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CAPÍTULO 2 CAMINHOS TEÓRICOS E METODOLÓGICOS

3.3 EDUCAÇÃO HUMANIZADORA COMO RELEVANTE POSSIBILIDADE NO

Entende-se por educação humanizadora aquela pautada nos princípios da inclusão social, acrescida de valores morais, como a solidariedade, fraternidade entre outros,

preconizada por Souza (a) (2004), em seu livro “E a educação: ¿¿QUÊ?? a educação na sociedade e/ou a sociedade na educação”. Para melhor entendimento conceitual, recorda-se um pouco a história do movimento denominado inclusão.

De acordo com Sassaki, o movimento de inclusão teve sua semente na Declaração de Princípios de 1981, quando se definiu o conceito de equiparação de oportunidades, proclamada em assembleia da Organização das Nações Unidas (ONU):

O processo mediante o qual os sistemas gerais da sociedade, tais como o meio físico, a habitação e o transporte, os serviços sociais e de saúde, as oportunidades de educação e de trabalho, e a vida cultural e social, incluídas as instalações esportivas e de recreação, são feitos acessíveis para todos. Isto inclui a remoção de barreiras que impedem a plena participação das pessoas deficientes em todas estas áreas, permitindo-lhes assim alcançar uma qualidade de vida igual à de outras pessoas (ONU, 1981).

Baseando-se nesses princípios, os quais buscam equalizar as oportunidades para todas as pessoas, indiscriminadamente, desenvolveu-se a nova corrente – a inclusão.

São citados vários encontros internacionais como promotores de mudanças de postura diante das Pessoas com Deficiências; entre eles, as Declarações de Cuenca - Equador (1981) e Sundemberg – Torremolinos, Espanha (1981); a XXIII Conferência Sanitária Pan-Americana (1990); a Declaração Mundial sobre Educação para Todos (1990); o Informe Final do Seminário da UNESCO (1992), sobre o Seminário Regional sobre Políticas, Planejamento e Organização da Educação Integrada, para Alunos com Necessidades Especiais.

Tem-se ainda: a Declaração de Santiago (1993); Declaração Mundial de Educação para Todos – Jomtien, Tailandia (1990); a Declaração de Salamanca (1994), sobre Princípios, Política e Prática em Educação Especial - criação e manutenção de sistemas educacionais inclusivos. Esta última traz como pontos fortes a colocação de crianças com Necessidades Educacionais Especiais – termo usado na época - em classes regulares, exaltando a Educação para Todos e o respeito às diferenças entre os indivíduos.

O movimento de inclusão, entretanto, só recebeu maior impulso após esta Conferência realizada na Espanha, especificamente em Salamanca, geradora de compromissos oficiais por parte de vários países e organizações não governamentais.

Glat e Fernandes, chamam a atenção sobre a efetivação do processo de inclusão das pessoas com deficiência, ao afirmarem que apesar de a produção do conhecimento a respeito da inclusão estar sendo incrementada, “ainda são poucas as pesquisas, experiências e práticas

educacionais validadas cientificamente que mostrem como fazer para incluir27 no cotidiano de uma classe regular alunos que apresentem diferentes tipos de necessidades educativas especiais” (GLAT e FERNANDES, 2005).

Diferentemente do movimento anterior – o de Integração – no qual a pessoa com deficiência tinha que desenvolver mecanismos de adaptação ao local que frequentava, o movimento de Inclusão coloca esta responsabilidade nas instituições que as recebem.

Compartilha-se com a ideia de Pierucci (2000) em relação à inclusão e à concepção de pertencimento, no qual o indivíduo só se considera incluído quando sente pertencer àquele lugar, grupo, comunidade.

Cabe às instituições garantirem todas as condições para que as pessoas com deficiência delas usufruam em situação de igualdade com os demais, tendo todos os seus direitos respeitados, assim como suas diferenças. Da acessibilidade aos recursos necessários, da formação de pessoal qualificado, à conscientização de todos, tudo deverá ser providenciado.

De escola inclusiva, tem-se um coerente conceito:

Escola inclusiva é uma escola onde se celebra a diversidade, encarando-a como uma riqueza e não como algo a evitar, em que as complementaridades das características de cada um permitem avançar, em vez de serem vistas como ameaçadoras, como um perigo que põe em risco a nossa própria integridade, apenas porque ela é culturalmente diversa da do outro, que temos como parceiro social (SANCHES & TEODORO, 2006).

Souza (a), sabiamente, postula sobre o processo de aprendizagem que:

Um novo saber é construído a partir do confronto entre os saberes que uma pessoa já possui e outras informações, concepções e pensamentos aos quais tem acesso, por diferentes e diversos meios. Esse confronto provoca conflitos sóciocognitivos que podem possibilitar a desconstrução das idéias anteriores e a construção do assunto em foco ou do problema do estudo (SOUZA (a), 2007, p.19).

Este confronto pode acontecer de forma amistosa ou conflitiva, porém vão provocar tensões, reações que seguramente geração novas formulações de pensamento. Com esta concepção, Souza (a) (2004) abre perspectivas para construção de conhecimento mesclando saberes intrínsecos e extrínsecos, respeitando a ambos e demonstrando um abrangente leque

de possibilidades educativas, ao desconstruir e reconstruir conhecimentos, descortinando a educação humanizadora.

Este mesmo autor trabalha com a convicção de que a educação escolar contribui com a construção da humanidade do ser humano. Para isto, utiliza-se de duas hipóteses: na primeira, os conhecimentos adquiridos sob quaisquer processos educacionais podem ser úteis para qualquer pessoa. Desta forma, estes processos são “direitos inalienáveis de todos os seres humanos” (SOUZA (a), 2004, p. 18).

Na segunda hipótese, as pessoas, independentemente da idade, aprendem não só com os conflitos cognitivos, mas com os saberes já adquiridos e as informações recebidas, incluindo as salas de aula e quaisquer outros ambientes, sejam sociais e/ou educacionais.

Souza (a) utiliza os conceitos de recognição e reinvenção no processo de construção da humanização ou desumanização do sujeito social. A recognição se refere ao confronto de saberes, provocador de suas construções/reconstruções. A recognição “se realiza na reinvenção permanente que o ser humano está a cada momento desafiado a fazer de si mesmo” (SOUZA (a), 2004, p. 19).

Para este mesmo autor, a recognição e a reinvenção são responsáveis por um processo maior- a ressocialização, o qual consiste nos procedimentos que ocorrem diante do confronto entre conhecimentos, atos e sentimentos de um indivíduo ou grupo cultural. Isto resulta em novos conhecimentos, ações e emoções, promovendo nas pessoas envolvidas, mais socialização, enriquecimento cultural, amor e amizade, respeito às diferenças, justiça social, traduzidos simbólica e materialmente, isto é, externando mais humanização.

Quando não existem esses confrontos, provocadores das mais diversas reações, não há processo de aprendizagem possível, nem educação. Nas palavras de Souza (a) “É nessas reações que se dá a aprendizagem, que começa a acontecer a educação. Aquele que mais reage e formula a própria reação, sobretudo se as escrever, certamente mais aprenderá e continuará a se educar” (SOUZA (a), 2004, p. 20, 21).

A questão das diferenças entre as pessoas é abordada por este autor, quando reflete que as pessoas têm direito a ser diferentes; para ele não há experiência educativa verdadeiramente democrática quando enfatizamos a diferença. Na verdade, a corrente inclusiva enfatiza as possibilidades das pessoas com deficiência, e não suas dificuldades.

Na ótica de Souza (a),

As diferentes áreas do conhecimento devem nos ajudar a entender a realidade individual e pessoal (social). Entender melhor nossa realidade

local, regional e nacional, entender melhor o mundo, para que, por meio da busca da satisfação das diferentes necessidades e dos nossos desejos, sejamos capazes de transformar as situações menos humanas em situações mais humanas (SOUZA, 2004, p. 230).

Percebe-se em suas palavras a vontade de mudanças significativas através da educação, porém no sentido humanitário, colocando o ser humano no centro das discussões político-pedagógicas, resgatando os valores morais, as capacidades de sentir, se emocionar, interpretar, refletir, analisar, enfim: transformar. Para este autor, (2000, p. 228), humanidade é “a maneira própria de existir desse animal chamado SER HUMANO, ou, simplesmente, homem. É O JEITO PRÓPRIO DE SER GENTE.” 28·.

De uma maneira peculiar, Souza (a) revela seu pensamento sobre o ser humano, dotado de sentimento e respeito pelo mesmo e contextualizando-o no mundo. Entretanto, a participação deste ser no mundo é dotada de vários conflitos, prejudicando, em muitas situações, sua inclusão social.

De acordo com Candau (2012), tornou-se comum a contraposição exclusão/inclusão. Em termos semânticos, a exclusão está associada a verbos como eliminar, expulsar, abandonar, negar, silenciar, recusar, privar, enquanto a inclusão se relaciona com verbos do tipo envolver, implicar, inserir, pertencer, participar.

Esta autora reitera que “as questões relativas ao binômio inclusão/exclusão estão relacionadas à problemática da igualdade-desigualdade social nas sociedades em que vivemos” (CANDAU, 2012, s/p). Ainda nos alerta sobre o fato de que esta realidade não pode ser dissociada das tensões entre igualdade e diferença, da mesma forma significativamente fortes no mundo atual.

Para um melhor entendimento sobre inclusão social, utiliza-se o clássico, mas sempre atual conceito de Sassaki (1997):

Processo pelo qual a sociedade se adapta para poder incluir, em seus sistemas sociais gerais, pessoas com necessidades especiais e, simultaneamente, estas se preparam para assumir seus papéis na sociedade. A inclusão social constitui, então, um processo bilateral no qual as pessoas, ainda excluídas e a sociedade buscam, em parcerias, equacionar problemas, decidir sobre soluções e efetivar a equiparação de oportunidades para todos (SASSAKI, 1997, p.3).

De uma maneira infeliz, o que ocorre em relação à inclusão é a distorção desse processo por parte da sociedade. Muitos fatores contribuíram e contribuem com a dificuldade de efetivação da inclusão social e educacional. Na perspectiva de Souza (a), a expansão europeia acarretou problemas sociais e educacionais diversificados, em vista de que:

Não tematizou nem analisou, porém, as diferenças; ao contrário, tratou de uniformizar valores, comportamentos e competências a partir de um centro de supremacia incontestável por um certo tempo, mesmo que tenha sido, muitas vezes, tolerante com as diferenças, desde que subordinadas (SOUZA (a), 2004, p. 62).

É fato que tentativas de homogeinização na conduta social tendem ao fracasso em virtude da diversidade cultural estar presente entre os seres humanos. Suas diferentes relações entre povos, etnias, civilizações, processos educativos, entre outros, apontam para colocar essa diversidade como centro histórico da humanidade. Na perspectiva de Souza (a).

O debate cultural levanta questões sobre as possibilidades da convivência dos diferentes com suas diferenças num contexto que supere as violências, as hierarquias, os preconceitos, as inclusões perversas, as subordinações, as desigualdades econômico-sociais e as exclusões histórico-culturais (Ibidem, p. 62).

A diversidade cultural é um fator que pode oferecer obstáculos no curso de mudar o olhar para os diferentes. Souza traz uma ideia freiriana a este contexto, quanto comenta que as probabilidades de convivência com os diferentes ou as possibilidades de fragmentação cultural e socioeconômica caracterizam o clima do momento por nós vivenciado. Isso acarreta um desafio no sentido de “transformar as possibilidades de convivência em uma nova perspectiva de organização social (econômica, política, gnosiológica, interpessoal) para a humanidade da pós-modernidade/mundo” (SOUZA (a), 2005, p. 8).

Para este autor, o direito dos outros é inquestionável. São suas as palavras:

[...] a obrigação de reconhecer e respeitar o direito dos outros, na medida, inclusive, em que somos os outros para eles e queremos, enquanto outros, ser reconhecidos e respeitados. Se eu tenho direito, sou um eu, uma singularidade, o outro também é um eu, uma identidade, com os mesmos direitos que eu (SOUZA (a), 2004, p. 82).

São visíveis as noções de justiça social nas palavras de Souza (a) e o profundo respeito ao direito do próximo. Em seu debate sociológico sobre a diversidade cultural, ele apresenta o contexto social conturbado da pós-modernidade/mundo, perturbação essa provocada pelos vários processos transculturais já experimentados no nosso planeta.

Esse cenário descortina as dificuldades de convivência com os diferentes, a necessidade do respeito para com os mesmos, a urgência de destruir,

não somente as extremas desigualdades econômico-sociais (grandes causadoras das exclusões), as inclusões perversas, o desemprego estrutural, as hierarquias, frutos das explorações, dominações e subordinações, mas também as exclusões histórico- culturais (Ibidem, p.65).

Na história da humanidade, as realidades sociais vêm demonstrando que situações de diversidades se configuram em exclusão e desigualdades. De acordo com Souza (a), “Suas influências se estendem, entretanto, sobre todas as outras situações socioculturais, condicionando-as. Até mesmo sobre comunidades muito isoladas” (SOUZA, 2004, p. 98).

Vale salientar, entretanto, que o discurso sobre as diferenças pode oportunizar equívoco e situações conflitantes, como demonstrou Pierucci, ao chamar a atenção para o fato de se acreditar que a bandeira das diferenças extrapola e sobreleva a causa universalista da igualdade:

A primeira grande cilada da diferença, portanto, diz respeito ao abandono do igualitarismo ou da igualdade como bandeira na defesa dos grupos discriminados, pois a defesa das diferenças joga água no moinho do pensamento conservador que sempre navega melhor no campo da argumentação diferencialista (PIERUCCI, 2013, p. 29).

Pierucci (2013) revela a existência de problemas em relação à questão da igualdade, quando elabora ataques à utilização das diferenças como alicerce de bandeira política nos vários movimentos sociais. É dele a seguinte concepção:

Penso que uma política que hoje queira agir sobre as condições de vida reais dos “diferentes” devesse preocupar-se também em reconstruir “o geral” e não se deixar cair presa da essencialização das diferenças com vistas à sua institucionalização e canonização que não prometem outra coisa senão pavimentar a avenida e balizar o percurso rumo a um beco sem saída minado de explosivos (Ibidem, p.33).

De fato, correm-se riscos quando se perde a essência do conteúdo reivindicador, deflagrando distorções entre simpatizantes de quaisquer causa que não possuam uma sedimentação teórica suficientemente robusta, a ponto manter os indivíduos no foco de suas aspirações durante todo o tempo de militância. Os resultados dessa perda podem acarretar consequências desastrosas para o movimento reivindicador.

A superação de qualquer tipo de discriminação é necessária, e ações focadas no combate à mesma devem ser postas em prática, sob pena de manter injustiças sociais enraizadas. No combate à discriminação, as palavras de Souza (a) são incisivas; elas se desvelam na indissociabilidade da construção da humanização do ser humano e os valores:

Torna-se menos difícil a construção de nossa humanidade se cultivarmos os valores da solidariedade, da cooperação, do amor e da amizade, do respeito às diferenças, do diálogo, das relações democráticas e da justiça. Para que isso aconteça, temos que mudar nosso EU, temos de estar sendo de outra forma. Emocionarmos de uma nova forma: amor, respeito ao outro como outro, cooperação, solidariedade. São exigidas muitas mudanças (SOUZA, 2004, p. 230).

As diferentes áreas do conhecimento têm papel preponderante no entendimento das realidades individuais e coletivas (sociais) e, especialmente, de suas necessidades. Daí revela- se a importância de programas ou projetos de extensão que buscam favorecer o processo de inclusão de pessoas com deficiência através de diversos meios, como o esporte, por exemplo, em um contexto social ainda carente de conhecimento voltado à prática pedagógica específica para esta finalidade, tornando-os, por esta ótica, laboratórios adequados para a caminhada no sentido de suprimir essa lacuna.

Neste capítulo apresentaram-se concepções sobre a Educação e sua capacidade de transformações, dando ênfase à Educação não formal, Educação Física Adaptada e Educação humanizadora. No próximo capítulo, versou-se sobre a Extensão Universitária, desde sua origem até a atualidade, intentando compreender seu papel, responsabilidade social e posição ocupada no âmbito acadêmico.

CAPÍTULO 4 - EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA: ORIGEM, SIGNIFICADO E