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2. DA LUDOTERAPIA NÃO-DIRETIVA À LUDOTERAPIA CENTRADA NA

3.3. O pensamento ético levinasiano e a psicoterapia na ACP

3.3.2. Aproximações entre a ética levinasiana e a ACP

3.3.2.2. ACP como um encontro “Tu-Eu” em Schmid

3.3.2.2.6. Empatia – A arte de não saber

A empatia, para Schmid (2001b), é a capacidade básica do ser humano e, como atitude inerente ao encontro, não só na psicoterapia, mas além dela, englobando qualquer relação desenvolvida entre duas pessoas. Originário da estética e do entendimento de trabalhos de arte, o termo empatia aqui é entendido como a transferência do meu modo de compreensão das coisas, dos meus sentimentos para a obra de arte. Etimologicamente, empatia64, vem do grego en “em” e phatos “sentimento”, significando o “entrar na dor e tristeza do outro e lá permanecer” (SCHMID, 2001b, p. 2, grifo no original, tradução nossa)65. A empatia abordada aqui é diferente de simpatia66 (originada como “sym-pathein”), que significa “sofrer junto” (SCHMID, 2001b, p. 2). A empatia, necessariamente, precisa ter componentes: um mínimo de contato pessoal e a intenção de acompanhar o outro.

A empatia é, como Rogers (1977[1967]) informou, uma característica da personalidade de quem a expressa. Schmid (2001b) a denomina de qualidade inata pessoal e informa que ser empático ultrapassa a identificação e a interpretação. A outra pessoa é vista, então, em sua alteridade, absolutamente diferente de mim, excedendo qualquer representação que minha consciência representacional faça dela. É o que Lévinas (1988[1982], p. 77) chama de acesso ético ao Rosto: “a relação com o rosto pode, sem dúvida ser dominada pela

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Em Abbagnano (2007, p. 325): “União ou fusão emotiva com outros seres ou objetos. […] A reprodução das manifestações corpóreas alheias reproduziria em nós mesmos as emoções que costumam acompanhá-las, colocando-nos assim no estado emotivo da pessoa a quem essas manifestações pertencem. É justamente essa projeção em outro ser de um estado emotivo despertado em nós pela reprodução imitativa da expressão dos outros”.

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[…] to enter somebody’s pain and grief and stay there.

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Em Abbagnano (2007, p. 901): “Ação recíproca entre as coisas e sua capacidade de influência mútua. […] Com o declínio da magia no mundo moderno, o significado de simpatia limitou-se a indicar o a comunhão de emoções entre os indivíduos humanos. […] Scheler distinguiu-a dos fenômenos afins, mas não idênticos, especialmente daquilo que ele chama de contágio afetivo ou fusão afetiva. A fusão emotiva consiste em ter a mesma emoção de outrem […]”.

percepção, mas o que é especificamente rosto é o que não se reduz a ele”. Quando sou empático, me coloco, sem uma intenção específica67, no lugar do Outro, em um campo de referência da outra pessoa.

Aqui, Schmid (2001b) acentua a importância do “como se”, amplamente descrito na obra rogeriana. E a importância de considerar o “como se” afasta a possibilidade de identificação (sentir da mesma maneira que o outro e, portanto, dissolver-se em suas próprias emoções, perdendo-se das experiências do outro) e de interpretação (julgamento dos pensamentos, sentimentos e expressões do outro de maneira a formar uma avaliação sobre o esquema de referência do outro, objetivando-o para mim) da experiência do outro. Uma relação desenvolvida a partir da identificação ou da interpretação deixa de ser uma relação pessoa a pessoa e nos remete à palavra princípio buberiana Eu-Isso, uma relação égotica na qual o primado está na instauração do “vínculo objetivante, lugar e suporte da experimentação, do conhecimento, da utilização [...]” (VON ZUBER, 1984, p. 77). Portanto, na psicoterapia, o encontro que acontece não se dá “entre um cientista e seu objeto de investigação [...] mas, ao contrário, realiza-se entre duas pessoas mediadas pela relação de ajuda” (VON ZUBER, 1984, p. 76, grifo nosso). Ainda, a identificação, segundo Schmid (2001b), gera uma situação em que a pessoa é ignorada, a partir de negação de atenção por parte de quem escuta. A interpretação nega a singularidade do outro.

A pré-condição essencial para a empatia (SCHMID, 2001b) é a escuta ativa, uma atenção refinada, prestando atenção, além do que a pessoa fala, para o que ela está tentando expressar. O ponto decisivo é a tentativa de aproximação da experiência do outro, da forma como ele vive, o não o sucesso da psicoterapia, a chegada a um objetivo, o conquistar algo. A empatia não visa à adivinhação e nomeação do que a pessoa está expressando. Ao invés disso, a empatia se dá como movimento, como verificação contínua e conjunta entre terapeuta e cliente. Um deles, o terapeuta, disponibiliza-se para que o outro possa tomá-lo como um “alter ego”.

Aqui, o ponto não é fazer com que algo se torne consciente para o outro, mas um convite para que a outra pessoa compreenda-se melhor. Entrar sensivelmente no mundo do outro, respeitando a sua experiência com a ausência de julgamentos prévios, poder participar da experiência da outra pessoa, tornando-se um companheiro confiável e presente na caminhada dessa pessoa. Isso é uma forma de comunicar-se com o outro, através da simbolização, que pode acontecer tanto na verbalização como de maneira não-verbal

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Empatia exercida dessa forma mesmo no momento da psicoterapia, em que haveria, por assim dizer, um “foco”, um “objetivo”.

(SCHMID, 2001b). Aqui, temos um ponto pertinente para discutirmos sobre a forma de comunicação com a criança empaticamente, já que sua forma de comunicação é diferenciada da comunicação adulta. É quando podemos recorrer a recursos expressivos diferenciados da fala, como o trabalho com o corpo, a pintura, a modelagem etc., para que a criança encontre outros meios para expressão em sua alteridade.

Nesse processo de acompanhar o outro nos seus conteúdos, desejos e sentimentos, devo ser impressionado, desalojado e, então, devo expressar a mim mesmo. Se a empatia significa comunicação com o Outro, é necessário que a pessoa empática desenvolva essa atitude também para consigo. A comunicação do que se entende do mundo interno do outro, nessa perspectiva, não significa somente compreensão, mas também um convite para que o outro dê continuidade ao processo de diferenciação e compreensão de si próprio. O apoio proporcionado pela pessoa empática possibilita que o outro acesse suas próprias experiências com menos medo e se envolva numa espécie de “diálogo” com ele mesmo (SCHMID, 2001b).

3.3.2.2.7. Consideração Positiva Incondicional como Habilidade de resposta (“response