• Nenhum resultado encontrado

2. REVISÃO DE LITERATURA E FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.2 A regulamentação da profissão em Biblioteconomia

2.2.4 Educação continuada do bibliotecário

Em face da necessidade de oferecer ao bibliotecário uma educação continuada e da celeridade como o conhecimento é produzido e disseminado na sociedade, pode-se tentar explicar essa questão pela via da tendência de mudanças rápidas gerada pelos "tempos líquidos."21 Bauman (2015), que cunhou essa expressão, declara que, diante de um cenário

20 BAPTISTA, Sofia Galvão. Empresário da informação: uma carreira alternativa para o bibliotecário. Revista de Biblioteconomia de Brasília. Vol. 19, no.2, 127-299, 1995.

líquido, rápido e de mudanças imprevisíveis, a educação deve ser pensada durante a vida inteira. Logo, a educação continuada, ou permanente, também destacada por Chaui (2003), torna-se vital em decorrência da globalização e do consequente processo de transformação contínuo. Este tipo de educação converte-se em uma estratégia pedagógica indispensável para a permanência do indivíduo no mercado de trabalho. A autora alerta para o fato de o capital confundir educação e reciclagem, exigida pelas condições do mercado de trabalho, com o processo de educação, que ocorre em cada indivíduo, como uma transformação interna, pois "a educação é inseparável da formação e é por isso que ela só pode ser permanente" (CHAUI, 2003, p. 11). Se reciclagem ou educação, o fato é que essa necessidade se tornou um importante artifício para suprir as lacunas deixadas pela formação no curso superior ou, mesmo, para continuar a manter a empregabilidade22 do profissional no

mercado de trabalho em um cenário mutável.

Sobre educação continuada, Souza (2007, p. 5) destaca:

A educação na perspectiva da formação continuada ajuda o profissional a recompor o equilíbrio entre os esquemas práticos predominantes e os esquemas teóricos que os sustentam, levando este profissional a romper com a dimensão da prática dissociada da dimensão teórico-crítica. Sob esse aspecto, pode-se dizer que a formação continuada confere acesso a novos conhecimentos, habilidades e atitudes profissionais sintonizadas com os novos paradigmas da sociedade contemporânea, provocando uma reflexão sobre os processos de trabalhos, que deve ser feita não de forma ingênua, mas com autocrítica.

Souza (2007) reafirma que as rápidas mudanças tecnológicas impactam os currículos acadêmicos, em que os novos conhecimentos, geralmente, não são assimilados concomitantemente com essas mudanças. Diante desse contexto, a autora reconhece que há muitas aprendizagens que são mais bem apreendidas em ambiente externo às instituições de

heterogeneização das identidades e o enfraquecimento das instituições representativas e das propostas utópicas no longo prazo. Nessa sociedade, o Estado deixa de interferir no âmbito social (desregulamentação) e a relação espaço-tempo é ressignificada por conta da velocidade da comunicação, do transporte e das relações sociais, surgindo, assim, um novo patamar de relações. O conjunto amplo dessas modificações gera grande sensação de incertezas, como em relação ao trabalho, principalmente pelo fato de não se ter certeza se o Estado conseguirá garantir a vida no amanhã.

22 “Nessa perspectiva, a empregabilidade se refere à condição de o profissional ser empregável, ou seja, ter competência e habilidades necessárias para atuar no mercado de trabalho mais livremente e de modo completo. Para que essa completude seja alcançada, tanto a educação formal quanto a aprendizagem adquirem importante papel no mercado de trabalho” (VALENTIM; ALMEIDA; SILVA, 2015, p. 9).

ensino, como as atividades de qualificação profissional. Contudo, ainda segundo Souza (2007, p. 6),

[...] o fato de serem realizadas fora das escolas (nas empresas, nos sindicatos, nas associações) não significa dissociação da relação dinâmica entre teoria e prática, mas pelo contrário: a proximidade imediata com as experiências do cotidiano acirra essa dinâmica. Portanto está implícito o princípio de que a ideia de “educação continuada” deve se dar na complementaridade entre os diversos universos educativos.

Essa questão da educação continuada toca em especial o fazer dos professores que, com o advento das NTIC e da Cibercultura23 −, proporcionada pelo desenvolvimento do

espaço virtual de computadores interligados, propiciando a interatividade com usuários que utilizam esse espaço para consultar, extrair e inserir dados e informações (LÉVY, 1999) −, são impelidos a assumir o desafio de se qualificarem continuamente, para se manterem atualizados em seus métodos de ensino e aprendizagem, sendo preparados para articular e conduzir as exigências dessa sociedade contemporânea (TRIVINHO, 2007).

Em se tratando do objeto de trabalho do bibliotecário, isto é, a informação, é incontestável que, em virtude dessa especificidade, sua prática profissional foi imensamente modificada ao longo das duas primeiras décadas deste século. Portanto, o surgimento das bases e dos bancos de dados virtuais, ainda que forçosamente, vem provocando nos bibliotecários a busca por uma atualização permanente; ou seja, uma formação continuada capaz de mantê-los sincronizados com as mudanças nos processos de tratamento e disseminação da informação (SOUZA, 2007).

A respeito dessa busca por educação continuada do bibliotecário, Souza (2007) adverte sobre a necessidade de ele procurar uma qualificação que ressaltasse também seu papel intelectual e crítico que, por muito tempo, foi focado no viés tecnicista. Para exemplificar isso, a autora relatou a experiência ocorrida entre 2004 e 2007, na Universidade Federal Fluminense (UFF), em que profissionais da área se organizaram em oficinas para tratar da reformulação da política de informação do Sistema de Bibliotecas e Arquivo da UFF. Durante os trabalhos, a equipe organizadora dos eventos observou que “a base teórica e técnica dos bibliotecários estava frágil, necessitando que o debate sobre a práxis biblioteconômica fosse retomado”. Observou-se, por exemplo, “o pouco domínio das ferramentas da área, em

23 “Configuração material e a atmosfera simbólica e imaginária internacionais da era pós-industrial avançada, correspondente à informatização e virtualização generalizada da vida social, seja no âmbito do trabalho, seja no do tempo livre” (TRIVINHO, 2007, p. 101).

especial do AACR2 (Código de Catalogação Anglo Americano), fazendo com que esse recurso fosse utilizado de forma acrítica, sem reflexão intelectual” (SOUZA, 2007, p. 3).

Torna-se um bibliotecário destacado aquele que saiba utilizar ferramentas mais elaboradas, do ponto de vista tecnológico, em um ambiente cada vez mais virtualizado. Por conseguinte, o conhecimento em conteúdos tecnológicos pode agregar valor ao profissional da área que consiga aliar os conhecimentos técnicos tradicionais da Biblioteconomia com as necessidades surgidas na contemporaneidade. Nesse cenário, a base tecnológica necessária ao profissional bibliotecário consiste

[...] na aquisição de habilidades que envolvam conhecimento de informática, de formação de redes, de estruturação de bases de dados, na familiarização com implementação de periódicos eletrônicos, bibliotecas virtuais, com os mecanismos de busca para recuperação de dados na Internet, e até mesmo adquirir habilidades de webmaster (auxiliando no desenvolvimento estético e de programação dos sistemas de automação em centros de informação) (ANDRADE; FONSECA, 2016, p. 137).

A temática “Educação continuada” para os profissionais contemporâneos, sejam bibliotecários ou não, é recorrente nas publicações da área. Inclusive, parece ser preocupação de entidades de classe, como o Conselho Federal e os Conselhos Regionais de Biblioteconomia (CFB/CRB). A edição 75 do Boletim da Biblioteconomia, publicação vinculada a esses órgãos, mostrou 11 casos de bibliotecários que não trabalhavam em seu lócus tradicional, isto é, em bibliotecas. A professora Valéria Valls (2019), autora do artigo, chama a atenção para o fato de que o mercado não tradicional demanda competências para além da formação básica em Biblioteconomia. Ressalta que nenhum curso de graduação no Brasil consegue contemplar todas essas competências requeridas pelo mercado, até mesmo pelo grande número de possibilidades existentes. A graduação, segundo Valls (2019), consegue suprir alguns conceitos básicos e mostrar algumas conexões. Logo, os cursos de bacharelado em Biblioteconomia são

[...] a base, a “estrutura da casa” e o profissional, ao longo da sua carreira, deve investir em aprimoramento profissional constante, buscando desde algo mais formal (como uma segunda graduação ou uma pós-graduação), ou capacitações específicas que aumentem a sua própria empregabilidade e inserção em novos campos (VALLS, 2019, online).

Outro ponto relevante que tangencia a questão da educação continuada do bibliotecário é o fato de ela contribuir para a melhora da imagem social desse profissional,

que se percebe pouco valorizado pela sociedade. Segundo Almeida e Baptista (2009, p. 11), parafraseando o que Walter (2008)24 verificou,

[...] os bibliotecários não se sentem valorizados pela sociedade. Partindo do princípio que quanto mais capacitado e proativo o profissional for, melhores serão seus serviços prestados à comunidade, o bibliotecário terá a chance de se promover perante o seu público nos ambientes em que há muita informação, avanços tecnológicos, inúmeros usuários com diferentes necessidades e um problema em comum: muita informação e necessidade de precisão na recuperação da informação.

A questão da divulgação à sociedade das competências e habilidades inerentes ao bibliotecário parte muito da vontade própria do profissional em se manter atualizado e atento às novas tendências, independentemente da formação que ele venha a receber no curso de graduação. Castro (200025, p. 9 apud ALMEIDA; BAPTISTA, 2009, p. 11) afirma que:

O profissional é responsável pela imagem que reflete para a sociedade e observando a relevância de mudar esta imagem e se tornar um Moderno Profissional da Informação é necessário que o bibliotecário busque “um intenso processo de educação continuada”.

Rubi, Euclides e Santos (2006) destacaram o marketing profissional e pessoal como uma ferramenta aliada do bibliotecário para o delineamento e divulgação do novo perfil de profissional que se afigurava no início dos anos 2000. Segundo as autoras, que se basearam na literatura,

[...] tão importante quanto à formação, são as ações que divulguem esse profissional para o mercado de trabalho. O marketing também pode ser um instrumento de valorização do profissional e da organização, mostrando com persistência e competência o diferencial de sua contribuição para a disseminação da informação na sociedade (RUBI; EUCLIDES; SANTOS, 2006, p. 87).

Assim como Valls (2019), Walter e Baptista (2008) também defendem que a mudança de paradigma decorrente dos avanços tecnológicos na contemporaneidade exige mais do que as competências básicas no tratamento e recuperação da informação, e por isso os cursos de mestrado e doutorado em Ciência da Informação do País ainda hoje atraem profissionais formados em outras áreas. Estes, ao completarem sua formação com esses cursos, estariam

24WALTER, Maria Tereza Teles. Bibliotecários no Brasil: representações da profissão. 2008. 345 f. Tese (Doutorado em Ciência da Informação) -Departamento de Ciência da Informação e Documentação, Universidade de Brasília, Brasília, 2008.

25 CASTRO, César Augusto. Profissional da informação: perfis e atitudes desejadas. Inf. & Soc.: Est., João Pessoa, v. 10, n. 1, 2000.

aptos para competir com os bibliotecários em se tratando da atuação em sistemas de informação. Daí, segundo as autoras, a necessidade premente de assegurar aos profissionais bibliotecários a continuidade de seus estudos no percurso da educação formal, o que, provavelmente lhes proporcionaria melhores condições para atuar no mercado da informação.

É consenso entre os autores que os futuros profissionais da informação devem se conscientizar, desde o início da graduação, de que é preciso continuar a estudar, aprender a aprender, para “buscar novos meios de melhoria contínua para os serviços prestados, independente de qual seja o ambiente de trabalho” (VALENTIM; ALMEIDA; SILVA, 2015, p. 9).

2.2.5 Visibilidade das práticas profissionais dos bibliotecários com o advento da