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Espaço de uso público – O espaço da hospitalidade urbana

Mapa 22 – Mapa de conforto físico e ambiental da Avenida Engenheiro

1.2. AS CONCEPÇÕES ATUAIS

1.2.2. Hospitalidade urbana: em busca de conceitos e definições

1.2.2.2. Espaço de uso público – O espaço da hospitalidade urbana

urbana

Com a intenção de esclarecer qual é exatamente o espaço da hospitalidade urbana, faz-se necessário investigar algumas definições sobre espaço público. Entre as diversas definições do conceito de espaço público, abordaremos aquelas que guardam maior relação com o nosso tema.

tradicionais de uso comum das cidades, como as ruas, as praças, os largos, as avenidas etc. e que estão sob a jurisdição do poder público podendo sofrer alterações físicas a qualquer instante em prol do bem comum.

Para alguns autores, o espaço público assume alguns papéis que remontam à cidade grega. Para Arendt (1993, Apud Abrahão, 2008, p.24) ele é o espaço da palavra e da ação, podendo ser conhecido como “espaço público político”. A origem da vida pública veio da cidade-estado grega e da República romana e era constituída por duas atividades políticas: a ação (práxis) e o discurso (conversação). Para a autora (1993), a vida pública na polis realizava- se na reunião entre cidadãos livres e, viver numa polis significava que tudo era decidido mediante palavras e persuasão, mas não através de violência ou força. Dessa forma, o espaço público era diretamente político.

Compartilhando dessa função política do espaço público, Chauí (In Abrahão, 2008, p.30) defende que o espaço público pode ser entendido enquanto espaço social de lutas (os movimentos sociais, os movimentos populares, os movimentos sindicais) e de formas políticas de expressão permanente (partidos políticos,

Estado de direito, políticas econômicas e sociais).

Na visão de Jordi Borja (Apud ABRAHÃO, 2008, p. 47-48), o espaço público é como um instrumento substantivo para revelar os problemas e apontar as soluções no âmbito do urbanismo, da cultura e da cidadania. Mas o espaço público a que o autor se refere não é compreendido entre a fachada e a rua nem o vazio considerado público apenas por razões jurídicas, mas sim o chamado “espaço cidadão”, ou seja, um espaço urbanístico, cultural e político.

Espaço urbanístico porque o espaço público deveria ser capaz de organizar um território, dar suporte a diversos usos e funções e criar lugares; espaço cultural porque deveria ser monumental, de modo a expressar e cumprir diversas funções, ser referência urbanística, símbolo de identidade coletiva, manifestação da história e da vontade do poder; e, finalmente, espaço político porque além do espaço da expressão coletiva da vida comunitária, da visibilidade dos diferentes grupos sociais, dos encontros cotidianos, deveria ser também o espaço da afirmação ou da confrontação, o espaço das grandes manifestações cidadãs ou sociais (ABRAHÃO, 2008, p. 48).

E a obsessão pelos espaços públicos urbanos fez Borja (Apud ABRAHÃO, 2008, p. 48) acreditar que o espaço público é a própria cidade. Para o autor: “a história da cidade sempre se confundiu com a história de seus espaços públicos, enquanto síntese de lugares e fluxos, lugar de coesão social e de intercâmbios”.

Para Abrahão (2008), os espaços públicos são tidos como lugares onde deveriam estar assegurados os direitos dos cidadãos ao uso da cidade, a acessibilidade à memória, segurança, informação, conforto, circulação, além do acesso visual à arquitetura e à estrutura urbana. Para o autor, esses são espaços imprescindíveis ao exercício da cidadania e à manifestação da vida pública.

Para Stephen Carr (In YÁZIGI, 2000, p. 313), “o espaço público é visto como a plataforma comum onde o povo leva a cabo as atividades funcionais e rituais, tanto nas rotinas diárias como nas festividades periódicas”. Para Grinover (2007, p. 160) “os espaços públicos são os lugares privilegiados para a vida coletiva, para a sociabilidade, a civilidade, a ordem pública, a cidadania e a hospitalidade urbana. São os espaços públicos que dão a qualquer conglomerado urbano a possibilidade de várias experiências

espaciais, em termos de vivências humanas e de prazer estético; onde se possibilitam e se exercitam a escolha, a liberdade e a hospitalidade”.

Enquanto espaços que potencializam a hospitalidade, Isabel Baptista (2008) destaca os lugares coletivos e os define como lugares de trânsito, com destaque para as praças, os mercados, os cafés, os parques e os centros cívicos. A autora defende que, no contexto da vida contemporânea, a hospitalidade dos lugares é medida pelo tipo de sociabilidade que instauram, pelo espírito humano que os anima, e não tanto pelos rituais de recepção que tradicionalmente caracterizam o acolhimento na nossa casa. Ou seja, o espaço da hospitalidade urbana não é exclusivamente público, mas todos aqueles espaços de uso comum, uso coletivo, o que inclui ainda todos os espaços privados de uso público.

Para Gastelaars (1993, Apud VARGAS, 2001, p. 98), para ser considerado espaço público, o espaço deve ser, em princípio, “acessível a todos os moradores e visitantes, ao mesmo tempo em que esses cidadãos e visitantes devem ser capazes de interagir, livremente, na mesma base, independente de sua condição social”. Dentre os espaços que não são exatamente públicos,

estamos falando dos espaços privados, para alguns autores chamados de espaço semi-públicos ou espaços que possuem livre acesso pelo menos durante o período em que esses espaços estiverem abertos. E para a hospitalidade urbana, quanto mais espaços desses melhor, pois o que é importante, na realidade, é a dinâmica que esses espaços proporcionam com o verdadeiro espaço público, a rua.

Para Jacobs (1999, p. 4), as ruas têm várias funções. Elas são ao mesmo tempo um espaço para trocas (trocas de serviços ou de mercadorias), um espaço político (isto é, funcionam como uma espécie de ponto de encontro para o desenvolvimento do intercâmbio de ideias ou ainda um palco para manifestações e expressão de massa), e um espaço simbólico (onde os citadinos entendem os símbolos da cidade, assim como seus rituais, seus cerimoniais, suas regras das ruas etc).

Dessa forma, os cafés, os restaurantes, os lobbies dos hotéis, as igrejas, as bibliotecas, as livrarias, os cinemas, os teatros e os museus só têm importância porque são atividades, privadas, mas que têm uma relação direta com o espaço público e, portanto, são fundamentais para a vitalidade das ruas. Ainda podemos destacar

as estações ferroviárias ou metroviárias e os terminais de ônibus, entre outros.

Alguns desses espaços internos de uso público têm uma atmosfera tão agradável que podem agradar tanto moradores quanto turistas. E para Kloos (1993), esses lugares além de ter uma relação com o desenho urbano devem ter uma arquitetura que transmita a sensação de convidar o pedestre, seduzindo-o. Para o autor, o desenho urbano tem que prever as necessidades urbanas como as de conforto, relax e descoberta para não gerar espaços frios e desinteressantes. Ele propõe que um bom espaço público tem que primar por ser:

• Compreensivo (manejados para atender as necessidades dos seus usuários);

• Democrático (espaços aptos a proteger os direitos dos grupos de usuários);

• Significativo (espaços que levam as pessoas a estabelecerem fortes ligações entre suas vidas e o mundo segundo suas condições físicas culturais, sociais e psicológicas).

Ou seja, o espaço da hospitalidade urbana envolve todos os espaços de livre acesso, de uso coletivo. E, especificamente os espaços privados de uso público, como os acima citados oferecem inúmeras possibilidades, pois certamente têm um duplo uso: eles foram projetados para um uso específico (exemplo: estações de trem, cinemas, restaurantes etc.), mas também atraem outros tipos de usuários de uma natureza neutra, ou seja, estrangeiros são sempre bem-vindos.

Esses espaços podem contribuir para a sociabilidade já que eles, pra começar, estão sempre abertos, e este é o princípio que se torna possível entrar ou sair sem ser controlado ou vigiado. Além disso, esses lugares normalmente são cobertos, ou seja, protegem os estrangeiros das intempéries.

Para Kloss (1993), a vida urbana moderna é incompleta sem esses edifícios privados de acesso público, afinal, a complexidade da cidade envolve nuances entre a rua e o edifício, entre o exterior e o interior, entre o público e privado. O morador da cidade tem naturalmente uma necessidade grande e crescente para os encontros em espaços públicos e semi-públicos, designados também como lugares neutros. Como não se trata da casa de

alguém, não se criam as obrigações e se estabelece o anonimato. Contudo, algumas exigências devem ainda ser atendidas, mesmo nos lugares neutros, como o conforto. Afinal, é desagradável ficar esperando alguém no frio, na chuva ou longe da possibilidade de tomar um café.

Assim como os espaços públicos, os espaços privados de uso público também são importantes para a hospitalidade urbana. Isso significa que os espaços da hospitalidade urbana não são necessariamente os espaços públicos, mas os espaços coletivos, os espaços que permitem ao morador ou ao visitante o livre acesso ou o acesso controlado sob algumas regras. Isso porque nem todos são bem-vindos em certos espaços semi-públicos:

Alguns espaços que, em princípio também têm acessos livres, não são para todos. As pessoas por vezes têm seus acessos recusados, ou são convidadas a se retirar ou até mesmo expulsas. É evidente que nem todo mundo é bem-vindo em determinados espaços semi-públicos24 (Kloos, 1993, p. 13).

Um exemplo dessa situação ocorre, por exemplo, em um restaurante elegante, onde é preciso que os homens usem gravata.

Sem isso, os visitantes não podem entrar. Isso significa que, para ser bem-vindos ao interior de certos edifícios privados, teoricamente de livre acesso ou acesso controlado, o visitante deve respeitar um certo código de comportamento. São as regras para o uso, os códigos de conduta de abrangência social.

Segundo Kloss (1993), quando um código de comportamento é imposto, a fim de impedir a entrada de certos tipos de pessoas, esse interior não pode ser considerado um espaço totalmente público. No entanto, o código de comportamento é aplicado de forma a garantir o anonimato. Isso é, muitas vezes, o propósito é justamente esse: não ser um espaço público, mas um espaço controlado.

Sendo assim, entende-se como o espaço da hospitalidade urbana todo espaço urbano de propriedade pública ou privada, aberto ao público e que permita o livre acesso.