessivo e, durante à noite e fins de semana, praticamente nulo. Isso acontece porque praticamente só há um tipo de uso: o uso comercial (ou uso misto: serviço e comércio), fazendo com que os serviços ali instalados acabem se especializando para esse horário. Ou seja, os restaurantes ficam abertos praticamente apenas para o almoço, as lojas fecham cedo. E isso remete diretamente com a segurança do lugar, pois quanto mais gente na rua, maior a sensação de segurança.

(2012) vem pesquisando desde a década de 1970 como as cidades podem ser mais “humanizadas”. Preocupado com a escala humana, o arquiteto defende que a “cidade para pessoas”deve ser, entre outros aspectos36, “viva”. Defendendo a “activity as attraction” (a

atividade como atração) e que pessoas são atraídas por outras pessoas, Gehl (2012, p. 25) defende que a concentração de pessoas, seja nos edifícios, nos centros cívicos ou áreas de lazer, é sempre positiva.

Para o autor (2012), uma cidade “viva” (lively) já é em si um atrativo, que torna a cidade convidativa, e é o ponto de partida para que essa cidade seja segura. Sentir-se “seguro” é essencial se desejamos ver as pessoas compreenderem o espaço urbano, e essa seguranca pode ser decorrente, dentre outras coisas, da diversidade de usos que gera uma divesidade de pessoas. Quanto mais “animado”, no sentido de densidade, for o lugar, mas seguro ele pode ser.

O requisito básico da vigilância é um número substancial de estabelecimentos e outros locais públicos dispostos ao longo das calçadas e do distrito; deve haver entre eles sobretudo estabelecimentos e espaços públicos que sejam utilizados de noite. Lojas,

36 Para Gehl (2012) uma cidade deve ser viva, segura, confortável e saudável

(lively; safe; sustainable; healthy).

bares e restaurantes, os exemplos principais, atuam de forma bem variada e complexa para aumentar a segurança nas calçadas. (Jacobs, 2000, p. 37).

Para Madden (2002), a importância das atividades (ou usos urbanos) é a base para um lugar de sucesso. Elas são a razão pela qual as pessoas visitam o lugar pela primeira vez e o motivo pelo qual elas retornam.

Belgiojoso (1988) também concorda com a necessidade da diversidade de usos numa cidade. Para o autor, a qualidade urbana depende de atividades diversificadas que garantem a presença de vários personagens (pessoas). Ou seja, a diversidade de usos é fundamental, não só para atrair as pessoas ao longo do dia e da noite, mas também para gerar uma mistura de pessoas.

Quanto maior é a diversidade de pessoas, maior é sua receptividade. Isso é, lugares com diversidade de usos têm mais chances de atrair um público variado do que lugares monofuncionais. Os visitantes se sentem mais à vontade, pois as chances de encontrar alguém com as mesmas características aumentam. Como será visto nos estudos de caso no Capítulo 3, a falta de um mix de usos na Av. Luís Carlos Berrini traz um número reduzido de diversidade de pessoas. O que mais se vê são os

funcionários dos escritórios, dos bancos e dos restaurantes. Isso é, não há uma diversidade de pessoas e de classes sociais. O que já não acontece na Avenida Paulista, outro estudo de caso, pois ela apresenta uma diversidade de usos que garante uma diversidade de pessoas circulando de dia e de noite. E uma coisa, puxa a outra:

Quanto mais complexa for a mistura de grupos de usuários – e daí sua eficiência –, maior será o número de serviços e lojas necessário para pinçar sua clientela dentre todos os tipos de grupos de pessoas, e consequentemente maior será o número de pessoas atraídas (Jacobs, 2000, p. 178).

Além da diversidade de usos e atividades (diversidade de funções), a diversidade urbana também está ligada à diversidade física. Afinal, é preciso que haja um mix de espaços capazes de acolher as pessoas ou uma diversidade dos espaços de hospitalidade urbana. E isso pode ser obtido através da variedade de espaços públicos que a cidade oferece, tais como parques, praças e largos, assim como por meio da variedade de espaços privados de uso público, como cafés, livrarias, galerias, centros de exposição, bibliotecas, restaurantes, cinemas etc.

E pra essa mistura de espaços, podemos associar outra teoria de Jacobs (2000, p. 207): a de que uma cidade ou um bairro deve ter

uma combinação de edifícios com idades e estados de conservação variados. Para a autora, as cidades precisam tanto de prédios antigos, quanto de prédios novos, pois sem eles não há como obter ruas e distritos dinâmicos. Isso é, essa variedade na idade dos edifícios, assim como a variedade no tamanho dos imóveis, gera uma diversidade social muito grande, pois aumenta a oferta de aluguéis com preços variados. Ou seja, vários tipos de pessoas e de diversas classes sociais passam a circular no mesmo trecho urbano. Se uma cidade tiver apenas prédios novos, a empresas que ali se instalarem terão que arcar com os custos dos novos edifícios, repassando automaticamente esse custo nos aluguéis. Quando se tem uma variação grande de prédios antigos e novos, surgem novas opções de aluguel, que pode resultar numa mistura de empresas de rendimentos altos, médios e baixos. E continua a autora:

Um distrito bem-sucedido torna-se uma espécie de celeiro natural de construções. Ano após ano, alguns dos prédios antigos são substituídos por novos – ou reformados a ponto de equivaler a um novo. Portanto, com o passar do tempo, há uma mistura constante de edifícios de várias idades e de vários tipos. (Jacobs, 2000, p. 209).

Apesar de concordar com Jacobs no que diz respeito à importância de uma cidade ter edifícios com preços acessíveis, Glaeser (2011) discorda da forma que a autora coloca essa questão. Para o economista, restringir a altura e preservar os edifícios antigos não é a maneira mais adequada de garantir os preços acessíveis. Para Glaeser (2011, p. 12):

A oferta e a procura não funcionam dessa forma. Quando aumenta a demanda por uma cidade, os preços sobem, a menos que mais casas sejam construídas. Quando as casas restringem novas construções, elas se tornam mais caras.

Vale lembrar que, do ponto de vista da hospitalidade urbana, essa mudança de cenário precisa ser controlada, afinal a cidade hospitaleira apresenta certos atributos intangíveis, como sua história e sua identidade, que muitas vezes podem ser percebidas nas edificações. Apesar de que também é preciso lembrar que a “destruição” também faz parte da “construção” da cidade.

Mas é na maneira de articular essa dupla operação de construção-destruição que reside à possibilidade de as cidades se desenvolverem harmoniosamente, visto que o ideal é que a construção se faça com o mínimo de destruição possível e,

sobretudo, que essa destruição não seja nada além de uma readaptação inteligente às novas exigências (MATHEUS, In DIAS, 2002).

Dessa forma, a heterogeneidade arquitetural e cultural pode ser benéfica para a diversidade, pois ajuda a fomentar, através da variedade de edifícios e classes sociais, níveis satisfatórios e duradouros de vitalidade. Além disso, essa diversidade de espaços físicos ajuda na oferta de elementos visuais que contribuem para a legibilidade de um lugar, o terceiro atributo espacial a ser discutido.