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Entre a escravidão e a liberdade: casos da fronteira sul do Brasil e seu impacto nas relações diplomáticas

com o Estado Oriental (1842-1858)

Rachel da Silveira Caé* O atual estudo está voltado para a análise das tensões diplomáticas entre o Brasil e o Estado Oriental do Uruguai que envolveram a questão da escravidão, abordando a discussão sobre o conceito de fronteira e os diversos movimentos que esta vai possibilitar aos escravos, senhores, comerciantes e autoridades de ambos os países entre as décadas de 1840 e 1860. A demarcação territorial, assim como a busca pela consolidação de outros interesses nacionais, no caso específico da fronteira brasileira com o Estado Oriental, envolveu também debates sobre a legi- timidade jurídica da escravidão. Esses conflitos na fronteira meridional no século XIX serão resultados de relações de poder entre dois Estados em formação que possuíam posturas distintas frente à escravidão.

Os embates diplomáticos ao longo dessas duas décadas estiveram relacio- nados a fatores distintos, embora interligados. Primeiramente pode-se destacar o conflito em torno da abolição da escravidão na República Oriental, em dezembro de 1842, que afetou tanto proprietários brasileiros residentes naquele território quanto senhores de escravos no Brasil, passando por situações de protestos, fugas de escravos rumo ao Uruguai e até fugas de senhores com seus escravos rumo ao Brasil. O segundo conflito consistiu na negociação do tratado de 12 de outubro de 1851, que, mais do que a simples extradição dos escravos fugidos, implicou toda uma discussão em torno da condição dos cativos que ultrapassavam aquela fron- teira. Em terceiro lugar, temos os problemas que surgiram a respeito das acusações de roubo de negros livres orientais para serem escravizados no Brasil.

Diante da impossibilidade de abordar todas essas questões no es- paço reservado a esta apresentação e buscando aprofundar a análise de certos aspectos importantes quanto à relação entre a condição jurídica dos escravos e o trânsito fronteiriço, será realizado um recorte. As negociações em torno do tratado de extradição de escravos feito entre o Brasil e o Estado Oriental em outubro de 1851 será, assim, o principal objeto de estudo neste trabalho. A razão deste recorte está ligada a um problema historiográfico: o tratado de extradição ainda não foi analisado com profundidade e muitos dos trabalhos que abordam os conflitos na região do Prata tratam do conjunto de tratados que foram realizados com o Uru-

*Mestranda da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNI-Rio) e bol- sista da CAPES.

guai em 1851 (aliança, limites, comércio, navegação, subsídios e extradição) apenas como um todo, tendo em vista a conjuntura do final da Guerra Grande e a vitória contra Juan Manuel Rosas e Manuel Oribe. O tratado de extradição de escravos é visto como a conclusão de um choque diplomático em torno da crescente fuga de escravos em direção ao Estado Oriental e, em alguns casos, também como uma im- posição dos interesses brasileiros sobre o Uruguai.1 Não é suficiente analisar ape- nas a assinatura dos tratados, sua estrutura formal, mas também os mecanismos adotados por ambos os países para contornar certos aspectos, indo a fundo nos acontecimentos que mostram como eles foram de fato colocados em prática. A ce- lebração do tratado não só não foi capaz de colocar um fim aos problemas com os escravos na região como também suscitou novas disputas diplomáticas a respeito da condição dos escravos que transitavam pela fronteira.

Atravessando a fronteira: a busca dos escravos pelo refúgio

A questão das fugas dos escravos sempre esteve presente no es- paço fronteiriço, mas a partir da abolição da escravidão no Estado Oriental ela não só ganhou um destaque crescente nas relações diplomáticas como adquiriu novos sentidos. O processo de emancipação no território oriental foi paralelo ao de construção deste Estado, e ambos foram marcados pela conjuntura bélica do ano de 1839 a 1851. No decorrer dessa guerra civil, a Guerra Grande, o governo oriental promulgou um decreto que versava sobre o sorteamento de negros e es- cravos para as tropas orientais ─ eram as autoridades orientais tentando conciliar o direito de propriedade dos senhores e as necessidades dos militares por recrutas. As decisões do governo oriental estiveram balanceando nessa linha tênue entre di- reito e necessidade por um tempo, até que, nesse ano de 1842, penderam para um dos lados. A guerra se aprofundou a ponto de levar não só a libertação de alguns escravos mas também a emancipação total no território. Foi, em grande medida, a necessidade de homens para as tropas que trouxe a alforria aos escravos. A partir dessa constatação, podemos analisar os problemas diplomáticos que a questão viria trazer.

A conjuntura bélica afetou o trânsito de senhores e escravos pela fronteira meridional e a ida para o Uruguai foi marcada por distintas, e por vezes contraditó-

1 Dentre estes trabalhos podemos citar: FERREIRA, Gabriela Nunes. O rio da Prata e a con- solidação do Estado imperial. São Paulo: Hucitec, 2006; PETIZ, Silmei de Sant’Ana. Buscando a liberdade: as fugas de escravos da província de São Pedro para além-fronteira (1815-1851). Rio Grande do Sul: Universidade de Passo Fundo, 2006; GOLIN, Tau. A fronteira: os tratados de limites Brasil-Uruguai-Argentina, os trabalhos demarcatórios, os territórios conquistados e os conflitos na bacia do Prata, volume 2. Porto Alegre, LP&M, 2004, dentre outros.

rias, possibilidades de refúgio: durante a Farroupilha, muitos senhores brasileiros refugiaram-se no território oriental com seus escravos, muitas vezes com o obje- tivo de mantê-los no cativeiro diante das expropriações ocorridas neste conflito sul-rio-grandense, enquanto na Guerra Grande muitos escravos fugiram para o território oriental buscando a liberdade. O fato de o Uruguai ter abolido a escra- vidão e de, naquele período de guerra civil, acolher em suas tropas escravos de proprietários brasileiros se constituiu como um atenuante diante dos empecilhos para garantia da continuidade de uma liberdade arriscada conseguida por meio da fuga. Atravessando a fronteira com o Estado Oriental nas décadas de 1840 e 1850, o escravo passava a uma espécie de asilo, o que dificultava sua captura, além de minar a atuação de capitães do mato e a repressão dos proprietários sobre os escravos. As fugas se tornavam “mais frequentes nesses momentos em que mais facilmente os escravos receberiam a proteção como fugitivos”.2 Os cativos fugiam em direção à fronteira pelos mais variados motivos, como abusos físicos, busca de melhores condições de vida, entre outros, ou simplesmente visando à liberdade, não sendo ainda possível apontar qualquer razão como a principal. A fuga para o Exército certamente não era a única, mas nesse período de guerra se apresentou como aquela de maior potencial efetivo na manutenção da liberdade.

Hendrik Kraay, ao analisar as relações entre o Exército brasileiro e os escra- vos fugidos ao longo do século XIX, constata que o simples ato da fuga marcava uma condição de liberdade suscetível de ser transitória. O escravo fugido, na sua condição de ilegalidade, podia facilmente “escorregar de uma precária liberdade de volta à escravidão”, mas pelo serviço militar essa condição podia ser alterada.3 O Exército, de acordo com o autor, apesar de não poder ser encarado como uma instituição abolicionista, era fortemente marcado por uma política de relutância em liberar aqueles escravos que tivessem servido, princípio advindo do direito ro- mano, “segundo o qual escravos que prestassem serviços ao Estado como soldados deviam ser libertados”, e, muito embora isso nunca tivesse sido introduzido em có- digos e leis, o que poderia ser um convite à fuga em massa, o Exército não devolvia esses escravos.4 Pode-se perceber tais concepções presentes nas tropas no Estado Oriental, seja isso pela conjuntura bélica do momento, seja por princípios ligados à própria instituição; para os escravos, a atividade militar se transformou em uma nova via de saída para a liberdade. A proteção do Exército oriental apresentava-se, assim, como forma de minar a instabilidade da condição de escravo fugido, trans-

2 PETIZ, Silmei de Sant’Ana. Buscando a liberdade: as fugas de escravos da província de São Pedro para o além-fronteira (1815-1851). Rio Grande do Sul: Universidade de Passo Fundo, 2006, p. 57.

3 KRAAY, Hendrik. “O abrigo da farda: o Exército brasileiro e os escravos fugidos, 1800-

1881”, in Afro-Ásia, n. 17, 1996, pp. 29-56.

formando uma liberdade arriscada conseguida por meio da fuga em uma liberdade legitimada pelo serviço militar.

Na análise desses casos dos senhores que tiveram seus escravos refugiados no território oriental, deparamos com o do proprietário brasileiro João Leite Pen- teado, morador da vila de Jaguarão, na província do Rio Grande do Sul. Em abril de 1850, esse proprietário requeria à legação brasileira no Estado Oriental que fizesse uma reclamação ao governo de Cerrito para a entrega de quatro escravos. A res- posta de Manuel Oribe foi de que deveriam ser devolvidos os escravos do Brasil que tinham fugido, ou que viessem a fugir, quando fosse comprovada sua condição de cativo e a posse do requerente, fazendo porém uma clara exceção à entrega daqueles que se engajavam no serviço militar, exigindo que a estes fosse mantida a condição de homens livres, enquanto seus ex-senhores deveriam ser indenizados “em tempo oportuno”.5

A questão obviamente suscitou reivindicações brasileiras, primeiro pelo pró- prio princípio de liberdade que se postulava, segundo pela promessa de indeniza- ção imprecisa e, por último, pelo resultado que a ação poderia trazer na manuten- ção da ordem escravista nessa fronteira do Império, como podemos perceber da correspondência a seguir:

Parece querer-se estabelecer o princípio de que tendo o escravo fugido assentado praça, fica por tal modo livre do cativeiro, que terá seu dono de contentar-se não digo já com uma indenização pronta, e suficiente, mas com a promessa da indenização. Isto não me parece justo; nem me parece político pois tornará inútil em grande parte o resultado que da restituição dos escravos fugidos se promete o Governo Imperial para a pacificação da Fronteira do Rio-Grande do Sul, e desta República. De mais um tal precedente pode servir para excitar a fuga dos escravos, per- suadidos estes de que assentando praça nas forças do comando do general Oribe, ainda que alheio seja este ato à vontade do ge- neral, há de Oribe mantê-los necessariamente na posse, e gozo da liberdade.6

O desenrolar de tal caso revela que, pelo menos durante esse período de 1842 a 1851, o que se aplicava aos escravos fugidos era, mais do que um princípio 5 Oficio do dia 8 de abril de 1850, Missões diplomáticas do Brasil em Montevidéu, Arquivo

Histórico do Itamaraty.

6 Oficio do dia 7 de maio de 1850, Missões diplomáticas do Brasil em Montevidéu, Arquivo

de liberdade do solo, o princípio de liberdade por serviço militar. Não bastava fugir e pisar em solo livre (apesar da relutância, principalmente nesses tempos de guer- ra, o governo oriental teoricamente se comprometia a devolver tais escravos) para conseguir o perpetuamento de sua condição de liberdade, o escravo deveria “as- sentar praça”. Podemos dizer com certa propriedade que, para tais casos, não foi o processo de abolição da escravidão em si que levou o Estado Oriental a constituir- -se enquanto refúgio dos escravos dos senhores brasileiros, mas antes a guerra, que, além de criar maiores possibilidades de fuga e dificuldades para extradição, levou o Exército oriental à necessidade de recrutar um número cada vez maior de escravos, fazendo com que recorressem inclusive aos escravos de territórios vizinhos. O número de reclamações de proprietários brasileiros crescia paulatina- mente a partir do ano de 1842, devido às medidas do governo de Montevidéu e à lei de abolição de 1846, relativa ao território ocupado por Manuel Oribe. Se antes tacitamente o governo brasileiro especulava sobre o envolvimento de autoridades orientais que “seduziam” os escravos, com o desenrolar da guerra começaram a surgir acusações abertas aos comandantes de tropas e de fronteira e demais auto- ridades.

É muito difícil, se não impossível, fazer uma quantificação sistemática das fugas dos escravos para o território oriental. Em uma das correspondências de re- lações exteriores do ano de 1850, fala-se em “crescido número de 197 escravos”7 que teriam se refugiado no Uruguai. Essa importância não deve ser medida apenas em termos quantitativos, mas acima de tudo pelo seu potencial qualitativo. Essas fontes diplomáticas revelam a conotação diferenciada da fuga fronteiriça no con- texto de resistência escrava, mostrando também que os escravos participaram ati- vamente na circulação naquele espaço; eles agiram conforme interesses próprios, aproveitando-se dos momentos instáveis de guerra civil para fugirem.8

A possibilidade de mobilidade social de negros e escravos demonstra a con- dição da fronteira enquanto uma região que possui um conjunto de peculiaridades em relação a outros espaços, especialmente durante um período de guerras civis. Nesse quadro, as fugas foram mais do que um ato isolado, constituíram-se como atos políticos,9 representando um empecilho à manutenção da ordem escravista no Brasil e produzindo efeitos significativos nas relações internacionais entre o Im- pério e a República.

Diante da emancipação dos escravos no território vizinho, da conjuntura béli- 7 Correspondência para o ministro de Estrangeiros de 5 de agosto de 1850, Arquivo Histó-

rico do Rio Grande do Sul.

8 PETIZ, Silmei de Sant’ Ana. Op.cit., p. 42. 9 PETIZ, Silmei de Sant’ Ana. Op. cit., p. 138.

ca e dos limites imprecisos, quais os mecanismos que o governo brasileiro poderia adotar para reprimir o fluxo de cativos para além-fronteira? Em fins da década de 1840, o Brasil, que buscara manter neutralidade na Guerra Grande até então, mu- dou a condução de sua política externa na região platina, o que significou, entre outras coisas, tentar preservar interesses escravistas por meio da instituição de mecanismos que negociassem condições de extradição desses escravos que ultra- passavam a fronteira. A postura imperial pode ser resumida com as seguintes pala- vras extraídas da correspondência diplomática:

[...] releva observar que o Governo Imperial, reconhecendo que se não pode negar a qualquer governo o direito de dar emanci- pação a escravos residentes no seu território, entende contudo que esse direito só pode ser legitimamente exercido, quando é levado a efeito com as necessárias cautelas para não ofender os direitos adquiridos de propriedade, nem perturbar o sossego, tranquilidade e segurança dos Estados vizinhos.10

A partir da segunda metade da década de 1840, ao governo brasileiro inte- ressava o fim do confronto na República Oriental. O Brasil visava, por um lado, à manutenção da unidade territorial por meio da resolução dos problemas locais da província do Rio Grande do Sul, e, por outro, queria a conservação da independên- cia do Uruguai ameaçada por Rosas e a implantação de acordos que colocassem um fim às instabilidades na fronteira. Estava presente nessa guerra um conflito de interesses nacionais emergentes, que abrangia desde questões territoriais e de navegação a outras de escravatura, problemas que eram vistos como um assunto de segurança nacional pelo Império.

Negociações para o tratado de extradição de escravos: antigos e novos problemas

Em 12 de outubro de 1851, autoridades do Brasil e do Estado Oriental do Uruguai assinaram um conjunto de cinco tratados para regulamentar alguns assun- tos que já vinham sendo negociados havia algum tempo. O tratado de aliança ins- taurou um comprometimento perpétuo de auxílio entre os dois Estados, no caso de ameaças de movimentos revolucionários, enquanto o tratado de limites definia a fronteira Chuí-Quaraí, tomando como referência um convênio estabelecido em 10 Correspondência do encarregado de negócios do Brasil no Estado Oriental para o gover-

1821. O tratado de comércio e navegação, dentre outras coisas, tornava livre a passagem de gado pela fronteira e estabelecia a navegação comum do rio Uruguai, além de vedar “a confiscação bélica de propriedade particular”.11 Conforme o tra- tado de prestação de socorros, o governo brasileiro daria um subsídio mensal ao Uruguai, que, por sua vez, reconhecia a dívida pelos empréstimos e o pagamento de indenizações de guerra aos brasileiros que haviam perdido suas propriedades. E, finalmente, pelo tratado de extradição, os governos ficavam obrigados à devolu- ção de desertores e criminosos, assim como de escravos fugidos que ultrapassas- sem a fronteira, sendo que esta ultima disposição contemplaria apenas o Brasil, já que não havia mais escravidão no território oriental.

Mas teria esse acordo bilateral de fato marcado o fim dos problemas com os escravos na fronteira? Quais teriam sido as consequências dessas negociações para ambos os países? Uma análise mais profunda evidencia que, ao invés de mar- car um período de estabilidade, este tratado suscitou novas questões, que ainda envolviam a possibilidade de mobilidade social dos cativos através do trânsito fron- teiriço.

Pelo artigo 6º do tratado de extradição de 12 de outubro, o governo do Uruguai reconhecia o princípio de devolução dos escravos pertencentes a brasilei- ros que, contra a vontade de seus senhores, fossem, por qualquer maneira, para o território uruguaio e ali se encontrassem. A devolução contava com as seguin- tes disposições: os escravos deveriam ser reclamados diretamente pelo governo imperial ou por meio de seu representante na República Oriental; admitia-se que a reclamação fosse feita pelo presidente da província do Rio Grande do Sul, se o escravo pertencesse a um residente daquela localidade; admitia-se também que a reclamação partisse do senhor do escravo, perante autoridade competente do lugar em que ele estivesse; a reclamação deveria ser acompanhada de documentos que provassem o direito à propriedade, segundo as leis do Brasil; as despesas que se fizessem para apreensão e devolução do escravo deveriam ser pagas pelo recla- mante.12

O tratado não significou a estabilidade almejada pelo governo brasileiro, pois não previa os procedimentos a serem tomados diante de uma série de situações que se tornavam evidentes com o passar do tempo e com a especificidade de cer- tas reclamações. O governo do Uruguai, ao se sentir lesado quanto às resoluções do tratado que iam de encontro à legislação do país e quanto às atitudes tomadas 11 GOLIN, Tau. A fronteira: os tratados de limites Brasil-Uruguai-Argentina, os trabalhos demarcatórios, os territórios contestados e os conflitos na bacia do Prata, volume 2. Porto Alegre: L&PM, 2004, p. 35.

por muitos proprietários brasileiros, enviou, em julho de 1852, uma circular refe- rente ao tratado de extradição de escravos que incluía certas especificações. Esse documento, além de revalidar certas cláusulas do tratado quanto às reclamações e às despesas, procurava instituir outros princípios que foram depois combatidos ou contornados pelo Império, causando algumas contendas entre os governos. Num dos pontos desta circular o Estado Oriental estabelecia o seguinte:

Fica entendido que não devem ser reclamados, nem podem ser devolvidos, os escravos brasileiros que tenham entrado no nos- so território como fugidos, antes do dia 14 de novembro do ano passado [1851], que é a data de ratificação do respectivo Tra- tado, o qual não poderia ter vigor senão desse dia em diante.13

O governo uruguaio atrelava, assim, o direito dos senhores ao momento da fuga do escravo. Pela parte brasileira, foram feitas reclamações contra a disposi- ção, o que era de se esperar já que o tratado havia sido celebrado não só prevenir acontecimentos futuros como também resolver os diversos casos de fuga anterio- res àquele ano e ainda pendentes. A grande indagação dos proprietários era: os senhores que não tivessem seus escravos devolvidos seriam por acaso indenizados pelo governo oriental? Diante de uma economia bastante fragilizada pelos gastos da guerra, pelo saldo das dívidas devido a empréstimos estrangeiros, pelos prejuí- zos dos próprios cidadãos orientais, como poderia o governo uruguaio se compro- meter a destinar uma verba para essas compensações? Em 25 de julho de 1853 foi sancionada uma lei concernente às reclamações pelos prejuízos causados no perío- do do conflito, já que os decretos anteriores não haviam sido suficientes para esta-