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Ludoterapia Centrada na Criança de Landreth

2. DA LUDOTERAPIA NÃO-DIRETIVA À LUDOTERAPIA CENTRADA NA

2.3. Ludoterapia Centrada na Criança – Desenvolvimento e uma nova inteligibilidade a

2.3.6. Atendimento infantil na Fase Pós-rogeriana e Pós-axlineana (1997 – dias atuais)

2.3.6.1. Ludoterapia Centrada na Criança de Landreth

Garry Landreth é professor da University of North Texas e fundador do Center for Play Therapy. Já escreveu diversos livros e artigos sobre ludoterapia, assim como orientou ludoterapeutas ao redor do mundo (BAGGERLY, 2005). Escrito em primeira pessoa, a obra

Play Therapy (LANDRETH, 2002[1991]) trata sobre a relação entre terapeuta e criança. Ao

invés de técnicas de atendimento, o ludoterapeuta deve demonstrar seu profundo compromisso com a criança e sua capacidade de crescimento, maturidade, resiliência e auto- direção.

Só podemos aprender sobre a criança, Landreth (2002[1991]) alerta, a partir delas próprias. O autor lista os antecedentes que fomentam as atitudes do ludoterapeuta centrado na criança e que listamos a seguir. Crianças: 1) não são adultos em miniatura; 2) são pessoas; 3) são únicas e dignas de respeito; 4) são resilientes; 5) têm uma tendência para o crescimento e maturidade; 6) são capazes de auto-direção positiva; 7) têm como linguagem natural o brincar; 8) têm o direito de permanecer em silêncio; 9) levam a experiência terapêutica para onde precisam; 10) não precisam ter seu crescimento acelerado.

O que faz a diferença significativa no comportamento da criança, para Landreth, é a percepção desta sobre si própria. Cada criança possui uma visão sobre si mesma e esta visão é a realidade para ela. Essa visão provê a base para o funcionamento da criança em suas

contribuem como agentes de mudança, facilitando sessões de Ludoterapia Centrada na Criança com seus próprios filhos. Essas sessões são supervisionadas pelo ludoterapeuta com treinamento em Filial Therapy (GUERNEY, 2001).

experiências. Assim, a teoria da personalidade centrada na criança, baseada na teoria da personalidade descrita por Rogers (1992[1951]), seria estruturada em três construtos:

1) A pessoa – tudo que a criança é: pensamentos, comportamentos, sentimentos e o seu ser físico. Portanto, a criança deve ser compreendida como um sistema total. Esse sistema mantém-se em constante esforço em direção à atualização do eu (self). Essa visão está consonante com a teoria da personalidade em Rogers (1992[1951]);

2) Campo fenomenal – tudo que a criança experiencia, consciente ou inconscientemente, interna ou externamente. O que a criança percebe acontecendo é a realidade para esta criança. Logo, “[...] a percepção da criança de realidade é o que deve ser compreendido se se quer compreender a criança e seus comportamentos” (LANDRETH, 2002[1991], p. 62). O comportamento da criança sempre deve ser visto através desta. Dessa forma, julgamentos de valor sobre seus comportamentos são evitados e o ludoterapeuta deve entrar em contato com a criança e com seu campo fenomenal.

3) Self – A partir do contato com as pessoas-critério, com o meio e o campo fenomenal, a criança inicia a diferenciação das experiências, formando o self. Quanto mais o bebê se desenvolve, uma parte de seu mundo total diferencia-se e torna-se “eu”, “mim” (ROGERS, 1992[1951]). O self cresce e muda como resultado da contínua interação com o mundo e com outras pessoas, interação essa mediada pelo seu campo fenomenal.

As condições abordadas por Landreth que propiciam crescimento são as condições facilitadoras descritas por Rogers (1992[1957]). Apesar de essas condições já terem sido amplamente descritas anteriormente, sinalizaremos a forma como Landreth as compreende. A primeira condição descrita por Landreth é a necessidade de ser real, o que implica que o terapeuta tenha um alto grau de auto-compreensão, auto-aceitação, sendo congruente com o que ele sente e expressa na relação com a criança. A segunda condição trata do estabelecimento de uma relação calorosa e de aceitação – aqui o autor ressalta a necessidade de que essa aceitação inicie-se do terapeuta para consigo mesmo. Só então ela pode acontecer do terapeuta em relação à criança. Outra característica é a de que o terapeuta realmente cuida da criança quando estabelece com ela um contexto de não julgamentos ou avaliação. A última condição é a de que o terapeuta desenvolva uma compreensão sensível frente à criança. Essa compreensão ocorre quando o terapeuta põe de lado suas expectativas e

experiências para dar espaço à pessoa da criança; requer do terapeuta um alto grau de interação emocional com a criança; aqui, o terapeuta exercita entrar no mundo interno da criança “com se” fosse ela, uma postura além do reflexo de sentimentos.

A concepção de psicoterapia desenvolvida por Landreth (2002[1991]) parte dos princípios básicos propostos por Axline (já descritos em tópico anterior) e privilegia a relação: “em ludoterapia centrada na criança, a relação, e não a utilização de brinquedos ou a interpretação dos comportamentos, é a chave para o crescimento” (p. 86)18. O autor esboça essa relação da seguinte forma:

Pessoa da criança ... ao invés do ... problema Presente ... ao invés do ... passado

Sentimentos ... ao invés do ... pensamentos e ações Compreensão ... ao invés de ... explicação

Aceitação... ao invés de ... correção

Direção da criança ... ao invés de ... instrução do terapeuta

Sabedoria da criança .. ao invés do ... conhecimento do terapeuta (LANDRETH, 2002[1991], p. 86, tradução nossa)19.

A partir do exposto, Landreth enumera as dimensões terapêuticas da relação desenvolvida com a criança na LCC: a crença na criança e o respeito aos seus limites; a aceitação da sua vontade; a escuta do interior da criança; o foco em suas necessidades; a liberdade para determinar a direção a ser vivenciada pela criança; a oportunidade para que ela faça escolhas; paciência com o processo.

Os objetivos esperados na LCC, segundo Landreth (2002[1991]), têm como ênfase a facilitação dos esforços da criança para enfrentar e resolver os atuais e futuros problemas que se apresentem para ela. A LCC deve ajudar a criança no aprendizado de uma liberdade expressiva responsável; de auto-respeito e auto-direção; da aceitação de seus sentimentos e no controle responsável destes; da responsabilização por si mesma; da busca de criatividade e recursos para o enfrentamento e resolução dos seus problemas.

Landreth afirma que a atmosfera da sala de atendimento tem uma grande importância, já que é ela que inicialmente impacta a criança. A sala deve comunicar claramente que “é um lugar de criança” (LANDRETH, 2002[1991], p. 125). Toda a sala, desde a sua estrutura até a disposição dos materiais, deve denotar que a criança está livre para explorá-la da forma que considerar conveniente.

18

In child-centered play therapy, the relationship, not the utilization of toys or the interpretation of behavior, is the key to growth.

19

Person of the child ...rather than... problem; present ...rather than... past; feelings ...rather than... thoughts or acts; understanding ...rather than... explaining; accepting ...rather than... correcting; child’s direction ...rather than... therapist’s instruction; child’s wisdom ...rather than... therapist’s knowledge.

O autor sugere que o espaço físico da sala deve estar localizado de tal maneira que a criança possa ser barulhenta (se necessário), sem incomodar quem não está no atendimento. Uma sala à prova de som, no entanto, se constitui como algo fora da realidade. O tamanho da sala deve ser grande o bastante para acomodar um grupo de, no máximo, três crianças. Em espaços maiores, o terapeuta precisaria “perseguir” a criança pela sala no sentido de estar próximo dela.

Os materiais e brinquedos que compõem a sala são importantes para a expressão dos sentimentos da criança de forma mais completa. Assim, a escolha dos materiais, dos jogos, dos brinquedos, é um aspecto muito importante para a composição da sala. A regra a seguir, nesse caso, é a da seleção ao invés do acúmulo. Para a seleção dos brinquedos e materiais da sala, o ludoterapeuta deve ter algumas questões como critério. Eles (os brinquedos e materiais) possibilitam: propiciar uma vasta gama de expressões criativas e emocionais; despertar o interesse da criança e facilitar a brincadeira exploratória e expressiva; permitir a exploração e a expressão sem verbalização; ser exitosos sem necessidade de estruturação e prescrição do terapeuta; dificultar que a criança brinque de maneira evasiva. Outro ponto ressaltado por Landreth (2002[1991]) é de que o brinquedo tenha estrutura forte, que permita o uso progressivo, sem quebrar facilmente.

Os brinquedos selecionados pelo terapeuta devem atender a determinados objetivos que são indispensáveis na prática da ludoterapia, a saber: o estabelecimento de uma relação positiva com a criança; a possibilidade de uma ampla expressão de sentimentos; a exploração de experiências relacionadas à vida real da criança; a testagem da realidade sobre os limites; o desenvolvimento de uma auto-imagem positiva, de auto-compreensão e de auto- controle.

As crianças normalmente são dependentes de um ou mais adultos (geralmente os pais), que decidem sobre ela e sobre sua entrada no processo de ludoterapia. O ludoterapeuta deve levar em consideração alguns aspectos sobre a relação a ser estabelecida com os pais. Outros pontos a serem considerados são as novas estruturas familiares ocasionadas pelos divórcios, pelo aumento da quantidade de pais solteiros, pelas mudanças nos papeis familiares, dentre outras motivações. Dessa forma, para atender à criança é necessário compreender que os pais também precisam de assistência e informação.

A partir do informado por Landreth (2002[1991]), as noções que sustentam a teoria e metodologia de ludoterapia proposta pelo autor repousam na teoria da personalidade da TCC desenvolvida pelo Rogers da Fase Reflexiva e nos princípios de Axline (1984[1947],

1993[1969]). Landreth também reconheceu a influência do trabalho de Moustakas em sua proposição de LCC (BARGGELY, 2005).