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Enquadramento e estrutura da formação em Enfermagem 76

Capítulo II – Ser Estudante de Enfermagem: Desafios e Exigências 72

2. Enquadramento e estrutura da formação em Enfermagem 76

A formação em Enfermagem tem vindo a revelar-se fonte de preocupação, reflexão e debate nos nossos dias, pelo contexto de transformação e mudança da sociedade actual.

A Enfermagem é uma profissão que, na área da saúde, tem como objectivo prestar cuidados de enfermagem ao ser humano, são ou doente, ao longo do ciclo vital, e aos grupos sociais em que ele está integrado, de forma que mantenham, melhorem e recuperem a saúde, ajudando-os a atingir a sua máxima capacidade funcional tão rapidamente quanto possível (artigo 4.º, ponto 1, Decreto-Lei n.º 161/96).

No decurso dos últimos anos, a enfermagem registou uma evolução, quer ao nível da formação de base, quer ao nível da complexificação e dignificação do seu exercício profissional (ibidem, 1996).

Com efeito, a formação académica e profissional dos enfermeiros tem registado modificações significativas ao longo dos tempos as quais se prendem com os paradigmas da formação e do próprio exercício profissional. Os iniciais modelos assistenciais de índole religiosa e de caridade deram lugar a outros de cariz biomédico, que privilegiam a execução de tarefas técnicas prescritas pelo médico, centradas na dimensão curativa, negligenciando a dimensão do cuidar que assume o destaque e a verdadeira essência da Enfermagem nos dias de hoje (Fonseca, 2006).

Os anos oitenta acarretaram transformações importantes relativamente à evolução do ensino da Enfermagem com a integração do ensino de Enfermagem no Sistema Educativo Nacional, ao nível do Ensino Superior Politécnico (Pires, Sardo, Morais, Santos, Koch & Machado, 2004). Integrada no ensino superior, a formação inicial em Enfermagem passou a conferir o grau académico de bacharel e, posteriormente, de licenciado em Enfermagem. Tal contribui para um maior reconhecimento social desta área do saber (Fonseca, 2006).

A formação dos futuros enfermeiros deve ser orientada no sentido de os levar a reflectir sobre a qualidade dos serviços de saúde com base na leitura que fazem da realidade que os envolve e das suas próprias vivências e experiências (Ferreira, 2003).

Regulamentado pela Portaria n.º 195/90 de 17 de Março, o curso de Bacharelato em Enfermagem tinha a duração de 3 anos sendo que a sua estrutura curricular incluía de forma adequadamente articulada, uma vertente de ensino teórico e uma vertente de ensino clínico. A duração do ensino teórico deveria ser de, pelo menos, um terço da

carga horária total do curso, e a do ensino clínico deveria ser de, pelo menos, metade da carga horária total do curso (artigo 4.º da Portaria n.º 195/90). Tal realça a importância e relevância dos ensinos clínicos distribuídos ao longo do curso numa lógica de alternância entre contexto escolar e contexto de trabalho.

A componente de ensino teórico visa “a aquisição, pelo estudante de enfermagem, dos conhecimentos, compreensão, aptidões e atitudes profissionais necessários para planear, prestar e avaliar cuidados globais de enfermagem” (artigo 5.º, alínea 1, Portaria n.º195/90).

O ensino clínico “tem como objectivo assegurar ao estudante de enfermagem, a partir dos conhecimentos e aptidões adquiridos, em contacto directo com o indivíduo são ou doente e/ou com uma comunidade, a aprendizagem do planeamento, prestação e avaliação dos cuidados globais de enfermagem” (artigo 6.º, alínea 1, Portaria 195/90).

A componente de ensino clínico, sob a forma de estágios, realiza-se nomeadamente em centros de saúde e hospitais e na comunidade, sob a responsabilidade de docentes da escola superior de enfermagem com a colaboração de enfermeiros das instituições em que se realiza.

Com a cessação do funcionamento do Curso de Bacharelato, surge o Curso de Licenciatura em Enfermagem e o Ano Complementar de Formação, destinado a facultar aos bacharéis em Enfermagem o acesso ao grau de licenciado (Dec. Lei n.º 353/99 de 3 de Setembro). Nesse sentido, foram criados novos planos de estudo, da responsabilidade de cada escola.

O Curso de Licenciatura em Enfermagem tem como finalidade “assegurar a formação científica, técnica, humana e cultural para a prestação e gestão de cuidados de enfermagem gerais à pessoa ao longo do ciclo vital, à família, grupos e comunidade, nos diferentes níveis de prevenção” (artigo 5.º, alínea 1 - Dec. Lei n.º 353/99 de 3 de Setembro, p.6199), primária, secundária e terciária.

Regulamentado pela Portaria n.º 799-D/99 de 18 de Setembro, o Curso de Licenciatura em Enfermagem passa a ter a duração de quatro anos, mantendo a estrutura curricular preconizada no curso de Bacharelato, com ensino teórico e clínico.

Actualmente a formação inicial em enfermagem orienta-se em torno de dois eixos estruturantes: o ensino teórico e o ensino clínico que têm como missão proporcionarem a apropriação de saberes teóricos e práticos que se traduzam num exercício profissional responsável, autónomo e de qualidade (Simões, Belo, Fonseca, Alarcão & Costa, 2006).

A componente de ensino teórico visa “a aquisição dos conhecimentos de índole científica, deontológica e profissional que fundamente o exercício profissional da enfermagem” (artigo 4.º, alínea 1, Portaria n.º799-D/99 de 18 de Setembro). A componente teórica, para além do ensino teórico propriamente dito inclui também o teórico-prático, o prático e os seminários. Destina-se à satisfação de necessidades de ordem cognitiva que possibilitem o planeamento, a prestação e avaliação dos cuidados de Enfermagem.

A componente de ensino clínico visa “assegurar a aquisição de conhecimentos, aptidões e atitudes necessários às intervenções autónomas e interdependentes do exercício profissional de enfermagem (artigo 5º, alínea 1, Portaria n.º799-D/99 de 18 de Setembro).

O ECE, componente curricular do curso de formação em enfermagem, pontua-se pela sua densidade formativa e pela complexidade e diversidade de dimensões de que se reveste, traduzindo desafios permanentes aos seus (mais diversos) intervenientes (Longarito, 2002). Importa salientar que os ECE são transversais a todo o plano de estudos da formação inicial, o que lhes retira as características puras de estágio profissionalizante e de integração no mundo do trabalho.

O processo de aprendizagem clínica permite aos estudantes desenvolverem competências de aplicação de conhecimentos, comportamentos e atitudes em situações clínicas reais. Através da atenção e cuidados prestados aos utentes, à família e à comunidade, os estudantes dão sentido à teoria ao colocarem-na em prática e aprendem a reconhecer as recompensas e problemas inerentes ao exercício da Enfermagem (Vizcaya Moreno, Juan Herrero & Pérez Cañaveras, 2005).

Tem-se subjacente a ideia de que o estudante aprende em estágio aquilo que mais dificilmente poderia aprender em sala de aula, através da observação orientada da realidade e dos modelos, pelas vivências possibilitadas e pela transferência, para o concreto, das aprendizagens iniciadas em contexto escolar. Escola e estágio devem assim ser conceptualizados como dois contextos distintos, mas intimamente interligados e complementares no processo de formação dos estudantes.

Mais recentemente, a Resolução do Conselho de Ministros nº 116/2002, de 2 de Outubro aprovou um conjunto de medidas que visa assegurar as necessidades de formação superior na área da saúde e de garantir que essa formação se reveste da indispensável qualidade. Entre essas medidas inclui-se o aperfeiçoar as formas de articulação entre as unidades prestadoras de cuidados de saúde e os estabelecimentos

de ensino público na área da saúde, visando o aprofundamento dos modelos de cooperação entre as instituições de ensino superior e o Serviço Nacional de Saúde.

Na sequência desta resolução é criada uma comissão técnica para o ensino na área da saúde que tem na sua missão proceder à análise das formas de articulação das escolas superiores públicas que ministram o ensino das tecnologias da saúde com as unidades prestadoras de cuidados de saúde tendo em vista a realização do ensino prático e elaborar proposta de regulamentação nesse domínio (Despacho Conjunto n.º 291/2003).

No contexto do ECE os estudantes percepcionam e confrontam-se com as diferenças entre teoria e o exercício profissional e ao procurarem descobrir formas de dar resposta adequada às situações do seu quotidiano de prestação de cuidados vão ampliando, consolidando e transformando os seus conhecimentos (Longarito, 2002). Estes contextos proporcionam ao estudante a aprendizagem pela mobilização de saberes, de natureza diversa, de modo a agir perante uma situação como um verdadeiro agente de transformação e mudança da realidade existente (Almeida, 2006).

Especificamente no âmbito da formação em Enfermagem, o ensino clínico compreende todo o ensino que é realizado numa instituição de saúde quer seja junto do utente, de um grupo de utentes ou simplesmente de contacto com a instituição e que é essencial para a formação do estudante (Simões, Alarcão & Costa, 2008).

A finalidade da formação inicial em Enfermagem é o desenvolvimento cognitivo, pessoal, social e profissional dos futuros enfermeiros no sentido de adquirirem competências que lhes permitam cuidar de pessoas, de forma contextualizada e individualizada, ao longo do seu ciclo de vida (Fonseca, 2006).

Formar pessoas que se cuidam e que cuidam de outras, exige na formação em Enfermagem a existência de estruturas e dinâmicas que favoreçam a aquisição de saberes provenientes de teorias e princípios científicos da Enfermagem e de outras ciências (Fonseca, 2006).

A preocupação da formação em Enfermagem reside assim na apropriação de saberes teóricos e práticos que se reflictam na responsabilidade e autonomia dos cuidados de saúde prestados à comunidade e na qualidade dos mesmos.

Cada vez mais se assiste à necessidade de formação de profissionais de qualidade sob o ponto de vista humano, científico e técnico, competentes e responsáveis pela sua própria aprendizagem e capazes de darem resposta a uma complexidade de

No âmbito das dimensões clínicas propriamente ditas, assiste-se à crescente complexidade dos cuidados e às pressões sociais no sentido da qualidade e da excelência.

Aos novos profissionais já não é só exigido o conjunto tradicional de saberes e competências, destreza, segurança, atitudes ou conhecimentos. Muito mais do que saber quais os gestos técnicos e modos de execução, os estudantes e futuros profissionais têm necessidade de adquirir e desenvolver conhecimentos e competências que lhes possibilitam entender e decidir sobre o cuidar de uma pessoa e, concomitantemente, pensar e agir em contextos de trabalho com características culturais, sociais e organizacionais próprias (Fonseca, 2006). Solicita-se a capacidade de contribuir para o desenvolvimento da profissão e de trabalhar os fundamentos da mesma, tornando-os mais sólidos e consistentes. Por outro lado, espera-se abertura face à aprendizagem ao longo da vida, a motivação para a auto-avaliação e a formulação de contributos para as ciências da Enfermagem (Abreu, 2003).

Um profissional competente será aquele que, na posse de um repertório vasto e diversificado de conhecimentos e de capacidades, toma, executa e avalia as decisões que toma de modo a que as mesmas se constituam como soluções adequadas, socialmente legitimáveis e abertas a constantes reajustamentos para darem resposta à instabilidade constante (Sá-Chaves, 2000).

A Enfermagem, centrada na pessoa humana e visando a sua independência, ajuda a pessoa mediante um processo de cuidados que visa a promoção, manutenção ou restabelecimento da saúde ou a morte serena.

A formação inicial assume assim um papel fundamental na aprendizagem do papel do enfermeiro e dos princípios e valores inerentes à profissão de Enfermagem (Lage, 2005). Com efeito, uma das funções primordiais das escolas é dotar os estudantes de estratégias que lhes permitam reelaborar, transformar e criticamente reconstruir o conhecimento (Simão, 2002).

Escola e locais de estágio são complementares para a construção de um saber pela acção e pela reflexão, no sentido de formarem profissionais capazes de reflectir na acção e de agir em contextos reais. Para que esta formação em alternância seja bem sucedida impõe-se uma articulação estreita entre o contexto de trabalho e o escolar, numa partilha sistemática de experiências onde o processo formativo constituia o objectivo principal (Ramos, 2003).

Importa que os estudantes, futuros enfermeiros, sejam detentores de um pensamento crítico e procurem de forma continuada o conhecimento e o desenvolvimento de competências, aspectos fulcrais para a manutenção de uma prática da Enfermagem actualizada. Com efeito, a aprendizagem não se confina à instituição educativa mas é um processo co-extensivo à duração da vida, abrangendo igualmente uma diversidade de contextos. Actualmente, para desempenhar eficazmente as suas funções nos contextos de trabalho, os indivíduos têm de estar a par da nova informação, das tendências actuais e emergentes, tratamentos, tecnologia médica e conhecimento científico e profissional (Smedley, 2007).

A finalidade última do curso superior de Enfermagem é formar enfermeiros competentes, capazes de integrar saberes diversos e heterogéneos para, dessa forma, resolver os problemas e lidar com as situações profissionais com as quais são confrontados. Para tal, importa o desenvolvimento de modalidades de formação e processos de ensino/aprendizagem que desenvolvam nos estudantes as várias competências, promotores de um exercício profissional de excelência (Carvalhal, 2003).

A formação em Enfermagem é, assim, uma formação integradora que tem como finalidade permitir a transferência das aprendizagens efectuadas no contexto escolar para o contexto de trabalho, no sentido de minimizar as dificuldades de aproximação da escola ao real e, simultaneamente, a pedagogizar as aprendizagens e vivências nos locais de trabalho.

A formação inicial em Enfermagem, mais especificamente, em situação de prática clínica, encerra em si, um espaço e tempo propiciador e potencializador do desenvolvimento de capacidades e habilidades conducentes à construção de competências profissionais nos estudantes, futuros enfermeiros (Longarito, 2002). Desta forma, constitui-se como um período único e significativo no processo de desenvolvimento pessoal, académico e profissional.

Os ECE são, então, um processo formativo insubstituível, favorecendo quer a mobilização e integração de conhecimentos, através da reflexão para, na e sobre a prática, quer a aquisição de saberes práticos e processuais, para a integração no mundo do trabalho. Por outro lado, os ensinos clínicos contribuem ainda para a definição e construção de uma consciência e identidade dos formandos como futuros profissionais (Abreu, 2003).

como atractivo e assustador e, por isso, potencialmente indutor de stress, podendo comprometer a sua saúde e bem-estar.

Dado o nosso trabalho incidir sobre o stress em ECE no ponto seguinte iremos proceder a uma caracterização de uma forma mais pormenorizada do mesmo.

3. O Ensino Clínico na formação em Enfermagem: Importância para a