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Dos ideais da educação científica para todos e da educação

CAPÍTULO 2 DE FINALIDADES RENOVADAS PARA A EDUCAÇÃO

2.1. Contextos de reforma e emergência de perspectivas renovadas de

2.1.1. Dos ideais da educação científica para todos e da educação

O ensino formal das ciências teve como finalidade principal, durant

século XX, a instrução científica dos alunos com vista à preparação de futuros cientistas. Nesta perspectiva, o ensino praticado, designadamente o ensino de química, visava a transmissão de factos, conceitos e teorias científicas. Assentava numa perspectiva internalista, em que o ensino destes produtos das ciências tinha valor por si mesmo, e reflectia estereótipos, designadamente de objectividade, neutralidade e singularidade metodológica, relativamente à ciência enquanto forma de produção de conhecimento (Freire, 1993; Hurd, 1990; Pereira, 2002; Santos, 1999)

ução posterior noutros países designadamente Portugal, continuavam a ter como objectivo principal angariar estudantes para profissões relacionadas com as ciências, e pretenderam uma aproximação à "ciência pura" praticada e desenvolvida pelos cientistas. O ensino das ciências procurava treinar os alunos para pensarem e agirem como cientistas, para "fazerem" ciência recorrendo a uma orientação indutivista assente na vivência e aplicação do método científico. Esta orientação foi posteriormente alvo de muitas críticas por promover imagens das ciências e do conhecimento científico marcadas por um empirismo e indutivismo extremos, desumanizadas e descontextualizadas, num claro desfasamento relativamente a imagens preconizadas por desenvolvimen

orâneos da epistemologia e da filosofia das ciências.

Nas décadas de 1960 e de 1970 crescia a consciência social, nomeadamente nos EUA, do peso dos desenvolvimentos científicos e tecnológicos na vida quotidiana dos cidadãos, na vida das sociedades e, globalmente, na qualidade de vida na Terra. Porém, a

melhores do que anteriormente, o que contribuía ainda mais para afas

aquela autora, o número d

avaliação dos programas curriculares implementados nos EUA nessa altura apontava para um desinteresse crescente dos alunos pelo estudo das ciências - o objectivo de angariar estudantes para o estudo de ciências não estava a ser alcançado. Os resultados escolares dos alunos também não eram

tar os alunos do estudo destas disciplinas, nomeadamente os que pretendiam obter classificações que lhes permitissem ingressar no ensino superior (Freire, 1993).

A consciência pública da ciência que se desenvolveu entre a população adulta, a partir das décadas de 1960 e de 1970, e que correspondeu a uma maior sensibilização e reconhecimento do poder do conhecimento e da influência da ciência na sociedade devia- se mais, na opinião de Fensham e Harlen (1999), à divulgação sensacionalista pelos media de acontecimentos relacionados com a ciência e com a tecnologia, e à crescente popularidade de obras de autores como Azimov, Stephen J. Gould, Richard Dawkins, Stephen Hawkins, entre outros, do que às vivências escolares.

Num contexto em que se reconhecia a necessidade das pessoas viverem e tomarem decisões, designadamente relacionadas com estilos de vida e aspectos específicos das suas vidas privadas, em contextos fortemente marcados e condicionados pela ciência e pelas realizações tecnológicas, assistia-se a um crescente distanciamento dos jovens relativamente às ciências e às suas formas de pensar, preferindo formas pós-modernas (Solomon, 1999) de pensar sobre o mundo, aproximando-se mais de ciências mais humanísticas como a psicologia e a sociologia. Ainda de acordo com

e alunos que na Grã-Bretanha optava por continuar a estudar física ou química, após a escolaridade obrigatória, continuava a diminuir, ou pelo menos, não aumentava.

A confiança na ciência tem sido abalada, aos olhos do público, pela discordância assumida entre cientistas relativamente a questões sociocientíficas polémicas como a BSE, a ingestão de alimentos geneticamente manipulados, ou o tratamento de resíduos industriais perigosos. O papel da probabilidade em ciências e o seu papel na avaliação de riscos inerentes a tomadas de decisão pessoais, designadamente em questões informadas

a vida (Martins, 2002a), entendendo-se a Educação no seu sentido lato, que não se esgota mas que inclui, pelas ciências, são ainda pouco reconhecidos pelas pessoas. A credibilidade pública das ciências também tem sido afectada pela tomada de consciência da existência de teias de factores sociais, económicos e políticos que condicionam e restringem a actividade científica (Solomon, 1999).

Contudo, é hoje socialmente reconhecida a importância de todos os cidadãos desenvolverem alguns conhecimentos sobre ciências, de ciências, e competências associadas a formas de raciocínio científico para poderem beneficiar plenamente do progresso científico e técnico, quer pessoalmente quer enquanto elementos das comunidades em que se inserem e que devem ajudar a construir e a preservar. No entanto, os problemas mais sérios com que a humanidade se depara hoje são globais, pelo que há mais do que as dimensões pessoal, comunitária e nacional em jogo. Durante a década de 1980 surgiu a ideia, hoje praticamente consensual, de que a educação científica deve ser um direito de todos os cidadãos. Aderiram, então, a esse ideal, sob o título "Science for All", organizações como a UNESCO, a National Science Foundation (EUA), o Science Research Council (Canadá) ou a The Royal Society (GB) (Fensham & Harlen, 1999). A educação científica para todos deve ser entendida no âmbito mais alargado da educação para todos, com três metas principais relacionadas com o crescimento e desenvolvimento pessoal continuado, com a capacitação para a participação activa dos cidadãos em sociedades democráticas e com as possíveis ocupações profissionais ao longo das suas vidas. Assim, a educação científica para todos deverá ser geral e não específica - deve ser orientada para a formação de cidadãos e não de cientistas (Bybee, 1997).

A UNESCO preconiza ideais e valores alargados relativamente à educação e ao direito universal à educação. Em 1990 realizou-se a Conferência Mundial da Educação para Todos. Definiu-se o conceito de Educação Básica, para todos, tendo no seu cerne o desenvolvimento de competências para aprender ao longo d

necessariamente, a educação formal escolar. A educação para todos preconizada pela UNESCO enquadra-se no ideal da Educação para o Desenvolvimento Sustentável, que

os,

nomeadamente, obo,

pela per ição

dos recu a da

dissemin as de

agricultu s de

diversidade de espécies, pelas persistentes negações da democracia e violações de direitos humanos, pelos crescentes conflitos e violência de origem étnica e religiosa, pela ameaça de holocausto nuclear ou biológico, pela in

desenvolvimento rrem

destes f de práticas sociais,

económ tiza-

se a nec uma

perspectiva do futuro enraizada em

1997). Ao colocar no cerne da definição de desenvolvimento sustentável o papel da cultura, dos valores das pessoas, das suas percepções das relações interpessoais e das suas relações com

ento sustentável e o reconhecimento da necessidade de o valorizar, fazem com que os já vem sendo desenvolvido e defendido desde Tbilisi, em 1977 (UNESCO, 2002) - para uma apreciação crítica de conceitos de sustentabilidade e de princípios operativos do conceito ver, por exemplo, Luffiego & Rabadán, 2000. O futuro do nosso planeta tem vindo a ser encarado como problemático face a problemas sociais e ambientais suscitad

pelo crescimento desmesurado da população em algumas partes do gl sistência de pobreza muito generalizada e de iniquidades extremas na distribu rsos, pelas crescentes pressões exercidas sobre o ambiente em consequênci ação pelo planeta de indústria (poluidora) e de novas e mais intensivas form ra, pela depleção de florestas tropicais e de outras fontes importante

iquidade sexual e pela própria noção de e de como é medido. Considerando que os problemas que deco actores são produto de formas de pensar, de valores e

icas e políticas que colocaram o nosso planeta numa rota não sustentável, enfa essidade de, a par de lidar no imediato com esses problemas, se construir

valores de sustentabilidade (AAAS, 1989; UNESCO,

o ambiente que sustenta a vida humana (ver quadro 2.1.), a UNESCO atribui à educação para todos a responsabilidade de desenvolver a consciência pública para a sustentabilidade e para um mundo mais equitativo. Confere-lhe o estatuto de meio estratégico para se alcançar o grande objectivo da criação de um futuro sustentável, através da promoção de mudanças de conhecimentos, valores, comportamentos e competências para aprender ao longo da vida - ver quadro 2.2..

referidos ideais da educação científica para todos e da educação para um desenvolvimento sustentável se entrecruzem e até certo ponto se fundam. Na Conferência Mundial sobre a Ciência, que decorreu em

os objectiv ue os os ra as rio de e se as, e a na

tomada de decisões relacionadas com a aplicação do novo conhecimento." (UNESCO &

ICSU, 1999, p. 9).

Em sinton ,

aos alunos de áreas não científicas."

na vi a

educação científica é essencial para o

capacidade científica endógena e para uma cidadania informada e activa"

ICSU, 1999,

As decisões das pessoas relativas aos seus estilos de vida e condutas têm

implicações que tra acionam

com condu resíduos

domésticos identais)

prevê a participação dos cidadãos em

diversos m ciais ou

ambientais s também o

são as consultas públicas previstas nos Estudos de Impacte Ambiental, requeridos pela Budapeste em 1999, valorizando-se o papel da ciência perante os de um mundo mais equitativo, próspero e sustentável, proclamou-se q

"A educação científica, no sentido lato, sem discriminação e abrangendo tod níveis e modalidades, é um pré-requisito fundamental para a democracia e pa segurar um desenvolvimento sustentável [...] Mais do que nunca é necessá senvolver e expandir uma alfabetização científica de base em todas as culturas ctores da sociedade, assim como a capacidade de raciocínio e as competências prátic uma sensibilidade para os valores éticos, de modo a melhorar a participação públic

ia com o ideal da educação científica para todos

"Os estabelecimentos de ensino devem garantir uma educação científica de base

(UNESCO & ICSU, 1999, p. 24)

"[...] o acesso ao conhecimento científico para fins pacíficos, desde muito cedo da, é parte do direito à educação reconhecido a todos os homens e mulheres e que

desenvolvimento humano, para a criação de uma

(UNESCO & p. 5).

nscendem a esfera pessoal. São disso exemplos as que se rel tas de consumo ou com preocupações de tratamento selectivo de . Além disso, a vida democrática das sociedades (nomeadamente oc

processos de tomada de decisão política, por ecanismos. Referendos nacionais ou regionais sobre questões so

Quadro 2.1. - Visão emergente do Desenvolvimento Sustentável

Sustainable development is widely understood to involve the natural sciences and

ps among peoples and

NESCO, 1997, p. 36)

"(...) while there are many definitions of sustainable development, it can perhaps be better understood as an emerging vision rather than as a neatly defined concept or relationship. In truth, it is as much an ethical precept as a scientific concept, as concerned with notions of equity as with theories of global warming.

economics, but it is even more fundamentally concerned with culture: with the values people hold and how they perceive their relations with others. It responds to an imperative need to imagine a new basis for relationshi

with the habitat that sustains human life." (U

that reaches out to all members of society through new modalities and new

"Education is not only an end in itself. It is a key instrument for bringing

knowledge formation and sharing, rural development and changes in production

es and knowledge to live sustainably in

(UNESCO, 2002, p. 2) Quadro 2.2. - Educação e Desenvolvimento Sustentável

'the key to sustainable, self-reliant development is education - education

technologies in order to provide genuine lifelong learning opportunities for all. We must be ready, in all countries, to reshape education so as to promote attitudes and behaviour conducive to a culture of sustainability'

(Frederico Mayor, UNESCO, 1997, p. 4)

about the changes in the knowledge, values, behaviours and lifestyles required to achieve sustainability and stability within and among countries, democracy, human security and peace.

Education at all levels and in all its forms constitutes a vital tool for addressing virtually all global problems relevant for sustainable development, in particular poverty, HIV/AIDS, environmental degradation, peace and stability,

and consumption patterns.

Education for sustainable development (ESD) implies providing the learners with the skills, perspectives, valu

legislaç

de construçõe ção que os

cidadãos podem adoptar para fazer reivindicações sobre questões relevantes para o seu ambiente próximo. Também a estes níveis se torna relevante uma educação científica básica p

lectivas, e já não só individuais, preparando as pessoas para o exercício de uma cidadania informada e responsável.

N o século XXI, em que é "o

conhecimento científico aquilo que mais demarca a época actual de épocas passadas" (Martins, 2002a, p.89), verificam-se níveis de literacia científica baixos, ou mesmo muito reduzido

ade mais abrangente do desenvo

ão, nomeadamente portuguesa, para a implantação de indústrias ou de outros tipos s (Figueiredo Dias & Mendes, 2000) e outras formas de participa

ara todos os cidadãos, onde desenvolvam uma literacia científica que os capacite a colocarem conhecimentos científicos e competências desenvolvidas nesse contexto ao serviço das tomadas de decisão co

o final do século XX, e na transição para

s, por parte dos jovens no final da escolaridade obrigatória, mesmo em países desenvolvidos (eg., OECD, 2001), e um crescente afastamento dos jovens relativamente ao estudo das ciências após aquele nível de escolaridade (eg., Solomon, 1999). As reflexões desenvolvidas por investigadores em educação em ciências mas também por organizações responsáveis e influentes na política educativa e científica, ao nível mundial, apontam para a necessidade de repensar a cultura de educação científica e, portanto, também o ensino formal das ciências, designadamente ao nível da educação básica, tendo por referência os ideais da educação (científica) para todos e da educação para o desenvolvimento sustentável do planeta. Destes ideais, surge como finalidade da educação científica, e, portanto, do ensino formal das ciências, o desenvolvimento de literacia científica dos jovens considerado essencial para a finalid

lvimento de uma cidadania informada, participativa e responsável (meta transversal a todas as áreas da educação).

O conceito de cidadania é um conceito actualmente muito invocado, quer nas análises

e determinam a construção das pessoas como cidadãs e as respectivas actuação e intervenção no seu mundo circundante. É, portanto, um conceito situado historicam

existên a de

2.1.2. DAS METAS DA EDUCAÇÃO CIENTÍFICA PARA O DESENVOLVIMENTO DA