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2 QUADRO TEÓRICO CONCEITUAL

2.4 Entre o subjetivo e o operacional: contribuições da Teoria dos Campos

O presente estudo tem como foco central os aspectos subjetivos de crianças consideradas em situação de dificuldade de aprendizagem e o processo de aprendizagem destas. Sabe-se que a subjetividade não é a psique em sua totalidade, temos outros processos psíquicos que não fazem parte da subjetividade, mas podem ser por ela influenciadas, por exemplo alguns processos intimamente relacionado ao fisiológico ou processos memorísticos. Outro processo importante a se destacar, principalmente quando falamos de aprendizagem matemática, é o operacional, que por vezes pode estar relacionado a processos memorísticos, porém, a aprendizagem, como já destacaram Mitjáns Martínez e González Rey (2012), vai

além dos processos memorísticos e operacionais, pois pressupõe um caráter ativo, intencional, reflexivo e emocional. A aprendizagem não é apenas uma expressão do cognitivo, mas é uma expressão da subjetividade, pois o cognitivo é uma produção subjetiva.

Assim, para entender os processos operacionais na realização de atividades matemáticas e na aprendizagem matemática nos apoiaremos na Teoria dos Campos Conceituais de Gerárd Vergnaud (2009a, p. 41). Para o Estudioso

os processos cognitivos organizam não só a conduta (as diferentes etapas de aprendizagem) – a representação, a percepção e, de forma geral, a atividade - como também o desenvolvimento das competências de um indivíduo no decorrer da sua experiência. Esta perspectiva de desenvolvimento leva-nos a tirar consequências de duas ordens: teóricas e práticas. De fato o que se desenvolve no decorrer da experiência é um amplo repertório de formas de organização da atividade: os gestos, os afetos e as emoções; a linguagem, as relações com outrem, os saberes e as competências [savoir-faire] científicos e técnicos.

Para Vergnaud (2009a), no momento de realização de uma atividade matemática a criança não está envolvida apenas com o cognitivo, mas nesse processo há uma rede de fatores que irão, de forma sistêmica, se organizar para realização da atividade. Assim, o autor traz o conceito de esquema, no qual destaca que este abrange a ideia de organização. É importante destacar nesse momento que essa teoria vem nos dar suporte no que se refere aos processos operacionais da criança na aprendizagem matemática, e não tenta explicar a psique, mas sim sua parte operacional, que é uma expressão da subjetividade. Vergnaud (2009a) traz o caráter sistêmico do operacional na realização de atividades matemáticas, já que é um processo que se dá na organização cognitiva. Nessa perspectiva a produção de um esquema sempre se dá dentro de uma situação, e é na situação que os esquemas serão produzidos. Nessa perspectiva, Vergnaud (2009a, p. 43) destaca que

o conhecimento é adaptação que ocorre pelos esquemas; estes, por sua vez, se adaptam a situações. Assim, estamos longe do binômio estímulo/resposta dos behavioristas e, ao mesmo tempo, trata-se de algo mais rigoroso que o par utilizado tradicionalmente: sujeito/objeto.

É nessa linha de pensamento que o autor define esquema a partir de quatro componentes: “objetivos, subobjetivos e antecipações; regras em ação de tomada de informação e de controle; invariantes operatórios: conceitos em ação e teoremas em ação; possibilidades de inferência em situação” (VERGNAUD, 2009b, p. 21).

Vergnaud (2009b) destaca que o objetivo é a parte intencional do esquema e é essencial na organização da atividade.

O objetivo se decompõe em subobjetivos, sequencialmente e hierarquicamente agenciados; os quais dão lugar a numerosas antecipações.

Mesmo quando o objetivo é somente parcialmente consciente e os efeitos esperados da ação não são, de forma alguma, previsíveis pelo sujeito, esse caráter intencional da conduta e da atividade não pode ser ignorado. Ele é, com efeito, a fonte de aspectos diferenciais importantes da conduta, na educação e no trabalho, em particular. A força da intenção é variável; diversas intenções distintas podem coexistir na mesma atividade; satisfazer ou seduzir o outro e em paralelo atingir um objetivo puramente material (VERGNAUD, 2009b, p. 22)

As regras “formam a parte propriamente generativa do esquema: elas engendram a atividade à medida que evoluem as variáveis da situação” (VERGNAUD, 2009a, p. 45). Os invariantes operatórios se concretizam no movimento que se dá entre os conceitos em ação e os teoremas em ação, situação em que “os conceitos em ação permitem tirar do meio as informações pertinentes e selecionar os teoremas em ação necessários ao cálculo, ao mesmo tempo, os objetivos e subobjetivos suscetíveis de serem formados, e de regras em ação, de tomada de informação e de controle permitindo atingi-los” (VERGNAUD, 2009b, p. 22).

Nesse momento é importante definirmos esses dois termos, que serão centrais na produção de esquemas durante a realização de atividades matemáticas: “um conceito em ação é um conceito considerado pertinente em uma situação. Um teorema em ação é uma proposição tida como verdadeira na ação em situação (VERGNAUD, 2009b, p. 23).

Na produção de esquemas, para realização de uma atividade matemática, são mobilizados diferentes informações, emoções, representações, signos, significantes, significados, é uma rede que está em movimento para realizar a atividade. Assim, “a conduta não é formada somente por ações, mas também por informações necessárias à continuidade da atividade, e os controles que permitem ao sujeito ter segurança de que ele fez o que pensava fazer e que ele continua no caminho escolhido” (VERGNAUD, 2009b, p. 22).

O operacional na Teoria dos Campos Conceituais está atrelado ao conceito de esquema, essencial para a produção matemática. Apesar de seguir uma linha cognitivista, Vergnaud (2009a) destaca a importância das experiência em contexto no processo de produção de esquemas, assim como das emoções manifestadas nesse processo. Nesse sentido, destacamos a importância dessa teoria na análise da aprendizagem da criança em situação de dificuldade de aprendizagem matemática, dentro do seu caráter sistêmico e configuracional. Assim, “compreendemos que a ideia de sistema é a que nos permite a integração do operacional e do subjetivo como configuração subjetiva em processo que permite explicar a aprendizagem para além do contexto imediato da operação” (MITJÁNS MARTÍNEZ; GONZÁLEZ REY, 2012, p. 77).