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Dos interesses financeiros da União Europeia e a Procuradoria Europeia

CAPÍTULO II: DA UNIÃO EUROPEIA E DO DIREITO PENAL EUROPEU

II.3: Da arquitetura do Direito Penal Europeu

II.3.3 Dos interesses financeiros da União Europeia e a Procuradoria Europeia

Antes de analisarmos a PE, centremo-nos na sua competência material: as infrações

que orbitam em torno do conceito de interesses financeiros da UE. De acordo com

GIUFFRIDA (2017, p. 4), este assenta no orçamento da UE, representando “(…) the

common interest par excellence, and interest that is ipsa natura supranational and whose

need for the protection transcends national frontiers”, sendo classificado como um

quintessential (MITSELGAS, 2016, p. 67).

A COMISSÃO EUROPEIA (2000) considera que as infrações que o lesem

representam genuine european crimes, quantificando inclusivamente o seu valor

348

.

Segundo GIUFFRIDA (2017, p. 6), “the risks to the EU budget are even greater in light

of the growing involvement of criminal organisations”.

De acordo com o art.º 17, n.º 2, do último esboço para Diretiva sobre a Proteção

dos Interesses Financeiros da UE — Council Doc. 5478/17 de 1 de fevereiro de 2017

(CONSELHO, 2017), este catálogo penal deverá ser preenchido com crimes inextricably

linked ao conceito suprarreferido e preponderantes

349

, complementando seguidamente

“(…) in light of the relevant case law which, for the application of the ne bis in idem

principle, retains as a relevant criterion the identity of the material facts (or facts which

are substantially the same), understood in the sense of the existence of a set of concrete

circumstances which are inextricably linked together in time and space”

350

.

Ora, em 28 de julho de 2017, foi então publicada a Diretiva 2017/1371 do

Parlamento Europeu e do Conselho relativa à luta contra a fraude lesiva dos interesses

348 Conjuntamente com a proposta previamente referida, foi apresentada uma avaliação do impacto sem

uma quantificação precisa, estimando-se, enquanto uma mera ponta de um iceberg, uma fraude que varia dos 500 milhões aos 3 biliões de euros por ano. No entanto, recordemos “one would be foolish if one demanded an exact sum for the level of fraud in the EU today: by definition fraudulent activities are meant to remain in the shadows” (XANTHAKI, 2010, p. 133)

349 Cfr. art.º 13, do último esboço para Diretiva PIF. Este conceito leva a que se tenha de considerar as

legislações penais de cada Estado-Membro a fim de se apurar a relevância do tipo penal em questão.

350 Veja-se que a penúltima versão (Proposta de Regulamento para o estabelecimento da PE — Council

Doc. 15200/16, de 2 de dezembro 2016) (CONSELHO, 2016) apresentava um conceito mais claro no seu preâmbulo: “the notion of inextricably linked offences should be considered in light of the jurisprudence of the Court of Justice of the European Union. Such may be the case, for exemple, for offences which have been committed for the main puropose of creating the conditions to commit the offences affecting the financial interests of the Union, such as offences strictly aimed at ensuring the material or legal means to commot the offence affecting the financial interests of the Union, or ensure the profit or product thereof”.

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financeiros da União através do Direito Penal

351

(CONSELHO e PARLAMENTO

EUROPEU, 2017). Esta destina-se, de acordo com o parágrafo 4, do seu preâmbulo, à

“(…) definição comum de fraude (…) que deverá abranger os comportamentos

fraudulentos que afetam as receitas, as despesas e os ativos do orçamento geral da União

Europeia (…) incluindo operações financeiras como as atividades de contratação

352

e

concessão de empréstimos (…) o conceito de infrações graves ao sistema comum do IVA

(…)”.

O interesse financeiro da União, de acordo com o seu art.º 2, n.º 1, alínea a),

subalíneas i) e ii), define-se como “(…) todas as receitas, despesas e ativos cobertos por,

adquiridos através de ou devidos ao orçamento da União e os orçamentos das instituições,

dos órgãos e dos organismos da União criados nos termos dos Tratados, ou os orçamentos

por eles geridos e controlados direta ou indiretamente”, vinculando todos os Estados-

Membros a que a sua lesão, ou a cumplicidade, instigação e tentativa

353

constituem

infrações penais, se cometida intencionalmente, seja a responsabilidade adstrita a pessoas

singulares ou coletivas, nos termos do art.º 3, n.º 1, art.º 4, n.

os

1, 2 e 3, art.º 5, n.

os

1 e 2,

e art.º 6, n.

os

1 a 3, da Diretiva 2017/1371

354

.

Assim, esta lesão desmaterializa-se em vários tipos de fraudes, as quais surgem

tipificadas pela enumeração de condutas constitutivas de diversos tipos de crime.

Vejamos, nas fraudes, por atos ou omissões associadas a despesas não relacionadas com

contratação pública, nos termos do art.º 3, n.º 2, alínea a), da diretiva, são dotadas de

caráter penal as seguintes condutas:

i) à utilização ou à apresentação de declarações ou de documentos falsos, inexatos ou incompletos, que tenha por efeito a apropriação ou a retenção ilegítimas de fundos ou de ativos provenientes do orçamento da União ou dos orçamentos geridos pela União ou por sua conta,

ii) à não comunicação de uma informação, em violação de uma obrigação específica, que produza o mesmo efeito, ou;

iii) à aplicação ilegítima de tais fundos ou ativos para fins diferentes daqueles para os quais foram inicialmente concedidos.

351 Esta que substitui a já mencionada e analisada Convenção PIF estabelecida com base no artigo K.3, do

TUE, de 26 de julho de 1995, bem como os ses Protocolosseus protocolos de 27 de setembro de 1996, 29 de novembro de 1996 e 19 de junho de 1997.

352 Estes encontram-se definidos e regulamentados por via do art.º 101, n.º 1, do Regulamento n.º 966/2012,

do Parlamento Europeu e do Conselho (CONSELHO e PARLAMENTO EUROPEU, 2012).

353 Apenas no caso das infrações previstas no art.º 3, e no art.º 4, n.º 3, da Diretiva 2017/1371, nos termos

do art.º 5, n.º 2, do mesmo diploma.

354 As sanções aplicáveis a pessoas singulares ou coletivas, a circunstância agravante, o congelamento e

perda, a competência jurisdicional, os prazos de prescrição das infrações penais lesivas dos interesses financeiros da União e a cooperação entre os Estados-Membros e a Comissão (OLAF) e outras instituições, órgãos ou organismos da União foram alvo de uma análise prévia neste capítulo.

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No quadro das despesas relacionadas com a contratação pública, são incluídas as

fraudes cometidas com a intenção de obter um proveito ilícito em benefício do autor da

infração ou de terceiras, causando prejuízo aos interesses financeiros da UE, por ação ou

omissão, e as fraudes associadas a receitas distintas das provenientes dos recursos

próprios do IVA, em ambos os casos, através das condutas específicas atrás elencadas

355

.

Passemos à inclusão das fraudes associadas ao IVA. O conceito de fraude grave ao

IVA encontra-se estipulado na Diretiva 2006/112/CE do Conselho (CONSELHO, 2006),

e reproduzido parcialmente nos termos do art.º 2, n.º 2, da Diretiva 2017/1371, e inclui o

seu cometimento por via da fraude carrossel, de operadores fictícios ou por organizações

criminosas, que afetem decisivamente o orçamento da UE, ou seja, relacionadas com o

território de dois ou mais Estados-Membros, através de um esquema estruturado com o

objetivo de obter vantagens indevidas do sistema comum do IVA, e se os prejuízos totais

forem, pelo menos, de 10.000.000,00 Euros

356

.

Não obstante estas considerações e atendendo ao disposto no art.º 3, n.º 2, alínea d),

da Diretiva 2017/1371, a fraude lesiva dos interesses financeiros da União reporta-se às

receitas provenientes dos recursos próprios do IVA, que envolvam as seguintes condutas,

por ação ou omissão, inseridas em esquemas fraudulentos transfronteiriços:

i) à utilização ou à apresentação de declarações ou de documentos relativos ao IVA falsos, inexatos ou incompletos, que tenha por efeito a diminuição dos recursos dos recursos do orçamento da União; ii) à não comunicação de uma informação relativa ao IVA, em violação de uma obrigação específica, que produza o mesmo efeito, ou;

iii) à apresentação de declarações relativas ao IVA corretas para fins de dissimulação fraudulenta do não pagamento ou da criação ilícita de direitos a reembolso do IVA.

A inclusão da fraude ao IVA no conceito de interesses financeiros da União já fora

defendida pelo TJUE por via dos acórdãos de 15 de novembro de 2011 (Comission Vs.

Germany), de 7 de maio de 2013 (Akerberg Fransson), e de 8 de setembro de 2015

(Taricco). O último dos quais, no seu parágrafo 43, especificou que, para a prevenção e

combate à fraude ao IVA, “(…) the measures adopted in that respect must be the same as

those which the Member States adopt in order to combat equally serious cases of fraud

affecting their own financial interests”.

355 Cfr. art.º 3, n.º 2, alíneas b) e c), subalíneas i) a iii), da Diretiva 2017/1371.

356 Este conceito de prejuízo total refere-se aos prejuízos estimados resultantes de todo o esquema

fraudulento, tanto para os interesses financeiros dos Estados-Membros em causa como para a União, com exclusão de juros e sanções.

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Este conceito penal europeu estende-se ainda, com a menção outras infrações

penais lesivas dos interesses financeiros da União, classificadas como satélites por

MARLETTA (2017, p. 87), ao branqueamento de capitais, assim definido no art.º 1, n.º

3, da Diretiva n.º 2015/849 do Conselho, “(…) quando envolva bens que sejam produtos

das infrações penais abrangidas pela presente diretiva”

357

, nos termos do art.º 4, n.º 1, da

Diretiva 2017/1371, bem como ao crime de corrupção

358

passiva e ativa, cometido

intencionalmente, definindo-as respetivamente no art.º 4, n.º 2, alíneas a) e b), da Diretiva

2017/1371, e de apropriação ilegítima como o “(…) facto de um funcionário público,

direta ou indiretamente encarregado da gestão de fundos ou de ativos, afetar ou

desembolsar fundos, ou se apropriar de ativos para fins contrários ao objetivo para o qual

estavam previstos de modo que lese os interesses financeiros da União”

359

.

Ora, para a aplicação dos crimes de corrupção e apropriação ilegítima, surgiu a

necessidade de comunitarizar o conceito de funcionário da União, o qual surge

operacionalizado no art.º 4, n.º 4, alínea a), subalínea i), bem como o conceito de

funcionário nacional como “(…) qualquer pessoa titular de um cargo executivo,

administrativo ou judicial a nível nacional, regional ou local. Qualquer pessoa que exerça

um cargo legislativo a nível nacional, regional ou local é equiparado a um funcionário

nacional”, definição prevista no art.º 4, n.º 4, alínea a), subalínea ii), comungando, em

ambos os casos, na definição do art.º 4, alínea b), todos da Diretiva 2017/1371, que se

estatuí como o exercício de funções de serviço público que impliquem a gestão de

interesses financeiros da União ou a tomada de decisões sobre os interesses financeiros

da União nos Estados-Membros ou em países terceiros.

Este catálogo não se encerra com os mencionados crimes, estendendo-se a outros

que, na investigação concreta, estejam indissociavelmente ligados, com base no critério

da identidade dos factos materiais entendidos no sentido da existência de uma série de

circunstâncias concretas indissociáveis ligadas no tempo e no espaço, e sejam

preponderantes em termos de gravidade da infração em causa

360

, como no caso concreto

da participação numa organização criminosa

361

.

357 Para esse efeito, é assegurado que o regime de sanções estabelecido pela Diretiva 2017/1371 se aplique

a todas as infrações penais graves lesivas dos interesses financeiros da União.

358 Nos termos do parágrafo 8, do preâmbulo da diretiva em análise, “a corrupção (…) constitui uma ameaça

particularmente grave para os interesses financeiros da União”.

359 Cfr. art.º 4, n.º 3, da Diretiva 2017/1371.

360 Cfr. parágrafos 54 e 55, do preâmbulo, e art.º 22, n.º 3, do Regulamento 2017/1939.

361 Nos termos do art.º 22, n.º 2, do Regulamento n.º 2017/1939, com base no preceituado no art.º 2, n.º 1,

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Territorialmente, BRIÈRE (2017, p. 101) considera que os crimes mencionados

devem ser considerados quando cometidos no território e por nacionais ou residentes dos

Estados-Membros da União enquanto a single legal area, não obstante os instrumentos

jurídicos europeus serem omissos nesta questão.

Explicado o seu âmbito material e territorial de competência

362

, sujeito a critério de

valor adicional

363

, é momento de analisar o Regulamento (UE) 2017/1939 do Conselho,

de 12 de outubro de 2017 (CONSELHO, 2017) que dá execução a uma cooperação

reforçada

364

para a instituição da PE, com base no art.º 86, TFUE, independente

365

responsável perante as instituições da UE

366

e descentralizada

367

, com a missão de “(…)

investigar, instaurar a ação penal e deduzir acusação e sustentá-la na instrução e no

julgamento contra os autores e seus cúmplices nas infrações penais lesivadas dos

interesses financeiros da União”, nos termos do art.º 4, do mencionado regulamento, no

âmbito da sua competência territorial e pessoal

368

.

Ancorados no princípio da subsidiariedade e da proporcionalidade, ambos previstos

no art.º 5, TUE, reconheceu-se que a exclusividade de combate atribuída aos Estados-

362 Nos termos do art.º 22, do Regulamento n.º 2017/1939.

363 Para ser considerada a competência da PE, o catálogo penal referido deve ter lesado ou ser suscetível de

lesar os interesses financeiros da União em mais de 10.000,00 Euros, ou, alternativamente, o processo assumir repercussões a nível da União ou os os funcionários ou outros agentes da UE, ou membros das instituições da União, puderem ser suspeitos de ter cometido a infração, nos termos do art.º 25, n.º 2, alíneas a) e b), do mencionado regulamento. Ainda subjazem critérios alternativos previstos no art.º 25, n.º 3, alíneas a) e b), do mesmo regulamento.

364 Em 3 de abril de 2017, a Bélgica, a Bulgária, a Croácia, Chipre, a República Checa, a Finlândia, a França,

a Alemanha, a Grécia, a Lituânia, o Luxemburgo, Portugal, a Roménia, a Eslováquia, a Eslovénia e a Espanha notificaram o Parlamento Europeu, o Conselho e a Comissão sobre a sua intenção de instituir esta cooperação reforçado no intuito de formar a PE, nos termos do art.º 86, n.º 1, terceiro parágrafo, TFUE, art.º 20, n.º 2, TUE, e art.º 329, n.º 1, TFUE. Em 19 de abril de 2017, 1 de junho de 2017, 9 de junho de 2017 e 22 de junho de 2017, a Letónia, a Estónia, a Áustria e a Itália, respetivamente, procederam à mesma notificação para participarem nessa inciativa. Todos os restantes Estados-Membros podem incidir sobre o intercâmbio de informações estratégicas e o destacamento de agentes de ligação para a PE, nos termos do art.º 105, do Regulamento 2017/1939.

365 Veja-se que a Eurojust deverá se constituir como uma parceira da PE e cooperar com esta em questões

operacionais. Com a OLAF, deve ser estabelecida uma cooperação estreita com o objetivo de assegurar a complementaridade dos respetivos mandados e evitar a sobreposição de esforços (parágrafos 102 e 103, do preâmbulo, art.º 3, n.º 3, e art.º 100, do Regulamento 2017/1939). Esta independência é garantida com um orçamento próprio, financiado essencialmente por uma contribuição do orçamento da União e minuciosamente definida, a par da sua responsabilidade, no âmbito do art.º 6, do Regulamento n.º 2017/1939.

366 Cfr. parágrafo 18, do Regulamento n.º 2017/1939.

367 Cfr. art.º 8, n.º 1, do Regulamento n.º 2017/1939.

368 Esta fixa-se nas infrações cometidas, no todo ou em parte, no território de um ou vários Estados-

Membros, por um nacional de um Estado-Membro, desde que um Estado-Membro tenha competência em relação a essas infrações, quando cometidas fora do seu território, ou cometidas fora dos territórios referidos por uma pessoa sujeita ao Estatuto dos Funcionários ou ao Regime aplicável aos Outros Agentes, na altura da infração, desde que um Estado-Membro tenha competência em relação a essas infrações, atendendo ao disposto no art.º 23, alíneas a) a c), do Regulamento n.º 2017/1939.

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Membros não é suficiente, em virtude da fragmentação dos procedimentos penais

nacionais no domínio das mencionadas infrações penais. Deste modo, almeja-se a partilha

de competências, assente no princípio da cooperação leal, entre a PE e as autoridades

nacionais na luta contra as infrações lesivas dos interesses financeiros da União,

encontrando-se a primeira munida do direito de avocação

369

. Esta partilha assenta na

comunicação permanente e sem demora, por via de um sistema de informação próprio,

de qualquer conduta integrante da PE ou vice-versa, entrando também neste canal todas

as instituições, órgãos e organismos da UE

370

.

Por outras palavras, este grupo de Estados-Membros optou por transferir para uma

PE independente, mas indivisível da UE, poderes de investigação e ação penal, em troca

da sua responsabilização

371

perante o Parlamento Europeu, o Conselho e a Comissão. Esta

ação pública cedida aplica-se até ao termo do processo, ou seja, até ser proferida uma

decisão definitiva sobre a questão de saber se o suspeito ou o arguido cometeu a infração,

incluindo, se for caso disso, a condenação ou decisão sobre uma eventual ação judicial

ou via de recurso disponível até que a referida decisão se torne definitiva. Além destas,

são ainda atribuídas à PE as competências de supervisão geral, acompanhamento e

orientação e supervisão

372

. Os Estados-Membros abstêm-se assim de reinvindicar

competências, exceto em caso de necessidade de medidas urgentes

373

, possíveis até a PE

decidir investigar

374

.

369 Este encontra-se consagrado no art.º 27, n.º 1, do Regulamento 2017/1939, após obtenção de toda a

informação pertinente e na maior brevidade possível, o mais tardar cinco dias após o recebimento da mencionada informação. Em caso de abstenção do seu exercício, a PE informa as autoridades nacionais de imediato, sendo que estas últimas também devem reencaminhar quaisquer novos dados que a possam levar a reconsiderar. No caso específico de uma lesão inferior a 100.000 Euros dos interesses financeiros da UE, tendo em conta o grau de gravidade ou a complexidade, o Colégio pode deliberar no sentido da sua não avocação — art.º 27, n.º 8, do Regulamento 2017/1939.

370 Nos termos das regras específicas previstas no art.º 24, do Regulamento n.º 2017/1939.

371 Aplicando-se mutatis mutandis o regime de demissão dos Procuradores Europeus junto da Eurojust, o

qual envolve o requerimento fundamentado ao TJUE.

372 Nos termos do parágrafo 23, do regulamento em análise, a supervisão geral envolve a administração

geral das atividades PE, em que apenas são dadas instruções sobre questões que têm para esta uma importância horizontal, o acompanhamento e orientação são entendidas como as competências para acompanhar e orientar as investigações e ações penais individuais, e a supervisão enquanto a fiscalização mais estreita e contínua das investigações e ações penais, que inclui, sempre que necessário, a intervenção e a formulação de instruções sobre questões relativas às investigações e ações penais.

373 Cfr. art.º 28, n.º 2, pelo Regulamento n.º 2017/1939.

374 Em caso de desacordo sobre o exercício de competências, as autoridades nacionais competentes

(quaisquer autoridades judiciais com competência para decidir da atribuição de competências em conformidade com o Direito nacional) têm a competência de decidir sobre a atribuição de competências, nos termos do art.º 25, n.º 6, do regulamento em análise.

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Em toda a investigação e ação penal é garantido o pleno respeito pelos direitos dos

suspeitos e dos arguidos consagrados na CDFUE, incluindo o direito a um tribunal

imparcial, os direitos de defesa, e restantes previstos no Direito da União

375

.

Toda a investigação e ação penal levadas a cabo pela PE devem conformar-se com

o sistema de princípios e normas que preenchem o DPE, sendo aplicáveis as regras penais

e processuais penais em vigor nesste Estado-Membro, sempre que omissas neste mesmo

regulamento

376

, sujeitando-se ainda à fiscalização pelos órgãos jurisdicionais nacionais

competentes à luz desse mesmo Direito e às decisões do TJUE

377

. A PE, nessas ações

concretas, é apoiada por todas as autoridades nacionais de cada Estado-Membro (polícias,

serviços de investigação ou informação, autoridades fiscais e aduaneiras), bem como por

todos os organismos competentes da UE

378

.

A PE encontra-se assim constituída numa estrutura dupla: central e descentralizada.

A primeira constitui-se pela Procuradoria Central, na sede da PE, a qual, por sua

vez, integra o Colégio, as Câmaras Permanentes, o Procurador-Geral Europeu, os

Procuradores-Gerais Europeus Adjuntos, os Procuradores Europeus e o Diretor

Administrativo. Na sua dimensão descentralizada, esta é composta pelos Procuradores

Europeus Delegados sediados nos Estados-Membros

379

.

O Colégio, composto pelo Procurador-Geral Europeu e por um Procurador Europeu

por cada Estado-Membros

380

, é responsável pela supervisão geral de todas as atividades