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7.3. FATORES PROGNÓSTICOS NA SOBREVIDA DOS PACIENTES COM LINFOMA NÃO-HODGKIN

7.3.2. Dosagem sérica de ácido úrico e de ureia

Os LNH se originam dos tecidos linfóides, mas o envolvimento extranodal de outros órgãos como os rins, é bem conhecido (BUYUKPAMUKÇU et al., 2005). Entretanto, o acometimento renal como única manifestação dos LNH, ou seja, linfoma renal primário é muito raro (BERTONCELLI et al., 1993). Em geral, o acometimento renal ocorre como consequência de doença avançada, com frequência que varia de 0,8 a 49%. Todavia, a maioria dos trabalhos relatados é em pacientes adultos com LNH (DA’AS et al., 2001). Para pacientes pediátricos poucos estudos sobre incidência de acometimento renal são descritos (PATEL et al., 1990).

Os rins podem ser comprometidos em pacientes com LNH de várias maneiras: efeito de massa pelo aumento dos linfonodos retroperitoneais, uropatia obstrutiva secundária a um tumor intrabdominal, ou pelos efeitos metabólicos da síndrome de lise tumoral (SLT). O acometimento renal pelo LNH em geral não é diagnosticado pelo exame clínico; raramente massa tumoral é palpada na região dos flancos. Muitas vezes o comprometimento renal é diagnosticado por meio de exame de imagem utilizado no estadiamento inicial dos pacientes com LNH, ou por meio de exames laboratoriais que revelam a presença de disfunção renal (GLICKLICH et al., 1986).

Para avaliar a função renal dos pacientes no presente estudo foram solicitados ao diagnóstico: dosagens sérica de ureia, creatinina, potássio e ácido úrico. Os dados referentes a ureia, creatinina, potássio, e ácido úrico foram obtidos de 95, 96, 71, e 89 pacientes, respectivamente. Nos demais pacientes não foi encontrado o registro desses exames laboratoriais em seus prontuários médicos. A avaliação dos demais eletrólitos como fósforo e cálcio solicitados de rotina para pacientes com LNH ao diagnóstico, foi obtida em um número muito reduzido de pacientes, assim eles foram omitidos da análise.

A dosagem sérica de ureia, no ponto de corte de 30 mg/dL, que se refere ao percentil 75% na presente casuística, demonstrou estar significativamente associada ao óbito para 76 pacientes analisados. A probabilidade estimada de sobrevida global para as crianças com dosagem de ureia ao diagnóstico < de 30 mg/dl foi de 81,5% ± 5,3%. Para as crianças com dosagens de ureia ≥ a 30 mg/dl a pSG foi de 55,2% ± 11,2% (p = 0,03 – Figura 48). A dosagem sérica de ureia ao diagnóstico de acordo com a data do diagnóstico também foi avaliada. A pSG para os pacientes admitidos no primeiro período foi de 81,3% ± 7,5% para os pacientes com dosagem inicial de ureia < que 30 mg/dl e 67,3% ± 13,6% para aqueles com dosagens ≥ a esse valor de corte (p = 0,36; figura 40). Em relação aos pacientes admitidos no segundo período, a pSG foi de 81,8% ± 7,4% e

de 37,5% ± 17,1%, para os pacientes com dosagem inicial de ureia < que 30 mg/dL e para aqueles com dosagens ≥ a 30 mg/dl (p = 0,011; figura 48), respectivamente. Para os pacientes que faleceram, em 19 foi resgatada a dosagem sérica de uréia e em 9 pacientes era > 30 mg/dL.

A dosagem sérica de creatinina, adotando o ponto de corte de 0,8 mg/dL, que corresponde à mediana da creatinina dos pacientes desta casuística, não se constituiu em uma variável significativa de predizer o óbito. As pSG para os pacientes com creatinina < 0,8 e para aquelas com valores ≥ 0,8 mg/dl, foram de 76,1% ± 6% e 71, 8% ± 9,2%, respectivamente (p=0,66 - figura 51).

Em relação à dosagem sérica do potássio também não foi observada associação significativa com o evento adverso estudado, quando utilizado o ponto de corte na mediana 4,2 mmol/l ou de 5,5 mmol/l, limite superior da normalidade para 54 pacientes. A pSG foi de 82,5 ± 7,1% para o grupo com potássio ≤ 4,2 mmol/l e de 71,2 ± 9,2% para pacientes com dosagens > 4,2 mmol/l (p= 0,39), conforme ilustrado na figura 44. Para o ponto de corte de corte de 5,5 mmol/l, a pSG foi de 80% ± 5,7%, e de 37,5% ± 28,6%, para os pacientes com potássio < 5,5 mmol/l e ≥ 5,5 mmol/l, respectivamente (p=0,10- figura 53). Entre os pacientes que faleceram, 7 tinham potássio > 4,2 mmol/l e 2 pacientes com K ≥ 5,5 mmol/l.

A dosagem de ácido úrico variou de 0,8 a 41 mg/dl, sendo a mediana de 4,9 mg/dl. Essa variável se constituiu em um expressivo fator para predizer o óbito. Adotando o ponto de corte de 7 mg/dl, a pSG foi avaliada em 74 pacientes e foi de 87%± 4,6% e 33,3%±11,1% para os pacientes com ácido úrico <7 mg/dl e ≥ 7mg/dl, respectivamente, sendo altamente significativo (p < 0,0001).

A síndrome de lise tumoral (SLT), quadro de alteração metabólica grave, caracterizada por hiperpotassemia, hiperfosfatemia, hipocalcemia e hiperuricemia, por lise de células tumorais espontânea ou secundária a quimioterapia, apresenta alta prevalência nos pacientes com LNH podendo levar o paciente ao óbito, mesmo naqueles com função renal preservada (SHAD et al., 1997; PATTE et al., 2001).

Em estudo desenvolvido no período compreendido entre 1997-2003 na Turquia, foram avaliados retrospectivamente 104 pacientes com LNH com mediana de idade de seis anos (0,9 -16 anos) e com uma mediana de seguimento de 64 meses. Foram avaliados a dosagem sérica de uréia, creatinina, ácido úrico, eletrólitos e desidrogenase lática, além de exame de urina rotina. Neste estudo a infiltração renal foi também avaliada através de um ou mais métodos de imagem como ultrassonografia de vias urinárias, urografia excretora, tomografia computadorizada e ressonância magnética. Os fatores que apresentaram impacto significativo na sobrevida dos pacientes foram os altos níveis de creatinina (p = 0,00001) e de uréia (p = 0,0001). O início da SLT, diagnosticada por níveis elevados de ácido úrico e fósforo, e a necessidade de diálise foram também relacionados com um pior prognóstico (p = 0,01, p = 0,009, respectivamente). Os autores concluíram que a disfunção renal é fator de mau prognóstico para pacientes com LNH. A presença de altos níveis de ácido

úrico, hiperfosfatemia, e infiltração renal pelo linfoma ao diagnóstico são fatores de prognóstico desfavorável. Existe uma forte correlação negativa entre o grau de insuficiência renal e a sobrevida desses pacientes (BUYUKPAMUKÇU et al., 2005).

Outro estudo encontrado relaciona o ácido úrico como fator de mau prognóstico no LNH. Entretanto, somente os pacientes com LB foram avaliados. Trata-se de estudo retrospectivo com 42 pacientes africanos de Uganda avaliados entre 1967 e 1973 com idade de até 28 anos, com o objetivo de avaliar se alterações bioquímicas refletiam a carga tumoral e se elas poderiam correlacionar-se com o estadio e o prognóstico. Houve uma correlação entre o nível de ácido úrico e LDH com o estadio, sendo observado níveis mais elevados em pacientes com doença mais avançada (p < 0,01, e p < 0,005, respectivamente). Os autores também observaram correlação significativa entre as variáveis LDH e ácido úrico (p = 0.012). Em relação à dosagem sérica de uréia, não houve relação significativa com o estadio da doença (p = 0,1). O estadiamento, as dosagens séricas de LDH e de ácido úrico apresentaram correlação com o prognóstico, e os autores concluíram que esses parâmetros poderiam ser utilizados como indicadores de carga tumoral. Além disso, a correlação altamente significativa entre LDH e ácido úrico quando a influência do estadio é removida é consistente com a probabilidade de que ambos refletem carga tumoral total. Entretanto, nesse estudo, o mais importante fator prognóstico foi o estadiamento ao diagnóstico (MAGRATH et al., 1980).

Dessa maneira, o ácido úrico, produto final da degradação da purina, pode ser correlacionado com a carga tumoral. Além disso, a concentração real de ácido úrico é sem dúvida influenciada por diferenças na cinética da população de células tumorais, pelo estado de hidratação do paciente e pela excreção tubular renal. A avaliação da carga tumoral pode então ser provavelmente aferida não só pelo estadio clínico e pela dosagem sérica de LDH, mas também pela de ácido úrico.

Devido à probabilidade de comprometimento renal na admissão dos pacientes com LNH, seja primário ou secundário à generalização da doença, é importante o monitoramento da função renal ao diagnóstico e durante o tratamento. Os rins são a principal via excretora de substâncias metabólicas tumorais. Além disso, a presença de disfunção renal por acometimento tumoral direto ou quadro obstrutivo pode atrasar o início do tratamento ou favorecer complicações secundárias a ele. No presente estudo, dos exames utilizados para avaliar a função renal, o ácido úrico e a uréia foram associados, na análise univariada, a uma pior evolução dos pacientes. Para os pacientes com LNH e grande carga tumoral pode ocorrer lise celular espontânea que em geral determina anormalidades bioquímicas, das quais a hiperuricemia com seu potencial fator de agressão renal é o fator de risco mais importante (IVERSEN et al., 1974; MAGRATH, I et al., 1980). Deve ser também ressaltado que, tipicamente, os LNH apresentam alta taxa de crescimento e são mais

frequentemente associados a alterações bioquímicas como níveis elevados de ácido úrico ou LDH (HUDSON et al., 2007).