• Nenhum resultado encontrado

Por que a Educação Popular em Economia Solidária no Brasil? Das mobilizações nacionais ao surgimento dos CFES

ECONOMIA SOLIDÁRIA

2- Por que a Educação Popular em Economia Solidária no Brasil? Das mobilizações nacionais ao surgimento dos CFES

Antes de ser denominada “educação em Economia Solidária” pelo movimento ES (que exclui a denominação “popular”, por ser considerada uma evidência, mas que aqui incluímos para afirmar o projeto político-pedagógico da Educação Popular) a educação percorre um rico caminho de experimentação, em que variados atores, como os próprios EES, as entidades de apoio e fomento (EAF), redes de incubadoras, entre outros, promovem ações educativas diversificadas, em sua maioria, para atender às necessidades de formação dos EES ou dos coletivos que vão surgindo e se organizando em torno do movimento.

Como referimos no capítulo anterior, embora o movimento ES não seja formado exclusivamente por sujeitos em situação de debilidade económica e social, estes são, certamente, os que compõem a maior parcela dos seus militantes, excluídos pela economia capitalista. Sendo assim, a necessidade de que o trabalho seja gerador de rendimentos suficientes para garantir às necessidades dos trabalhadores e trabalhadoras e suas famílias é uma realidade inquestionável. Entretanto, dignificar o trabalho e

enfrentar os estratagemas do sistema capitalista, que apesar de primar pela sua desqualificação mantém reféns milhares de outros trabalhadores às suas estruturas – a que se vincula o poderio tecnológico e a capacidade competitiva - requer que os participantes da Economia Solidária consigam superar um conjunto de fragilidades que, certamente, têm pela frente.

Por estas e outras razões, as necessidades de formação são, naturalmente, de vária ordem em que, a capacitação técnica, tem sido uma reivindicação permanente. Estar na Economia Solidária não significa o espontaneísmo, já que os produtos gerados devem ter a sua qualidade intrínseca assegurada o que, por parte de quem produz, exige conhecimento e aprimoramento das suas técnicas. Outra questão é que, apesar da Economia Solidária reivindicar uma educação autogestionada pelos seus participantes, isto não significa que estes deixem de solicitar conhecimentos especializados a outros/as profissionais, participantes ou não do movimento ES.

Sendo assim, há alguns anos inúmeras ONG têm capacitado trabalhadores da Economia Solidária, assim como universidades têm desenvolvido trabalhos de incubação de EES, em que a vertente técnica e de gestão têm integrado os conteúdos educativos. Contudo, é preciso perguntar em que medida estes processos de capacitação têm em conta a formação de sujeitos emancipados para atuarem num projeto de construção de outra economia, com os princípios e valores da Economia Solidária? Em que medida fomentam conhecimentos emancipatórios que impulsionem estes sujeitos a construírem e aprimorarem os seus processos de trabalho autogestionários? Até que ponto a capacitação técnica não estará vocacionada apenas para a geração de trabalho e renda, reproduzindo as vicissitudes do sistema capitalista? Será que as metodologias utilizadas, ainda que sendo participativas, atendem aos pressupostos do projeto da Economia Solidária para uma autogestão pedagógica? Ou será que apenas reproduzem as metodologias de participação voltadas para a manutenção das formas económicas capitalistas?

Ao lado das ONG e universidades é sabido que, no Brasil, o governo federal não tem poupado esforços para que entidades como o SEBRAE (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), pertencente ao Sistema S9, tenha um papel destinado a

9 Do ponto de vista da educação formal, a vertente profissionalizante, no Brasil, tem-se especializado no atendimento das exigências do mercado capitalista. Spinelli (2010) destaca que desde à criação das primeiras escolas profissionalizantes, a constituição do Sistema S e finalmente das Escolas Técnicas/CEFETs, a vocação do sistema profissional de ensino nacional tem sido o de formar o pessoal

formar os trabalhadores para serem empreendedores, no sentido de cumprir as exigências do processo produtivo associado ao avanço industrial e tecnológico, combater a pobreza, incentivar a competição e o individualismo.

Muito embora as experiências de produção e comercialização dos EES busquem construir alternativas de reconstrução das cadeias produtivas, como defende Mance (2001, 2002a, 2002b, 2005), a realidade é que estas não são hegemónicas e estes sujeitos também produzem e comercializam no mercado capitalista, este sim, dominante. Os conhecimentos técnicos possibilitam que os EES concorram com as empresas capitalistas, garantam os seus rendimentos e consigam sobreviver no mercado. Por outro lado, a Economia Solidária requer práticas antagónicas às do capitalismo, assim como saberes que vão mais além do conhecimento técnico.

Como abordamos a seguir, esta preocupação tem sido constante e acompanhado o percurso do movimento ES no Brasil. A fragilidade económica dos EES é uma realidade e, a urgência da sobrevivência, impõe atenções redobradas à aprendizagem técnica. Por sua vez, a autogestão não significa ausência de disciplina e responsabilidades partilhadas, o que exige uma aposta eficaz na partilha das experiências dos trabalhadores. Como integrar a formação técnica e sociopolítica, considerando o projeto político-pedagógico da Economia Solidária? O que é ser educador e educando em Economia Solidária? As questões aqui levantadas têm continuidade nos tópicos seguintes, em que buscamos apresentar os debates realizados no seio do movimento ES, para seguir construindo a prática da Educação Popular em Economia Solidária.

2.1- O passo a passo da Educação Popular em Economia Solidária no Brasil

A história da Educação Popular em Economia Solidária é longa e pode ser escrita a partir das diversas contribuições coletivas geradas nas plataformas políticas de diálogo entre os seus atores. São estes e estas que vão traçando, a partir das práticas ensinadas e aprendidas no seio do movimento e fora deste, com a marca do pensamento latino americano e caribenho da Educação Popular, um percurso original que é desenhado e vivenciado por trabalhadores-educadores.

necessário a responder às necessidades do avanço industrial e tecnológico. Segundo a autora, este fenómeno tem perpetuado a estratificação social, “na medida em que reafirma suas diferenças, ficando simplificadamente definido: o Sistema S voltado a formar o trabalhador de manutenção e operador e as Escolas Técnicas, o técnico atuante em nível intermediário.” (Ibid. p. 52). O Sistema S é assim conhecido pelas siglas das instituições especialmente constituídas para dar respostas formativas específicas aos diferentes setores, nomeadamente: o comercial (SENAC), o rural (SENAR), o transporte (SENAT), o industrial (SENAI), o de apoio às micro e pequenas empresas (SEBRAE), entre outros.

No seguimento das primeiras mobilizações realizadas durante o I FSM (2001) e da I e II Plenária (s) Nacional de Economia Solidária (2002 e 2003, respetivamente) surgem sinais reveladores da preocupação com os processos educativos do movimento, vinculados ao trabalho associado, com características emancipatórias e autogestionárias. Ressaltamos aqui que, apesar de não haver documentos disponíveis sobre as duas primeiras plenárias, a nossa afirmação tem como referência as menções que constam na ata da III plenária.

Sendo assim, tal começa a expressar-se já na III Plenária Nacional da Economia Solidária, realizada em 200310, de cuja ata destacamos os seguintes trechos:

Foram apresentados [...] os dois principais desafios da Economia Solidária: o direito ao trabalho solidário e a incorporação, na legislação brasileira, do direito ao trabalho solidário e associado. [...]

Formação: adotar formação política e cultural voltada para a auto-gestão e solidariedade, rompendo com a lógica capitalista; adotar formação e qualificação dos trabalhadores das cooperativas e de formações associativas da Economia Solidária; garantir acesso à formação contínua; inserir no currículo escolar, ensino fundamental e médio, a consciência do cooperativismo baseados no princípio da Economia Solidária; implementar a formação de empreendedores da economia popular e solidária para produção, garantindo um padrão de qualidade; viabilizar estruturação metodológica considerando a diversidade cultural no que se refere à educação de comunicação social; adotar o conhecimento do saber popular; aprender a comercializar e calcular o preço justo; utilizar uma linguagem mais popular, que o povo e o empreendedor se identifique; adotar uma estratégia de formação e capacitação articulando as atividades econômicas da Economia Solidária; incentivar a pesquisa de ensino na Economia Solidária nas universidades; implantar mudanças na cultura de consumo, a partir dos atores da economia popular e solidária; adotar formação para formadores e agentes multiplicadores da Economia Solidária; introduzir os princípios da Economia Solidária na educação formal; desenvolver o programa de formação a distância em Economia Solidária.

Em 2004, são criados os fóruns estaduais e regionais para garantir a realização do I Encontro Nacional de Empreendimentos de Economia Solidária11. Na comunicação

realizada por Dubeux (2012) esta destaca que a Coordenação Nacional do FBES cria em 2005 a comissão de organização da I Oficina Nacional de Formação em” Economia Solidária12, que acontece no mesmo ano.

10 Esta plenária nacional realiza-se entre 27 e 29 de junho de 2003. Neste mesmo ano, o FBES (2006a) também assinala a importância da participação do movimento ES no III FSM, em Porto Alegre, que conta com dezenas de representantes da América Latina e Caribe por meio de seminários, encontros e feiras. Neste encontro, ampliam-se as perspetivas de integração regional do movimento ES e, com isso, o trabalho de articulação na região entra definitivamente na agenda do FBES. Para mais informações a ata da III Plenária Nacional de Economia Solidária está disponível em: <http://www.fbes.org.br/index.php? option=com_docman&task=cat_view&gid=112&Itemid=216>

11 Esta iniciativa decorre nos dias 13, 14 e 15 de agosto e, segundo o FBES (2006a, p. 2), reúne trabalhadoras/es oriundas/os de todos os estados, contando com a participação de cerca de 2 500 pessoas. Neste evento, o movimento ES é desafiado a gerir o abastecimento, comercialização, trabalhar com moeda social, realizar feiras em todos os estados, fazer campanha de consumo consciente, comércio justo e solidário, constituir redes, cadeias produtivas, finanças solidárias, trabalhar no campo do marco legal entre outras atividades.

Podemos destacar esta iniciativa como fundamental, já que são conhecidas e debatidas diversas experiências de formação levadas a cabo em todo o país, fruto de um trabalho prévio de preparação, que permite sistematizar as diversas contribuições. Percebe-se, então, a existência de uma grande e rica diversidade de atuação entre as ações realizadas por EAF, EES, redes de articulação em nível regional e nacional, incubadoras universitárias, entre outras. Durante a Oficina, as iniciativas de formação são também agrupadas a partir de duas características: i) as experiências de formação de formadores/multiplicadores ii) as experiências de formação de trabalhadores de EES. Dos grupos de trabalho (GT) são identificadas as principais lições que as experiências ensinam, considerando as suas contribuições, limites e dificuldades.

Outro fator importante é que são destacados indicadores para as necessidades de formação em Economia Solidária a partir de cindo eixos: i) Princípios e diretrizes do processo formativo em Economia Solidária; ii) conteúdos a serem trabalhados na formação em Economia Solidária; iii) elementos metodológicos; iv) sistematização e avaliação; v) elementos para a construção de uma política de formação em Economia Solidária. O documento chamado carinhosamente de “livrinho verde” pelos formadores/educadores é publicado pela SENAES/MTE e passa a ser uma referência importante sobre o tema.

O ano de 2006 é promissor no que concerne à Educação Popular em economia solidária. Dubeux (Ibid.) sublinha a realização de inúmeras Conferências estaduais, quando são escolhidas/os as/os delegadas/os e definidas as reivindicações e propostas para a I Conferência Nacional de Economia Solidária13, cujo ponto relacionado com a “Formação

e Assistência Técnica e Tecnológica” é intensamente discutido e gerador de um documento final com extensa proposta para a política pública.

Do relatório final (FBES, 2006b, pp. 2-20, destaques nossos) retiramos alguns trechos que começam por evidenciar a tipologia da educação reivindicada pelo movimento ES:

A Economia Solidária exige uma educação solidária que transforme a mentalidade cultural dominante de competição para a construção do espírito de cooperação, além do

quarenta experiências de formação. Nesta oficina é também criado o GT Nacional de Formação. O documento que retrata, em pormenor, a sistematização dos debates e os elementos fundamentais está disponível em: <http://cirandas.net/cfes-nacional/i-oficina-nacional-formacao-es.pdf>

13 Esta Conferência é realizada em Brasília, no período de 26 a 29 de junho de 2006, cuja temática é “Economia Solidária como Estratégia e Política de Desenvolvimento”. O relatório final está disponível em: <http://cirandas.net/cfes-nacional/i-oficina-nacional-formacao-es.pdf>

desenvolvimento de uma matriz científica e tecnológica que esteja comprometida com o desenvolvimento sustentável e solidário. [...]

As iniciativas de Economia Solidária têm em comum a igualdade de direitos, de responsabilidades e oportunidades de todos os participantes dos empreendimentos econômico solidários, o que implica em autogestão, ou seja, a participação democrática com exercício de poder igual para todos, nas decisões, apontando para a superação da contradição entre capital e trabalho. [...]

A Economia Solidária é geradora de trabalho emancipado, operando como uma força de transformação estrutural das relações socioeconômicas, democratizando-as, superando a subalternidade do trabalho em relação ao capital. Nesse sentido, compreende-se por trabalho emancipado:

o trabalho exercido por livre opção, de acordo com o gosto ou aptidões do trabalhador, e não forçado pelo maior valor de mercado a ser obtido;

o trabalho cujo produto seja de propriedade do trabalhador, individual ou coletivamente, e não alienado pelo capital;

o trabalho como exercício de construção do sujeito, de desenvolvimento de suas capacidades físicas, mentais, culturais e sociais, e não embrutecedor, transformador do ser humano em máquina;

o trabalho que possibilita a realização pessoal do trabalhador, seja pelo reconhecimento de seus pares, seja pela satisfação do bom uso de quem o recebeu, e não individualizado e desvinculado do destino final do produto;

o trabalho que é viabilizado pela redução crescente do trabalho necessário, pela democratização dos ganhos da produtividade e pela maximização do tempo disponível para o desenvolvimento dos potenciais individuais e coletivos superiores do ser humano (físicos, mentais e espirituais);

o trabalho que possibilita a realização de todos os trabalhos que precisam ser feitos para reconstrução da vida e não a fabricação desenfreada de mercadorias para a comercialização, ameaçando o trabalho;

trabalho como fonte geradora de conhecimento é fundamental;

o trabalho que pressupõe o fim do trabalho subordinado ao capital e a implantação da autogestão;

o trabalho que pressupõe o fim da alienação do trabalho e apropriação da produção por quem a produz;

o trabalho que considera tanto a esfera produtiva quanto a reprodutiva, sob pena de excluir parcela ativa responsável pelo cuidado das pessoas. […]

A Educação para a Economia Solidária, seguindo os princípios da solidariedade e autogestão, contribui para o desenvolvimento de um país mais justo e solidário. Ela deverá valorizar as pedagogias populares e suas metodologias participativas e os conteúdos apropriados à organização, na perspectiva da autogestão, tendo como princípio a autonomia. Deve viabilizar tecnicamente as suas atividades sociais e econômicas e despertar a consciência crítica dos trabalhadores. A complexidade desta formação inclui tanto estes princípios, enquanto ferramentas para o empoderamento dos sujeitos, como a capacitação técnica, a inclusão digital e a própria prática da autogestão.

Dubeux (Ibid.) assinala a realização da primeira reunião do Conselho Nacional de Economia Solidária (CNES), no ano de 2006, com 56 entidades, em que é destacado um comitê assessor na área de formação. Entre dezembro de 2006 e fevereiro de 2007,

segue-se a realização de cinco oficinas regionais, que mobiliza cerca de 150 experiências no país. Estas têm como foco os debates realizados na I Oficina Nacional de formação em Economia Solidária, a discussão sobre a Política Nacional de Formação e a criação da rede nacional de formadores.

As oficinas regionais possibilitam, assim, consultas e aprofundamento de debates, ampliando a participação e consulta realizada durante a I Oficina Nacional de Economia Solidária, que contou com um menor número de experiências. Por conta destas oficinas são identificados mais de duzentos processos formativos no país.

2.2- Os elementos fundantes da Pedagogia da Autogestão na Educação Popular em Economia Solidária no Brasil

Em 2007 tem lugar a II Oficina Nacional de Formação em Economia Solidária14. Optamos

por destacar as contribuições oriundas desta iniciativa, por considerar que constituem uma referência para a consolidação dos princípios e diretrizes da Educação Popular em Economia Solidária e, mais ainda, por tornar mais explícitos alguns dos elementos para a compreensão da “Pedagogia da Autogestão”.

Segundo o relatório do FBES (2007, pp. 32-33), a partir das conclusões das oficinas regionais sobre o tema dos “Princípios e Diretrizes Metodológicas da Formação/Educação em Economia Solidária” é reelaborada uma nova síntese do debate, incluindo as contribuições dos/as participantes das oficinas regionais, considerando-se quatro eixos interrelacionados: princípios, diretrizes metodológicas, proposta de conteúdos e sistematização dos processos formativos/educativos em Economia Solidária.

É, ainda, uma oportunidade de aprofundamento de dois temas fundamentais para os processos formativos na Economia Solidária: o primeiro, relacionado com a formação em Economia Solidária e a Educação Popular, “incorporando o acúmulo histórico dos movimentos sociais e populares” (Ibid., p. 33) e, o segundo, diz respeito aos desafios da formação em Economia Solidária para a organização autogestionária e a qualificação para a eficiência económica. Por fim, um dos pontos altos é também um tema que vai ganhando destaque desde a oficina nacional anterior, no seguimento das atividades do

14 A iniciativa decorre entre os dias 16 a 18 de abril de 2007, em Brasília/DF, organizada e coordenada pelo GT de Formação (FBES e SENAES), contando com cerca de cinquenta formadores/educadores. O documento síntese encontra-se disponível em: <https://www.google.pt/? gws_rd=cr#fp=6b130efd47b6abf8&q=II+oficina+nacional+de+forma%25C3%25A7%25C3%25A3o %252Feduca%25C3%25A7%25C3%25A3o+em+economia+solid%25C3%25A1ria+-+

GT de formação, que é a rede de formadores em Economia Solidária, formalizada durante esta iniciativa.

O documento produzido é também revelador da necessidade de alimentar o debate sobre uma nova forma de percorrer o caminho “de ensinar e aprender, em que a radicalização da participação de educador e educando, […] denominada de metodologia

autogestionária, é o elemento constitutivo e ontológico do ser formativo.” (Ibid., p. 3,

destaque nosso). Com base neste relatório, buscamos levantar elementos diversos que entendemos serem os pressupostos em que estão assentes os processos pedagógicos da Educação Popular em Economia Solidária, de maneira a podermos elaborar uma primeira síntese desta proposta do movimento ES, que nos sirva de orientação para melhor compreender a Pedagogia da Autogestão.

De qualquer forma, é preciso ter a clareza de que embora tais pressupostos sejam oriundos de um extenso processo de consultas e debates, legitimados em espaços coletivos nas diversas instâncias nacionais do movimento ES, não significa que esteja a ser colocado em prática integralmente ou que estejam a ser implementados da mesma forma nos CFES regionais ou demais iniciativas educativas do movimento ES. Ter em conta a complexidade em que está imersa a tentativa de construção de “outra educação” para “outra economia” esbarra, naturalmente, nas vicissitudes do sistema capitalista hegemónico, cuja proposta educativa está carregada de uma intencionalidade política que concorre para a manutenção e aprofundamento do modelo económico dominante.

Sendo assim, é também natural que os EES se defrontem com condicionalismos de toda a ordem (sobrevivência económica dos EES; dificuldades de contrariar os modelos educativos apreendidos/interiorizados; a prioridade atribuída à capacitação técnica em detrimento de um projeto educativo que inclua as dimensões reivindicadas pela Economia Solidária, entre outros) para que ocorra uma implementação mais ampla.

Posto isto, apresentamos, a seguir, os trechos selecionados do relatório da II Oficina Nacional de Formação em Economia Solidária (FBES, 2007):

i) Princípios:

Os princípios da prática educativa podem ser objetivos e subjetivos, assim sendo, o primeiro deles é o agir-refletir-agir. Trata-se de algo que revela o sentido último do ser e fazer

o humano. Os princípios são o início de tudo. Início não na perspectiva cronológica ou evolutiva, mas como presença, que novas práticas são realizadas e a ele se remetem para não perderem a perspectiva emancipadora e autogestionária. Portanto, princípios e diretrizes metodológicas da formação/educação em Economia Solidária são dinâmicos e dinamizados pela prática metodológica. Não podem ser entendidos como algo estático, doutrinário, mas caminho em que a prática do viver educativo se faz e os refazem na relação do refletir-agir-refletir-sistematizar, ou seja, nos fazem dentro de uma práxis em que o alimento da vida é o fazer da história. [...]

Os processos formativos/educativos têm como princípio e, ao mesmo tempo como