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Pedagogia da Autogestão: por onde circulam as suas referências?

ECONOMIA SOLIDÁRIA

3- Pedagogia da Autogestão: por onde circulam as suas referências?

Quando indagamos “que elementos conferem uma identidade própria à Pedagogia da Autogestão?”, se tomarmos como referência o percurso e o repertório do movimento ES, esta pedagogia aparece atrelada, inevitavelmente, às referências centrais do projeto político-pedagógico da Educação Popular em Economia Solidária que, nesta etapa, podemos já apontar as seguintes características: educação e trabalho unem-se,

conferindo protagonismo aos espaços de educação não-formal, que neste caso estão relacionados ao trabalho associado e aos processos de autogestão dos trabalhadores e trabalhadoras, permanentemente mencionados.

O propósito do movimento ES de avançar na construção de “outra economia”, leva-o a buscar reforços nas vivências dos trabalhadores e trabalhadoras que lutam por transformações sociais, ancoradas em princípios e valores como a cooperação, autogestão, solidaridade, justiça social entre outros. Estas vivências, contudo, necessitam ser partilhadas para além dos seus espaços de trabalho autogestionário e, como tal, o movimento ES procura ampliar as oportunidades de socialização destas práticas educativas, através de uma estratégia que tem em conta a criação de redes de educadores (populares) associadas à noção de território.

A originalidade desta proposta vivencial está, precisamente, em valorizar a experimentação destas práticas como processos educativos, facto que amplia a visão de educação para além da clássica formação “entre-muros” das instituições escolares.

Para viver uma Pedagogia da Autogestão, é também fundamental superar uma educação confinada à qualificação profissional, numa perpetiva de capacitação técnica, mas que tenha como alicerce processos político-pedagógicos que permitam não somente a crítica ao sistema capitalista hegemónico, mas a experimentação e partilha de práticas sócio- educativas assentes noutras formas de convivência e de economia.

Por diversas vezes salientamos que a educação, por si só, não transforma a realidade, mas pode alimentar outras visões de mundo mais equitativas e solidárias, que se materializem em práticas de “outras economias” e “outra educação”. Por isso mesmo, a necessidade premente de compreender as pedagogias que reforçam os sentidos da Educação Popular e que, por sua vez, buscam fortalecer processos como o do movimento ES, ao mesmo tempo que confrontam às que se valem do pensamento único neoliberal e corroboram para a sua manutenção e reforço.

Neste sentido, na tentativa de desvelar os meandros da Pedagogia da Autogestão, consideramos que, a priori, existem duas categorias – pedagogia e autogestão - que, apesar de conectadas, merecem um exercício de análise autónomo, de maneira a que

consigamos compreender as suas particularidades para depois voltar a conjugá-las. É este exercício de análise que apresentamos a seguir.

3.1.- Pedagogia (s) e os sentidos da educação

Ao retroceder no tempo, encontramos na Grécia antiga a etimologia da palavra “pedagogia”, a que Ghiraldelli Jr. (2006, p.8) associa a sua origem à “paidagogia”, termo que designa o “acompanhamento e a vigilância do jovem”. O “paidagogo”, considerado como o “condutor da criança” é, neste caso, o escravo cuja função específica é guiar as crianças à escola, quer na “didascaléia”, para aprender a alfabetização, quer ao “gymnásion”, para o cultivo do corpo.

Entretanto, a expressão “pedagogia” apresenta atualmente outros sentidos. Ainda segundo o autor, três tradições – a francesa, alemã e saxónica - concorrem para a atual configuração da pedagogia. A francesa, na linha da sociologia de Émile Durkheim (1858- 1917), que entre o final do século XIX e o início do XX, busca conceptualizar "pedagogia", "educação" e "ciências da educação". Por esta via, a educação é concebida como o fato social através do qual a transmissão cultural e as experiências sociais são passadas de uma geração a outra, o que permite a sua continuidade histórica.

A pedagogia, neste caso, é considerada “não propriamente como teoria da educação, ou pelo menos não como teoria da educação vigente, mas como literatura de contestação da educação em vigor e, portanto, afeita ao pensamento utópico.” (Ibid.). Esta, ao contrário das teorias da educação real e vigente, devem acompanhar as ciências da educação integradas, especialmente, pela sociologia e pela psicologia. Ghiraldelli Jr. (Ibid.) refere que para Durkheim, enquanto a sociologia deve substituir a filosofia na tarefa de propor fins para a educação, a psicologia deve assumir o trabalho de fornecer os meios e instrumentos para a didática.

Na tradição alemã, Johann Friedrich Herbart (1776-1841) não separa a ciência e a pedagogia, sendo este estudioso o que elabora a ideia da “pedagogia como ciência da educação". Neste caso, fundamenta a pedagogia na psicologia. Já na tradição saxónica, John Dewey (1859-1952), pertencente à corrente filosófica do pragmatismo, não estabelece uma dicotomia entre a pedagogia e a filosofia. Ghiraldelli Jr. ressalta a influência desta corrente nos debates filosóficos contemporâneos, no que concerne à contestação da visão tradicional de verdade — a verdade como correspondência — em

favor da ideia pragmática de verdade — "a verdade é o útil". (Ibid., p. 9). Por este prisma, o autor explicita que, segundo à argumentação de Dewey, uma teoria do conhecimento, de cunho filosófico, pode ser entendida como verdadeira, a partir de seus resultados práticos — sua "utilidade".

Neste sentido, o melhor lugar para verificar a veracidade/validade de uma teoria do conhecimento é a própria situação de ensino.

O importante é menos o estabelecimento de fins para a educação propostos pela filosofia e mais a averiguação da veracidade de uma filosofia (uma teoria do conhecimento) proporcionada pela educação. A educação torna-se o banco de provas da filosofia. A filosofia, então, é uma filosofia da educação. Pedagogia, filosofia e filosofia da educação, na concepção deweyana ,tornam-se, em alguma medida, sinônimos. (Ghiraldelli Jr., 2006, p. 9)

O autor assinala, então, que o termo “pedagogia” é utilizado pelos estudiosos contemporâneos da educação como “alternada ou concomitantemente, negativa ou positivamente, nas acepções definidas acima, isto é, como utopia educacional, como ciência da educação e como filosofia da educação.” (Ibid.). Do mesmo modo, possui características particulares concebidas no mundo moderno, definindo-se, principalmente, a partir da noção essencialmente moderna da conceção de infância.

Não sendo o nosso objetivo aprofundar as correntes pedagógicas que promovem as diferentes noções de infância, não podemos deixar de mencionar que, pelo menos, dois modos mais evidentes de pensar e compreender a criança são oriundos dos séculos XVI, XVII e XVIII e que estes influenciam a pedagogia moderna.

Dando seguimento às contribuições de Ghiraldelli Jr. (2006) verificamos que, se antes as crianças são tratadas com indiferença ou com “demasiada” atenção, a partir do século XVI ocorre, progressivamente, uma alteração dos sentimentos dos adultos em relação às crianças, quando são empreendidos esforços para convencer os pais e a sociedade a adotar um comportamento mais racional.

O filósofo francês Michel de Montaigne (1533-1592) é um dos defensores de que o tipo de atenção que os pais demonstram pelas crianças pequeninas, beijando-as e abraçando-as é, nada menos, que uma utilização das mesmas como entretenimento próprio. Por conseguinte, este deve ser eliminado, de forma a que a criança seja reconhecida como um ser diferente do adulto e, como tal, deve receber um tratamento

centrado numa disciplina racional, de maneira a ultrapassar a infância e tornar-se um adulto responsável.

No século XVIII, a conceção da criança, como ser singular, começa por ganhar outra perspetiva. O filósofo Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) já não se preocupa com as atenções “privilegiadas” dos pais em relação às crianças, mas centra-se na busca da reestruturação da noção de infância. Este “acredita que a verdade depende de uma disposição de 'sinceridade do coração' e, portanto, tem seu berço na intimidade, enquanto na vida pública reina a máscara social, a mera aparência — no limite, a mentira.” (Ibid., p. 11).

Assim, se por um lado a infância é a fase “em que estamos de posse do melhor de nós” (Ibid.), já que ainda não estamos sujeitos à realidade social e cultural que corrompe e, por esta razão, deve ser preservada, por outro, é uma fase da vida em que os esforços pedagógicos devem incidir no cultivo da intimidade, ou seja, do que é tomado como íntimo, que é a criatividade, e que não pode estar afeito ao convencional, ao social. Assim, a pedagogia que aqui se propõe, por vezes de modo confessional, orienta-se para a relação íntima e a disciplina interior, autónoma e não heterónima, privilegiando a criança como indivíduo.

Desta forma, Montaigne e Rousseau oferecem contribuições fundamentais à conceção de infância, com elementos edificantes para as abordagens que se desenham na modernidade, qualificando-na como um período especial de cada ser humano e que, como tal, vai-se construindo a ideia de que deve ser preservada, evitando-se as interferências “desastrosas” no universo infantil.

Neste sentido, a escola tende a ser reorganizada para criar o "mundo da criança", assim como o lar e toda a vida pública devem ser alterados para fortalecer esta tendência. Busca-se, nesta época, uma extensão da escola até o lar, o que se realiza com êxito. Um dos muitos exemplos demonstrados por Ghiraldelli Jr. (Ibid.) é o do que hoje “faz do quarto das crianças um pequeno escritório para afazeres escolares.” (Ibid).

Do nosso ponto de vista, os fundamentos iniciais de que se acercam as noções de pedagogia, associadas às de infância, levam-nos também à necessidade de

questionamento dos paradigmas22 em que estas formas pedagógicas vão se ancorando e

dando origem às escolas modernas. Podemos observar que as questões levantadas no capítulo I, acerca das formas de produção do conhecimento moderno, tendencialmente dicotómico e fragmentado, têm estreita conexão com a organização do meio escolar, tal como o conhecemos hoje, com regras, disciplinas, conteúdos programáticos, divisões por séries a partir de critérios cronológicos, etc..

Na própria abordagem deste estudioso (Ibid., p, 12) verificamos que, se por um lado este enfatiza que as visões acerca da infância começam por demonstrar uma articulação com um novo sentimento dos adultos em relação às crianças, associado aos cuidados especiais para com estas, e que, por sua vez, esta noção segue-se consolidando com o advento da modernidade, a partir da Revolução Industrial e os desdobramentos do capitalismo no século XVIII, começam por interferir e a moldar a noção de infância.

as crianças, que com o surgimento e consolidação da noção de infância começavam a ser vistas como seres destinados à escola, são colocadas (ou recolocadas) crescentemente no mundo do trabalho. Quando se inicia o século XX, a escola torna-se de direito o lugar da infância, mas não seu lugar de fato. Então, a separação entre o mundo da criança e o mundo do trabalho, que parecia estar na base da modernidade e que havia conquistado a consciência científica e democrática, torna-se um problema. E a pedagogia manifesta-se por meio de uma nova linguagem: a "escola está separada da vida", está "apartada da realidade".

Então, indagamos: de que tipo de “vida” a escola está separada? De que realidade está apartada?

A pedagogia, que até então, mesmo com alguma hesitação, dava indicações de querer se manter na determinação original de levar a criança ao mundo do deleite com os bens culturais, entendido como mundo fora do trabalho (o que lembrava sua função originária na Grécia antiga), é convocada a harmonizar esses mundos, até então vistos como inconciliáveis. Para tal, a pedagogia se redefine. O pensamento pedagógico, na medida em que se propõe resolver a tensão entre escola e trabalho, soluciona a questão subordinando a primeira ao segundo. Quase todas as tendências do pensamento pedagógico laico do início do século XX passam a advogar algum tipo de união entre ensino e trabalho. As reflexões de Durkheim, Dewey e Gramsci exemplificam essa situação. (Ibid., p. 13)

Em Durkheim, a educação pode ser compreendida como o conjunto de ações exercidas das gerações adultas sobre as que ainda não alcançam o estatuto de maturidade para a vida social. (Ghiraldelli Jr., 2010; França Lima, 2009; Lucena, 2010). Partindo desta premissa, França Lima (2009, p. 1) revela que Durkheim concebe a sua teoria da educação em que, a exemplo de Comte, a pedagogia e a sociologia devem estar articuladas, uma vez que a escola tem como objetivo estimular e desenvolver na criança

22 A noção de paradigma a que nos referimos equivale àquela utilizada por Adams (2010, p. 17) e Mejía (2001, p. 8), e diz respeito a “um conjunto de princípios, ideias e valores compartilhados e que servem de referência e orientação para uma comunidade ou uma distinta sociedade”.

certo número de estados físicos, intelectuais e morais exigidos pela sociedade e que seriam aplicáveis à mesma.

França Lima (Ibid.) afirma que, em Durkheim, “os fins da educação são determinados pela sociologia, pois a educação e a pedagogia para ele, são anexos apêndices da sociedade, que não carecem de autonomia para se desenvolver.” Assim, este defende que a escola deve ensinar as normas sociais às crianças, utilizando-se de metodologias apropriadas que incluam técnicas, linguagens ou mesmo arranjo do prédio escolar, tendo em conta que o saber a ser produzido deve contribuir para perpetuar a ordem social, valendo-se de uma pedagogia que reproduza a organização social existente.

Segundo França Lima (Ibid.), ao enfatizar que a educação é um anexo da sociedade e a sua finalidade deve estar voltada para esta, Durkheim sublinha o caráter determinista da sua teoria educacional, já que a escola deve fortalecer os padrões de comportamento sociais, de maneira a satisfazer as suas necessidades sociais, por meio da imposição de suas regras.

Lucena (2009, p. 295) ratifica que Durkheim pressupõe a educação como uma “poderosa ferramenta para a construção gradativa de uma moral coletiva, fundamental para a continuidade da sociedade capitalista”, pressuposto fundamental para compreender as inquietudes que marcam os debates das ideias liberais, presentes na Europa no início do século XX. A crítica ao liberalismo de Durhheim, no entanto, se apresenta com a demonstração da impossibilidade de concretização de uma sociedade mais avançada sob a lógica do individualismo.

Ao considerar que o individualismo é desastroso para a constituição e a manutenção de uma sociedade mecanicista, que implementa a primeira revolução tecnológica, Durkheim defende a existência de uma moral coletiva, expressa na divisão social do trabalho e manifesta pela “solidariedade orgânica”23, sendo esta um dos grandes desafios para o

avanço de uma sociedade. Da mesma forma, ao entender que a expansão da educação escolar possibilita à sociedade a diversificação das especialidades profissionais,

23 Lucena (2009, p. 297) explica que na teoria da solidariedade durkheiminiana este estabelece uma a distinção entre a solidariedade mecânica e a orgânica. No caso da solidariedade mecânica “os homens estão unidos a partir da semelhança de valores expressos na religião, tradição ou sentimento comum. Este é um tipo de solidariedade à qual a sociedade tem coerência porque os indivíduos ainda não se diferenciam.” A solidariedade orgânica, por sua vez, é aquela em que “o consenso resulta de uma diferenciação, ou se exprime por seu intermédio. Dentro desta conceção, os homens não se assemelham, sendo diferentes entre si. A união desses homens só é possível a partir da dependência que um tem do outro para realizar alguma atividade social.”.

Durkheim considera que esta é fundamental para tornar complexa a divisão do trabalho social.

Como no seu entendimento uma sociedade complexa e diversificada rege-se por uma "solidariedade orgânica", esta “funciona como um corpo que se mantém coeso pela interdependência de seus órgãos.” (Ghiraldelli Jr., 2010, p. 14). Sendo assim, uma educação escolar que potencialize a diversificação profissional, é estimulada pela sua contribuição com o equilíbrio e a perpetuação da vida social.

Se Durkheim propõe a relação entre trabalho e escola como um fator promissor para a manutenção da vida social, o filósofo norte-americano John Dewey entende que “o trabalho se introduz na própria alma da vida escolar e da pedagogia, revigorando a educação.” (Ghiraldelli Jr., 2010, p. 14). Dewey propõe, desta forma, uma reviravolta nas conceções do sistema educacional burguês norte-americano que, durante os séculos XIX e XX, utiliza métodos assentes em técnicas de memorização e na transferência do conhecimento. (Pereira, Martins, Alves, & Delgado, 2009).

Pereira et al (Ibid. p. 157) sublinham que Dewey, durante à última década do século XIX e as três primeiras do século XX, inserido numa tendência pedagógica liberal progressista, abre espaço no campo da teoria sócio-educativa pela via de movimentos como a Escola Nova e o movimento ativista. Entre as contribuições de Dewey estão os conceitos de experiência e democracia, que acabam por influenciar os precursores da Escola Nova no Brasil e noutros países.

Entretanto, embora o movimento da Escola Nova tenha se oposto ao modelo tradicional de ensino, este não representa uma ruptura com o modelo de educação vigente, no que concerne à relação política entre educação e sociedade. Segundo estes autores, a sua inovação se dá, fundamentalmente, em termos de método, na forma de trabalhar com o conhecimento.

Cunha (2001) reforça esta ideia, chamando a atenção para o facto de que o contexto em que se desenvolve a Escola Nova é marcado pelo avanço da sociedade capitalista, o que pode explicar as diversas tendências desse movimento pedagógico. Segundo o autor,

nenhum outro sistema de produção e circulação de mercadorias confere tanta ênfase à necessidade e urgência de as pessoas aceitarem alterações na ordem existente. O progresso

tecnológico e as imposições da lucratividade determinam que todos estejam disponíveis para adequar-se às novidades, o que certamente responde pela difusão do tema da transformação constante, levando-o a ocupar posição de centralidade no discurso pedagógico, tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos de John Dewey. (Ibid., p. 98)

A pedagogia deweyana dedica especial atenção aos problemas sociais da época, defendendo que a educação deve ser adequada a uma democracia moderna. Sendo assim, as escolas devem estar vocacionadas para formar as novas gerações para uma sociedade democrática, considerada por ele como a mais elevada forma de organização humana, uma vez que leva os cidadãos a agir livremente e de forma consciente. Para o autor, a escola é um espaço propício para a igualdade de oportunidades e para que os indivíduos exerçam os seus direitos.

Mas para tal aconteça, é necessário que a educação vá de encontro aos interesses dos alunos, valorizando e estimulando a sua aprendizagem a partir da experiência quotidiana, de forma a promover a sua curiosidade natural. Por exemplo, a partir das atividades manuais, considera que é possível ir de encontro à situações-problema para que sejam solucionadas pelos alunos. É, ainda, uma oportunidade para o desenvolvimento do trabalho em equipa e para o exercício da divisão das tarefas entre os participantes, o que permite a cooperação.

Para Dewey, a iniciativa e a independência estimulam a autonomia, consideradas por ele como virtudes das sociedades democráticas, fatores não contemplados pelo ensino tradicional, que valoriza a obediência. Assim, o questionamento e a consequente alteração dos métodos tradicionais, utilizados pelos professores em sala de aula, são imprescindíveis.

Desta forma, a necessidade de uma formação reflexiva por parte desses profissionais, em especial no que se refere às metodologias adotadas, constitui uma prioridade. Por isso mesmo, para além da democracia, a sua pedagogia preocupa-se, igualmente, com o conceito de “experiência”, como fundamento da realidade. Neste sentido, ao defender uma “Escola Ativa”, busca problematizar a relação entre indivíduo e sociedade, disciplina coletiva e interesses individuais, bem como a formação para a liberdade. Sobre o conceito de experiência, Silva (2007, p. 2) considera que, num sentido lato, este leva-o a romper com a sua perspetiva tradicional:

é o vínculo entre o ser vivo e seu ambiente, na dimensão física e social. Dewey investigou a experiência em seu aspecto essencialmente dinâmico: toda a experiência modificada ocorre pelo meio, concepção que leva o autor a admitir a existência de processo contínuo de criação

de conexões e continuidades, propiciando permanentes recriações dos elementos envolvidos. Fundamentalmente, é a experiência que provoca mudanças nas relações do homem com o meio. Defensor da Escola Ativa, Dewey apontou a importância da aprendizagem partindo da experiência. Da crítica à escola tradicional, instauradora de comportamentos de submissão e obediência, o autor propôs uma inversão de valores que considerasse iniciativa, originalidade e cooperação, possibilitando a liberação das potencialidades criativas do indivíduo, objetivando não a mudança social, mas o seu aperfeiçoamento.

É precisamente por defender uma educação assegure uma apropriada transmissão de crenças, ideias, valores e conhecimento, que permitam a continuidade social, que concordamos com a autora que há uma afastamento da proposta de Freire, na sua elaboração acerca da Educação Popular. Da mesma forma, a questão que acima levantamos sobre os paradigmas que estão na base dos processos pedagógicos ganham relevo quando o compromisso da proposta dewiniana sublinha uma aposta na manutenção de uma ordem social, coerente com o pensamento liberal com o qual o autor está identificado.

Apesar disto, Dewey aposta em teorias pedagógicas progressistas, no entendimento de vários autores, no que concerne ao envolvimento do estudante como sujeito no processo de aprendizagem, à reflexão acerca da democracia como valor imprescindível na organização social e à sua defesa aguerrida da escola pública (Gadotti,1993; Luzuriaga,