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R etom o as palavras do filósofo, na sua indagação provocativam ente lúcida: “Q ue aconteceria se, em vez de apenas construirmos nossa vida, tivéssem os a loucura ou a sabedoria de dançá-la?” (Garaudy 1980, p.13). O que aconteceria, penso então, se nós educadores tivéssemos a ousadia e a sabedoria de dançar a educação?

Dançar a educação... Fazer dançar a pedagogia... Sonho. Utopia. D esejo. Por isso fui para a roda dançar e pesquisar. A o m esm o tempo em que, com o aprendiz, procurava aprofundar minhas vivências com as Danças Circulares. Participando de cursos, treinamentos e eventos com diferentes mestres-focalizadores, fui entrando n o círculo da dança com professoras, com o pesquisadora-focalizadora, a buscar saberes e fazeres sensíveis. Meus e delas. Colocava-me na fronteira, para utilizar a bela imagem da dança de Martha Graham: uma fronteira de exploração e descobertas.

Entrei na roda com quatro grupos: dois no interior da universidade, com educadoras em formação inicial do Curso de Pedagogia da Unicamp e dois grupos de educadoras em formação continuada, da rede pública municipal de Blumenau — SC. N ão desconsiderando a presença de dois participantes do sexo masculino que estiveram dançando, vou m e referir aos m em bros desses grupos sempre no feminino: educadora ou professora, haja vista que a maioria, tanto na roda com o n o exercício do magistério, é feminina. Cabe explicitar também minha escolha por utilizar predominantemente o termo educadora: entre os grupos de Blumenau participavam não apenas professoras, mas outras profissionais da educação que assim, sob aquela denominação, ficam contempladas.

As rodas com as alunas na Unicamp, definidas explicitamente com o cam po de pesquisa, foram devidamente documentadas, seja em meu caderno de campo, com registros de todos os encontros, seja por m eio de fotografias e de alguns registros em vídeo. H ouve a coleta de outro tipo de material, nada usual: a produção das alunas ao final do semestre. Explico. Sugeri aos grupos que registrassem, da form a que m elhor lhes parecesse, o percurso dos encontros, ou aspectos considerados relevantes, que pudesse expressar o encontro de cada uma com as danças. Diferentes linguagens apareceram: desenho, pintura, escultura, mosaico, poesia, prosa poética, relatório descritivo, relatório analítico, diário, cartaz, colagem . Resulta que, ao final do processo da pesquisa, estava de posse de um material heterogêneo e riquíssimo na sua diversidade. Foi preciso fazer escolhas: utilizei essencialmente os dados recolhidos no m eu caderno de cam po, apenas recorrendo aos outros materiais em situações pontuais, quando

julguei que enriqueceriam a análise.

Já o s en con tros com as educadoras em Blumenau, considerados parte do que cham ei estudo exploratório, com o aproximação às questões da pesquisa, não obedeceram a nenhuma sistematicidade d e registros. Fazia anotações breves numa caderneta, de com entários e m anifestações do grupo, observação de algum fato ou situação considerados relevantes. O que fiz regularmente foi listar as danças realizadas e as m ais pedidas, ou preferidas, pelas educadoras. U m dia apenas, por conta dos acontecim entos singulares que dele fizeram parte, elaborei um registro mais detalhado, que compartilhei com as educadoras. Revendo o material do estudo exploratório, m esm o que pouco sistematizados, identifiquei dados relevantes e por isso estão aqui incluídos.

Considerando as experiências que foram distintas já na estrutura dos encontros para dançar, dentro e fora da universidade, com educadoras em formação inicial e educadoras atuando, tentarei apresentar alguns retratos dos encontros, por “tipologia” do grupo. O u seja, vou contar a experiência com os grupos de Blumenau e com os grupos de alunas da Unicamp. N o desenrolar da narrativa, vou acentuar as especificidades, características de um e outro grupo, mas no sentido de oferecer uma imagem de cada processo e não de comparar ou particularizar. Vou assim com pondo imagens, retratos, também memórias, dando visibilidade à experiência e aos grupos.

A o narrar a experiência, vou ligando p on tos, traçando linhas que m e conduzirão a uma análise posterior. Por ora, trato de mostrar o s m ovimentos que fom o s criando, no encontro com as educadoras, ensaiando passos — na dança e na pesquisa. Caminhos pelos quais fom os ocupando e desenhando espaços — dentro e fora, passado e presente, formação e experiência. Círculos. Espirais de vida. Mistérios.

Quando cheguei na sala indicada para dançarmos encontrei, surpresa, um grupo de professoras bem-vestidas, como que arrumadas para um evento especial, algumas com salto alto, sentadas em cadeiras que ocupavam todo o espaço da sala, organizadas feito platéia de um auditório. Muitas já estavam com caneta e papel na mão. Ora, é claro! Elas tinham vindo para um curso de formação\

A ssim foi meu primeiro contato com um grupo de educadoras da rede pública municipal de Blumenau-SC, com o qual dancei durante o ano de 2003, em encontros mensais, de abril a novembro. Esses encontros “para dançar” integraram o programa de formação continuada levado a efeito pela Secretaria Municipal de Educação (Semed) daquela cidade, o qual consistia, de m odo geral, em oficinas variadas envolvendo “múltiplas linguagens” oferecidas para educadores da Educação Infantil.

C om o já havia trabalhado com a Semed em anos anteriores e conhecia um p ouco a Rede, propus as Danças Circulares Sagradas com o uma oficina do programa: eu oferecia a oficina e a Semed viabilizava minha viagem a Blumenau, haja vista que eu estava morando em Campinas-SP, durante todo o período do doutorado; eu disponibilizava meu repertório de D anças e o grupo me possibilitava uma aproximação ao trabalho de pesquisa (o que chamei estudo exploratório).

Durante praticamente todo o ano de 2003, viajei para Blumenau um a vez por mês, para m e encontrar com dois grupos que se inscreveram na oficina: um grupo constituído de educadoras que atuavam diretamente com as crianças, em Centros de Educação Infantil e, em m enor número, n o ensino fundamental; e outro grupo constituído por coordenadoras pedagógicas dos Centros de Educação Infantil e algumas coordenadoras da Semed. N o s grupos, apenas um hom em esteve dançando (era professor de educação física).

O s encontros com os dois grupos foram fundamentais para o co m eço da pesquisa, para direcionar m eu olhar à procura de pontos a ser investigados n o universo das D anças Circulares. Para visualizar algumas intrigas já levantadas, enfim, para identificar caminhos a seguir na abordagem d o tema e questões que se revelavam. E u estava aberta à aventura de dançar na roda com educadores. N ã o entrei com posições e idéias fechadas, com roteiros a ser seguidos. Apenas sabia que seriam encontros para dançar, nada mais

Dançando com