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Parte I O ensino superior como política pública e o desenvolvimento socioeconómico

6. O ensino superior como expressão do capital humano e o desenvolvimento socioeconómico

6.1. A educação como direito fundamental

O artigo 26º da Declaração Universal dos Direitos do Homem refere:

Toda a pessoa tem direito à educação. A educação deve ser gratuita, pelo menos a correspondente ao ensino elementar fundamental . . . A educação deve visar à plena expansão da personalidade humana e o reforço dos direitos do homem e das liberdades fundamentais e deve favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e todos os grupos raciais e religiosos, bem como o desenvolvimento das atividades das Nações Unidas para a manutenção da paz.

Portanto, não sendo fim em si, a educação visa a construção de saberes e conhecimentos úteis ao crescimento e ao desenvolvimento do indivíduo, sujeito primordial do processo de desenvolvimento das sociedades. Vista de forma global, a educação e a formação são um meio de as sociedades responderem, a cada momento, aos desafios do desenvolvimento, passando necessariamente pelo fortalecimento permanente da sua força de trabalho.

Reconhecida como um dos direitos fundamentais da pessoa humana, a educação é um tema recorrente nas leis fundamentais das nações democráticas, bem como em documentos supranacionais, das Nações Unidas particularmente, não só na sua componente do desenvolvimento da personalidade, mas ainda nas que se relacionam com a formação do capital humano e com o trabalho. Sem a educação não há desenvolvimento sustentável das pessoas e das respetivas sociedades, sendo clara a sua importância como fator de formação e consolidação do capital humano e de luta contra a pobreza e subdesenvolvimento.

Quando analisamos a educação como fator de crescimento económico e do desenvolvimento, uma questão ressalta à nossa vista e vem expressa na Lei Fundamental de São Tomé e Príncipe (Lei nº1/2003) e na Declaração Universal dos Direitos do Homem

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(Assembleia Geral das Nações Unidas, Resolução 217ª -III, 1948) que é a necessidade de sua universalização32, isto é, proporcionar a todos os cidadãos a igualdade de oportunidade de acesso, combatendo assim as diferenças sociais e culturais, as assimetrias regionais e locais, entre outras diferenças. Por outras palavras, a educação de todos os cidadãos, sem quaisquer tipos de diferenças, sejam elas de origem social, cultural, económica, de sexo, de raça ou de outras.

Enfatizando a importância da educação básica, Cardim (2005, pp.55-56) diz que “A questão da escolaridade básica . . . é determinante para o desenvolvimento de um país”, pois “. . . o nível cultural básico de uma população determina o grau de organização das iniciativas económicas com origem “na base”. Acrescenta que “. . . a escassez cultural da generalidade da população condiciona o crescimento de pequenas iniciativas . . .”, o que parece ser o caso de São Tomé e Príncipe, pois não sendo um problema a escolarização geral das crianças, coloca- se sim a questão da qualidade da oferta educativa, que em boa verdade pode acabar por ser negativo pela escassez cultural de uma parte da sua população.

A respeito da escola, Costa (1997, pp. 92-93) refere:

Em primeiro lugar, visando a escola a formação para a cidadania e o apetrechamento para o seu exercício, ela persegue objetivos universais e nacionais tendencialmente niveladores . . . Assim, em segundo lugar, o próprio acesso à cultura padrão, e a sua igualdade de oportunidades, obrigam ao reconhecimento e conhecimento das diferenças culturais na escola de massas.

A Constituição da República Democrática de São Tomé e Príncipe (Lei nº1/2003) não é omissa nesta matéria, sublinhando, no seu artigo 55º, ponto 1, que “A educação, como direito reconhecido a todos os cidadãos, visa a formação integral do homem e a sua participação ativa na comunidade”. Esta ideia vem também expressa na Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei nº 2/2003). Na mesma linha de pensamento, lemos na Declaração Universal dos Direitos Humanos (Nações Unidas, Resolução 217ª, Dezembro de 1948, p. 5),artigo 26º, que “Toda a

32 Em boa verdade, conclui-se que a ênfase na universalização, ou seja, em todos os cidadãos tem

importância funcional, pois a educação deve ser vista, tanto como meio de superação das diferenças culturais e sociais e das assimetrias, instrumento de preparação dos cidadãos para os desafios do crescimento económico e do desenvolvimento. A educação deve ter uma função inclusiva, visando o envolvimento de todo o capital humano no processo de construção ou de consolidação das sociedades.

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pessoa tem direito à educação . . .” e que “A educação deve visar à plena expansão da personalidade humana e ao reforço dos direitos do homem e das liberdades fundamentais . . .”.

Hoje em dia parece ser cada vez mais notável o agravamento das desigualdades económicas e sociais no mundo e em São Tomé e Príncipe, em particular. Como sublinham (Delors e Eufrásio, 2014, p. 5) “Não se trata, apenas, das disparidades . . . entre países ou regiões do mundo, mas sim de fraturas profundas entre grupos sociais, tanto no interior dos países desenvolvidos como no dos países em desenvolvimento”. É assim que se compreende o papel social da educação como fator de inclusão e de coesão entre todos os indivíduos, pois de outra forma ela pode conduzir à marginalização, à exclusão social. Referem ainda estes autores (2014, p. 4):

Em todo o mundo, a educação, sob as suas diversas formas, tem por missão criar, entre as pessoas, vínculos sociais que tenham a sua origem em referências comuns. Os meios utilizados abrangem as culturas e as circunstâncias mais diversas; em todos os casos, a educação tem como objetivo essencial o desenvolvimento do ser humano na sua dimensão social. Define-se como veículo de culturas e valores, como construção de um espaço de socialização, e como caminho de preparação de um projeto comum.

Assumindo que as sociedades humanas foram sempre marcadas por conflitos que têm posto em causa a sua coesão social, provocando o agravamento das desigualdades e, portanto, a pobreza e a exclusão social, Delors e Eufrásio (2004, p. 6) referem que “A educação pode ser um fator de coesão, se procurar ter em conta a diversidade dos indivíduos e dos grupos humanos, evitando tornar-se um fator de exclusão social”.

É neste sentido que se deve compreender que a provisão de uma educação de base gratuita e universal seja o ponto de partida para o combate à exclusão. Todos os cidadãos devem ter acesso à educação de base, como condição para continuar a crescer socialmente, integrados numa sociedade onde possam ser verdadeiramente úteis a si próprios e, simultaneamente, à sua sociedade. Por isso, os sistemas educativos não devem produzir a exclusão social, pelo contrário, a inclusão, ou seja, a participação ativa de todos os cidadãos.

Segundo Bruner (1998, p. 27) partindo do pressuposto de que “A educação deve servir de meio para preparar cidadãos equilibrados para a democracia”, ela tem a ver com os processos de ensino e aprendizagem de saberes, conhecimentos, práticas e atitudes, construídos em diferentes espaços educativos, destacando-se a escola com os seus programas, seus métodos

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específicos, seus curricula, organização pedagógica, capital humano e outras ferramentas de produção de conhecimentos. É essencialmente na escola onde se desenvolvem as bases sobre as quais os cidadãos constroem o seu futuro e o futuro das suas sociedades.

A educação tem, por isso, um sentido funcional, por satisfazer determinadas necessidades dos seres humanos, preparando-os para a vida, para os desafios pessoais e comunitários. No mundo globalizado em que vivemos é fundamental o papel da educação, integral e inclusiva, pelo seu contributo na formação e capitalização da mão-de-obra, visando o desenvolvimento.

Contudo, reconhecendo esse importante papel da escola, ela só é útil se a educação e o ensino nela processados tiverem um significado prático para o desenvolvimento de todos aqueles que dela beneficiam e, concomitantemente, da sociedade, pelo que ela deve fundamentar-se em bons princípios e práticas.

Nesta perspetiva, Tolentino (2007, p. 108) referindo à educação moderna diz que:

[…] Só o sistema educativo moderno, simultaneamente produto e condição da afirmação e da sobrevivência do Estado-Nação, pode fornecer o nível de instrução e de competência técnica exigido a quem queira ter acesso ao emprego e ao gozo da cidadania plena numa sociedade baseada numa tecnologia poderosa, uma expectativa de crescimento prolongado e comunicação padronizada.

Esta visão não deixa de ser particularmente importante, pois se é relevante o sentido funcional da educação, não deixa de ser marcante que ela esteja estruturada para responder, na prática, pela sua qualidade e utilidade, aos anseios dos cidadãos e sua inserção no mercado de trabalho, no lazer, em suma, na melhoria da qualidade de vida. A educação deve contribuir para que o cidadão adquira competências que lhe permitam uma efetiva inserção no mercado de trabalho, isto é, a capacidade para lidar com as novas formas de operacionalização dos conhecimentos e competências adquiridas ao longo da vida escolar, bem como de inovação permanente de conhecimentos, práticas e atitudes face ao trabalho, à produção e à produtividade.

Em suma, a educação tem como propósito conferir ao indivíduo o conjunto de ferramentas (conhecimentos, habilidades, atitudes e práticas) tão essenciais para que o mesmo possa responder positivamente aos desafios do desenvolvimento integral da sua personalidade e aos desafios da sociedade onde se encontra inserido.

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Nesta perspetiva, o ensino superior, em particular, assume um papel mais preponderante no desenvolvimento de competências técnicas, científicas e na construção de conhecimentos, saberes, atitudes e práticas cruciais para o desenvolvimento do capital humano das sociedades modernas.