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Os eixos não foram definidos a priori: emergiram no processo de análise do material produzido no trabalho de campo, nas interações entre os envolvidos, procurando captar não apenas o que ficou explícito, mas “buscando indícios” (GINZBURG, 1999) que evidenciassem as percepções ocorridas. Quando mencionamos “indícios”, estamo-nos referindo ao paradigma indiciário do referido autor, que nos ajuda metodologicamente a investigar, usando pistas, marcas, sinais, que nem sempre são perceptíveis de imediato. Segundo Ginzburg (1999, p. 177), “se a realidade é opaca, existem zonas privilegiadas – sinais, indícios – que nos permitem decifrá-la”. Para essa busca, as conversas com a bibliografia e a leitura de outros textos, na mesma perspectiva, foram fundamentais, assim como a leitura e a revisão cuidadosa dos múltiplos registros realizados durante o trabalho de campo, como gravações de áudio e vídeo, diário de pesquisa e formulários de identificação respondidos pelos participantes do grupo Estatisticando. O processo de construção dos eixos de análise pode ser caracterizado, de acordo com Fiorentini e Lorenzato (2006, p. 135), como emergente-misto, pois emergiram “mediante um processo interpretativo, diretamente do material de campo” e no “confronto entre o que diz a literatura e o que encontra nos registros de campos”.

Com o propósito de analisar o percurso vivenciado pelos participantes do Estatisticado, para explicitar as respostas à questão de investigação: Que indícios de desenvolvimento profissional apresentam os professores e futuros professores da Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamental em contextos colaborativos em práticas de letramento estatístico?, relacionamos as informações com os seguintes eixos de análise:

Eixo 1 – Complexidade do desenvolvimento profissional

Estamos entendendo o desenvolvimento profissional aqui como o “caminhar para a mudança”, de acordo com Ferreira (2003), pensando na evolução. Compõem este eixo dois subitens:

a) Desenvolvimento profissional do professor como desenvolvimento de conhecimento na perspectiva do letramento estatístico;

b) Desenvolvimento profissional do professor como desenvolvimento de si mesmo ou pessoal.

Embora tenhamos descrito esse eixo de forma subdividida, consideramos que estão interligados.

O desenvolvimento profissional, como desenvolvimento de conhecimento na perspectiva do letramento estatístico, considerado fora do contexto, pode ser apontado como mecânico ou relativo à ideia de frequentar cursos, mas, segundo nosso entendimento, o conhecimento é potencializador do desenvolvimento pessoal dos participantes. Para nós, nesse contexto, aprender é “alterar, ampliar/rever/avançar em relação aos próprios saberes, à própria forma de aprender e à prática pedagógica” (FERREIRA, 2009, p. 274). Os professores e futuros professores podem caminhar para a mudança – cuja necessidade se revela na sua própria sala de aula –, ao aliar seus saberes e práticas num contexto colaborativo, para estudar e refletir conjuntamente a partir de suas necessidades e demandas, com auxílio de produções de diversas instâncias (elaboradas por acadêmicos, por professores, pelo governo) e da sua própria produção.

O desenvolvimento profissional do professor como desenvolvimento de si mesmo ou pessoal também envolve toda a pessoa que o professor é, suas crenças, seus pensamentos e atitudes. Esse desenvolvimento também pode ser influenciado, de acordo com Oliveira-Formosinho (2009), pela maturidade psicológica, pelos ciclos de vida e pela dimensão da carreira profissional: nosso grupo tinha participantes de várias idades; sem filhos e com filhos de várias idades; solteiros ou casados; ainda em formação, em início de carreira ou já na aposentadoria.

Assim, tendo como ponto de partida os desafios da prática educativa, num contexto de colaboração formado por uma pesquisadora, professores e futuros professores dos anos iniciais do Ensino Fundamental, almejávamos a produção de conhecimento escolar e docente e o desenvolvimento profissional dos professores.

Eixo 2 – Colaboração: a) Contexto de colaboração.

De acordo com Simão et al. (2009), as pesquisas têm demonstrado que o desenvolvimento profissional (conhecimento, pessoal e curricular) aumenta quando é valorizado um trabalho colaborativo, em que exista interação, compartilhamento de experiências de sucesso e de erro, com relação a contextos em que isso não ocorre. Então estamos entendendo a colaboração e o contexto colaborativo desenvolvido no grupo Estatisticando como potencializadores do desenvolvimento profissional de seus participantes. Consideramos, assim como Ferreira (2009), que juntos aprendemos mais sobre Estatística, sobre o trabalho com os professores, sobre o trabalho coletivo e sobre nós mesmos.

Eixo 3 – Letramento (s):

a) Indícios do letramento estatístico b) Práticas de letramento

De acordo com Rojo (2009), letramento tornou-se um conceito plural, ou seja, devemo-nos referir a letramento(s). Consideramos que o letramento estatístico faz parte do(s) letramento(s), a partir da ideia dos multiletramentos e da preocupação com o ensino a partir das múltiplas demandas do mundo atual. Os encontros do grupo Estatisticando e seu contexto colaborativo podem ser tidos como eventos de letramento em que se constroem as práticas de letramento, pois ali percebemos, nos momentos de discussão e circulação das ideias estatísticas, indícios do letramento estatístico: questionamentos, dúvidas e intervenções com as crianças.

Optamos, como já afirmamos, por narrar a análise do trabalho de campo de forma cronológica e buscando evidenciar os indícios da complexidade do desenvolvimento profissional, do contexto colaborativo e dos letramento(s). As narrativas do trabalho de campo encontram-se no capítulo seguinte.

CAPÍTULO 5

Narrativas do trabalho de campo – contexto de

desenvolvimento num grupo colaborativo

“Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar possibilidades para a sua produção ou a sua construção” (Paulo Freire, 2005, p. 24)

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Durante a composição da narrativa, que ocorreu depois de observar e descrever os dados (vídeos, diário e outros materiais trazidos pelos participantes), foram escolhidos alguns momentos gravados em vídeos, que julgamos importantes. Eles foram transcritos para este capítulo e depois analisados à luz de nosso referencial teórico e dos eixos de análise. Buscamos evidenciar, ao longo da narrativa, os processos de desenvolvimento profissional na perspectiva do letramento estatístico em contextos colaborativos do grupo Estatisticando.