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2 QUADRO TEÓRICO CONCEITUAL

2.7 O papel do outro no processo de aprendizagem

Acreditamos que a aprendizagem está relacionada com o domínio dos conhecimentos de uma dada cultura. Assim, é a partir da interação comunicativa com outros sujeitos que se dará a aquisição e criação de conhecimentos. Como destaca Maturana (2002, p. 29)

o educar se constitui no processo em que a criança ou o adulto convive com o outro e, ao conviver com o outro, se transforma espontaneamente, de maneira que seu modo de viver se faz progressivamente mais congruente com o do outro no espaço de convivência.

Nessa perspectiva, acreditamos que o aprender, parte constituinte do processo educacional, só é possível na relação com outros indivíduos. É no meio social que o indivíduo se constitui, tomando a cultura como fonte constante de conhecimento, aprendizagem e desenvolvimento.

Para Maturana (2002), o desenvolvimento do cérebro humano se deu a partir da capacidade do homem de se comunicar com o outro e comunicar-se consigo mesmo, com seu presente-passado-futuro, entre o realizado e o realizável. A comunicação permite a aprendizagem e consequentemente o desenvolvimento do indivíduo.

Vigotski (1991) também destacou a importância do outro nesse processo de humanização do homem, ressaltando que são as relações sociais que constituem o homem, pois é por meio dessas relações que se dá a apropriação da cultura.

Outro importante teórico que ressaltou a importância do outro no processo de construção do conhecimento, na área da aprendizagem matemática, foi Brousseau (1996). O autor explica o processo de aprendizagem matemática utilizando a teoria das Situações Didáticas, demonstrada no Triângulo Didático, composto por aluno, professor e saber, da seguinte forma apresentada na Figura 1:

Figura 1 - Triângulo didático de Brousseau

A relação entre professor e aluno, dentro do ambiente escolar, se dá, segundo Brousseau (1996), por meio da relação didática que se estabelece entre as duas partes, no qual o objetivo final é a obtenção do conhecimento. Essa relação se estabelece por meio do “Contrato Didático” (Brousseau, 1996) que pode ser explícito ou implícito. E é nessa relação que ambos se constituem nesse processo, situação em que o aluno pode ser receptor ou construtor, reprodutor ou criador. As regras do contrato didático, ou melhor, como o aluno significa, percebe tais regras, define fortemente a natureza da sua produção de conhecimento escolar.

É nesse caminho que a Teoria da Subjetividade não estabelece um determinismo causal entre a didática e a aprendizagem, porém, há certas ações e didáticas que favorecem uma boa relação entre professor-aluno e aluno-saber, situação em que a empatia, a motivação e o lúdico estão presentes. Porém, essa não é a fórmula secreta para o fim dos problemas em relação às dificuldade de aprendizagem matemática, como já destacou Brousseau (1996, p. 71)

Conhecer o sujeito cognitivo é suficiente para resolver os problemas do aluno? Não acredito: a criação e a gestão das situações de ensino não são redutíveis a uma arte que o professor poderia desenvolver espontaneamente com boas atitudes (escutar a criança, etc.), com o manejo de técnicas simples (utilizar jogos, material ou o conflito cognitivo, por exemplo). A didática não se reduz a uma tecnologia, e sua teoria não é a da aprendizagem, mas a da organização das aprendizagens de outro ou, mais genericamente, a da difusão e transposição dos conhecimentos.

Acrescentaríamos, ainda, o olhar sobre as necessidades emocionais, ou conflitos afetivos, que fazem parte da construção ou obtenção do conhecimento, no qual o ambiente escolar é apenas mais um espaço de aprendizagem e socialização, pois o indivíduo faz parte de uma rede de conexões entre experiências passadas e ações presentes. Novamente trazemos esse sujeito que aprende como um ser sistêmico, situação em que os espaços sociais e a cultura circundam suas concepções, conceitos e ações.

É no meio social, dentro de um contexto cultural, na interação com outros indivíduos, que ocorre a aprendizagem. É na relação com o outro, dentro de uma determinada cultura, que se dará a constituição da subjetividade individual. Nesse processo, o sujeito que aprende matemática se constitui na relação com a subjetividade social.

Muitas pesquisas na área de dificuldade de aprendizagem matemática (CORSO, 2008; LAUTERT, 2005; MOURA, 2007; MULLER, 2012) apresentam como foco de estudo processos interventivos com novas metodologias e didáticas de ensino. Tais pesquisas revelam as novas metodologias como a causa para a superação de dificuldades na

aprendizagem matemática, sem analisar os processos emocionais mobilizados nessa dinâmica. É importante pensarmos se são realmente as metodologias e didáticas que fazem a diferença nesse processo de superação das dificuldades de aprendizagem matemática. As recentes pesquisas no Brasil nos mostram muito sobre os processos cognitivos e sobre as didáticas da matemática, mas quase nada sobre os processos simbólico-emocionais produzidos nesse processo e com essas novas metodologias ou intervenções.

Vigotski (2009b) e Maturana (2002) destacaram a importância da comunicação no processo de desenvolvimento humano, e é por meio dessa comunicação que ocorre a aprendizagem e a apreensão da cultura historicamente construída. É na relação com o outro, na comunicação com o outro, por meio de um arcabouço simbólico-emocional, que ocorre a aprendizagem e o desenvolvimento subjetivo, incluindo a construção de conceitos matemáticos, historicamente construídos dentro da nossa cultura.

Nesse sentido Maturana (2002) destaca:

Por isso, toda história individual humana é sempre uma epigênese na convivência humana. Isto é, toda história individual humana é a transformação de uma estrutura inicial hominídea fundadora, de maneira contingente com uma história particular de interações que se dá constitutivamente no espaço humano. Esta se constituiu na história hominídea a que pertencemos com o estabelecimento do linguajar como parte do nosso modo de viver (MATURANA, 2002, p. 28).

Tanto Maturana (2002), como Vigotski (2010) trazem as emoções como um componente essencial no processo de desenvolvimento da humanidade e do indivíduo. Os processos emocionais são responsáveis pela construção de si, do outro e do social. Um emocional que González Rey (2005a) apresenta como inseparável do simbólico, onde a inteligibilidade e as emoções são processo simultâneos.

Assim, o outro pode se estabelecer como um facilitador na produção subjetiva da criança que aprende, já que trará novas situações que podem desestabilizar a criança tanto cognitivamente como emocionalmente, promovendo movimentos em sua subjetividade, assim como possibilitando a produção de novos sentidos subjetivos de um sujeito que aprende.