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DO RECURSO DA TERRACAP:

No documento rdj103 (páginas 176-185)

apelação cível 2011011235278-

1. DO RECURSO DA TERRACAP:

A irresignação da apelante cinge-se, tão somente, quanto à determinação para que seja suspensa, até a efetiva desocupação do terreno, a exigibilidade das pres- tações ainda não pagas, vencidas ou vincendas, referentes à alienação do imóvel descrito na inicial ao autor, via processo licitatório.

No ponto, importa transcrever os fundamentos da sentença resistida, que ora se adota como razões de decidir, in verbis:

“Quanto ao pedido de suspensão da exigibilidade das prestações pecuniárias assumidas pelo autor perante a ré TERRACAP, também merece ser acolhido, por se tratar a situação versada nos autos de exceção de contrato não cumprido. Ao disponibilizar os imóveis à venda em licitação, a Terracap se compromete a entregá-los livres e desembaraçados, salvo os imóveis expressamente iden- tificados como ocupados ou obstruídos no edital, para os quais há condições especiais (Capítulo XIII do edital, fl. 123).

No caso, o imóvel adquirido pelo autor não foi anunciado como ocupado ou obstruído, portanto, a Terracap comprometeu-se publicamente a ceder a posse plena ao adquirente, como decorre da própria natureza do contrato de compra e venda.

Como visto, a parte vendedora não assegurou ao comprador a imediata imissão na posse, de forma que, independentemente de se tratar de fato de terceiro, ou de que não tenha havido a culpa da parte da ré Terracap, deve-se considerar não cumprida a sua obrigação, de modo que não poderá exigir da parte contrário o cumprimento das obrigações recíprocas.

Assim, diante da exceção de contrato não cumprido (art. 476 do Código Civil), deve-se decretar a suspensão da exigibilidade das prestações a cargo do autor, até que obtenha a posse plena do terreno”.

Com efeito, a tese apresentada pela recorrente – a de que a previsão legal da ex- ceção do contrato não cumprido (art. 476, do CC) não se aplica à hipótese, vez que o autor, após sagrar-se vencedor no certame licitatório, emitiu-se imediatamente na posse do imóvel – não merece acolhida.

Verifica-se que o autor, na petição inicial, afirmou que “ainda no transcurso da lici- tação, ou seja, antes de o autor ter sido investido na posse e domínio do referido imóvel, no aguardo da lavratura da escritura pública de compra e venda (ainda não realizada e assinada, na forma do edital), o imóvel foi esbulhado pela 2ª Ré, em litisconsorte – Igreja Assembleia de Deus do Planalto, sob a direção e iniciativa de seu pastor, Senhor J.F. da S., e construído de pronto no imóvel um barraco de madeirite, e dias depois reconstruído em alvenaria e placas de metal e cercado de

grades de ferro, com placa visível: ‘IGREJA ASSEMBLEIA DE DEUS DO PLANALTO’, como se constata das fotos juntadas (docs.)”.

Corroborando as alegações do autor/apelado, verifica-se que, embora conste dos laudos de vistoria (fls. 89/90), realizados nos dias 28.10.2009 e 26.07.2010, que a área objeto de licitação “encontra-se vaga, sem indícios de construções no local” (fls. 89), bem como que “se encontra sem indícios de construção, porém existe um poste de energia elétrica no terreno”, respectivamente, por meio do Ofício 138/2011 – DITEC (fls. 92), datado de 17.02.2011, a própria recorrente, admitindo que a área foi “irregularmente ocupada pela Igreja Assembleia de Deus do Planal- to na vigência do edital do evento licitatório”, requer providências junto ao Secretá- rio de Estado da Ordem Pública e Social – SEOPS, no sentido de agendar operação de desobstrução sobre o imóvel (grifado).

Vale notar que, por meio da Carta 91/2011 CLPI/NUCOM, de 26.04.2011 (fls. 28), a TERRACAP comunicou a homologação do resultado do processo licitatório (item 143, do Edital 08/2010), em favor do autor/apelado, fixando o prazo para o paga- mento do valor referente à “entrada inicial”, para o período compreendido entre 26.04.2011 a 02.05.2011.

Como se vê, e ao contrário do que a apelante alega, embora o imóvel adquirido pelo autor tenha sido anunciado como desocupado ou desobstruído, a igreja ré ocupou o terreno licitado durante o processo de licitação, não tendo a TERRACAP se desincumbido do ônus de ceder a posse plena ao adquirente, como decorre da própria natureza do contrato de compra e venda, e consoante comprometeu-se publicamente, como bem observou o douto magistrado sentenciante.

Assim, não tendo a ré/apelante se desincumbido do ônus que lhe cabia – ceder a posse plena ao adquirente – não pode exigir o implemento da obrigação da parte adversa – pagamento das parcelas–, nos termos do art. 476, do CC, impondo-se a manutenção da sentença, neste ponto.

2. DO RECURSO DA IGREJA ASSEMBLEIA DE DEUS DO PLANALTO.

Inicialmente, quanto ao pedido de gratuidade de justiça, não obstante as alega- ções da igreja apelante – de que se trata de pessoa jurídica sem fins lucrativos, que vive da ajuda dos fiéis –, a recorrente não comprovou a impossibilidade de arcar

com as custas processuais, sendo presumível que as liberalidades (pagamento de dízimos e doações para igreja) superam o valor das custas e afastam a presunção

juris tantum de pobreza, impondo-se a rejeição do seu pedido, na esteira da juris- prudência deste egrégio Tribunal de Justiça. Confira-se:

“IMPUGNAÇÃO À GRATUIDADE DE JUSTIÇA. PAGAMENTO DE DÍZIMOS E DO- AÇÕES PARA IGREJA. LIBERALIDADES QUE SUPERAM O VALOR DAS CUSTAS E AFASTAM A PRESUNÇÃO ‘JURIS TANTUM’ DE POBREZA.

Tendo sido desconstituída a presunção de miserabilidade decorrente do defe- rimento do benefício da gratuidade judiciária, impõe-se afastar o beneplácito inicialmente concedido” (Acórdão 572944, 20090110756247APC, Relator: CARMELITA BRASIL, Revisor: WALDIR LEÔNCIO LOPES JÚNIOR, 2ª Turma Cível, Data de Julgamento: 14/03/2012, Publicado no DJE: 19/03/2012. Pág.: 149). De igual modo, importa registrar que a decisão que recebeu a apelação ape- nas no efeito devolutivo foi objeto de apreciação por este Relator, por oca- sião da decisão monocrática proferida no agravo de instrumento (processo 2013.00.2.0057690), que inadmitiu o recurso, com fundamento no art. 557, do CPC. O argumento ali utilizado, que agora se transcreve e se adota como razão de decidir, foi o de que “consoante farta jurisprudência desta egrégia Corte de Justiça, a determinação do recebimento do recurso de apelação ape- nas no efeito devolutivo decorre de expressa disposição legal – art. 520, inciso VII, do CPC”.

No que diz respeito à preliminar arguida – cerceamento de defesa –, sob o argu- mento de que não foi oportunizada a produção de prova testemunhal, não assiste razão à apelante.

Com efeito, a inadmissão da produção da prova requerida não culmina em cer- ceamento de defesa, na medida em que o Juiz não é obrigado a acolher todas as provas requeridas pelas partes, sendo relevante observar que as provas des- tinam-se ao convencimento do magistrado, cabendo a ele delimitar a produção das mesmas, ou proceder ao julgamento antecipado, quando já possui subsídios suficientes para o deslinde da causa.

Rejeita-se, pois, a preliminar.

No mérito, melhor sorte não lhe assiste.

Em que pese o esforço da combativa defesa da apelante, a tese apresentada na contestação, e ora reprisada nas razões de apelação – a de que as fotografias jun- tadas às fls. 169, demonstram que, desde os anos de 2005/2006, portanto, muito antes da aquisição do terreno pelo autor, a recorrente já havia instalado um barra- cão no local, tendo sido posteriormente edificada a igreja – não merece acolhida. Com efeito, e como já dito, os laudos de vistoria (fls. 89/90), realizados nos dias 28.10.2009 e 26.07.2010, indicam que a área objeto de licitação encontrava-se vaga, sem indícios de construções no local.

Registre-se, por oportuno, que, consoante se depreende do Ofício 138/2011 – DITEC (fls. 92), em que a TERRACAP solicita ao Secretário de Estado da Ordem Pública e Social a desobstrução do imóvel, foi ressaltado que “a alegação da ocu- pante de que o imóvel estaria inserido na relação constante da Lei Complemen- tar 806/2009 (que dispõe sobre a política pública de regularização urbanística e fundiária das unidades imobiliárias ocupadas por entidades religiosas ou de assistência social) foi rechaçada em razão da sua não ocupação até 31.12.2006, conforme previsto na citada lei, conforme parecer jurídico descrito no Expediente 008000/2010, cópia anexa”.

No mais, as circunstâncias em que se deu o esbulho praticado pela igreja ré, bem como a intenção de o autor adquirir o bem para instalação de sua empresa, com

animus domini, foram bem observadas pelo douto magistrado singular na sen- tença recorrida, cuja fundamentação ora se transcreve e se adota como razões de decidir, verbis:

“Da análise da prova documental carreada aos autos, verifico que assiste ra- zão ao autor. Ele adquiriu imóvel em concorrência pública promovida pela ré Terracap, contudo, foi impedido de obter a posse plena da área em virtude de esbulho praticado pela ré Assembleia de Deus do Planalto.

O autor participou da concorrência pública 8/2010 e apresentou a melhor proposta de compra para o imóvel descrito na inicial (fls. 25/26), que lhe foi adjudicado regularmente (fl. 27). Pagou a entrada inicial (fls. 30/31) e vinha pagando as demais prestações (fls. 33/39).

Porém, o autor foi impedido de obter a posse plena do terreno, em razão de ter sido construída a igreja retratada à fl. 41, de responsabilidade da segunda ré. Portanto, verifica-se que o autor faz jus à tutela jurisdicional para se imitir na posse da parcela do terreno ocupada pela igreja ré, como consectário da aqui- sição regular do terreno perante a legítima proprietária, a Terracap.

Por outro lado, a ocupação promovida pela ré é injusta e de má-fé, eis que não amparada por qualquer ato autorizativo do proprietário ou outro título de qualquer natureza.

Destaco que, até a venda do imóvel em licitação, o bem era pertencente ao domínio público, pertencente ao Distrito Federal e administrado pela empresa pública TERRACAP.

Assim, a ocupação promovida pela igreja ré não pode ser considerada verda- deira posse e nem receber a proteção possessória, tratando-se, na verdade, de mera detenção de bem público. Assim, ante a aquisição do terreno por particu- lar, em procedimento licitatório, a detenção ilegal deve cessar para que haja a legítima imissão na posse do adquirente.

Nesse contexto, é irrelevante perquirir a data de início da ocupação promovida pela igreja ré, pois, tratando-se de mera detenção ilegal do bem público, não pode ser chancelada em detrimento do direito do legítimo adquirente. Ainda assim, verifico que são muitos os elementos de prova que apontam para o fato de que a obra retratada à fl. 41 foi feita às vésperas da aquisição pelo autor, com o objetivo de se apoderar ilegalmente da área.

Primeiro, as próprias fotos às fls. 41 demonstram se tratar de obra recente, pois as chapas metálicas são novas e há diversos materiais de construção espalha- dos ao seu redor, como tijolos, areia, brita e revestimento cerâmico.

Segundo, porque as equipes técnicas da TERRACAP vistoriaram o local em 28/10/2009 e 26/7/2010 e registraram que a área encontrava-se ‘vaga, sem indício de construções no local’, à exceção de um poste de energia elétrica. Por tais razões, o lote foi disponibilizado na licitação pública como vago, como se

vê à fl. 120, em que o item 143 não possui a ressalva assinalada por asterisco, que indicaria a existência de obstrução.

Além disso, os expedientes da TERRACAP (fl. 92) noticiam que a ocupação ocorreu na vigência do edital licitatório, e não anteriormente a 31/12/2006, como alegado pela ré.

Por fim, nenhum dos documentos trazidos com a contestação, como o certifi- cado, correspondências e ofícios às fls. 159/162, mencionam que a igreja ré estivesse estabelecida no lote objeto da lide.

De todo modo, ainda que a ocupação fosse antiga, não poderia subsistir, por se tratar de mera detenção irregular de área pública.

Por outro lado, equivoca-se a ré quanto ao alcance das Leis Complementares Distritais 806/09 e 834/11, que tratam da ‘política pública de regularização urbanística e fundiária das unidades imobiliárias ocupadas por entidades re- ligiosas ou entidades assistenciais’. O art. 2º da Lei Complementar 806/09 se limitou a estabelecer a preferência das entidades que se já se encontrassem instaladas para a aquisição dos terrenos.

Em tais leis não há – nem poderia haver – qualquer disposição que assegure às entidades religiosas a doação dos terrenos, ou a perpetuação da ocupação a qualquer outro título. Somente por licitação pública pode-se dispor sobre os bens imóveis públicos, sendo inconstitucional qualquer iniciativa governa- mental que buscasse contornar tal exigência.

Portanto, a segunda ré poderia gozar, no máximo, de preferência no procedi- mento licitatório, desde que tivesse comprovado, previamente à licitação, que atendia aos requisitos da Lei Complementar 806/09, o que não foi feito. Além de não preencher os requisitos para obter o direito de preferência, a igre- ja ré sequer participou da licitação pública. Não foi alegado na contestação e nem há qualquer documentos nos autos que indique que a ré participou da licitação na qual o autor sagrou-se vencedor, única oportunidade em que o eventual direito de preferência poderia ser reivindicado.

Ao não participar da licitação, a ré demonstra que pretendia, na verdade, es- bulhar a área e se apoderar em definitivo dela sem nada pagar, o que não encontra respaldo jurídico, nem moral.

Ademais, não socorrem à ré as alegações de que o imóvel não seria destinado à construção de depósito de gás e de que o estabelecimento não seria dotado de alvará de funcionamento. O edital da licitação indicou que o bem é destina- do a ‘uso coletivo’ e não a fins exclusivamente residenciais (fl. 24), e a parte ré, que alegou a irregularidade, não trouxe aos autos a NGB adotada pela Admi- nistração Regional para disciplinar o uso do imóvel.

Em especial, destaco que o pedido deduzido pelo autor se limita à imissão na posse, com a retirada da igreja da área por ele adquirida. As questões relati- vas à regularidade da atividade econômica ali exercida são alheias à presente ação e tais fatos, ainda que sejam verdadeiros – o que não foi comprovado –, não garantiriam à ré permanecer ocupando terreno alheio.

Sendo assim, a pretensão do autor merece ser acolhida, a fim de garantir a sua imissão na posse. Cabível, também, a fixação de multa para coibir a reiteração do ilícito, conforme previsto no art. 921, inc. II, do Código de Processo Civil”.

Por fim, quanto ao valor fixado a título de danos morais – R$ 20.000,00 (vinte mil reais), verifica-se que o douto magistrado singular bem observou a repercussão do dano na esfera da vítima, que ficou privada do uso de parte do seu imóvel, a sua extensão, tendo em vista que a ocupação perdurou por tempo muito maior do que o razoável e a ré se recusou a desocupar o imóvel, sem justa causa, e o potencial econômico-social da obrigada ao ressarcimento, à luz dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, bem como o caráter compensatório e inibidor, não merecendo qualquer reparo o decisum, neste ponto.

Nesse sentido:

“CIVIL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. AJUIZAMENTO DE AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. DÍVIDA QUITADA. DANO MORAL. OCOR- RÊNCIA. QUANTUM. PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MANUTENÇÃO.

1. A instituição financeira que negligencia o cômputo do pagamento da obri- gação por parte do devedor, e contra este ajuiza ação de reintegração de posse, deve responder pelos danos morais impingidos ao autor.

2. Na fixação da indenização por danos morais, o juiz deve considerar a pro- porcionalidade e razoabilidade da condenação em face do dano sofrido pela parte ofendida e o seu caráter compensatório e inibidor, mediante o exame das circunstâncias do caso concreto.

3. A fixação de honorários advocatícios na forma do Art. 20, §4º, do CPC, deve observar os critérios previstos nas alíneas do §3º do mesmo dispositivo legal, o que ocorreu no caso dos autos.

4. Recurso não provido” (20110112166427APC, Relator: CRUZ MACEDO, Re- visor: FERNANDO HABIBE, 4ª Turma Cível, Data de Julgamento: 12/12/2012, Publicado no DJE: 10/01/2013. Pág.: 376)

Dessa forma, nego provimento aos recursos, mantendo na íntegra a sentença resistida.

É como voto.

Des. Antoninho Lopes (Revisor) – Com o Relator. Des. James Eduardo Oliveira (Vogal) – Com o Relator.

decisão

Negar provimento aos recursos, unânime.

apelação cível

No documento rdj103 (páginas 176-185)