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do ensino básico português 1 Adelinda Candeias 1 , Nicole Rebelo 2 , Diana Varelas 2 & António Diniz

2. Enquadramento conceptual

Assume-se, em muitos contextos educacionais, que o bom desempenho dos alunos é indicador do funcionamento ótimo dos diversos fatores que influenciam o ambiente escolar. A par disso, percebeu- se que os alunos operam mediante dois modos fundamentais: o cognitivo e o afectivo. O primeiro, que está linearmente associado ao desempenho e sucesso académico, recebeu, durante muito tempo a atenção dos investigadores e dos próprios agentes educativos. O segundo, onde estão incluídas as atitudes e os valores do aluno face à escola, foi negligenciado até se perceber que também ele possuiria um papel determinante na compreensão do rendimento académico (Thornburg, 1985). A atitude é uma predisposição emocional interna e, por isso, não observável directamente, para agir de certo modo em relação a outra pessoa, objecto ou ideia, de forma a permitir uma organização de conhecimentos (Stratton, 2003; Thornburg, 1985) que, teoricamente, é explicada mediante três dimensões: a afectiva que compreende os aspectos emocionais da atitude, colocando-a em termos valorativos de gosto/não gosto; a dimensão cognitiva que engloba as crenças em torno dessa mes- ma atitude, e a dimensão conativa ou comportamental que se refere à continuidade e congruência entre afetos, cognições e a manifestação explícita da atitude (Stratton, 2003).

A noção de que as atitudes podem ser adquiridas e moldadas através do contacto com o meio social em que o indivíduo se move, associada ao papel concreto que estas podem deter face à aprendizagem (Thornburg, 1985), justifica o interesse no estudo das atitudes dos alunos face à escola. É na escola que as crianças e jovens passam grande parte do seu tempo e onde vivem um número significativo das suas experiências sociais. Assim, o meio escolar e, em concreto a sala de aula, apresentam-se como contextos privilegiados para a aquisição e consolidação de atitudes e valores (Rebelo, 2012; Thornburg, 1985).

Carecendo ainda de delimitação e robustez teórica e empírica, o construto de AFE obteve o maior consenso quando definido por Lewy (1986, p.4408) sendo que “School attiude denotes feelings, such as liking, satisfaction, appreciation, and so on, of learners toward their school and school-related experiences”, isto é, a expressão de sentimentos e juízos de apreciação ou aversão à escola e às experiências escolares (Bastos, 2007).

A par desta definição, Lewy (1986) propõe ainda quatro componentes básicas que deverão ser contempladas nos estudos da temática das AFE: o sentimento em relação à escola, ao professor, ao currículo e à turma.

Também Candeias (1996) contribuiu para a sua explicação na medida em que a concebeu como a opinião do aluno, os sentimentos relativos à escola, a representação da escola, as preferências na escola e enfatizou a sua relação com o desempenho escolar, motivação e interesse.

As AFE e as aprendizagens aí empreendidas resultam, assim, da singularidade de cada aluno em relação ao conjunto de sentimentos e crenças perante a escola, e das interações sociais e avaliações pessoais que a criança realiza das suas vivências escolares, diretas ou indiretas. Mais especificamente, as AFE ancoram na qualidade das relações com familiares, professores e pares, em experiências anteriores de sucesso/fracasso escolar (Akey, 2006), no interesse pelas matérias escolares, na capacidade de adaptação ao método de ensino e numa perceção da escola enquanto espaço físico agradável (Rebelo et al., 2011) e podem ainda depender da idade do sujeito, do ano de escolaridade, do sexo, do nível socioeconómico, entre outros (Candeias et al., 2010; Bastos, 2007).

Pode dizer-se, então, que o processo de configuração das atitudes deriva do processo de socialização e dos processos de maturação e desenvolvimento cognitivo (Zabalza, 2000).

É à luz desta constelação de fatores de onde emerge uma atitude mais ou menos positiva em relação à escola, que construtos contíguos ao de AFE, como o nível de interesse do aluno nas aprendizagens escolares e a sua motivação para aprender, devem ser olhados (Candeias & Rebelo, 2010; Candeias et al., 2010).

De facto, o sentimento de competência geral face às tarefas escolares que se desenvolve nos primeiros anos de escola e decai à medida que se implantam sentimentos de competência por matérias

escolares (Harter, cit. por Hauser-Cram, Durand & Warfield, 2007), as atitudes que se formam num sentido negativo derivadas de ambientes sociais desfavoráveis e a diminuição dos níveis de motivação e autoconfiança (Urdan & Schoenfelder, 2006) podem ser colmatados por uma postura cooperante e apoiante por parte dos professores e por uma escola capaz de proporcionar o ambiente estimulante e envolvente necessário ao desenvolvimento de atitudes mais positivas nos seus alunos (Abreu, Veiga, Antunes & Ferreira, 2006).

Assim, de acordo com Morissette e Gingras (1999), a prática pedagógica deverá reger-se por intervenções sistematizadas que visem o ótimo desenvolvimento afetivo da criança, tendo por base a premissa de que as atitudes são aprendidas e correspondem ao resultado das interacções vividas pelos alunos, constituindo, em simultâneo, as causas para que estes olhem e vivam a escola de forma positiva.

É nesta possibilidade manifestada pela escola de ser apreendida enquanto agente de modelação das atitudes e no impacto que o deter atitudes positivas face à escola irá ter na aprendizagem e motivação para aprender que reside o interesse em desenvolver meios que permitam avaliar a atitude dos alunos face à escola.

3. Objetivo

Considerando a escassez de instrumentos para a população portuguesa que permitam avaliar as atitudes dos alunos face à escola, o objetivo do presente estudo é analisar a validade estrutural do Questionário de Atitudes Face à Escola (QAFE, Candeias, 1997; Rebelo et al., 2011) para o ensino básico, tendo em vista a garantia das suas qualidades psicométricas.

4. Metodologia

4.1 Participantes

Este trabalho foi desenvolvido com uma amostra de conveniência de 1457 alunos (leque etário=10-18 anos) do Ensino Básico Português (28,8% do 1º ciclo, Mdnidade=9 anos; 34,7% do 2º ciclo, Mdnidade=11 anos; e 36,6% do 3º ciclo, Mdnidade=14 anos), de ambos os géneros (52,37% de raparigas).

4.2 Instrumentos

Na primeira versão do Questionário de Atitudes Face à Escola (QAFE; Candeias, 1997) os alunos deveriam responder a 43 itens constituídos por uma frase única e objetiva em formato verbal, organizados em seis dimensões: Objetivos e projetos de futuro; Relação com o professor; Espaço vivenciado; Ritmo e tempo vivenciado; Desinteresse face à frequência escolar e relação com os colegas. Trata-se de um instrumento com uma escala de resposta de Likert em que 1 representa “Absolutamente de acordo” e 5 representa “Absolutamente em desacordo”.

A revisão deste questionário foi realizada por Rebelo e colegas (2011) e teve por base três objetivos principais: obter uma versão reduzida do instrumento, adequada aos alunos do 1.º e 2.º ciclo do ensino básico (CEB) e com uma escala de resposta tipo Likert de quatro pontos (1=discordo totalmente; 2=discordo; 3=concordo; 4=concordo totalmente), de forma a minimizar o erro de tendência central, isto é, evitando que o respondente situasse a sua resposta sistematicamente no ponto 3. “Não concordo nem discordo”.

Neste sentido, os itens do questionário passaram por um processo de reformulação tendo em vista uma uniformização que permitisse a sua aplicação aos três CEB. Foram também transformados em positivos todos os itens cujo conteúdo era descrito na forma negativa, embora continuem a existir itens de teor negativo em relação à escola.

Os dados foram inseridos no IBM SPSS Statistics for Windows (version 21). Foi efetuada uma análise descritiva das características da amostra. Os valores omissos no QAFE foram substituídos pelo valor da mediana obtida para o conjunto da amostra. Realizou-se, seguidamente, a análise fatorial exploratória do QAFE, pelo método de extração das Componentes Principais com rotação varimax. A determinação do número de fatores teve por base a formulação teórica tridimensional do construto Atitude sendo, por isso, forçada a três fatores. Na análise fatorial exploratória foi utilizado como critério de exclusão de itens um peso fatorial <.40 e a existência de uma diferença <.20 entre os pesos fatoriais de um mesmo item em diferentes fatores.

Resultou deste estudo o instrumento adaptado e reduzido utilizado no projeto RED, constituído por 24 itens, organizados em três fatores – Atitude face à aprendizagem (AP), Perceção de motivação (MOT) e Perceção de competência (COMPET).

4.3 Procedimentos

A administração do QAFE decorreu durante o ano letivo 2011/2012 numa sessão única de 90 minutos, durante o tempo letivo. A participação foi voluntária e apenas requerida após o consentimento informado dos encarregados de educação.

Através do LISREL 9.10 (Jöreskog & Sörbom, 2013) realizaram-se análises fatoriais confirmatórias (AFC) ao QAFE, examinando-se a sua validade estrutural. Esta foi realizada através do estudo da validade fatorial (VF), bem como da validade convergente (VC) e fiabilidade compósita (FC) dos fatores, e da validade discriminante (VD) entre fatores (Fornell & Larcker, 1981). A VC foi apreciada a partir da variância média extraída (VME) dos itens pelos fatores, que deve apresentar valores iguais ou superiores a 50% (Fornell & Larcker, 1981), enquanto a FC deve apresentar valores superiores a, pelo menos, 70% (Nunnally & Bernstein, 1994). Quanto à VD, ela foi analisada através da comparação entre a variância partilhada (quadrado da correlação desatenuada, φ2) entre fatores e a VME de cada um deles: esta última deve ser superior à primeira.

Dada a natureza categorial ordinal das variáveis, para o teste dos modelos recorreu-se ao método de abordagem bivariado latente normal (Jöreskog & Mustaky, 2001), envolvendo a técnica de máxima verosimilhança (MV), com a correção de Satorra-Bentler (SB; Satorra & Bentler, 1994), aplicada sobre matrizes de correlações policóricas (CP) conjuntamente com as respetivas matrizes de covariâncias assimptóticas (Jöreskog, 2005; Jöreskog & Sörbom, 1993, 1996). Na identificação dos modelos foi igualizada a um a relação dos fatores com um dos seus itens.

A apreciação do ajustamento dos modelos foi realizada com base nos seguintes índices práticos de adequabilidade do ajustamento do modelo aos dados empíricos: o comparative fit index (CFI), que deve ser igual ou superior a .95 para indicar um bom ajustamento; o root mean square error of approximation (RMSEA), que deve apresentar valores próximos ou inferiores a .06 para indicar um bom ajustamento; e, o standardized root mean square residual (SRMR), cujos valores deverão ser próximos ou inferiores a .06 para indicar um bom ajustamento (Hu & Bentler, 1998).

5. Resultados

Para a AFC do QAFE foi inicialmente testado um modelo oblíquo com três fatores e 24 itens (Tabela 1), decorrente da AFE (Rebelo et al., 2011), que estava bem ajustado (CFI=.931; RMSEA=.062; SRMR=.076). O fator AP apresentou um valor de VME abaixo do nível desejável (VMEAP=.33), os fatores MOT e COMPET apresentaram valores de VME próximos do desejável (VMEMOT=.48 VMECOMPET=.46) o

que indica, para AP, problemas de VC. A FC foi muito boa para os três fatores (FCAP=.82; FCMOT=.86; FCCOMPET=.85). No que respeita à VD, verificaram-se graves problemas uma vez que as correlações desatenuadas entre fatores foram muito elevadas (φ a variar entre .86 e .91), o que se traduz em variâncias partilhadas (φ2) entre eles a oscilar entre .74 e .83, apontando, assim, para a existência de um só fator.

Tabela 1. AFC do modelo trifatorial do QAFE pelo método CP-MV-SB: estimativas da solução

estandardizada, VME e FC Item (Fator) M1 CF R2 4 (AP) .25 .06 6 .34 .12 7 .67 .45 8 .72 .53 10 .21 .05 11 .66 .43 12 .73 .53 13 .55 .30 17 .72 .51 19 -.10 .01 21 .56 .32 22 .82 .67 VME .33 FC .82 2 (MOT) .61 .38 5 .72 .52 9 .74 .55 14 .79 .62 18 .47 .22 20 .71 .50 24 .77 .60 VME .48 FC .86 1 (COMPET) .54 .29 3 .77 .59 15 .74 .55 16 .65 .42 23 .72 .51 VME .46 FC .85

Nota. CP=correlações policóricas; MV=máxima verosi-

milhança; SB=Satorra-Bentler. β=peso fatorial estandar- dizado (p < .001); R2 (comunalidade)=1 - ε (resíduo es-

tandardizado). VME=variância média extraída (validade convergente); FC=fiabilidade compósita. AP=Aprendiza- gem; MOT=Motivação; COMPET=Competência.

Neste sentido, realizou-se, então, o teste do modelo unifatorial. O modelo assim especificado revelou um bom ajustamento (CFI=.987; RMSEA=.058; SRMR=.054). Na Tabela 2 podem observar-se os resultados substantivos desse modelo, de onde se destaca a VC, muito próxima do valor desejável e a muito boa FC.

Tabela 2. AFC do modelo unifatorial do QAFE pelo método CP-MV-SB: estimativas da solução

estandardizada, VME e FC Item (Fator) M1 M2 M3 CF R2 CF R2 CF R2 1 (AFE) .51 .26 .51 .26 - - 2 .64 .41 .65 .42 .63 .40 3 .72 .52 .72 .52 .71 .51 4 .24 .06 - - - - 5 .75 .56 .74 .55 .74 .54 6 .32 .10 - - - - 7 .67 .45 .67 .45 .67 .45 8 .73 .53 .73 .53 .73 .53 9 .67 .45 .67 .45 .68 .46 10 .20 .04 - - - - 11 .64 .41 .64 .42 .64 .41 12 .72 .52 .72 .52 .72 .52 13 .53 .28 .53 .26 .53 .28 14 .74 .54 .74 .55 .75 .56 15 .68 .46 .68 .46 .67 .45 16 .64 .41 .64 .41 .64 .41 17 .69 .48 .69 .48 .70 .49 18 .45 .21 .46 .21 - - 19 -.09 .01 - - - - 20 .65 .42 .65 .42 .65 .42 21 .54 .29 .54 .29 .55 .30 22 .80 .64 .80 .64 .80 .65 23 .68 .47 .68 .46 .68 .47 24 .73 .53 .74 .54 .74 .54 VME .44 .47 FC .94 .94