Seja T : X → X cont´ınua e X compacto. Sejam h∗(T ) e h∗(T, α) os n´umeros que ocorrem na defini¸c˜ao de entropia topol´ogica usando coberturas abertas (as defini¸c˜oes de Bowen ficar˜ao sem asteriscos).
Para comparar as defini¸c˜oes de entropia topol´ogica precisaremos das seguintes esti- mativas.
Lema 7.7. Se T : X → X ´e uma transforma¸c˜ao cont´ınua e α ´e uma cobertura de X com n´umero de Lebesgue l ent˜ao
N n−1 _ i=0 T−iα ! ≤ rn( l 2) ≤ sn( l 2) .
Demonstra¸c˜ao. A segunda desigualdade vem do Lema 7.6. Seja Y um (n, l
2)-gerador com
cardinalidade m´ınima, igual a rn(2l). Temos que
X = [
y∈Y
Bn(y,
l 2) .
Como cada bola de raio 2l tem diˆametro l, ent˜ao cada uma delas est´a contida num elemento da cobertura α. Logo cada conjunto Bn(y,2l) est´a contido num elemento de
Wn−1
i=0 T
−iα, isto ´e, existe uma subcobertura deWn−1
i=0 T
−iα com r
n(2l) elementos.
Lema 7.8. Seja T : X → X uma transforma¸c˜ao cont´ınua, > 0 e γ cobertura com diˆametro menor ou igual a . Ent˜ao
rn() ≤ sn() ≤ N n−1 _ i=0 T−iγ ! .
Demonstra¸c˜ao. Seja E um conjunto (n, )-separado com cardinalidade m´axima igual a sn(). Se diam(γ) ≤ , ent˜ao para todo par de pontos distintos x e y de E existe i entre
0 e n − 1 tal que Tix e Tiy n˜ao pertencem ao mesmo elemento da cobertura γ. Isto ´e, x e y n˜ao pertencem ao mesmo elemento da coberturaWn−1
i=0 T
−iγ. Como toda subcobertura
deWn−1
i=0 T
−iγ deve cobrir E, ser´a sempre preciso ter no m´ınimo tantos elementos quanto
E tem, e o resultado segue.
Teorema 7.9. Se T : X → X ´e transforma¸c˜ao cont´ınua do espa¸co m´etrico compacto X ent˜ao h(T ) = h∗(T ).
Demonstra¸c˜ao. Se α for uma cobertura com n´umero de Lebesgue 2 ent˜ao do Lema 7.7 segue que h∗(T, α) ≤ r(, T ) e da´ı que h∗(T ) ≤ h(T ). Por outro lado, se γ for uma cobertura de diˆametro menor ou igual a ent˜ao segue que s(, T ) ≤ h∗(T, γ), portanto h(T ) ≤ h∗(T ).
Observe que se T for cont´ınua podemos usar os Lemas 7.7 e 7.8 para ver que o “lim sup” pode ser trocado pelo “lim inf”.
Teorema 7.10. Se T ´e cont´ınua e X espa¸co m´etrico compacto ent˜ao h(T ) = lim
→0lim infn→∞
1
n log rn() = lim→0lim infn→∞
1
nlog sn() .
7.3
Exemplos
Os primeiros exemplos n˜ao s˜ao propriamente exemplos, mas “geradores” de exemplos. Teorema 7.11. Se (X, d) ´e espa¸co m´etrico compacto ent˜ao h(Tm) ≤ mh(T ), para todo m ≥ 1. Se T for cont´ınua ent˜ao h(Tm) = mh(T ).
Demonstra¸c˜ao. Seja > 0 e En conjunto (n, )-gerador m´ınimo, ∀n ≥ 1. Ent˜ao Enm ´e
(n, )-gerador para Tm. Isso implica que
rn(, Tm) ≤ rnm(, T ) ,
onde a nota¸c˜ao foi expandida para deixar claro de qual aplica¸c˜ao estamos falando. Logo r(, Tm) = lim sup n→∞ 1 nlog rn(, T m) ≤ m lim sup n→∞ 1 nmlog rnm(, T ) ≤ m lim sup k→∞ 1 k log rk(, T ) = mr(, T ) . Logo h(Tm) ≤ mh(T ).
Se T ´e cont´ınua ent˜ao ´e uniformemente cont´ınua. Isso implica que, dado > 0 existe δ > 0 tal que d(x, y) ≤ δ implica dm(x, y) ≤ . Se E ´e conjunto (n, δ)-gerador para Tm
ent˜ao ´e (nm, )-gerador para T . Al´em disso, como T ´e cont´ınua podemos usar a defini¸c˜ao com “lim inf”. Portanto
m lim inf
k→∞
1
k log rk(, T ) ≤ m lim infn→∞
1
nmlog rnm(, T ) ≤ lim infn→∞
1
n log rn(δ(), T
m) ,
e tomando o limite quando → 0 sai mh(T ) ≤ h(Tm), pois δ() tamb´em vai a zero.
Teorema 7.12. Sejam Ti : Xi → Xi, i = 1, 2, aplica¸c˜oes de espa¸cos m´etricos compactos.
Ent˜ao h(T1× T2) = h(T1) + h(T2).
Demonstra¸c˜ao. Sejam d1 e d2 as m´etricas de X1 e X2 e seja d a m´etrica de X1× X2 dada
pelo m´aximo das distˆancias nas coordenadas.
Se E1 e E2 s˜ao (n, )-geradores para, respectivamente, T1 e T2, ent˜ao E = E1× E2 ´e
(n, )-gerador para T1× T2, implicando rn(, T1× T2) ≤ rn(, T1) · rn(, T2). Por passagem
ao lim sup (ap´os tirar o logaritmo e dividir por n) e ao limite quando → 0 conclui-se que h(T1× T2) ≤ h(T1) + h(T2).
J´a se F1e F2s˜ao conjuntos (n, )-separados para T1e T2ent˜ao F1×F2´e (n, )-separado
para T1× T2, logo
sn(, T1) · sn(, T2) ≤ sn(, T1× T2) .
Shifts e subshifts Usaremos o Teorema 7.3 para calcular a entropia topol´ogica dos shifts de Bernoulli e cadeias de Markov.
Considere em X = Σd(ou Σ+d) a parti¸c˜ao α formada pelos conjuntos da forma {x; x0 =
j}, j = 1, . . . , d. Observe que α ´e ao mesmo tempo uma parti¸c˜ao e uma cobertura aberta, pois X ´e totalmente desconexo. Considere tamb´em as coberturas (ou parti¸c˜oes) αk =Wk−1
i=0 T
−iα, k ≥ 1, que nada mais s˜ao do que os cilindros com k s´ımbolos fixados.
O diˆametro de αk tende a zero quando k tende a infinito, portanto a entropia topol´ogica
pode ser calculada por h(T ) = limk→∞h(T, αk).
Observe tamb´em que
n−1 _ i=0 T−iαk = n+k−2 _ i=0 T−iα . Assim, h(T, αk) = lim n→∞ 1 nH n−1 _ i=0 T−iαk ! = lim n→∞ 1 nH n+k−2 _ i=0 T−iαk ! = lim n→∞ n + k − 2 n 1 n + k − 2H n+k−2 _ i=0 T−iαk ! = h(T, α) , logo h(T, α) = h(T ).
Como todos os elementos de αn s˜ao essenciais para a cobertura, ent˜ao
N (αn) = dn,
logo h(T ) = log d para os shifts de Bernoulli com d s´ımbolos.
Agora consideremos X1 ⊂ X tal que T X1 = X1. Gostar´ıamos de determinar a entro-
pia topol´ogica de T1 = T |X1. Se definirmos θn como a cardinalidade dos (j0, . . . , jn−1)
tais que X1 intersecta {x; x0 = j0, . . . , xn−1 = jn−1}, ent˜ao θn ser´a exatamente o n´umero
N Wn−1
i=0 T
−iα para T 1.
Os subshifts de tipo finito s˜ao um caso particular e importante de subconjuntos invariantes de X. Seja A = (aij) uma matriz d × d de zeros e uns e seja
XA= {x; axixi+1 = 1, ∀i} ,
onde “∀i” ´e entendido como i ≥ 0 se X ´e unilateral e i ∈ Z se X ´e bilateral. Ou seja, A fornece as transi¸c˜oes permitidas.
Para determinar a entropia topol´ogica de T |XA precisamos calcular o n´umero θn, isto
´
e, o n´umero de seq¨uˆencias permitidas de tamanho n. Mas uma seq¨uˆencia (j0, . . . , jn−1) ´e
permitida se e somente se
Assim θn= X (j0,...,jn−1) aj0j1aj1j2. . . ajn−2jn−1 . Por´em X (j1,...,jn−2) aj0j1aj1j2. . . ajn−2jn−1 = a (n−1) j0jn−1 ,
que ´e a entrada (j0, jn−1) da matriz An−1, implicando que θn ´e a soma das entradas da
matriz An−1. Se adotarmos como norma de matrizes a soma dos valores absolutos das
entradas, ent˜ao teremos
θn = kAn−1k . Logo h(T ) = h(T, α) = lim n→∞ 1 nlog kA n−1k = lim n→∞log kA n−1k1n .
O Teorema de Perron-Frobenius garante que uma matriz n˜ao-negativa sempre tem um autovalor n˜ao-negativo λ, com um autovetor de entradas n˜ao-negativas, que ´e, em valor absoluto, maior ou igual a qualquer outro autovalor. Logo esse autovalor λ ´e o raio espectral de A, que tamb´em ´e igual ao limite de kAn−1kn1. Portanto h(T ) = log λ.
Homeomorfismos do c´ırculo Mostremos que a entropia topol´ogica de um homeo- morfismo do c´ırculo ´e nula.
Seja T o homeomorfismo. Certamente (e com folga) r1() ≤ [1]+1 ≡ N. Mostraremos
que se for suficientemente pequeno ent˜ao
rn() ≤ rn−1() + N .
Da´ı que rn() ≤ nN, implicando que r() = 0 e portanto h(T ) = 0.
Seja F um (n − 1, )-gerador com #F = rn−1(). Considere os pontos de Tn−1F e
adicione um conjunto de pontos E de tal forma que os intervalos determinados pelos pontos em conjunto tenham tamanho menor do que . Certamente n˜ao s˜ao necess´arios mais do que N pontos para isso, de forma que o conjunto F0 ≡ F ∪ T−(n−1)E tem no
m´aximo rn−1() + N pontos. Temos que mostrar apenas que F0 ´e um (n, )-gerador, se
for suficientemente pequeno.
Seja x ∈ S1. Precisamos de y ∈ F0 tal que as propriedades
max
0≤i≤n−2d(T
ix, Tiy) ≤ , d(Tn−1x, Tn−1y) ≤
sejam satisfeitas. Existe um ponto de y ∈ F que satisfaz a primeira, mas n˜ao necessari- amente a segunda. Se ele n˜ao satisfaz a segunda, ent˜ao os dois intervalos determinados
por Tn−1x e Tn−1y s˜ao maiores do que . Um deles (que chamaremos de I) ´e a imagem
do intervalo (que chamaremos de I0) entre Tn−2x e Tn−2y que ´e menor ou igual a . Por defini¸c˜ao, existe um ponto de E em I da forma Tn−1z, com z ∈ F0, com a propriedade
de que d(Tn−1x, Tn−1z) ≤ . S´o precisamos garantir que para cada i = 0, . . . , n − 3 o
ponto Tiz esteja contido no intervalo entre Tix e Tiy de tamanho menor ou igual a , desde que seja suficientemente pequeno.
Mostremos isso para i = n − 3, e o racioc´ınio pode ser completado por indu¸c˜ao. Como T ´e homemorfismo ent˜ao em particular T−1 ´e uniformemente cont´ınua, logo se ´
e suficientemente pequeno ent˜ao d(x, y) ≤ implica d(T−1x, T−1y) < 14. Se Tn−3z =
T−1Tn−2z n˜ao estivesse no intervalo certo ent˜ao estaria a distˆancia maior ou igual a 38 de Tn−3x ou de Tn−3y, o que seria uma contradi¸c˜ao.
Aplica¸c˜oes Lipschitz de uma variedade compacta Seja M uma variedade Rie- manniana compacta de dimens˜ao d e seja T : M → M uma aplica¸c˜ao Lipschitz, isto ´
e, tal que existe K > 0 de modo que d(T x, T y) ≤ Kd(x, y) para todo par de pontos x, y ∈ M . Obteremos uma limita¸c˜ao superior para a entropia topol´ogica de T .
Observe que se K ≤ 1 ent˜ao um (1, )-gerador tamb´em ´e um (n, )-gerador, para qualquer n, logo h(T ) = 0. Ent˜ao seja K > 1.
Considere m cartas φj, j = 1, . . . , m de abertos de Rd contendo B(0; 3) tais que a
uni˜ao das imagens de B(0; 1) cubra M . Nos dom´ınios das cartas considere a norma do m´aximo. Seja C tal que d(φj(u), φj(v)) ≤ Cku − vk. Seja tamb´em 0 < δ < 1 e E(δ) a
interse¸c˜ao do reticulado de hipercubinhos de tamanho δ com a bola B(0; 2). A distˆancia m´ınima entre os pontos de E(δ) ´e delta, e h´a no m´aximo (4δ)d pontos em E(δ).
Tome agora F (δ) = m [ j=1 φj(E(δ)) . ´
E f´acil ver que para qualquer ponto x ∈ M existe um ponto y ∈ F (δ) tal que d(Tix, Tiy) ≤
KiCδ, qualquer i ≥ 1.
Fixando > 0, tome δ = (KnC)−1. Neste caso F (δ) ser´a um (n, )-gerador. A
cardinalidade de F (δ) ´e no m´aximo m(4δ)d = Kndm(4C−1)d, e portanto este n´umero ´e uma limita¸c˜ao para rn(). Da´ı que r() ≤ d log K, independentemente de .