• Nenhum resultado encontrado

Educação em saúde na escola e na formação de profissionais de saúde

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.4 A ABORDAGEM SOCIOECOLÓGICA

3.4.2 Educação em saúde na escola e na formação de profissionais de saúde

Outra questão que merece ser destacada diz respeito ao papel fundamental da escola na educação e promoção da saúde (BERTHET, 1983; DANZON et al., 1998; EWENS; RICHARDS, 2000; ASHCROFT, 2011), por desempenhar ações que propiciam a formação cultural, troca de informações sobre saúde, além de ter no currículo disciplinas como Educação Física e Artística, que promovem a saúde, a partir de atividades físicas, sensibilização para a adoção de hábitos saudáveis de vida e discussões sobre cultura e tradições (MARTINEZ, 1996), além de a escola ser espaço apropriado para discutir a relação entre a fruição estética (o bem-estar advindo de fazer ou admirar uma obra de arte) e a saúde. Onyango-Ouma, Aagaard-Hansen e Jensen (2004) destacam, ainda, que ações orientadas para a educação em saúde são essenciais para modificar a visão de saúde e doença.

Convém realçar que as expressões “educação para a saúde” e “educação em saúde” demarcam, no Brasil, contextos teóricos e práticos distintos. A educação para a saúde busca principalmente propiciar acesso a informações sobre auto-cuidado, privilegiando ações de controle e prevenção de doenças, a partir de intervenções clínicas e mudanças comportamentais (SILVA, 2001). A educação em saúde, por sua vez, se refere às experiências educativas organizadas na escola e em outros ambientes com a finalidade de proporcionar oportunidades para a construção de conhecimentos teóricos e práticos em prol da saúde individual e coletiva (VALADÃO, 2004). Nesse trabalho, optamos, pois, pela expressão “educação em saúde”, por refletir melhor o foco de nosso interesse na análise de livros didáticos, por compreender que a forma como, no livro, são trazidas as discussões de saúde contribui para a construção, pelos estudantes, do seu conhecimento, bem como possibilita o seu empoderamento (empowerment) enquanto sujeitos ativos de transformação social. Além disso, como discute Valadão (2004), ela prevalece como expressão genérica, não sendo necessariamente emblemática de qualquer concepção sobre saúde, política ou educação. Consideramos que a educação em saúde consiste num meio de propiciar aos indivíduos e à comunidade acesso à informação, conhecimento, empoderamento, reflexão e sensibilização acerca de sua saúde.

Simovska e Carlsson (2012), por sua vez, ressaltam que os alunos podem ser agentes de saúde na escola e na sua comunidade, através de seu envolvimento em ações que melhoram as políticas escolares, bem como possibilitam a prática regular de exercícios e a disposição para a adoção de uma dieta saudável. Além disso, há na escola, embora de forma relativamente difusa, uma abordagem de temas relacionados à alimentação e nutrição, por exemplo, em livros didáticos (FERREIRA; SILVA; CARVALHO, 2010; JESUS et al., 2011; FIORE et al., 2012), que traz à tona uma das funções da escola, ser um ambiente propício para a formação de hábitos de vida saudáveis.

Dado o papel da escola na educação em saúde, há inúmeros trabalhos que argumentam a favor da necessidade de mudar e/ou melhorar o currículo dos cursos de formação de professores e nas áreas voltadas para a saúde, no sentido de incluir discussões sobre os pressupostos teóricos e práticos de uma abordagem da saúde integradora e as limitações da abordagem biomédica (WARREN, 1965; NOREN, 1997; WHITE, 2005; JONES; JOHNSTON, 2006; VODENICHAROV; GEORGIEVA; DYAKOVA, 2006; HAWKINS; WATSON, 2010; NUNES; NASCIMENTO; BARROS, 2010; SISTROM et al., 2011).

Além disso, ao considerarmos a saúde como um conjunto de condições vivenciadas pelo ser humano, definidas pelo contexto político, socioeconômico, cultural e ambiental, estudos sobre as ineficiências e desigualdades em saúde devem ir muito além da comparação de dados estatísticos, uma vez que o racismo, por exemplo, nem sempre se apresenta de forma explícita e mensurável nas interações sociais (LOPES, 2005). A título de exemplo, um estudo recente mostrou como, num hospital canadense, preconceitos étnicos em relação a mulheres de grupos nativos influenciavam as enfermeiras em sua condução de determinadas práticas médicas pós-operatórias (BROWNE, 2007; para mais exemplos, ver SÁNCHEZ-ARTEAGA et al., no prelo15). Além disso, o entendimento sobre a saúde e a doença variam, a depender de fatores socioeconômicos e culturais. Num estudo realizado em dois municípios gaúchos, por exemplo, foi mostrado que adolescentes que frequentam escolas públicas têm na família

15 SÁNCHEZ-ARTEAGA, J. M. et al. Alterização, biologia humana e biomedicina. Scientiae Studia (no

o agente assegurador da sua saúde, enquanto aqueles que frequentam escolas particulares possuem uma visão biomédica mais arraigada e têm na mãe ou no médico o agente assegurador da saúde (CHAISE; SOARES; MENEGHEL, 2008). Portanto, questões de saúde devem ser entrelaçadas à realidade, à cultura e aos recursos de cada país, como destaca Jatene (1999), sendo importante considerar tal entrelaçamento na educação em saúde.

Assim, diante dos diversos fatores e contextos que interferem na saúde, esta deveria ser tratada na escola e em outros ambientes educativos de forma mais ampla, não restringindo o enfoque a doenças e, quando estas fossem abordadas, a discussão sobre sua prevenção não deveria limitar-se a sua dimensão biológica, mas abranger uma compreensão mais ampla de fatores que ultrapassam as fronteiras orgânicas, dando-se atenção a fatores ambientais, sociais, psicossociais (ver MARTINS, 2004; BRUGNEROTTO; SIMOES, 2009; BEDOYA, 2013). Isso ressalta a necessidade de reformulações da educação médica e em outras áreas relacionadas à saúde, como enfermagem, nutrição, psicologia etc. (STEFAN; MCMANUS, 1989; STONE, 2000; WHELAN; BLACK, 2007; CARVALHO; CARVALHO, 2010; RIEGELMAN; ALBERTINE, 2011; REYES; HERNÁNDEZ; LAUZARIQUE, 2013), de modo que se apresente aos futuros profissionais de saúde o papel dos fatores psicológicos, sociais, políticos, econômicos e ambientais no processo de saúde e doença (CARVALHO; CARVALHO, 2008).

Cabe destacar, por fim, que a formação dos tomadores de decisão e gestores, e não somente dos profissionais da educação e da saúde, a partir de uma perspectiva mais abrangente de saúde se faz necessária para que a educação em saúde viabilize o empoderamento dos indivíduos.