• Nenhum resultado encontrado

2 Transformações que preservam medida Exemplos Isomorfismos O Teorema da Recorrência de Poincaré...

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "2 Transformações que preservam medida Exemplos Isomorfismos O Teorema da Recorrência de Poincaré..."

Copied!
157
0
0

Texto

(1)

Sum´

ario

1 Revis˜ao de Teoria da Medida 3

1.1 Espa¸cos de medida . . . 3

1.2 Algebras, semi-´´ algebras e parti¸c˜oes . . . 4

1.3 Extens˜ao . . . 10

1.4 Integra¸c˜ao . . . 15

1.5 Medidas absolutamente cont´ınuas . . . 17

1.6 Formas de volume . . . 17

1.7 Medidas regulares . . . 20

2 Transforma¸c˜oes que preservam medida 23 2.1 Defini¸c˜oes e motiva¸c˜ao . . . 23

2.2 Exemplos . . . 27

2.3 Isomorfismos . . . 51

2.4 Teorema da Recorrˆencia de Poincar´e . . . 55

2.4.1 O Teorema da Recorrˆencia de Poincar´e . . . 55

2.4.2 Recorrˆencia m´etrica . . . 56

2.5 O conjunto das medidas invariantes . . . 57

2.5.1 Transforma¸c˜ao sem medida invariante . . . 57

2.5.2 M´etrica em M(X) . . . 58

2.5.3 Compacidade de M(X) . . . 61

2.5.4 N˜ao-vacuidade de MT(X) . . . 61

2.5.5 Gerando medidas invariantes . . . 62

3 O Teorema Erg´odico de Birkhoff 65 3.1 Vers˜ao simplificada do Teorema Erg´odico . . . 65

3.2 Teorema Erg´odico Lp de Von Neumann . . . 69

(2)

4 Ergodicidade 71

4.1 Ergodicidade . . . 71

4.2 Exemplos . . . 75

4.3 Ergodicidade em shifts de Markov . . . 79

4.4 Pontos extremais . . . 82

4.5 Ergodicidade ´unica . . . 84

4.6 O suporte . . . 89

4.7 Sobre a decomposi¸c˜ao erg´odica . . . 90

5 Mixing 93 5.1 Defini¸c˜oes . . . 93

5.2 Mixing em shifts de Markov . . . 98

5.3 Ergodicidade e mixing na forma funcional . . . 99

5.4 Propriedades espectrais . . . 103

6 Entropia 109 6.1 Entropia de uma parti¸c˜ao: defini¸c˜ao . . . 109

6.2 Entropia de uma transforma¸c˜ao . . . 110

6.3 Existˆencia do limite . . . 111

6.4 Propriedades . . . 114

6.4.1 Parti¸c˜oes e sub-σ-´algebras . . . 114

6.4.2 Entropia de uma parti¸c˜ao e entropia condicional: propriedades . . 114

6.4.3 Entropia de uma transforma¸c˜ao: propriedades . . . 117

6.4.4 Dependˆencia da medida . . . 121

6.5 M´etodos para calcular a entropia . . . 123

6.5.1 Fatos b´asicos . . . 123

6.5.2 Geradores . . . 125

6.5.3 Exemplos . . . 126

6.6 O Teorema de Shannon-McMillan-Breiman . . . 130

7 Entropia topol´ogica 135 7.1 Defini¸c˜oes . . . 135

7.1.1 Defini¸c˜ao original . . . 136

7.1.2 Defini¸c˜ao de Bowen . . . 138

7.2 Equivalˆencia das defini¸c˜oes . . . 141

7.3 Exemplos . . . 142

(3)

Cap´ıtulo 1

Revis˜

ao de Teoria da Medida

Reuniremos os conceitos de Teoria da Medida necess´arios para o desenvolvimento da Teoria Erg´odica.

1.1

Espa¸

cos de medida

Uma medida ´e uma fun¸c˜ao dos subconjuntos (ou partes) de algum conjunto X, que associa “massas” a cada uma dessas partes. Evidentemente, uma medida deve satisfazer certas propriedades intuitivas que idealizamos para uma fun¸c˜ao “massa”.

A rigor, dificilmente uma medida se define no conjunto P(X) (ou 2X) de todas as

partes de X, porque isso j´a foi demonstrado n˜ao levar a propriedades interessantes, na maioria dos casos. Da´ı a necessidade de se definir classes de subconjuntos com proprie-dades m´ınimas que tornem vi´avel uma teoria.

Defini¸c˜ao 1.1. Seja X um conjunto qualquer. B ⊂ P(X) ´e uma σ-´algebra se 1. ∅ ∈ B

2. A ∈ B implica Ac ∈ B

3. Ai ∈ B, ∀i = 1, 2, . . ., implica ∪∞i=1Ai ∈ B

O par (X, B) ´e chamado de espa¸co mensur´avel, enquanto um elemento B ∈ B ´e referido como um conjunto mensur´avel.

Defini¸c˜ao 1.2. Uma medida em (X, B) ´e uma fun¸c˜ao µ : B → [0, ∞] que ´e contavel-mente aditiva, isto ´e, se {Bi}i∈N for uma cole¸c˜ao dois a dois disjunta de elementos de

(4)

B ent˜ao µ( ∞ [ i=1 Bi) = ∞ X i=1 µ(Bi) .

Em particular, se houver um elemento B de medida finita, ent˜ao µ(B) = µ(B ∪ ∅) = µ(B) ∪ µ(∅) ,

logo µ(∅) = 0. ´E claro que esse ser´a sempre o caso, sen˜ao n˜ao h´a muito interesse na medida.

Se a medida tiver imagem em [0, ∞) ent˜ao diz-se que ela ´e finita. Se for finita, pode ser normalizada para que µ(X) = 1, e neste caso ´e chamada de medida de probabilidade, ou simplesmente de probabilidade.

A tripla (X, B, µ) ´e chamada de espa¸co de medida, ou de espa¸co de probabili-dade, se µ(X) = 1.

1.2

Algebras, semi-´

´

algebras e parti¸

oes

O processo de defini¸c˜ao (ou identifica¸c˜ao) de uma medida ´e facilitado da seguinte forma: define-se a medida para certos subconjuntos da σ-´algebra e depois estende-se a medida a toda ela. Algumas observa¸c˜oes e defini¸c˜oes se fazem necess´arias.

Em primeiro lugar, uma fun¸c˜ao pode ser simplesmente finitamente aditiva em seu dom´ınio, formado por subconjuntos de X (desde que a uni˜ao dos subconjuntos conside-rado tamb´em esteja no dom´ınio da fun¸c˜ao).

Em segundo lugar, observamos que P(X) ´e uma σ-´algebra. Al´em disso, ´e f´acil ver que a interse¸c˜ao de duas σ-´algebras ´e uma σ-´algebra. Isto define uma ordem parcial nas σ-´algebras, e faz sentido definir a menor σ-´algebra que cont´em um subconjunto S de P(X). Ela ´e chamada a σ-´algebra gerada por S, e denotada por B(S).

N˜ao ´e necess´ario, no entanto, que as subclasses consideradas sejam sempre σ-´algebras. Definiremos os conceitos de semi-´algebra e ´algebra, que acabam por ser muito ´uteis no exame de casos concretos e na prova de teoremas.

Defini¸c˜ao 1.3. S ⊂ P(X) ´e uma semi-´algebra se: (i) ∅ ∈ S, (ii) A, B ∈ S implica A ∩ B ∈ S; (iii) se A ∈ S ent˜ao Ac ´e uma uni˜ao finita de elementos dois a dois disjuntos

de S.

O conjunto X pode n˜ao ser um elemento da semi-´algebra, mas certamente ser´a uma uni˜ao finita de elementos dois a dois disjuntos da semi-´algebra.

(5)

Defini¸c˜ao 1.4. A ⊂ P(X) ´e uma ´algebra se: (i) ∅ ∈ A, (ii) A, B ∈ A implica A ∩ B ∈ A; (iii) se A ∈ A ent˜ao Ac ∈ A.

Uma ´algebra ´e uma semi-´algebra, de maneira ´obvia. A diferen¸ca ´e que na primeira o complementar de um conjunto da ´algebra est´a na ´algebra, enquanto que na segunda o complementar de um conjunto da semi-´algebra ´e apenas uma uni˜ao finita de elementos da semi-´algebra.

Sejam A, B ∈ A. Temos A ∪ B = (Ac ∩ Bc)c, logo A ∪ B ∈ A. Segue que uni˜oes

finitas de elementos da ´algebra pertencem `a ´algebra. Por outro lado, fazendo o mesmo racioc´ınio, podemos substituir o item (ii) da defini¸c˜ao de ´algebra por (ii’): se A, B ∈ A ent˜ao A∪B ∈ A (assim como uni˜oes finitas de elementos da ´algebra est˜ao na ´algebra).Em particular, toda σ-´algebra ´e uma ´algebra, a ´unica diferen¸ca ´e que na primeira se permite tomar uni˜oes enumer´aveis e na segunda apenas uni˜oes finitas.

Por outro lado, uma ´algebra ser´a sempre uma σ-´algebra se for finita.

A interse¸c˜ao de duas ´algebras ´e uma ´algebra. Chamamos de A(S) a ´algebra gerada pela semi-´algebra S (a interse¸c˜ao de todas as ´algebras que contˆem a semi-´algebra S).

O seguinte Teorema explicita melhor o que ´e a ´algebra gerada por uma semi-´algebra. Teorema 1.5. A ´algebra A(S) consiste exatamente de todos as uni˜oes finitas de elemen-tos dois a dois disjunelemen-tos de S.

Demonstra¸c˜ao. Seja C o conjunto de todas as uni˜oes finitas de elementos dois a dois disjuntos de S. Isto ´e, se C ∈ C ent˜ao C =Sn

i=1Ei, com Ei ∈ S e Ei∩ Ej = ∅ se i 6= j.

Primeiro observamos que C ⊂ A(S). A(S) certamente cont´em S (por defini¸c˜ao) e, por ser ´algebra, ´e fechado pela uni˜ao (finita). Ent˜ao um elemento C como o descrito acima tem que pertencer a A(S).

Como A(S) ´e a menor ´algebra que cont´em S e como S ⊂ C, basta mostrarmos que C ´

e uma ´algebra para conclu´ırmos que C = A(S).

Seja C ∈ C. Queremos mostrar que o complementar de C est´a em C, isto ´e, ´e uma uni˜ao disjunta finita de elementos de S. Mas se C =Sn

i=1Ei ent˜ao X \ C =

Tn

i=1X \ Ei.

Por´em Ei ∈ S implica que X \ Ei ´e uma uni˜ao finita e disjunta de elementos de S:

X \ Ei = mi [ j=1 Dij , de forma que X \ C = n \ i=1 mi [ j=1 Dij .

(6)

Este conjunto, por´em, ´e uma uni˜ao de conjuntos da forma D1j1 ∩ D2j2 ∩ . . . ∩ Dnjn ,

pois os Dij’s s˜ao disjuntos para i fixo. Cada um deles ´e um elemento de S, pois S ´e

fechada por interse¸c˜oes finitas. Al´em disso, s˜ao todos disjuntos entre si, mostrando que X \ C est´a em C.

Da mesma forma, ´e f´acil mostrar que a interse¸c˜ao de dois conjuntos de C tamb´em est´a em C. (EXERC´ICIO)

J´a a descri¸c˜ao de uma σ-´algebra gerada por uma ´algebra ´e melhor compreendida com o conceito de classe mon´otona.

Defini¸c˜ao 1.6. Uma cole¸c˜ao M de subconjuntos de X ´e dita ser uma classe mon´otona se: (i) S∞

i=1Ei pertence a M sempre que a seq¨uˆencia dos Ei’s for crescente; (ii)

T∞

i=1Ei

pertence a M sempre que a seq¨uˆencia dos Ei’s for decrescente.

A interse¸c˜ao de duas classes mon´otonas ´e uma classe mon´otona, de forma que podemos falar na classe mon´otona gerada por uma classe qualquer.

Teorema 1.7. A σ-´algebra e a classe mon´otona geradas por uma ´algebra coincidem. Demonstra¸c˜ao. Sejam A ´algebra, B = B(A) a σ-´algebra gerada por A e M = M(A) a classe mon´otona gerada por A.

Uma σ-´algebra ´e sempre uma classe mon´otona, pois cont´em todas as suas uni˜oes e interse¸c˜oes enumer´aveis (em particular as mon´otonas). Logo B ⊃ M.

Por outro lado, n˜ao necessariamente uma classe mon´otona ´e uma σ-´algebra. No entanto, se soubermos que a classe mon´otona M ´e uma ´algebra ent˜ao saberemos que ´

e tamb´em uma σ-´algebra. Para ver isso, basta mostrar que o fechamento por uni˜oes finitas implica o fechamento por uni˜oes infinitas. Ora, se Ei ∈ M e M for ´algebra, ent˜ao

Fn =Sni=1Ei pertencer´a a M. A seq¨uˆencia {Fn} ´e mon´otona, logoS ∞

n=1Fn pertencer´a a

M. Por outro lado, S∞

n=1Fn´e igual a

S∞

i=1Ei, de forma que esta uni˜ao pertencer´a a M.

Para mostrar que M ´e uma ´algebra, introduzimos a classe L(F ) = {E ∈ P(X); E \ F, F \ E, E ∪ F ∈ M} , definida para qualquer F ⊂ X.

Observe que se para todo E ∈ M valer M ⊂ L(E), ent˜ao para todo par de conjuntos E, F ∈ M valer´a que E \ F , F \ E e E ∪ F pertencem a M, implicando que M ´e ´algebra. Pela simples manipula¸c˜ao de conjuntos, ´e f´acil ver que se L(F ) ´e n˜ao vazio ent˜ao ´e uma classe mon´otona. No caso em que F ∈ A, ´e imediato ver que L(F ) cont´em A,

(7)

portanto cont´em a classe mon´otona M gerada por A. Em outras palavras, se E ∈ M e F ∈ A ent˜ao E ∈ L(F ).

Por´em pela simetria da defini¸c˜ao, se E ∈ L(F ) ent˜ao F ∈ L(E). Podemos dizer ent˜ao que para quaisquer F ∈ A e E ∈ M vale F ∈ L(E). Logo L(E) ´e uma classe mon´otona que cont´em A, para todo E ∈ M, e conseq¨uentemente L(E) ´e uma classe mon´otona que cont´em M, para qualquer E ∈ M, mostrando o que quer´ıamos.

Vejamos alguns poucos exemplos, aos quais retornaremos adiante para ilustrar espa¸cos de medida. Olharemos para aqueles que nos ser˜ao ´uteis nos exemplos relevantes. Outros exemplos podem ser encontrados nos livros de Teoria da Medida. Falaremos mais das semi-´algebras, sendo evidente o que s˜ao as ´algebras geradas por elas, a partir do Teorema acima. Quanto `as σ-´algebras, ficam um pouco mais dif´ıceis de serem caracterizadas. No entanto, em todos os exemplos do curso adotaremos as σ-´algebras geradas pelas semi-´

algebras mencionadas abaixo.

Reta real Tomemos X = R, e consideremos os subconjuntos da forma (a, b] (com a ≤ b; se a = b ent˜ao (a, b] = ∅), juntamente com os subconjuntos da forma (a, ∞) e (−∞, b]. Essa classe de subconjuntos ´e uma semi-´algebra, `a qual chamaremos de semi-´algebra dos intervalos semi-abertos da reta.

Uma semi-´algebra maior, por exemplo, ´e o conjunto de todos os intervalos da reta, abertos, fechados ou semi-abertos, incluindo os casos degenerados (pontos ou o conjunto vazio).

Pode-se tomar tamb´em X = [0, 1] e definir a semi-´algebra dos intervalos de [0, 1]. (EXERC´ICIO: as σ-´algebras geradas por essas semi-´algebras contˆem os abertos?)

Espa¸co real de dimens˜ao n Para X = Rn, escolhe-se uma semi-´algebra S em R e

toma-se a cole¸c˜ao de conjuntos da forma

C1 × C2× . . . × Cn ,

com Cj ∈ S, j = 1, . . . , n. Esses conjuntos s˜ao chamados de retˆangulos. (EXERC´ICIO:

´

e realmente semi-´algebra?)

Seq¨uˆencias com um n´umero finito de s´ımbolos Seja X = {0, 1, . . . , d − 1}Z (resp.

X = {0, 1, . . . , d − 1}N). Denotaremos X por Σ

d (resp. Σ+d). Um elemento de X ´e

denotado por x = (. . . x−2x−1x0x1x2. . .) (resp. por x = (x0x1x2. . .)). Considere agora

os cilindros ou retˆangulos

C(n; y−n. . . y−1y0y1. . . yn) =

(8)

(resp. C(n; y0. . . yn)). O conjunto dos cilindros ´e uma semi-´algebra (EXERC´ICIO).

Outro tipo de elemento, cuja defini¸c˜ao inclui a dos cilindros, ´e o bloco, que ´e um conjunto da forma

j[yj. . . yl]l= {x ; xj = yj, . . . , xl = yl} .

Os blocos n˜ao formam uma semi-´algebra (EXERC´ICIO), mas est˜ao na ´algebra gerada pela semi-´algebra dos cilindros (EXERC´ICIO).

Espa¸cos m´etricos Seja X um espa¸co m´etrico. O conjunto de todos os abertos de X n˜ao ´e necessariamente uma semi-´algebra, pois o complementar de um aberto n˜ao tem que ser uma uni˜ao finita de abertos (basta pensar na reta real). Tomar a cole¸c˜ao de abertos e fechados resolveria o problema do complementar, mas n˜ao da interse¸c˜ao entre dois conjuntos: a interse¸c˜ao de dois abertos ´e aberta, a interse¸c˜ao de dois fechados ´e fechada, mas a interse¸c˜ao de um aberto e um fechado n˜ao ´e necessariamente nem uma coisa nem outra.

A σ-´algebra de Borel (ou dos boreleanos) de X ´e a menor σ-´algebra que cont´em os abertos de X. Em geral, ´e a σ-´algebra adotada quando se fala em espa¸cos m´etricos.

Nos dois primeiros exemplos, a semi-´algebra mencionada gera a σ-´algebra de Borel. No terceiro tamb´em podemos definir uma m´etrica. Seja X = Σ+d e seja

ρ(x, y) = ∞ X i=0 |xi− yi| (d + 1)i .

N˜ao ´e dif´ıcil ver que ρ ´e uma m´etrica. Vale tamb´em que ρ(x, y) < (d+1)1 n se e somente se

x0 = y0, x1 = y1, . . ., xn = yn. (EXERC´ICIO) (EXERC´ICIO: tente definir uma m´etrica

com propriedade semelhante em Σd)

Observe que todo aberto de Rn pode ser escrito como uma uni˜ao enumer´avel de retˆangulos (tome retˆangulos centrados em racionais com lados de tamanhos racionais). Isto significa que todo aberto est´a contido na σ-´algebra gerada pela semi-´algebra dos retˆangulos. Por sua vez, isto implica que a σ-´algebra gerada pelos retˆangulos no m´ınimo cont´em a σ-´algebra de Borel de Rn. Por outro lado, n˜ao ´e dif´ıcil mostrar que todo

retˆangulo est´a contido na σ-´algebra de Borel de Rn, da´ı que a σ-´algebra de Borel cont´em

a σ-´algebra gerada pelos retˆangulos.

No caso de Σde Σ+d, os cilindros s˜ao bolas abertas, e todo aberto de um espa¸co m´etrico

pode ser escrito como uma reuni˜ao de bolas abertas. No entanto s´o h´a uma quantidade enumer´avel de cilindros, implicando que todo aberto ´e uma reuni˜ao enumer´avel de cilin-dros. Ent˜ao os abertos est˜ao contidos na σ-´algebra gerada pelos cilindros. Ao mesmo tempo os cilindros s˜ao abertos, portanto a σ-´algebra de Borel coincide com a σ-´algebra gerada pelos cilindros.

(9)

Espa¸cos topol´ogicos Evidentemente a defini¸c˜ao de σ-´algebra de Borel se aplica para espa¸cos topol´ogicos (´e que na maioria das vezes os espa¸cos topol´ogicos tamb´em ser˜ao m´etricos). Exemplos s˜ao os grupos topol´ogicos e os grupos de Lie.

Um grupo topol´ogico ´e um espa¸co topol´ogico de Hausdorff G que tamb´em ´e um grupo, isto ´e, existe uma opera¸c˜ao de grupo

· : G × G −→ G

que leva (x, y) em x · y, cont´ınua, e tal que a fun¸c˜ao x 7→ x−1 tamb´em ´e cont´ınua. Um grupo de Lie ´e uma variedade C∞ tamb´em com uma estrutura de grupo, onde a composi¸c˜ao ´e uma opera¸c˜ao infinitamente diferenci´avel em G × G (que x 7→ x−1 ´e C∞ sai como conseq¨uˆencia).

Exemplos de grupos de Lie s˜ao

1. S1 = {z ∈ C; |z| = 1}, com a opera¸c˜ao induzida pelo produto em C.

2. Tn= (S1)n, com a opera¸c˜ao produto, isto ´e,

(z1, z2, . . . , zn) · (w1, w2, . . . , wn) = (z1w1, . . . , znwn) .

3. GL(n), o conjunto dos isomorfismos lineares de Rn.

4. SL(n) = {A ∈ GL(n) ; det(A) = 1}. 5. O(n) = {A ∈ GL(n) ; AAT = Id}.

6. SO(n) = {A ∈ GL(n) ; AAT = Id, det(A) = 1}.

7. Rn ou Cn, com a opera¸c˜ao de adi¸c˜ao.

8. {x ∈ R; x > 0}, com a opera¸c˜ao de multiplica¸c˜ao. 9. C \ {0}, com a opera¸c˜ao de multiplica¸c˜ao.

10. Qualquer produto cartesiano de grupos de Lie, com a opera¸c˜ao induzida.

N˜ao usaremos t˜ao cedo o conceito de parti¸c˜ao, mas ´e interessante introduzir o assunto, uma vez que fornece mais exemplos de semi-´algebras e ´algebras.

Seja (X, B) espa¸co mensur´avel. Uma parti¸c˜ao ξ de X ´e uma cole¸c˜ao de conjuntos mensur´aveis dois a dois disjuntos cuja uni˜ao ´e X. Falaremos em geral de parti¸c˜oes finitas.

(10)

Observe que uma parti¸c˜ao finita n˜ao ´e uma semi-´algebra, mas passa a ser se for acrescida do conjunto vazio.

Portanto, se tomarmos todas as uni˜oes poss´ıveis de elementos de uma parti¸c˜ao finita, formaremos uma ´algebra finita (portanto tamb´em uma σ-´algebra) contida em B, isto ´e, uma sub-σ-´algebra finita de B.

Por outro lado, suponha que A = {A1, . . . , Ak} seja uma sub-σ-´algebra finita de B.

Para cada x ∈ X podemos decidir se x ∈ Aj ou x ∈ X \ Aj, e associar um c´odigo

(i1, . . . , ik), onde ij = 0 se x ∈ Aj e ij = 1 caso contr´ario. O ponto x est´a na interse¸c˜ao

dos Aj’s ou seus complementares, dependendo dos ij’s. H´a 2k conjuntos desses, alguns

possivelmente vazios. Eles cobrem X e s˜ao dois a dois disjuntos, formando portanto uma parti¸c˜ao (pode-se excluir o conjunto vazio).

Portanto h´a uma associa¸c˜ao biun´ıvoca entre parti¸c˜oes finitas e sub-σ-´algebras finitas de B.

Quando discutirmos o conceito de entropia falaremos um pouco mais sobre parti¸c˜oes.

1.3

Extens˜

ao

J´a definimos uma medida como uma fun¸c˜ao contavelmente aditiva numa σ-´algebra. Con-sideremos agora fun¸c˜oes τ definidas em semi-´algebras, ´algebras e σ-´algebras, e como elas se estendem de uma para outra. Isso nos permitir´a definir medidas com mais facilidade. Teorema 1.8. Se τ : S → [0, ∞) ´e finitamente aditiva ent˜ao se estende unicamente a τ1 : A(S) → [0, ∞), com τ1 finitamente aditiva. Se τ for contavelmente aditiva ent˜ao τ1

tamb´em ser´a.

Demonstra¸c˜ao. Se A for um conjunto de A(S), ent˜ao A = Sn

k=1Ek, onde os Ek’s s˜ao

conjuntos dois a dois disjuntos de S. A fun¸c˜ao τ1 ´e definida como

τ1(A) = n

X

k=1

τ (Ek) .

No entanto, para mostrar que τ1 est´a bem definida, ´e preciso verificar que τ1(A) n˜ao

depende da decomposi¸c˜ao de A. Ent˜ao suponha que A = n [ k=1 Ek = m [ j=1 Fj ,

onde os Fj’s s˜ao conjuntos dois a dois disjuntos de S. Defina os conjuntos Hkj = Ek∩ Fj,

(11)

disjuntos. Temos ainda que Ek= m [ j=1 Hkj , Fj = n [ k=1 Hkj .

Como τ ´e aditiva em S (desde que a uni˜ao perten¸ca a S), temos τ (Ek) = m X j=1 τ (Hkj) , τ (Fj) = n X k=1 τ (Hkj) . Logo n X k=1 τ (Ek) = n X k=1 m X j=1 τ (Hkj) = m X j=1 n X k=1 τ (Hkj) = m X j=1 τ (Fj) .

O segundo passo ´e mostrar que τ1 ´e finitamente aditiva em A(S). Se A, B s˜ao

con-juntos discon-juntos de A(S) ent˜ao A =Pn

k=1Ek e B =

Pm

j=1Fj, como acima. Como A e B

s˜ao disjuntos, a cole¸c˜ao conjunta dos Ek’s e Fj’s ´e dois a dois disjunta, e forma A ∪ B.

Portanto τ1(A ∪ B) = n X k=1 τ (Ek) + m X j=1 τ (Fj) = τ1(A) + τ1(B) .

O terceiro passo ´e mostrar a unicidade. Suponha que χ seja uma extens˜ao finitamente aditiva de τ . Se A ∈ A(S), ent˜ao A = Sn

k=1Ek, portanto χ(A) =

Pn

k=1χ(Ek) =

Pn

k=1τ (Ek) = τ1(A), onde a igualdade do meio decorre do fato de χ e τ serem ambas

extens˜oes.

Finalmente, devemos mostrar que se τ ´e contavelmente aditiva ent˜ao o mesmo vale para τ1. Seja E =

S∞

k=1Ek ∈ A(S), onde os Ek’s s˜ao elementos dois a dois disjuntos de

A(S). Ao mesmo tempo, E pode ser escrito como uma uni˜ao disjunta finita de elementos de S: E =Sn

r=1Ar. O mesmo vale para cada Ek: Ek=

Snk

i=1Bki.

Os conjuntos Drki = Ar∩ Bki pertencem a S, pois s˜ao interse¸c˜oes de dois elementos

de S. Para cada k temos

τ1(Ek) = nk X i=1 τ (Bki) = nk X i=1 n X r=1 τ (Drki) ,

pois cada Bki ´e a uni˜ao disjunta dos Drki, com r = 1, . . . , n. A ordem das somas pode

ser trocada (s˜ao finitas), de forma que, somando em k, temos

∞ X k=1 τ1(Ek) = ∞ X k=1 n X r=1 nk X i=1 τ (Drki) .

(12)

Como os termos s˜ao todos positivos, a ordem de soma na s´erie n˜ao importa, portanto ∞ X k=1 τ1(Ek) = n X r=1 ∞ X k=1 nk X i=1 τ (Drki) .

Observe agora queS∞

k=1

Snk

i=1Drki´e uma decomposi¸c˜ao de Ar ∈ S em infinitos conjuntos

disjuntos de S. Como estamos supondo que τ ´e contavelmente aditiva, as duas ´ultimas somas resultam em τ (Ar). Logo

∞ X k=1 τ1(Ek) = n X r=1 τ (Ar) = τ1(E) .

O pr´oximo Teorema fala de extens˜ao da ´algebra para a σ-´algebra, mas requer um argumento mais intrincado em sua demonstra¸c˜ao, do qual exibimos apenas um esbo¸co. Para mais detalhes, ver [Taylor].

Teorema 1.9. Se τ1 : A → [0, ∞) ´e contavelmente aditiva e τ1(X) = 1 ent˜ao τ1 se

estende unicamente a uma medida de probabilidade τ2 : B(A) → [0, ∞).

Roteiro da demonstra¸c˜ao. O primeiro passo para a demonstra¸c˜ao desse Teorema ´e a de-fini¸c˜ao de medida exterior. Uma medida exterior ´e uma fun¸c˜ao µ∗ : P(X) → [0, ∞] com as seguintes propriedades: (i) µ∗(∅) = 0; (ii) µ∗ ´e mon´otona, isto ´e, E ⊂ F im-plica µ∗(E) ≤ µ∗(F ); (iii) µ∗ ´e contavelmente subaditiva, isto ´e, se E ⊂ S∞

i=1Ei ent˜ao

µ(E) ≤P∞

i=1µ(Ei).

Diremos que um subconjunto E de X ´e mensur´avel com respeito a µ∗ se para todo A ⊂ X vale

µ∗(A) = µ∗(A ∩ E) + µ∗(A \ E) ,

isto ´e, E n˜ao ‘quebra’ nenhum conjunto A em dois subconjuntos nos quais µ∗ n˜ao ´e aditiva.

Pode-se demonstrar que se µ∗ ´e uma medida exterior e M ´e a classe dos conjuntos mensur´aveis com respeito a µ∗ ent˜ao M ´e σ-´algebra e a restri¸c˜ao de µ∗ a M define uma medida em M.

Dada τ1 : A → [0, ∞) contavelmente aditiva, definimos uma fun¸c˜ao µ∗ dada por

µ∗(E) = inf

X

i=1

(13)

onde o ´ınfimo ´e tomado sobre todas as seq¨uˆencias {Fi} ⊂ A tais que E ⊂

S∞

i=1Fi (sempre

existe uma, pois X ∈ A).

O passo seguinte ´e mostrar que µ∗ ´e realmente uma medida exterior. Em seguida, mostrar que a classe M dos conjuntos mensur´aveis com respeito a µ∗ cont´em A. Como M ´e σ-´algebra, isso implicar´a que M cont´em B(A).

Como µ∗|M ´e medida, ent˜ao µ ≡ µ∗|B(A) tamb´em ´e. Finalmente, mostra-se que µ coincide com τ1 em A.

Para mostrar a unicidade, sejam µ1 e µ2 duas extens˜oes de τ1 para B(A). Considere

I a subclasse de B(A) onde µ1 e µ2 coincidem. Essa subclasse ´e uma classe mon´otona

(ver Corol´ario 1.13 abaixo) que cont´em A, logo I = B(A).

Pode ser dif´ıcil checar que uma fun¸c˜ao ´e contavelmente aditiva numa ´algebra. O resultado abaixo pode ajudar.

Teorema 1.10. A ´algebra, τ1 : A → [0, ∞) finitamente aditiva, com τ1(X) = 1. Se para

toda seq¨uˆencia decrescente F1 ⊃ F2 ⊃ · · · de membros de A com interse¸c˜ao vazia se tem

τ1(Fn) → 0 ent˜ao τ1 ´e contavelmente aditiva.

Demonstra¸c˜ao. Seja E ∈ A com E =S∞

i=1Ei, onde os Ei’s formam uma cole¸c˜ao disjunta

de elementos de A. Os conjuntos Fn= E \ n [ i=1 Ei pertencem a A, e T∞

n=1Fn = ∅. Por hip´otese, τ1(Fn) → 0 quando n → ∞. Por outro

lado, τ1(E) = n X i=1 τ1(Ei) + τ1(Fn) ,

pela aditividade (finita) de τ1, de maneira que

τ1(E) = lim n→∞ n X i=1 τ1(Ei) = ∞ X i=1 τ1(Ei) .

O Teorema acima resvala na no¸c˜ao de continuidade de uma medida.

Defini¸c˜ao 1.11. Uma medida µ : B → [0, ∞] ´e cont´ınua por baixo se para toda seq¨uˆencia crescente {Ei} ⊂ B tal que S

i=1Ei = E vale limn→∞µ(Ei) = µ(E). Ela ´e

cont´ınua por cima se para toda seq¨uˆencia decrescente {Ei} ⊂ B tal que

T∞

i=1Ei = E

(14)

Teorema 1.12. Se µ ´e finita ent˜ao ´e cont´ınua.

Demonstra¸c˜ao. Seja E ∈ B e E1 ⊂ E2 ⊂ . . . seq¨uˆencia crescente em B cujo limite ´e E.

Ent˜ao E pode ser escrito como uma uni˜ao disjunta: E = E1∪ ∞ [ i=1 (Ei+1\ Ei) . Portanto µ(E) = µ(E1) + ∞ X i=1

µ(Ei+1− Ei) = µ(E1) + lim N →∞

N

X

i=1

µ(Ei+1) \ µ(Ei) = lim

N →∞µ(EN) .

Isso mostra que µ ´e cont´ınua por baixo em E.

A finitude da medida de E foi admitida na segunda passagem, mas o mesmo resultado vale se µ(E) = ∞, portanto nessa demonstra¸c˜ao n˜ao ´e necess´ario admitir que µ ´e finita. J´a para mostrar que ´e cont´ınua por cima em E basta passar ao complementar, mas a´ı ´e preciso usar a finitude.

O Corol´ario abaixo foi usado na demonstra¸c˜ao da unicidade da extens˜ao, no Teo-rema 1.9.

Corol´ario 1.13. Sejam µ1 e µ2 medidas finitas definidas em B e seja I a subclasse de

B definida por

I = {E ∈ B; µ1(E) = µ2(E)} .

Ent˜ao I ´e uma classe mon´otona.

Demonstra¸c˜ao. Se E ´e o limite de uma seq¨uˆencia mon´otona em I ent˜ao µ1(E) = µ2(E),

pois pelo Teorema acima ambas as medidas s˜ao cont´ınuas. Segue que E ∈ I.

Finalmente, um teorema de “aproxima¸c˜ao”, bastante ´util em demonstra¸c˜oes. Do ponto de vista de medida, pode-se dizer que as ´algebras s˜ao “densas” na σ-´algebra que geram.

Teorema 1.14. (X, B, µ) espa¸co de probabilidade, A uma ´algebra tal que B(A) = B. Ent˜ao para cada  > 0 e B ∈ B existe A ∈ A tal que µ(A4B) < .

Demonstra¸c˜ao. Usaremos o fato obtido na demonstra¸c˜ao do Teorema 1.9 de que µ(B) = inf{X i µ(Ei); B ⊂ [ i Ei, Ei ∈ A, ∀i} .

(15)

Isto implica que existe uma seq¨uˆencia disjunta {Ei} ⊂ A tal que B ⊂ S∞ i=1Ei e µ(B) +  2 > ∞ X i=1 µ(Ei) .

Agora escolha n tal que

∞ X i=n+1 µ(Ei) <  2 e tome A =Sn i=1Ei ∈ A. Como A \ B ⊂S∞ i=1Ei\ B, ent˜ao µ(A \ B) ≤ µ( ∞ [ i=1 Ei) − µ(B) <  2 . Por outro lado, B \ A ⊂S∞

i=1Ei\

Sn

i=1Ei, logo, pela escolha de n, µ(B \ A) <  2.

A desigualdade µ(A4B) <  implica, em particular, em |µ(A) − µ(B)| < .

1.4

Integra¸

ao

Defini¸c˜ao 1.15. Seja (X, B) espa¸co mensur´avel. Diz-se que f : X → R ´e mensur´avel se para todo boreleano B de R valer f−1(B) ∈ B.

A mensurabilidade pode ser testada com conjuntos da forma B = (c, ∞), pois eles geram a σ-´algebra dos boreleanos de R. Se X for espa¸co topol´ogico e B for a σ-´algebra de Borel de X ent˜ao qualquer fun¸c˜ao cont´ınua ser´a mensur´avel.

Denotaremos por χA a fun¸c˜ao caracter´ıstica de A: χA(x) = 1 se x ∈ A e χA(x) = 0

caso contr´ario.

Defini¸c˜ao 1.16. Seja (X, B, µ) espa¸co de probabilidade. Diz-se que f : X → R ´e simples se f = n X i=1 aiχAi ,

(16)

A integral de uma fun¸c˜ao simples f = Pn

i=1aiχAi ´e dada por

Z f dµ = n X i=1 aiµ(Ai) ´

E f´acil ver que qualquer fun¸c˜ao mensur´avel n˜ao-negativa pode ser aproximada, por baixo e monotonamente, por uma seq¨uˆencia de fun¸c˜oes simples. A integral de f ´e definida como sendo o limite das integrais das fun¸c˜oes simples (provando-se que independe da seq¨uˆencia escolhida). Diz-se que f ´e integr´avel seR f dµ < ∞.

Para fun¸c˜oes reais basta decompor f = f+− f− e dizer que f ´e integr´avel se f+ e f−

forem integr´aveis. A fun¸c˜ao f ser´a integr´avel se e somente se |f | for integr´avel.

Teorema 1.17 (da Convergˆencia Mon´otona). Seja seq¨uˆencia {f1 ≤ f2 ≤ . . .}

de fun¸c˜oes reais integr´aveis em (X, B, µ). Se {R fndµ} for seq¨uˆencia limitada ent˜ao

limn→∞fn existe em quase todo ponto e R (lim fn)dµ = limR fndµ. Se a seq¨uˆencia n˜ao

for limitada ent˜ao ou lim fn n˜ao existe num conjunto de medida positiva ou lim fn existe

num conjunto de medida total mas n˜ao ´e integr´avel.

Teorema 1.18 (Lema de Fatou). Seja {fn}n seq¨uˆencia de fun¸c˜oes reais mensur´aveis,

limitadas inferiormente por uma fun¸c˜ao integr´avel. Se lim infnR fndµ < ∞ ent˜ao lim infnfn

´ e integr´avel e Z (lim inf n fn)dµ ≤ lim infn Z fndµ .

Um exemplo que ilustra um pouco esse Teorema e mostra que n˜ao precisa haver igualdade ´e dado pelas fun¸c˜oes fn: [0, 1] → R com

fn(x) =    n2x , 0 ≤ x ≤ n1 2n − n2x , 1 n ≤ x ≤ 2 n 0 , n2 ≤ x ≤ 1 ,

onde as integrais s˜ao sempre iguais a 1, as fun¸c˜oes s˜ao limitadas inferiormente por qual-quer fun¸c˜ao integr´avel n˜ao-positiva, e a fun¸c˜ao limite ´e a fun¸c˜ao nula (embora este exem-plo seja incompleto, pois n˜ao ´e preciso que exista o limite das fun¸c˜oes para que o Teorema seja verdadeiro).

O seguinte teorema ´e corol´ario do anterior.

Teorema 1.19 (da Convergˆencia Dominada). Se g ´e integr´avel e {fn}n ´e seq¨uˆencia

de fun¸c˜oes mensur´aveis com |fn| ≤ g q.t.p. e lim fn = f q.t.p. ent˜ao f ´e integr´avel e

(17)

1.5

Medidas absolutamente cont´ınuas

Seja (X, B) espa¸co mensur´avel, e µ, ν medidas de probabilidade. A medida ν ´e absolu-tamente cont´ınua com rela¸c˜ao a µ (ν << µ) se ν(A) = 0 sempre que µ(A) = 0. As medidas s˜ao equivalentes se µ << ν e ν << µ.

Teorema 1.20 (Teorema de Radon-Nikodym). Se ν, µ s˜ao probabilidades, ν << µ ´

e equivalente a existir f ∈ L1(µ) (isto ´e, integr´avel), n˜ao-negativa e com R f dµ = 1 tal

que ν(A) =RAf dµ. A fun¸c˜ao f ´e ´unica q.t.p.

Nota¸c˜ao: f ´e a derivada de ν com respeito a µ e ´e denotada por dν/dµ.

As probabilidades ν e µ s˜ao ditas mutuamente singulares (ν ⊥ µ) se existe B ∈ B tal que ν(B) = 0 e µ(Bc) = 0.

Teorema 1.21. Como acima, sejam ν, µ medidas de probabilidade. Ent˜ao existe ´unica decomposi¸c˜ao ν = pµ1+ (1 − p)µ2, com µ1 << µ e µ2 ⊥ µ.

1.6

Formas de volume

O determinante ´e uma aplica¸c˜ao det : (Rn)n → R com as seguintes propriedades: 1. det(e1, . . . , en) = +1;

2. det(u1, . . . , ui, . . . , uj, . . . , un) = − det(u1, . . . , uj, . . . , ui, . . . , un);

3. det(αu + βv, u2, . . . , un) = α det(u, u2, . . . , un) + β det(v, u2, . . . , un).

O determinante de (u1, . . . , un) ´e o (hiper)volume do (hiper)paralelep´ıpedo formado por

esses vetores, com um sinal, de acordo com a orienta¸c˜ao da n-upla em rela¸c˜ao `a base canˆonica (e1, . . . , en). Essas trˆes propriedades determinam univocamente o valor do

de-terminante.

Uma aplica¸c˜ao n-linear alternada ω : (Rn)n → R satisfaz as duas ´ultimas propri-edades do determinante. Pode-se mostrar que

ω(u1, . . . , un) = c det(u1, . . . , un) ,

onde

c = ω(e1, . . . , en) .

Em outras palavras, o espa¸co de aplica¸c˜oes n-lineares alternadas de (Rn)n em R ´e de

(18)

Uma n-forma (ou forma de volume) ω em Rn´e uma aplica¸c˜ao (cont´ınua) que para

cada x associa uma aplica¸c˜ao n-linear alternada ω(x) de (Rn)n em R.

Numa variedade M de dimens˜ao n orientada, a forma de volume ´e uma fun¸c˜ao que para cada p associa uma aplica¸c˜ao n-linear alternada de (TpM )n em R. Se a variedade

(orient´avel) ´e abstrata a forma em geral ´e definida nas cartas, de forma compat´ıvel nas interse¸c˜oes. Isto ´e, para cada carta φ : U → φ(U ) ⊂ M , define-se

ωφ(x) · (u1, . . . , un) = c(x) det(u1, . . . , un) = c(x)dx(u1, . . . , un) ,

de maneira que se ψ : V → ψ(V ) for outra carta e ωψ for a forma definida em V ter-se-´a

ωφ(x) · (u1, . . . , un) = ωψ(ξ(x)) · (Dξ · u1, . . . , Dξ · un) ,

onde ξ = ψ−1◦ φ, com dom´ınio em φ−1(φ(U ) ∩ ψ(V )).

Para integrar uma forma de volume numa variedade ´e preciso um procedimento que n˜ao dependa demais das cartas. Isso ´e feito com parti¸c˜oes da unidade, subordinadas ao atlas que define a variedade.

Uma parti¸c˜ao da unidade subordinada `a cobertura (do atlas) {φλ(Uλ)}λ ´e uma

cole¸c˜ao de fun¸c˜oes reais {αλ}λ de classe C1, indexadas pelo mesmo parˆametro do atlas,

com dom´ınio na variedade, que tem ainda as seguintes propriedades:

1. Para cada λ, o suporte de αλ (isto ´e, o conjunto onde αλ n˜ao se anula) est´a contido

em φλ(Uλ).

2. Para cada x ∈ M , existe apenas um n´umero finito de λ’s para os quais αλ(x) n˜ao

se anula. 3. P

λαλ(x) = 1, para todo x ∈ M (soma bem definida, por causa da propriedade

anterior).

O nome parti¸c˜ao da unidade vem, evidentemente, do fato de que a fun¸c˜ao constante e igual a 1 est´a sendo escrita como uma soma de fun¸c˜oes criteriosamente escolhidas. Pode-se mostrar tamb´em sua existˆencia, para qualquer cobertura (ver [Elon], por exemplo).

A forma αλω ´e tamb´em uma forma de volume cont´ınua em M , com suporte em φλ(Uλ).

Sua integral ´e definida usando a carta correspondente: Z M αλω ≡ Z φλ(Uλ) αλω ≡ Z Uλ αλ(φλ(x))cλ(x)dx ,

(19)

A integral da forma de volume ω em M ´e definida por Z M ω =X λ Z M αλω ,

e de fato ´e bem definida porque (pode-se mostrar) o resultado n˜ao depende da parti¸c˜ao da unidade escolhida.

A integral de uma fun¸c˜ao cont´ınua f em M , segundo a forma de volume ω, ´e sim-plesmente a integral da forma f · ω. Com isso, podemos falar tamb´em em integrais de fun¸c˜oes caracter´ısticas sobre boreleanos de M , e da´ı definir uma medida nos boreleanos de M .

Em conclus˜ao, a forma de volume ω define uma medida em M .

Muitas vezes falamos em “medida de Lebesgue” de uma determinada variedade. Isso pode ter dois significados, mas n˜ao h´a muito perigo de confus˜ao.

Se a variedade est´a mergulhada em Rm, para algum m ≥ n, a forma canˆonica de

volume em Rm (o determinante) induz uma forma de volume em M , da seguinte maneira. Seja p ∈ M e considere TpM como subespa¸co de Rm. Se (u1, . . . , un) ´e uma n-upla

de vetores em TpM , completa-se a n-upla com vetores un+1, . . . , um, todos unit´arios,

ortogonais entre si e ortogonais a TpM , e toma-se

ω(u1, . . . , un) ≡ det(u1, . . . , un, un+1, . . . , um) .

Outra possibilidade ´e quando a variedade ´e definida de maneira abstrata, mas em cada carta a forma de volume se expressa como a forma de volume canˆonica em Rn (isto

´

e, cλ(x) ≡ 1, para todo λ). Este ´e o caso de Tn visto como o quociente Rn/Zn, onde as

cartas s˜ao naturalmente dadas por aplica¸c˜oes do tipo x 7→ x mod 1.

Se T : U → V ´e um difeomorfismo, e ω ´e uma forma de volume definida em V , definimos o pullback de ω (por T ) como sendo a forma dada por

T∗ω(x) · (u1, . . . , un) = ω(T (x)) · (DT (x) · u1, . . . , DT (x) · un) .

N˜ao ´e dif´ıcil mostrar que

Z V ω = ± Z U T∗ω ,

onde o sinal ´e determinado de acordo com T : “+” se T preserva e “-” se T reverte orienta¸c˜ao.

Essa f´ormula cont´em a f´ormula de mudan¸ca de vari´aveis da integral. Se ω = f dx, ent˜ao

T∗ω(x) · (u1, . . . , un) = f (T x)dx · (DT (x) · u1, . . . , DT (x) · un)

(20)

logo T∗ω = (f ◦ T ) det DT dx. Portanto Z V f (x)dx = Z U f (T x)| det DT (x)|dx .

1.7

Medidas regulares

O seguinte Teorema pode ser ´util quando lidarmos com medidas cujo dom´ınio ´e a σ-´

algebra de Borel.

Teorema 1.22. Uma probabilidade de Borel µ num espa¸co m´etrico X ´e regular, isto ´e, para todo A ∈ B(X) e  > 0 existe um conjunto aberto U e um conjunto fechado C tais

que C ⊂ B ⊂ U e µ(U\ C) < .

Demonstra¸c˜ao. Seja R a cole¸c˜ao de conjuntos onde vale a regularidade, isto ´e,

R = {A ∈ B; ∀ > 0 ∃ U aberto e C fechado com C ⊂ A ⊂ U e µ(U\ C) < } .

Primeiramente mostramos que R ´e uma σ-´algebra. Evidentemente X ∈ R, pois ´e aberto e fechado, servindo como U e C para todo  > 0. Se A ∈ R ent˜ao X \ A ∈ R, pois X \ U

´

e fechado, X \ C ´e aberto e (X \ C) \ (X \ U) = U\ C. Para mostrar que R ´e fechado

por uni˜oes enumer´aveis, sejam A1, A2, . . . ∈ R e, para todo i = 1, 2, . . . ,, os conjuntos

U,i aberto, C,i fechado tais que C,i ⊂ Ai ⊂ U,i e µ(U,i\ C,i) < 3i. Chamando de A a

uni˜ao dos Ai’s, definimos U como sendo a uni˜ao dos U,i’s, que ´e um aberto, e ˜C a uni˜ao

dos C,i’s, que n˜ao ´e necessariamente um fechado. Como µ ´e medida de probabilidade

ent˜ao ´e cont´ınua (Teorema 1.12), logo existe k tal que µ( ˜C\Ski=1C,i) < 2. Tome ent˜ao

C=

Sk

i=1C,i, que ´e fechado. ´E f´acil ver que C ⊂ A ⊂ U e µ(U\ C) < .

A prova se completa se mostrarmos que R cont´em todos os fechados de X. Tome C fechado e  > 0. Defina C = C. Por outro lado, defina os abertos

Un= {x ∈ X; d(C, x) <

1 n} , n ≥ 1, de forma que T∞

n=1Un = C. Pela continuidade da medida, existe k tal que

µ(Uk\ C) < . Ent˜ao basta escolher U = Uk.

O pr´oximo Teorema mostra que em espa¸cos m´etricos uma medida ´e determinada pela maneira como ela integra fun¸c˜oes cont´ınuas.

Teorema 1.23. Seja X espa¸co m´etrico, µ e ν probabilidades de Borel. SeR f dµ = R f dν para toda fun¸c˜ao cont´ınua f : X → R ent˜ao µ = ν.

(21)

Demonstra¸c˜ao. Por causa da regularidade das duas medidas, basta mostrar que elas coincidem em conjuntos fechados. Sejam C um conjunto fechado e  > 0. Seja U aberto contendo C, de forma que ν(U ) < ν(C) + , o que ´e garantido tamb´em pela regularidade. Defina a fun¸c˜ao f : X → R como zero fora de U e

f (x) = d(x, X \ U ) d(x, X \ U ) + d(x, C)

para x ∈ U . A fun¸c˜ao f ´e cont´ınua, n˜ao-negativa, vale um em C e zero fora de U . Ent˜ao µ(C) <

Z

f dµ = Z

f dν < ν(U ) < ν(C) +  .

Como isso vale para todo  > 0, ent˜ao µ(C) ≤ ν(C). E trocando os pap´eis de µ e ν, conclu´ımos que µ(C) = ν(C).

A toda probabilidade de Borel de um espa¸co m´etrico compacto podemos associar um funcional linear ξ = ξµ : C0(X) → R dado por ξ(f ) = R f dµ.

Defini¸c˜ao 1.24. ξ : C0(X) → R ´e funcional linear positivo se ´e linear, ξ(f ) ≥ 0 se

f ≥ 0 e ξ(1) = 1.

Assim f 7→ R f dµ ´e funcional linear positivo. O Teorema acima mostra que se duas probabilidades induzem o mesmo funcional ent˜ao elas s˜ao iguais, o que caracteriza injeti-vidade da aplica¸c˜ao que leva probabilidades em funcionais. O pr´oximo Teorema garante a sobrejetividade da aplica¸c˜ao (sua prova se encontra nos textos cl´assicos de An´alise). Teorema 1.25 (da Representa¸c˜ao de Riesz). Se X ´e espa¸co m´etrico compacto e se ξ : C0(X) → R ´e funcional linear positivo, ent˜ao existe ´unica probabilidade µ tal que

Z

X

f dµ = ξ(f ) , para toda f ∈ C0(X).

(22)
(23)

Cap´ıtulo 2

Transforma¸

oes que preservam

medida

2.1

Defini¸

oes e motiva¸

ao

Sejam (X1, B1, µ1) e (X2, B2, µ2) espa¸cos de probabilidade, e T : X1 → X2 transforma¸c˜ao.

Dizemos que T ´e mensur´avel se para todo A ∈ B2 se tem T−1(A) ∈ B1. Dizemos

que T preserva medida se µ1(T−1A) = µ2(A).

O caso que mais nos interessa ´e quando X1 = X2 = X, B1 = B2 = B, µ1 = µ2 = µ,

para podermos fazer itera¸c˜oes.

O seguinte Teorema ajuda a verificar se uma transforma¸c˜ao preserva medida.

Teorema 2.1. (X1, B1, µ1) e (X2, B2, µ2), T : X1 → X2 transforma¸c˜ao. Seja S2 uma

semi-´algebra que gera B2. Se para todo A ∈ S2 se tem T−1(A) ∈ B1 e µ1(T−1A) = µ2(A),

ent˜ao T ´e mensur´avel e preserva medida.

Demonstra¸c˜ao. A prova usa os resultados de extens˜ao da Se¸c˜ao 1. Considere C2 = {A ∈ B2 ; T−1(A) ∈ B1 , µ1(T−1A) = µ2(A)} .

Queremos mostrar que C2 = B2. Em primeiro lugar, por hip´otese a semi-´algebra S2 est´a

contida em C2. Como B2 ´e a menor σ-´algebra que cont´em S2, ent˜ao basta mostrar que

C2 ´e uma σ-´algebra.

Com um argumento simples mostra-se que uni˜oes finitas e disjuntas de elementos de S2 est˜ao em C2, ou seja, a ´algebra A(S2) est´a contida em C2. Se mostrarmos que C2 ´e

uma classe mon´otona, ent˜ao teremos terminado. 23

(24)

Tome uma cole¸c˜ao de conjuntos E1, E2, . . . de C2, crescente: E1 ⊂ E2 ⊂ . . .. Cada

Ei tem a propriedade de que T−1Ei ∈ B1 e µ1(T−1Ei) = µ2(Ei). Temos T−1(

S∞

i=1Ei) =

S∞

i=1T −1E

i, e como cada T−1Ei est´a em B1 ent˜ao a uni˜ao tamb´em est´a. A preserva¸c˜ao

da medida ´e demonstrada escrevendo-se a uni˜ao como uma uni˜ao disjunta:

∞ [ i=1 Ei = E1 ∪ ∞ [ i=2 Ei\ Ei−1.

Com respeito `a interse¸c˜ao o racioc´ınio ´e o mesmo.

Em nossa investiga¸c˜ao, ser´a importante o seguinte Lema.

Lema 2.2. Se f : X → R ´e mensur´avel e µ ´e T -invariante, ent˜ao R

Xf ◦ T dµ =

R

Xf dµ,

no sentido de que se uma das integrais existe ent˜ao a outra tamb´em existe, e neste caso elas s˜ao iguais.

Demonstra¸c˜ao. Como f pode ser escrita como f+− f−, subtra¸c˜ao de duas fun¸c˜oes

men-sur´aveis positivas, podemos supor f ≥ 0. Al´em disso, o Lema ´e obviamente verdade para fun¸c˜oes simples. Se {fn}n´e uma seq¨uˆencia crescente de fun¸c˜oes simples convergindo para

f , ent˜ao Z X f ◦ T dµ = lim n→∞ Z X fn◦ T dµ = lim n→∞ Z X fndµ = Z X f dµ .

Evidentemente, se R f ◦ T dµ = R f dµ, ∀f ∈ L1 ent˜ao µ ´e T -invariante, simplesmente

pelo fato de que as fun¸c˜oes caracter´ısticas s˜ao integr´aveis.

O pr´oximo Lema diz garante a invariˆancia da medida com menos fun¸c˜oes, por´em com hip´oteses mais restritivas.

Lema 2.3. Seja X espa¸co m´etrico, B a σ-´algebra de Borel e µ medida de probabilidade. Seja T transforma¸c˜ao cont´ınua. SeR f ◦ T dµ = R f dµ para toda fun¸c˜ao cont´ınua f ent˜ao µ ´e medida invariante.

Demonstra¸c˜ao. Basta provar que µ ´e invariante para um conjunto fechado C qualquer. Seja {Un}n seq¨uˆencia decrescente de abertos tal que

T∞

n=1Un = C. Isso implica que

{T−1U

n}n ´e seq¨uˆencia decrescente de abertos tal que

T∞

n=1T −1U

n = T−1C. Tome fn

cont´ınua que valha 1 em C e zero fora de Un. Ent˜ao fn ◦ T vale um em T−1C e zero

fora de T−1Un. Como µ ´e probabilidade, µ(Un) converge a µ(C) e µ(T−1Un) converge a

µ(T−1C).

Al´em disso, como µ(C) ≤ R fndµ ≤ µ(Un) ent˜ao R fndµ converge a µ(C).

Ana-logamente, R fn ◦ T dµ converge a µ(T−1C). Mas pela hip´otese R fndµ = R fn ◦ T dµ,

(25)

Podem-se apontar v´arias raz˜oes para estudarmos transforma¸c˜oes que preservam me-dida. Em sistemas dinˆamicos a motiva¸c˜ao aparece invertida, pois muitas vezes interessa estudar, para uma dada transforma¸c˜ao T de um certo conjunto X quais s˜ao as medidas que T preserva. Em geral X ´e um espa¸co topol´ogico e B ´e a σ-´algebra de Borel.

O estudo das medidas invariantes por T ´e ´util para se investigar a estat´ıstica das ´

orbitas: dado um conjunto A ∈ B, qual ´e a freq¨uˆencia com que a ´orbita {x, T x, T2x, . . .}

visita o conjunto A? Ou seja, quanto vale (se existir) o limite de 1

n]{0 ≤ j < n ; T

jx ∈ A}?

Suponhamos que valesse a seguinte hip´otese, para um dado ponto x: para todo A ∈ B o limite acima existe. Com isso, poder´ıamos definir uma fun¸c˜ao τ : B → [0, 1], tal que τ (X) = 1, fazendo com que τ (A) fosse exatamente esse limite. A fun¸c˜ao τ seria candidata a ser uma medida de probabilidade invariante, pois a freq¨uˆencia de visita¸c˜ao a A ´e igual `

a freq¨uˆencia de visita¸c˜ao a T−1(A).

No entanto n˜ao h´a chance de que a hip´otese valha. Tomando por exemplo a σ-´algebra dos boreleanos num espa¸co m´etrico, seja x um ponto qualquer n˜ao-peri´odico (isto ´e, Tnx 6= x, ∀n ≥ 0). Seja J ⊂ N que n˜ao tenha densidade definida, isto ´e, tal que

1

n](J ∩ [0, n)) n˜ao converge, e tome A = {T

nx; n ∈ J }, que ´e boreleano pois ´e uni˜ao

enumer´avel de pontos. Isso faz com que a freq¨uˆencia de visita¸c˜ao a A n˜ao esteja bem definida.

Poder´ıamos no entanto ter a medida µ invariante j´a definida e perguntar se a freq¨uˆencia de visita¸c˜ao das ´orbitas a um conjunto mensur´avel coincide com sua medida (note que ´

e melhor que a pergunta seja feita para medidas invariantes, pois se a freq¨uˆencia de vi-sita¸c˜ao est´a bem definida ent˜ao ela est´a bem definida para a pr´e-imagem do conjunto e assume o mesmo valor; de fato a pergunta n˜ao est´a sendo feita para a imagem inversa do conjunto, mas faz sentido esperar que a freq¨uˆencia de visita¸c˜ao tamb´em forne¸ca sua medida). Se isso n˜ao valer para todas as ´orbitas (s˜ao raros esses casos) ent˜ao para quais ´

orbitas vale? `

As vezes a estat´ıstica das ´orbitas ´e estudada do ponto de vista de um observ´avel, isto ´

e, uma fun¸c˜ao f : X → R mensur´avel. Mede-se ent˜ao a m´edia temporal 1 n n−1 X i=0 f ◦ Ti(x) ,

e pergunta-se se ela converge, e se o resultado da convergˆencia ´e sempre o mesmo. A freq¨uˆencia de visita¸c˜ao a um conjunto mensur´avel ´e um caso particular dessa m´edia

(26)

temporal, bastando tomar f como sendo a fun¸c˜ao caracter´ıstica χA, pois 1 n]{0 ≤ j < n ; T jx ∈ A} = 1 n n−1 X j=0 χA(Tjx) .

No caso da fun¸c˜ao caracter´ıstica, perguntamos se a m´edia temporal converge para µ(A), que ´e igual a RXχAdµ. Para uma fun¸c˜ao f integr´avel, podemos perguntar se a m´edia

temporal converge para R

Xf dµ, sua m´edia espacial.

Ainda que a itera¸c˜ao de T seja determin´ıstica, a Teoria Erg´odica estuda os fenˆomenos do ponto de vista probabil´ıstico, como delineamos acima e veremos a partir de agora. No entanto, a probabilidade tamb´em pode ser enxergada do ponto de vista determin´ıstico (assim, a Teoria Erg´odica se coloca entre as teorias dos Sistemas Dinˆamicos e da Proba-bilidade).

Por exemplo, imagine uma seq¨uˆencia de lan¸camentos de uma moeda, que denotaremos pela seq¨uˆencia x = {xn}n≥0, onde xn = 0 denota “cara” e xn = 1 denota “coroa” no

n-´

esimo lan¸camento. Cada seq¨uˆencia (infinita) de lan¸camentos representa um ponto no espa¸co {0, 1}N.

Poder´ıamos pensar que no momento em que come¸camos a seq¨uˆencia de lan¸camentos o futuro j´a est´a determinado (por uma entidade superior, por exemplo), mas n´os s´o poderemos conhecer esse futuro realizando os lan¸camentos em ordem, um a um. Assim, n´os vamos “puxando” os valores de xn. Ao mesmo tempo, nossa hist´oria futura vai

mudando, simplesmente pelo fato de que uma parte dela j´a ficou para tr´as: no instante inicial, ela ´e representada pela seq¨uˆencia (x0, x1, . . .), enquanto que no instante n ela ´e

representada pela seq¨uˆencia (xn, xn+1, . . .).

Portanto em cada instante h´a um deslocamento da hist´oria futura em uma unidade. Esse deslocamento, conhecido pelo seu nome original em inglˆes (shift), ´e uma trans-forma¸c˜ao

σ : {0, 1}N−→ {0, 1}N

que leva (x0, x1, x2, . . .) em (x1, x2, x3, . . .). Ou seja, foi-nos dada uma hist´oria futura no

instante inicial, e `a medida em que fazemos os lan¸camentos nos deslocamos no espa¸co de hist´orias futuras atrav´es da itera¸c˜ao da transforma¸c˜ao σ.

A transforma¸c˜ao σ n˜ao ´e invert´ıvel (seria se consider´assemos seq¨uˆencias bi-infinitas). Para cada seq¨uˆencia (x0, x1, x2, . . .) h´a as pr´e-imagens (0, x0, x1, . . .) e (1, x0, x1, . . .).

Agora podemos introduzir uma medida de probabilidade µ natural em X ≡ {0, 1}N.

Essa medida deve ter rela¸c˜ao com o que esperamos a respeito da probabilidade das ocorrˆencias dos lan¸camentos. Para isso, a probabilidade de que o primeiro lan¸camento (x0) seja 0 deve ser igual a 12, igual `a probabilidade de que seja igual a 1, n˜ao importando

(27)

qual seja a hist´oria futura subseq¨uente. Isto ´e o mesmo que dizer que a medida do conjunto de pontos x ∈ X que come¸cam com x0 = i ´e 12, para i = 0, 1. Os conjuntos s˜ao

disjuntos e sua uni˜ao ´e X, de forma que isso ´e coerente com o fato de estarmos definindo uma medida de probabilidade.

No entanto, ´e preciso definir a medida em mais conjuntos, para se ter certeza de defini-la univocamente (os detalhes t´ecnicos ser˜ao desenvolvidos abaixo). Por exemplo, esperamos que a probabilidade de que x0 = i0 e x1 = i1, para dados i0 e i1, seja 14. Mais

ainda, que a probabilidade de que x0 = i0, . . ., xk = ik seja 2k+11 . Na linguagem de Teoria

da Medida, estamos supondo que o conjunto

C(k; i0, . . . , ik) ≡ {x ∈ X; x0 = i0, . . . , xk= ik}

tem medida 2k+11 . Esse tipo de conjunto ´e chamado de cilindro, e a classe dos cilindros

forma uma semi-´algebra, junto com ∅ e X.

Veremos que isso ´e o bastante para se definir a medida univocamente em X, usando os resultados da Se¸c˜ao 1. Al´em do mais, podemos ver que ela ´e invariante na semi-´

algebra dos cilindros, (o que nos garante a invariˆancia propriamente dita, por causa do Teorema 2.1): a pr´e-imagem de C(k; i0. . . ik) ´e a uni˜ao disjunta

C(k + 1; 0i0i1. . . ik) ∪ C(k + 1; 1i0i1. . . ik) ,

que tamb´em tem medida 2k+11 porque ambos os cilindros da uni˜ao tˆem medida

1 2k+2.

Qualquer dos cilindros pode ser um conjunto para fazermos uma estat´ıstica. Por exemplo, dado (i0, i1, . . . , ik), podemos nos perguntar qual ´e a probabilidade de, ao longo

de nossa seq¨uˆencia infinita de lan¸camentos, encontrarmos blocos de tamanho k + 1 exata-mente com a especifica¸c˜ao dada. Ora, isso ´e o mesmo que perguntar qual ´e a freq¨uˆencia m´edia de visita¸c˜ao ao cilindro A = C(k; i0. . . ik), dada pelo limite

1

n#{0 ≤ j < n; T

jx ∈ A} .

Mais uma vez esperamos que essa m´edia temporal seja igual a µ(A) = 2k+11 . De fato,

veremos que isso vale exceto para um subconjunto de X de medida zero.

2.2

Exemplos

Passemos a analisar alguns exemplos de medidas invariantes. Assumiremos implicita-mente que a σ-´algebra ´e de Borel quando nenhuma men¸c˜ao for feita a esse respeito.

(28)

´

Orbitas peri´odicas Suponha que X ´e um espa¸co topol´ogico e p um ponto tal que Tk(p) = p (e Tj(p) 6= p, ∀j = 1, . . . , k − 1). Seja δx a medida de Dirac associada a um

ponto x, definida assim: δx(A) = 1 se x ∈ A e δx(A) = 0 se x 6∈ A. Ent˜ao a medida

µ = 1 k k−1 X j=0 δTj(p) ´ e invariante por T . ´

E f´acil mostrar que

Z

X

f dδx = f (x) .

Medidas absolutamente cont´ınuas Suponha que T : U ⊂ Rn → T (U ) ⊂ Rn seja

um difeomorfismo, com U aberto, e que queiramos encontrar uma medida invariante µ absolutamente cont´ınua com respeito `a medida de Lebesgue. Seja φ a densidade da medida procurada, isto ´e, dµ = φ(x)dx.

A rela¸c˜ao µ(A) = µ(T−1A) se traduz em

Z A φ(x)dx = Z T−1A φ(y)dy .

Mas o lado direito pode ser reescrito, pela f´ormula de mudan¸ca de vari´aveis, como Z A φ(T−1x)| det DT−1(x)|dx , ou Z A φ(T−1x) | det DT (T−1x)|dx .

Ent˜ao a invariˆancia da medida ser´a garantida se sua densidade satisfizer

φ(x) = φ(T

−1x)

| det DT (T−1x)| . (2.1)

Por exemplo, qualquer difeomorfismo com determinante igual a ±1 ter´a a medida de Lebesgue como medida invariante. A maioria dos pr´oximos exemplos faz uso dessa observa¸c˜ao. Tamb´em n˜ao ´e necess´ario que dom´ınio e contradom´ınio estejam em Rn:

podem estar numa variedade de dimens˜ao n, com a forma de volume que induz a medida de Lebesgue (como veremos nos exemplos envolvendo toros n-dimensionais).

(29)

Fluxos de divergˆencia nula Se X : U ⊂ Rn → Rn ´e um campo C1 de divergˆencia

nula e se {φ(t, ·)}t´e o fluxo associado, ent˜ao cada difeomorfismo φ(t, ·) tem determinante

igual a 1, e portanto preserva a medida de Lebesgue.

Para ver isso, evocamos primeiramente que a derivada Dxφ(t, x) satisfaz a equa¸c˜ao

diferencial

d

dtDxφ(t, x) = DX(φ(t, x))Dxφ(t, x) ,

como consta dos textos b´asicos de equa¸c˜oes diferenciais (e que pode ser memorizada pela diferencia¸c˜ao em rela¸c˜ao a x de ∂t∂φ(t, x) = X(φ(t, x)), e depois “ingenuamente” trocando a ordem de deriva¸c˜ao no lado esquerdo).

Denominando Φ(t) = Dxφ(t, x) e A(t) = DX(φ(t, x)), ent˜ao a matriz Φ(t) ´e solu¸c˜ao

do problema de Cauchy

˙

Φ(t) = A(t)Φ(t) , Φ(0) = Id .

Ent˜ao s´o ´e preciso mostrar que det Φ(t) ≡ 1 para conclu´ırmos a afirma¸c˜ao. Para isso, deduziremos que o determinante de Φ(t) satisfaz a seguinte equa¸c˜ao diferencial:

d

dt det Φ(t) = [trA(t)] det Φ(t) , (2.2)

implicando que

det Φ(t) = det Φ(0) exp Z t

0

trA(s)ds 

,

e por conseguinte det Φ(t) = 1, pois o tra¸co de A ´e exatamente o divergente de X, que supusemos nulo.

Para chegar `a Equa¸c˜ao 2.2 temos que derivar det Φ(t). Neste caso conv´em escrever Φ(t) = (ϕ1(t), . . . , ϕn(t)), onde os ϕi(t) s˜ao as colunas de Φ(t). Usando a defini¸c˜ao de

derivada e a linearidade do determinante com respeito `as colunas, obtemos d dtdet Φ(t) = n X j=1 det(ϕ1(t), . . . , ˙ϕj(t), . . . , ϕn(t)) = n X j=1 det(ϕ1(t), . . . , A(t)ϕj(t), . . . , ϕn(t)) .

Pode-se mostrar que Φ(0) ´e n˜ao singular se e somente se Φ(t) ´e n˜ao singular, o que ´e o caso, uma vez que Φ(0) ´e a identidade. Da´ı que as colunas de Φ(t) formam uma base, e podemos escrever A(t)ϕj(t) = n X k=1 βjk(t)ϕk(t) .

(30)

A matriz (βjk(t))jk ´e a express˜ao de A(t) na base {ϕ1(t), . . . , ϕn(t)}, e como o tra¸co de

uma transforma¸c˜ao linear n˜ao depende de sua representa¸c˜ao, segue que

trA(t) =

n

X

k=1

βkk(t) .

Por outro lado, substituindo a express˜ao de A(t)ϕj(t) nessa base na f´ormula da derivada

do determinante segue que d dtdet Φ(t) = n X k=1 βkk(t) ! det Φ(t) ,

como quer´ıamos demonstrar.

Por exemplo, considere o sistema de equa¸c˜oes diferenciais em R2n= {(q1, . . . , qn, p1, . . . , pn); qi, pi ∈ R} , dado por ˙ qi = ∂H ∂pi , ˙pi = − ∂H ∂qi ,

onde H : R2n → R ´e uma fun¸c˜ao C2. O fluxo associado ´e chamado de fluxo

hamiltoni-ano (n˜ao consideraremos casos gerais de fluxos hamiltonianos porque localmente eles se escrevem dessa forma).

O campo de vetores que determina o sistema tem divergˆencia nula, por causa do Teorema de Schwarz (∂x∂y∂2f = ∂y∂x∂2f , se f ´e C2).

Rota¸c˜oes no c´ırculo O c´ırculo pode ser visto de duas maneiras. Primeiro, como um subconjunto do plano complexo:

S1 = {z ∈ C; |z| = 1} = {e2πix; x ∈ R} ,

que ´e um grupo sob a opera¸c˜ao de multiplica¸c˜ao complexa, ou como o grupo quociente R/Z ,

onde a opera¸c˜ao de grupo ´e a adi¸c˜ao m´odulo 1. A aplica¸c˜ao φ : S1 → R/Z

(31)

que leva e2πix em [x], a classe de equivalˆencia de x, ´e um isomorfismo entre os grupos,

isto ´e, ´e uma aplica¸c˜ao bijetiva e

φ(e2πix1 · e2πix2) = φ(e2πi(x1+x2)) = [x

1+ x2] = [x1] + [x2] = φ(e2πix1) + φ(e2πix2) .

Falaremos em medida de Lebesgue em S1 nos dois sentidos comentados na Se¸c˜ao 1:

como subvariedade de R2ou como variedade abstrata R/Z, com cartas “naturais”, porque ambas coincidem.

A fam´ılia de rota¸c˜oes constitui o primeiro conjunto de exemplos de transforma¸c˜oes do c´ırculo. Uma rota¸c˜ao (ou transla¸c˜ao, curiosamente, mas facilmente explic´avel depen-dendo de como se vˆe o c´ırculo) ´e a composi¸c˜ao com um elemento (fixo) do c´ırculo. Em S1 ⊂ C denotamos

Tα(e2πix) = e2πiαe2πix ,

enquanto em R/Z denotamos

Tα([x]) = [x + α] = [x] + [α] .

N˜ao ´e dif´ıcil ver que Tα preserva a medida de Lebesgue: basta testar em intervalos

(que formam uma semi-´algebra) e usar o Teorema 2.1.

H´a essencialmente dois tipos de dinˆamica, segundo o valor de α. Se α for racional, isto ´e, α = pq, onde p e q n˜ao tˆem fatores comuns, ent˜ao todo ponto ´e ponto peri´odico de per´ıodo q. J´a se α for irracional, ent˜ao a ´orbita de qualquer ponto ser´a densa em S1.

Exemplo de n˜ao boreleano usando rota¸c˜ao irracional Usemos o exemplo de rota¸c˜ao irracional para construir um exemplo de conjunto que n˜ao ´e boreleano.

Seja Tα uma rota¸c˜ao irracional do c´ırculo e defina a seguinte rela¸c˜ao de equivalˆencia

em S1: x ´e equivalente a y se y est´a na ´orbita de x (passada ou futura). As classes de

equivalˆencia s˜ao conjuntos enumer´aveis, e h´a um conjunto n˜ao-enumer´avel de classes de equivalˆencia.

Agora defina um conjunto E que tenha um e somente um ponto de cada classe de equivalˆencia (defini¸c˜ao poss´ıvel pelo Axioma da Escolha). Se E fosse boreleano, ent˜ao ter´ıamos µ(TnE) = E, onde µ ´e a medida de Lebesgue, pois j´a vimos que a medida de Lebesgue ´e invariante por rota¸c˜oes, e al´em disso as rota¸c˜oes s˜ao invert´ıveis. Por outro lado,

S1 = [

n∈Z

TnE ,

e todos os conjuntos TnE s˜ao dois a dois disjuntos. Logo

1 = µ(S1) =X

n∈Z

µ(TnE) =X

n∈Z

(32)

e esta ´ultima soma s´o pode ser zero (se µ(E) = 0) ou infinito (se µ(E) > 0). Portanto a medida de Lebesgue n˜ao est´a definida em E, e E n˜ao pode ser boreleano.

Superf´ıcies de energia em fluxos hamiltonianos Seja H : R2n → R e o fluxo

hamiltoniano associado a H. Observamos que H ´e constante ao longo das trajet´orias, isto ´e, se definirmos H(t) ≡ H(q1(t), . . . , qn(t), p1(t), . . . , pn(t)) ent˜ao ˙ H = n X i=1 ∂H ∂qi ˙ qi+ ∂H ∂pi ˙ pi . Como ˙ qi = ∂H ∂pi , ˙pi = − ∂H ∂qi , segue que ˙H = 0.

Portanto as trajet´orias do fluxo “vivem” dentro das (hiper)superf´ıcies de n´ıvel da fun¸c˜ao H, e seria muito mais interessante restringir a dinˆamica a elas, obtendo uma medida invariante para o fluxo dentro delas.

Se {Xt}t´e o fluxo ent˜ao para t fixo, Xt´e um difeomorfismo tal que H(Xt(x)) = H(x),

e ainda por cima tem determinante igual a 1. Pensando assim, sejam H : Rn→ R e um difeomorfismo T : Rn → Rn tal que | det DT (x)| = 1 e H(T (x)) = H(x) para todo x.

Seja M a variedade dada pela pr´e-imagem de um valor regular c, isto ´e, M = H−1(c). Analisaremos o determinante da restri¸c˜ao de T a M para procurar uma medida invariante por T em M .

Sejam x ∈ M , TxM o espa¸co tangente a M em x (visto como subespa¸co (n −

1)-dimensional de Rn) e {v1, . . . , vn} base ortonormal de Rn tal que {v1, . . . , vn−1} ⊂ TxM

e vn assuma o mesmo sentido que o gradiente de H. Em particular,

vn =

∇H(x) k∇H(x)k

O determinante de T , que j´a sabemos ser igual a 1, ser´a dado pelo volume (orientado) do (hiper)paralelep´ıpedo definido pelos vetores {DT (x) · v1, . . . , DT (x) · vn}, que por sua

vez ´e o (n − 1)-volume em TT (x)M de {DT (x) · v1, . . . , DT (x) · vn−1} multiplicado pelo

tamanho da proje¸c˜ao de DT (x) · vn em ∇H(T (x)), dado por

hDT (x) · ∇H(x), ∇H(T (x))i k∇H(x)k · k∇H(T (x))k .

(33)

O determinante da restri¸c˜ao de T a M ´e exatamente o (n − 1)-volume em TT (x)M de

{DT (x) · v1, . . . , DT (x) · vn−1}, que pelo exposto ´e o inverso da express˜ao acima.

Definindo F : Rn→ R por F (x) = H(T (x)), teremos, pela Regra da Cadeia, que

DF (x) · ∇H(x) = hDT (x) · ∇H(x), ∇H(T (x))i . Por outro lado, H(x) = H(T (x)) = F (x) implica que

DF (x) · ∇H(x) = h∇H(x), ∇H(x)i = k∇H(x)k2 ,

de onde tiramos que o determinante da restri¸c˜ao de T a M ´e dado por k∇H(T (x))k

k∇H(x)k .

Da´ı que se φ for densidade de medida invariante absolutamente cont´ınua, ent˜ao pela Equa¸c˜ao 2.1 deve valer

φ(T x)k∇H(T x)k = φ(x)k∇H(x)k , logo φ(x) = 1 k∇H(x)k ´ e a densidade procurada.

Em particular, a densidade da medida ser´a mais concentrada nas regi˜oes da superf´ıcie de n´ıvel que estiverem mais pr´oximas de uma singularidade.

Bilhares Seja M uma regi˜ao conexa de R2 com bordo ∂M regular (parametrizado por

uma curva C2, por exemplo, mas em geral consideram-se bordos regulares por partes). Um bilhar ´e o sistema dinˆamico que resulta do movimento de uma part´ıcula em M a velocidade constante, que colide com o bordo e desvia sua trajet´oria segundo a regra de que o ˆangulo de incidˆencia ´e igual ao ˆangulo de sa´ıda, contado em rela¸c˜ao `a tangente ao ponto de colis˜ao.

O espa¸co adequado para o estudo da dinˆamica n˜ao ´e propriamente M . Como nada acontece de surpreendente entre duas colis˜oes, vale mais analisar os instantes em que elas ocorrem, contando o tempo pelo n´umero de colis˜oes.

A posi¸c˜ao de uma colis˜ao n˜ao determina sozinha o futuro da trajet´oria: ´e preciso tamb´em saber o ˆangulo de sa´ıda. Convencionaremos esse ˆangulo da seguinte maneira: ´e o ˆangulo entre −π2 e π2 da reta normal ao bordo para a reta da trajet´oria de sa´ıda, com

(34)

sinal positivo se no sentido hor´ario. `A i-´esima colis˜ao corresponde um ponto (pi, θi) em

∂M × (−π2, +π2), e (pi+1, θi+1) ´e obtido de (pi, θi) pela transforma¸c˜ao T .

N˜ao ´e dif´ıcil ver que T pode ter pontos de descontinuidade, mas os ignoraremos a t´ıtulo de simplifica¸c˜ao. Para achar uma medida invariante para T vale analisar o determinante Jacobiano de T .

Faremos isso de modo emp´ırico no caso de bordo formado por segmentos de reta. (EXERC´ICIO: obter a medida invariante (ser´a a mesma) no caso geral.)

Sejam (p0, θ0) = T (p, θ), p + ∆p um ponto vizinho a p (∆p indica a distˆancia, ao longo

de ∂M , entre p e p + ∆p), e T (p + ∆p, θ + ∆θ) = (p0+ ∆p0, θ0+ ∆θ0). Nosso argumento consistir´a em desprezar a curvatura de ∂M perto de p e p0, supondo que nesses pontos o bordo ´e um segmento de reta, para calcular ∆p∆p0, ∆p∆θ0, ∆θ∆p0 e ∆θ∆θ0, que nos dar˜ao as derivadas parciais de T . Como ∆θ∆p0 deve ser zero, n˜ao precisaremos calcular ∆p∆θ0, e o determinante Jacobiano de T ser´a dado por

∆p0 ∆p ·

∆θ0 ∆θ .

Al´em disso, n˜ao ´e dif´ıcil ver que o valor absoluto de ∆θ∆θ0 vale 1, pois `a varia¸c˜ao do ˆ

angulo de sa´ıda em p corresponde uma varia¸c˜ao exatamente no mesmo montante em p0. Resta-nos apenas calcular |∆p∆p0| (pois interessa apenas o valor absoluto do determinante). (EXERC´ICIO: T preserva orienta¸c˜ao?)

Seguindo a figura abaixo, notamos que a rela¸c˜ao entre ∆p e ∆p0 se encontra no triˆangulo destacado. Usando a Lei dos Senos, temos

∆p sen (π2 + θ0) == ∆p0 sen (π2 − θ) . Da´ı que | det DT (p, θ)| = cos θ cos θ0 .

(35)

θ

´

π

2

θ

θ θ

− ´

θ θ

− ´

π

2

θ

π

2

+ ´

θ

ppp ´

θ

Suponha que λ seja a medida de Lebesgue em ∂M × (−π 2, +

π

2), produto da medida

de Lebesgue em ∂M pela medida de Lebesgue no intervalo (−π2, +π2). Se quisermos achar uma medida absolutamente cont´ınua com densidade φ(p, θ), teremos que usar a Equa¸c˜ao 2.1. Chamando x = (p0, θ0) e T−1x = (p, θ), teremos

φ(p0, θ0) cos θ0 =

φ(p, θ) cos θ .

Portanto a densidade φ(p, θ) = cos θ define uma medida invariante! Para que ela seja uma medida de probabilidade h´a que se introduzir um fator de normaliza¸c˜ao.

Vejamos um exemplo simples onde o bilhar ´e aplicado, facilmente generaliz´avel para situa¸c˜oes mais complicadas. Suponha duas part´ıculas no intervalo [0, 1], com posi¸c˜oes dadas por q1 e q2, e massas m1 e m2. As part´ıculas se movem com velocidade constante,

e mudam o sentido de suas trajet´orias quando colidem entre si ou com os pontos 0 e 1. Vamos mostrar que esse sistema pode ser modelado por um bilhar sobre uma regi˜ao triangular.

O espa¸co de estados ´e o plano (q1, q2), mas com a restri¸c˜ao 0 ≤ q1 ≤ q2 ≤ 1 (supondo

que a part´ıcula 1 est´a `a esquerda da part´ıcula 2). No entanto, faremos um reescalona-mento linear nas vari´aveis, definindo qi0 =√miqi, i = 1, 2. Isso implica que 0 ≤ qi0 ≤

√ mi e q10 √ m1 ≤ q 0 2 √ m2 . A figura abaixo mostra a regi˜ao dos poss´ıveis (q01, q20).

(36)

q´2

q1´ m2

m1

Denotemos por v1 e v2 as velocidades das part´ıculas, e por v10 e v 0

2 as velocidades nas

novas coordenadas, isto ´e, vi0 =√mivi, i = 1, 2. O vetor (v01, v20) representa a velocidade

do movimento no espa¸co de configura¸c˜oes (q10, q20).

Queremos mostrar que o movimento no espa¸co de configura¸c˜oes segue as regras de um bilhar, isto ´e, a velocidade absoluta ´e constante e o choque com a fronteira da regi˜ao de confinamento satisfaz a lei de reflex˜ao usual.

Para analisar as colis˜oes, precisamos introduzir a seguinte nota¸c˜ao: v0i,a, vi,d0 , vi,a, vi,d,

onde “a” indica antes e “d” indica depois da colis˜ao. Temos duas leis f´ısicas para utilizar, com respeito ao sistema original: a conserva¸c˜ao da energia e a conserva¸c˜ao do momento. Por exemplo, a conserva¸c˜ao da energia nos diz que

m1v1,a2 + m2v2,a2 = m1v1,d2 + m2v2,d2 ,

ou seja,

(v1,a0 )2+ (v2,a0 )2 = (v01,d)2+ (v02,d)2 .

Ent˜ao a velocidade absoluta, isto ´e, a norma do vetor (v01, v20) n˜ao muda, e a primeira propriedade est´a demonstrada.

Agora analisemos o caso espec´ıfico da colis˜ao entre as part´ıculas, que no espa¸co de configura¸c˜oes corresponde `a colis˜ao com a parede q02 = qm2

m1q

0

1. As outras colis˜oes s˜ao

mais simples, e podemos considerar indefinido o resultado da colis˜ao simultˆanea das duas part´ıculas com os bordos do intervalo.

Da conserva¸c˜ao do momento obtemos, nas novas coordenadas, √ m1v1,a0 + √ m2v2,a0 = √ m1v1,d0 + √ m2v02,d , isto ´e, (√m1, √ m2) · (v01,a, v 0 2,a) = ( √ m1, √ m2) · (v1,d0 , v 0 2,d) .

(37)

O vetor (√m1,

m2) ´e tangente `a parede e o vetor velocidade mant´em sua norma e ao

mesmo tempo seu produto escalar com esse vetor (al´em de n˜ao poder ser o mesmo que antes da colis˜ao), portanto vale a lei de reflex˜ao.

Essas id´eias se generalizam para um sistema com mais part´ıculas (no mesmo intervalo), que acaba sendo modelado num simplexo de dimens˜ao mais alta. Os bilhares em si podem ser concebidos em dimens˜ao mais alta. Mesmo o sistema de part´ıculas poderia ser mais complexo e mesmo assim ser modelado por um bilhar: por exemplo, bolas (n˜ao mais part´ıculas pontuais) circulando numa caixa tridimensional. Este ´ultimo exemplo estabelece forte conex˜ao entre a dinˆamica de bilhares e o estudo de gases na Mecˆanica Estat´ıstica e na Termodinˆamica. Como no estudo dos gases o interesse se volta para suas propriedades estat´ısticas, a Teoria Erg´odica se posta no meio caminho entre as duas ´

areas.

Medidas absolutamente cont´ınuas II Vimos acima que a densidade φ de uma me-dida invariante absolutamente cont´ınua de um difeomorfismo T de classe C1 deve

satis-fazer

φ(x) = φ(T

−1x)

| det DT (T−1x)|

(na verdade n˜ao ´e preciso que essa equa¸c˜ao seja satisfeita em todo ponto, basta um conjunto de medida total com essa propriedade).

Quando T n˜ao ´e injetiva, entretanto, pode-se formular uma condi¸c˜ao an´aloga. O mesmo racioc´ınio conduz `a seguinte equa¸c˜ao para φ:

φ(x) = X

y:T y=x

φ(y)

| det DT (y)| . (2.3)

Por exemplo, se o determinante Jacobiano ´e constante e igual a n, mas cada ponto tem n pr´e-imagens, ent˜ao a medida de Lebesgue ´e invariante. Exemplos deste tipo veremos abaixo, com os endomorfismos do toro.

Essa equa¸c˜ao sugere inclusive uma abordagem para a busca de medidas absolutamente cont´ınuas, a saber define-se o operador L num espa¸co adequado de fun¸c˜oes, onde

(Lφ)(x) = X

y:T y=x

φ(y) | det DT (y)| ,

de forma que a densidade procurada ser´a ponto fixo desse operador. Se o operador tiver boas propriedades de contra¸c˜ao, o limite da seq¨uˆencia {Lnφ

0}n, a partir de uma condi¸c˜ao

inicial φ0, ser´a o ponto fixo procurado.

Referências

Documentos relacionados

Para o Planeta Orgânico (2010), o crescimento da agricultura orgânica no Brasil e na América Latina dependerá, entre outros fatores, de uma legislação eficiente

Este trabalho buscou, através de pesquisa de campo, estudar o efeito de diferentes alternativas de adubações de cobertura, quanto ao tipo de adubo e época de

O enfermeiro, como integrante da equipe multidisciplinar em saúde, possui respaldo ético legal e técnico cientifico para atuar junto ao paciente portador de feridas, da avaliação

4 Este processo foi discutido de maneira mais detalhada no subtópico 4.2.2... o desvio estequiométrico de lítio provoca mudanças na intensidade, assim como, um pequeno deslocamento

By interpreting equations of Table 1, it is possible to see that the EM radiation process involves a periodic chain reaction where originally a time variant conduction

O desenvolvimento desta pesquisa está alicerçado ao método Dialético Crítico fundamentado no Materialismo Histórico, que segundo Triviños (1987)permite que se aproxime de

•   O  material  a  seguir  consiste  de  adaptações  e  extensões  dos  originais  gentilmente  cedidos  pelo 

1595 A caracterização do repertório de habilidades sociais dos alunos do Grupo com Baixo Desempenho Acadêmico (GBD) e do Grupo com Alto Desempenho Acadêmico (GAD),