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Parte I – Quadro Teórico

CAPÍTULO 3 – SUSTENTABILIDADE

3.3. Desenvolvimento Sustentável

3.3.1. Emergência histórica do conceito

O surgimento do conceito de Desenvolvimento Sustentável está, intimamente, associado à tomada de consciência e à crescente preocupação com os impactos nefastos decorrentes da intervenção do Homem na Natureza.

Revisitando a história mundial, são abundantes os exemplos que evidenciam esta preocupação com as consequências que advém do uso indiscriminado da Natureza pelo Homem. No início do século XVIII, antes mesmo da Revolução Industrial, os governos de países como a Grã- Bretanha, França e, sobretudo, a Alemanha, reconheceram que o consumo excessivo de madeira, por ser a principal fonte de combustível e a matéria-prima de excelência para a

construção, a fundição e a construção naval, estava a tornar-se insustentável (Blewitt, 2015:6). A pouco e pouco esta inquietação foi abrindo caminho ao que atualmente se entende por ciência da ecologia, ao conceito de Sustentabilidade e à pratica do Desenvolvimento Sustentável, ainda que à altura o seu reconhecimento conceptual e científico fosse praticamente inexistente. Paralelamente, o conceito de Sustentabilidade tornou-se no termo- chave, ou por outras palavras, no princípio de atuação para os grupos e associações ambientalistas que se foram formando, ainda no século XIX, pelos vários cantos do mundo, destacando-se a “Commons, Open Spaces and Footpaths Preservation Society (1865) [e a] East Riding Association for the Protection of Sea Birds (1867) [na Grã-Bretanha] [...] e a fundação do Sierra Club (1892) [nos EUA]” (Soromenho Marques, 1998:4).

Apesar dos inúmeros movimentos sociais relatados ao longo dos séculos XVIII, XIX e XX, cuja existência se centrava nas preocupações ambientais, a verdade é que a sociedade era ainda dominada, como já mencionado, pelo espírito industrial, onde a produção e o consumo imperavam e o ambiente era subvalorizado. De tal forma que, só em 1970, nos EUA, é que, segundo Blewitt (2015), se realizou o primeiro evento ambiental com algum impacto tanto a nível social, como público e cultural. Em parte, este impacto foi justificado pelo evento ter ocorrido, imediatamente, a seguir à discussão das Nações Unidas sobre a necessidade da existência de um feriado a nível mundial, o Dia da Terra, que captou a atenção geral para a degradação ambiental como nunca havia sido conseguido antes, deixando todos mais alerta para as questões ambientais.

Contudo, é passado dois anos, em 1972, que esta problemática começa a ganhar destaque científico e político. Por um lado, por ter sido o ano da publicação do estudo Limites para o crescimento (Meadows et al, 1972), desenvolvido pelo grupo de reflexão conhecido como o Clube de Roma, por outro, por ter sido o ano em que se realizou, em Estocolmo, a primeira discussão internacional sobre a problemática do ambiente, pela Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano – Conferência de Estocolmo.

Através do estudo Limites para o crescimento o Clube de Roma deu a conhecer ao mundo o lado mais negro do progresso industrial, considerando-o insustentável a curto-prazo. Dado o aumento tendencial da população e das suas respetivas necessidades, era urgente tomar medidas que contrariassem o consumo desmedido e despreocupado de recursos naturais, que vinha sendo feito, motivado pelo princípio subjacente às sociedades industriais de produzir sempre mais. Consciente da possível extinção, em poucos anos, dos recursos da Terra, o Clube de Roma, rejeitou uma solução tecnológica, por si só, na busca de um desenvolvimento sustentado dos países, defendeu antes uma articulação entre desenvolvimento e meio

ambiente, onde ambos os elementos fossem respeitados e valorizados (Meadows et al, 1972:192). A Conferência de Estocolmo (1972) conseguiu, por sua vez, reunir pela primeira vez, na história, os Estados-Membros das Nações Unidas para debaterem as questões ambientais direcionadas para o “meio ambiente humano” (Rist, 2008:180).

Apesar da evolução sem precedentes da ciência e da tecnologia, que permitia ao Homem transformar, de inúmeras maneiras, todo o meio ambiente que o cercava, ficou consagrada nesta Declaração a importância da existência não só do meio humano artificial, como do meio humano natural, para o bem-estar do Homem e para o usufruto dos direitos humanos fundamentais (ONU, 1972:3). Sem descura o crescimento económico, considerado indispensável para o desenvolvimento dos países, sobretudo para os subdesenvolvidos, o meio ambiente ganha a partir desta altura uma importância nunca antes alcançada.

Numa assumida articulação entre crescimento económico e Sustentabilidade ambiental, a proteção e o melhoramento do meio ambiente humano tornou-se numa questão fundamental, por afetar tanto o bem-estar dos povos, como o desenvolvimento económico do mundo inteiro. Foi, neste sentido e a partir deste encontro, que se fez notar um conceito, que hoje se pode considerar como precursor do Desenvolvimento Sustentável, dados os seus fundamentos, o Ecodesenvolvimento. Este conceito antecipava um desenvolvimento com especial preocupação tanto com a sobrevivência das gerações presentes, como com as gerações vindouras. Mais concretamente, alertava para a necessidade de os recursos naturais da Terra, incluindo o ar, a água, a terra, a flora e a fauna e, especialmente, as amostras representativas dos ecossistemas naturais, serem preservados em benefício das gerações presentes e futuras, mediante uma cuidadosa planificação ou ordenamento (ibidem:4). Ao mesmo tempo que recomendava que os recursos não renováveis da Terra fossem cuidadosamente empregados, evitando o seu esgotamento futuro e garantindo que toda a humanidade compartilhava dos benefícios da sua utilização.

O conceito de Desenvolvimento Sustentável propriamente dito é, habitualmente, atribuído ao Relatório O nosso futuro comum, elaborado pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, também conhecida como Comissão de Brundtland, quinze anos mais tarde, em 1987. Porém, Baroni (1992) defende que este reconhecimento começou em 1980, quando a União Internacional para a Conservação da Natureza apresentou uma Estratégia de Conservação Mundial, com o objetivo de promover o Desenvolvimento Sustentável, através da conservação de recursos vivos e que apesar das críticas acabou por receber o apoio do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente. Foi, então, popularizado por esta organização como um conceito dirigido para os mais pobres, assente na ideia de

desenvolvimento autossustentado, dentro dos limites dos recursos naturais, com custo real, usando critérios económicos não tradicionais e com vista à criação de iniciativas centradas nos indivíduos.

Mais tarde, em 1986, a Conferência de Ottawa volta a abordar esta temática e apresenta o que considerou serem os cincos requisitos basilares a que o conceito de Desenvolvimento Sustentável procurava dar resposta: “integração da conservação e do desenvolvimento; satisfação das necessidades básicas humanas; equidade e justiça social; provisão da autodeterminação social e da diversidade cultural; e manutenção da integridade ecológica” (ibidem:16).

Finalmente, em 1987, a Comissão Brundtland apresenta no seu Relatório o conceito de Desenvolvimento Sustentável, que passou a ser reconhecido e assumido pelas principais organizações mundiais como o processo que procura satisfazer as necessidades e as aspirações do presente sem comprometer a capacidade de satisfazer as necessidades e as aspirações das gerações futuras (WCED, 1987). Nesta nova definição é suprimido o requisito da equidade e justiça social, estabelecido originalmente em 1986 na Conferência de Ottawa, e são definidos sete novos objetivos: crescimento renovável; mudança na qualidade do crescimento; satisfação das necessidades básicas através do emprego, comida, energia, água e saneamento básico; garantia de um nível sustentado de população; conservação e proteção da base dos recursos; reorientação da tecnologia; e reorientação das relações económicas internacionais (ibidem).

Assente na ideia da solidariedade intergeracional, esta abordagem tornou-se numa referência do Desenvolvimento Sustentável, constituindo uma verdadeira inovação a diferentes níveis.