• Nenhum resultado encontrado

Capítulo I Da Educação aos Agentes Educativos

1.6. A Energia Emocional Olhos nos Olhos

A primeira tarefa da Educação é aprender a enxergar" Ruben Alves

Pela dificuldade na sua investigação, e pela complexidade dos seus processos de desenvolvimento, as emoções fixaram-se como um dos fenómenos mais controversos. Esta complexidade não se vem restringindo ao âmbito teórico e científico mas também a nível relacional do tecido Educativo.

Mas é preciso resgatar a ideia, de que, para que a Escola se renove, nomeadamente a partir do seu capital humano, e crie oportunidades para o encontro com o novo, é preciso imbuir-se de um etos de curiosidade e descoberta, como um percurso de aprender a aprender, que tem em essência, a marca afectiva dessa experiência, que por sua vez emerge da tonalidade valorativa emocional. A nossa aprendizagem é selectiva

71 Nesta obra, o autor, no momento dos Agradecimentos assume: «a Peter Salovey, da Universidade de Yale, fiquei a dever o conceito de inteligência emocional» (p.363)

(LeDoux , 2000), e modulada pela «filtragem afectiva» (Karli, 1995) que o sujeito produz na atribuição dos significados e do simbolismo, pelo que cabe também lembrar à educação, que o que fica, é o residual, a essência. Se o aluno conseguir reter a essência, impregnada de uma tonalidade emocionalmente positiva, este voltará ao assunto, porque

«os estados afectivos orientam a recolha de informação, ao mesmo tempo que facilitam o armazenamento das informações» (Karli, 1995: 142) podendo fazer novas abordagens aos

conteúdos, e reaprendizagens estimuladas por um tipo de curiosidade, animada pela alegria ou pela ansiedade. E essa será a melhor arma para as descobertas do saber, que derrotam de vez a cegueira e os reducionismos.

Aprender (Marques Teixeira73, 1997) é um processo, cujo contributo valorativo

emocional da experiência - e nesta, a intensidade emocional atribuída aos estímulos - se constitui como variável, que pode modificar o nível da aprendizagem, como produto. Aprendemos não só mas também, com o contributo de sistemas de memória sensorial, através dos quais os estímulos nos impressionam (Marques Teixeira74, 1997). O valor e a

tonalidade emocional atribuídos a estes estímulos, poderão determinar se estas apreensões se tornam transitórias ou permanentes. A não utilização dos factos (estimulantes ou não) apreendidos, desencadeia formas de "aprender a esquecer" o que se aprendeu, e ou a recordar selectivamente (LeDoux, 2000: 221). Retemos o que mais nos impressiona, e é este conjunto de dados que se guarda: a vivência, a essência. A aprendizagem dos conteúdos dos livros não é só o que fica, mas também e sobretudo a relação emocional que os alunos estabelecem com essa aprendizagem, através da interacção simbólica que foi (se foi) assim desenvolvida. E são os sentimentos e as emoções que sustentam os comportamentos do professor, que irão plasmar nos alunos os estados afectivos - ou não - necessários para estimular a aprendizagem. E o que se passa internamente, na pessoa do professor? Que contextos emocionais o envolvem? Como estão a ser geridos?

LEDOUX, quando defende que a memória é selectiva, dá ênfase à nossa capacidade de retenção dos estímulos percebidos como "mais competentes" pelo sujeito; donde defender que nem todos os pormenores de um acontecimento são apreendidos por nós da mesma maneira, ao contrário, «o aperfeiçoamento da

memória produzido pela activação emocional, pode afectar alguns aspectos mais do que outros» (p.221), o

que reforça o impacto das memórias emocionais em detrimento das memórias explícitas.

MARQUES TEIXEIRA, neste documento, ao contextualizar a aprendizagem e a memória como mecanismos adaptativos, define-as como «a capacidade que possuem os organismos vivos de adquirir, reter

e utilizar um conjunto de informações ou de conhecimentos». Considera que aprendizagem se refere ao «processo de adaptação do comportamento à experiência», e a memória refere-se aos «registos permanentes que estão na base desta adaptação»; conceitos que neste trabalho têm importância, dado que

as experiências emocionais e os respectivos aspectos valorativo e adaptativo podem constituir-se como variáveis a considerar na aprendizagem.

O autor aborda o contributo e a eficácia dos Sistemas sensoriais, como contributos de aprendizagem, já que durante um brevíssimo espaço de tempo retêm a informação recebida, de tal modo que o organismo tem hipótese de a codificar em memória permanente, através de processos de codificação e transformá-la em memória de longa duração (MLD) e memória permanente

problemas "...produzindo, também, apenas impactos negativos..." (p.172), que por exemplo relativamente ao cônjuge, desencadeiam "distanciamento, frieza e conflitos'" (p.171), e que este conjunto de vivências emocionais interiores é muito difícil de gerir, ocasionando perturbação intra e inter relacional, seja na escola ou no ambiente familiar. O principal problema é que este não controlo emocional poderá interferir nas relações sociais, desencadeando, através do efeito de contágio emocional (Goleman, 1995), inclusivamente, alteração dos processos emocionais de outros indivíduos que com estes professores convivam, e nomeadamente nos alunos.

Uma pessoa que demonstra medo excessivo ou angústia, ou que convive frequentemente com a frustração, pode propagar em outras pessoas as mesmas tonalidades emocionais. Interagir em grupo revelando comportamentos de "Indefensão aprendida" (Seligman, 1983; Bisquerra Alzina, 2000)75, passa a exportar mensagens de desmotivação

para agir, contamina os outros com tonalidades emocionais que fundamentam o desencorajamento. Todos os componentes corporais podem ser protagonistas de emissão e recepção deste tipo de mensagens, mas a voz e o olhar têm aqui um sério protagonismo, pelo controlo volitivo que temos sobre estes comportamentos, mas sobretudo pelo que não temos. Quantas vezes, apesar de não querermos, se alterou o volume ou o tom de voz, e manchámos o discurso com a tonalidade emocional que queríamos ocultar?

A Oralidade... Deixar Fluir a Emoção

Comecemos pela linguagem. A produção dos sons da linguagem resulta da convergência de intenções comunicativas múltiplas, originadas também em diferentes regiões do cérebro. Os processos emocionais estão aqui envolvidos.

Pode alterar-se o estado emocional de uma pessoa com um simples olhar de arrogância ou desprezo, uma expressão mímica ou com o tom de voz implícito na prosódia (Besson, 200376) de uma resposta ou frase, o que Caldas77 (2000) corrobora e explora nos

seus trabalhos.

Os autores referem-se ao efeito do síndroma de Indefensão aprendida, como a desmotivação geral para actuar quando a pessoa é sujeita a sucessivas experiências, cujos resultados (desejados e sucessivamente não obtidos) não dependem do seu comportamento voluntário.

76 A investigadora apresentou uma pesquisa levada a cabo no Institut de Neurociences Physiologiques e Cognitives, Marseille, tendo sido defendido: Há uma relação directa entre os níveis de processamento de linguagem, especificamente entre prosódia e semântica, e que a prosódia é de grande importância para a

A este propósito Damásio (2000: 109-118) defende que o relato verbal é uma das manifestações externas da consciência, mensurável e identificável, e que «nada mais é de

que uma variante do comportamento» (p.l 12). Damásio defende que as palavras que

pronunciamos, estão envolvidas de «uma inflexão de fundo - um dos aspectos da prosódia

- de natureza emocional (...) que consiste no acompanhamento musical ou tonal dos sons que constituem as palavras.» (p.l 17). Para clarificar, o autor acrescenta que «a prosódia pode exprimir não apenas as emoções de fundo, mas também algumas emoções específicas» (p.l 17), e exemplifica que não é o conteúdo do fonema em si, mas o tom e a

inflexão que colocamos na falácia, o que determina a intencionalidade e a orientação emocional do nosso discurso. Como «determinadas emoções se sucedem a estímulos ou

acções que claramente os motivam, o que é possível verificar na perspectiva do observador» (Damásio 2000: 117), o que significa que estamos perante um tipo de

diálogo, em que a mensagem expressa, transporta uma outra, que de facto pode alterar a intenção e a motivação de quem a emite e a recebe. Este fenómeno é importante na relação humana e mais ainda na relação educativa.

E neste sentido que a oralidade é uma das componentes essenciais, usada pelo e no corpo, para expressar as tonalidades emocionais, e como tal serem percepcionadas pelo receptor. Desde os primeiros meses de vida, e ao longo dela, os seres humanos captam e emitam sinais emocionais através de algumas variáveis que inserem as suas produções discursivas. A voz modifica-se de forma evidente perante os estados emocionais que se estão a sentir, e como tal é uma forma condutora de intencionalidade e de impacto: usamos a voz para chamar a atenção, para acalmar ou sugerir o clima relacional que se quer criar, quando estamos a comunicar. E é aqui que a prosódia faz sentido.

Tal como Caldas (2000) defende, que além do «enquadramento semântico, de

onde retiramos os conceitos que estamos a codificar em linguagem», para darmos

significado ao que queremos comunicar, «a prosódia do discurso pode exprimir o estado

de humor, mas também é a forma de produzir intenções comunicativas, sendo a forma interrogativa, talvez a forma mais clara dessa intenção» (p.225), pelo que o professor na

sua relação pode, com consciência ou sem ela, emitir mensagens emocionais.

compreensão da linguagem. Segundo os resultados, neste processo emerge a tonalidade emocional, para a estruturação da complexidade e da sintaxe, sobretudo em frases de natureza ambígua e ou complexa.

CALDAS, no estudo acerca da linguagem, na afasia, considera que esta componente discursiva, a prosódia, se pode analisar «através da melodia, da inflexão, do ritmo e do timbre» (p.l70) da produção do discurso que o sujeito emite.

O autor estuda os processamentos da linguagem oral e nesta temática, foca a «análise da fluência do

discurso proposicional espontâneo: aquilo que mais impressiona no primeiro contacto». Mas também

efectuados, em salas de aula para observar a gestão pedagógica, verificaram que as atitudes de professores bons gestores, incidiam maioritariamente nos seguintes pontos:

- Gostar de ser professor, e que este "gostar", se transmitiria pelo tom de voz, o que além de acentuar a designação de "utensílio pedagógico" que Vigotstsky (1962, in Canavarro, 1999) lhe atribuiu, corrobora o efeito de prosódia já apresentado (Besson, 2003; Caldas, 2000).

Mas além da voz, também as expressões faciais e o olhar são importantes. Neste ponto convém referir que o rosto, pela expressão, é por excelência, o lugar do corpo em que as emoções sociais têm possibilidade de ser exibidas, e portanto observadas e percepcionadas. Raramente os professores conseguem ter rapidamente a noção exacta dos contornos e dos ritos faciais na exibição das tonalidades emocionais. Mas no momento em que estão a experienciá-las, estão a emitir sinais dessa tonalidade, que os alunos, pela capacidade empática de que estão ontogénicamente dotados (Goleman, 1995) fazem leituras e percepções, como é explicado e ilustrado através do efeito de contágio emocional (Goleman, 1995, 1999; Damásio 2000 e Bisquerra Alzina, 2002).

- Conhecer individualmente os alunos, criando, assim, além duma relação pessoal, também uma posição favorável à aproximação, e dando-lhes a oportunidade dos "alunos

gostarem deles, e por isso serem imitados", (Lopes, J. A. 2003: 145) o que corrobora os

pressupostos de atribuição de características de modelo, já apresentadas nos anos 70 e 80 na teoria de aprendizagem social (Bandura, 1977, 1986).

- Mostrarem-se credíveis aos olhos dos alunos mas no sentido da congruência rogeriana, e da sintonia comunicacional, revelando nas atitudes e comportamento o que a falácia expõe, fortalecendo ainda mais as ideias defendidas por Goleman (1995, 1999) relativamente à energia das tonalidades emocionais, e sua importância nas relações

A Aprendizagem, ou seja a modificação da estruturação do meio e do comportamento de um sujeito, com o objectivo de melhorar esse meio, não é um processo só cognitivo, mas também emocional. Educador e educando, formador e formando, vão construindo consciente e ou inconscientemente, na sua interacção, um relacionamento que apesar de normativo, está impregnado de energia emocional. E esta emocionalidade que pode desencadear a energia motivacional - ou não - tanto para a "ensinagem" (Lopes,

O autor, faz referência à mediação cognitiva no processo de aprendizagem social, defendendo que a atenção, a retenção e a motivação (em termos de expectativa) são processos a ter em conta, para a aprendizagem que o sujeito faz da observação dos outros.

2003) como para a aprendizagem, e sobretudo para as atribuições causais que ocorrem em cada momento dos processos.

Assim, é de essencial relevância focalizar a atenção no tipo de tonalidade emocional que está implícita ao gestual, às palavras e à postura, que o professor assume no acto educativo.