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2.2.2 P ERFIL SÓCIO ECONÔMICO

No documento Corpo e identidade feminina (páginas 32-41)

2 Contextualização do campo teórico e da pesquisa de campo 2.1 M ETODOLOGIA DE COLETA E ANÁLISE DOS DADOS

2.2.2 P ERFIL SÓCIO ECONÔMICO

Como vimos na caracterização inicial da amostra, a pesquisa envolveu 80 mulheres que fazem atividade física na academia Cia Atlhética.

Embora a pesquisadora tenha percebido parte do perfil das mesmas através da observação de campo, optou-se por sistematizar os dados por meio da constituição de um perfil sócio-econômico.

Deve-se ressaltar que este é apenas um recurso para caracterizar melhor a amostra: a pesquisa não se concentrou neste objetivo; assim, os dados que seguem visam menos explicar os indicadores elencados, mas sobretudo situar o leitor no universo da pesquisa. Mesmo ao contemplar a relação entre os vários indicadores, a intenção permanece a de apenas contextualizar o campo.

a)ESTABELECENDO OS INDICADORES

Com o intuito de esboçar o perfil sócio-econômico das mulheres entrevistadas, foram escolhidos alguns itens dos questionários, aqui chamados de indicadores, que nos auxiliaram, ao serem analisados de forma isolada, a definir como é formada a nossa amostra. Posteriormente, ao se cruzar os dados de dois ou mais deles, poderemos correlacionar suas influências no universo de nossas pesquisadas. Para isto foram escolhidos os seguintes indicadores: • Idade. • Estado Civil. • Filhos. • Escolaridade. • Atividade Profissional. • Renda.

• Gasto mensal com cuidados estéticos. Vamos a eles.

A faixa de idade mais representativa (que corresponde a 40%) das entrevistadas é composta de mulheres entre 29 a 39 anos, em segundo, aparece a faixa que vai de 40 a 50 anos (20%). Nestas respectivas faixas de idade, encontramos muitas mulheres que são mães, bem como mulheres que têm companheiro (vide próximos gráficos).

Estas tendem a se concentrar especialmente no período da tarde, das 12:00 às 19:00, que foi o escolhido justamente por reunir maior número de mulheres, em especial aquelas que estão fora do mercado de trabalho. Este dado explica-se porque neste período, as mulheres costumam ir à academia com seus filhos ou enquanto os maridos trabalham.

Neste mesmo período do dia, encontramos também 28% de mulheres nas faixas de 18 e 28 anos, porque neste período elas se encontram dispensadas da rotina escolar ou de faculdade. A pesquisa mostrou que, devido às próprias opções dadas pelo sistema educacional do nosso país, a maioria dos cursos, seja do ensino médio, seja do ensino superior, é oferecida preferencialmente nos períodos matutinos e noturnos, assim, as mulheres nesta faixa etária freqüentam a escola antes ou depois da academia, agendando as atividades físicas no horário da tarde.

As mulheres que estão entre 51 anos 61anos correspondem a 13% da população investigada, justamente porque um dos diferenciais que marcam a cultura do corpo atual é que

Gráfico 1- Indica a faixa etária de todas as entrevistadas Distribuição das Entrevistadas, segundo a faixa etária

23% 40% 20% 13% 1% 3% 18 a 28 anos 29 a 39 anos 40 a 50 anos 51 a 61 anos 62 a 72 anos não respondeu

ela não se restringe às faixas etárias consideradas “mais jovens”. Ela tende, cada vez mais, a influenciar mulheres que já estão na chamada “terceira idade”, ou que caminham para ela. Acima dos 61 anos temos 1% da amostra, mas esta porcentagem aumentará progressivamente, porque as mulheres da faixa anterior (51 – 61 anos) afirmaram à pesquisadora que pretendem fazer ginástica a vida toda e algumas usaram a expressão “até ficar velhinha demais”, ou “até morrer”.

Os professores de ginástica entrevistados observaram que aumentou muito o ingresso destas faixas etárias no universo da ginástica, a ponto da academia citada, a Cia Athética, ter um plano específico para ela, chamado de “Platinun”, que promove atividades em ritmo menos acelerado e voltado para minimizar alguns problemas típicos da terceira idade, como osteoporose, dores na coluna, falta de flexibilidade, entre outros.

Como podemos perceber, 75% da amostra é constituída de mulheres que têm companheiro, sendo o restante, 25%, de mulheres sem companheiros.

Do total de 75% das mulheres que têm companheiro, foi impossível estabelecer a proporção de mulheres que se casaram no civil e as que vivem maritalmente, embora não tenham oficializado a relação. Para as próprias mulheres, esta é uma questão delicada por vários motivos.

Em primeiro lugar, porque embora o casamento civil ainda seja visto por muitas mulheres como um índice de status, já há, principalmente nas faixas etárias mais jovens, a

Gráfico 2 - Distribuição da mulheres que possuem namorado ou convivem maritalmente Companheiros

75% 25%

companheiros sem companheiro

incorporação da idéia de que não é necessário, ter um companheiro, oficializar a relação através de um casamento nos moldes formais.

Lembremos que a própria lei, acompanhando as mudanças sociais e culturais, modificou-se e legitimou o concubinato como uma união estável, dando aos pares os mesmos direitos garantidos pela união civil. Assim, as mulheres, muitas vezes, ficam em dúvida, diante de questionários fechados, sobre qual opção assinalar, se a definida nos termos da lei e dos costumes tradicionais ou a definida pelos novos códigos de convivência entre homens e mulheres.

Em segundo lugar, já na década de 1960, houve uma mudança de comportamento entre os sexos e uma maior liberdade sexual de homens e mulheres foi conquistada, permitindo que os dois sexos convivessem de forma mais íntima, o que diluiu um pouco as fronteiras que antes demarcavam o que era um “Casamento” e um “namoro”, propositadamente grafados aqui de maneira distinta, para evidenciar que, aos olhos da sociedade mais tradicional, o primeiro tinha um peso e uma dignificação maiores que o segundo. Hoje, estas fronteiras estão ainda mais tênues e é comum que as mulheres se sintam inseguras quanto ao status de sua situação: o termo “ficar” ganhou espaço e é possível “ficar”com alguém durante anos e anos, sem definir se se trata de um namoro, um noivado ou mesmo um casamento.

A pesquisadora optou, assim, por utilizar as categorias “com companheiro” e “sem companheiro” e não a terminologia usual de “casadas” e “solteiras”, fazendo uso das últimas apenas para dar fluência a alguns pontos da discussão.

Gráfico 3 - Distribuição das entrevistadas que têm filhos Filhos

48% 52%

filhos sem filhos

Conforme podemos ver, 52% das entrevistadas têm filhos, ao passo que 48% não os têm. A média de filhos da amostra foi de dois ou apenas um só, sendo raro mulheres com três ou mais filhos.

Com o advento dos anticoncepcionais, a taxa de natalidade, de um modo geral, diminuiu e isto ocorreu também no do universo das pesquisadas. Mais à frente, no item 4.2.1 -, em especial no item “e”, a questão dos filhos será retomada, ao avaliarmos as relações entre corpo e maternidade.

A pesquisa descobriu que 16% possui superior incompleto, 55% superior completo e 18% cursam pós-graduação, representando 89% das entrevistadas com nível superior. Esta informação é condizente com as faixas etárias mais expressivas da amostra (18-28 anos: 23% da amostra e 29-39 anos: 40% da amostra), porque nestas faixas etárias as mulheres já terminaram o segundo grau e ingressaram na faculdade, ou terminaram a faculdade e iniciaram a trajetória na Pós-Graduação.

É condizente também, como veremos, com o fato das mulheres pertencerem às classes média e média-alta, porque como sabemos, num país em que o acesso à educação não é igualitário, é mais fácil para mulheres com maior renda dedicar-se aos estudos. Muitas vezes, é difícil para as camadas das classes baixas ingressar em faculdades públicas, devido à

Gráfico 4 - Distribuição das entrevistadas segundo a escolaridade Distribuição das entrevistadas segundo a

escolaridade 3% 8% 55% 18% 16% Primário Completo Secundário Completo Superior Completo Superior Incompleto Pós-Graduação

educação de baixa qualidade que receberam ao longo dos anos e igualmente difícil, pagar as mensalidades das faculdades privadas.

O restante da amostra é composto de 3% que possuem apenas o primário e 8% que possuem secundário completo, totalizando somente 11% da amostra fora do universo do ensino superior. No entanto, esta porcentagem deve se alterar um pouco, pois duas mulheres, ambas com 18 anos (Mulher 4 e Mulher 16), ingressaram no ensino superior logo após a tabulação dos dados.

Já os 3% de mulheres que possuem apenas o primário corresponde a duas entrevistadas, Mulher 65, de 61 anos, e Mulher 42, de 66 anos, as quais indicaram que, nas décadas de 1930 e 1950, não era comum a mulher estudar, reservando-se, por questões de gênero, este privilégio aos homens. Da mulher esperava-se que ela fosse boa dona de casa e esposa, bastando-lhe, ademais, conhecer das primeiras letras (como muitas vezes era chamado o que hoje entendemos como primário e/ou ensino fundamental). Isso já era o suficiente.

Aproximadamente dois terços (67,5%) da população estudada exerce a profissão, enquanto que o restante, 32,5%, encontra-se fora do mercado de trabalho.

A relação entre mulher e mercado de trabalho oscilou consideravelmente ao longo do tempo, sendo marcada por avanços e retrocessos, ora porque parte das mulheres aderiu ao papel de donas-de-casa, ora porque lutava contra tais representações.

Rago (2004), em seu estudo “Trabalho Feminino e Sexualidade”, mostra aspectos da trajetória do trabalho feminino no Brasil durante as primeiras décadas do século XX. A autora

Gráfico 5 - Distribuição das entrevistadas segundo a inserção no mercado de trabalho Exerce alguma atividade profissional?

32,5%

67,5%

sim Não

afirma que em 1901 foi realizado um primeiro levantamento sobre a mão-de-obra no estado de São Paulo, revelando que 49,95% dela era constituída de mulheres e 22,79% de crianças, num total de 72,74%, porcentagem que aumentou ainda mais em 1919, tanto no Rio de Janeiro quanto em São Paulo. Mas a partir da década de 1920, as mulheres operárias começaram a sofrer pressões para que abandonassem seus empregos, por força de argumentos masculinos que identificavam a mulher que trabalhava fora como promíscua ou abandonadora do lar. Assim, a taxa de emprego feminino, que em 1872 correspondia a 76% do operariado fabril caiu, em 1950, para 23%.

Rameck (2001) aponta que a utilização da mão de obra operária feminina coincide com a luta pelo voto, que só se efetivou no Brasil em 1932, no governo de Getúlio Vargas. Mas, segundo a pesquisadora, a mulher passou a ter maior participação no mercado de trabalho só na década de 1970. Os fatores que possibilitaram esse ingresso crescente da mulher no mercado de trabalho foram de ordem econômica e social. A autora indica as pesquisas de Leite (1994) e Bruschini & Lombardi (1996)9, que mostram como a expansão da economia, aliada ao aumento da urbanização e do desenvolvimento industrial, forneceu maiores possibilidades de ascensão das mulheres no mercado de trabalho.

Para a autora, “a motivação econômica é, sem dúvida, um dos fatores mais importantes

na inserção da mulher no universo do trabalho. A economia gera novos produtos, ampliando os serviços, e estes, por sua vez, demandam a contratação de mais profissionais. É uma dinâmica econômica que aumenta as necessidades de consumo, pressionando por uma ampliação da receita no orçamento familiar” (Rameck, 2001: 28).

Outro fator indicado pela pesquisadora foi a ampliação do uso de métodos anticoncepcionais, que permitiu à mulher administrar melhor o seu desenvolvimento pessoal e profissional: “Ela pôde, assim, se dedicar também a estudos de aperfeiçoamento,

mobilizando-se para buscar melhor orçamento familiar e maior status econômico. Daí, outra grande transformação social para a entrada da mulher dos setores médios no mercado de trabalho: o seu ingresso no mundo universitário” (idem, ibidem: 28).

É possível ressaltar que, acompanhando a expansão da economia, os movimentos sociais, com destaque para o movimento feminista, ganham força nos anos 197010, e o

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Leite, L.C.P. Mulheres, Muito Além do Teto de Vidro, São Paulo, Atlas, 1994. Bruschini, C. & Lombardi, M.R., O Trabalho da Mulher Brasileira: primeiros anos da década de 90, Caxambu, Minas Gerais, Associação Brasileira de Estudos Populacionais, 1996.

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Sylvia Caiuby Novaes faz uma interessante discussão sobre os Movimentos Sociais no seu livro Jogo de Espelhos, Edusp, 1996. Ela mostra, entre outros pontos, que as minorias sociológicas necessitaram, para se organizar, passar por diferenças (inclusive ideológicas) entre seus vários componentes e se unificaram como um único conjunto, na atitude que ela denominou de “nós-coletivo”.

trabalho doméstico das mulheres começa a ser denunciado como uma subordinação ao homem, indicando que para as mulheres, trabalhar fora de casa equivaleria a traçar o caminho de sua emancipação.

Devido ao escopo desta pesquisa, não será possível enveredarmos pelas numerosas pesquisas que procuraram estudar as origens e implicações da divisão sexual do trabalho.

Muitas destas pesquisas estão na área de gênero e a título de exemplo11, podemos citar a pesquisadora Joan Kelly, que propõe que imaginemos vários conjuntos inter-relacionados de relações sociais, em vez da clássica oposição entre dois ou mais domínios:“O que vemos não são duas esferas da realidade social, e sim dois (ou três) conjuntos de relações sociais. Por enquanto chamaria estas relações de relações de trabalho e sexo (...) Em qualquer das formas históricas tomadas pela sociedade patriarcal (feudal, capitalista, socialista, etc) um sistema de sexo-gênero e um sistema de relações produtivas operam simultaneamente (...) para reproduzir as estruturas sócio-econômicas e o domínio masculino da ordem social dominante” (Kelly, 1979: 61, apud Lauretis, 1994: 215).

Outra explicação igualmente interessante é dada por Proust (2003), correlacionando os argumentos que orientam os novos rumos do trabalho feminino à progressiva especialização dos espaços no século XX. Segundo este autor, enquanto a casa e o mundo do trabalho não se constituíam como esferas autônomas, homens e mulheres trabalhavam juntos, num mesmo universo doméstico e a divisão do trabalho não era vista como manifestação de desigualdade ou sujeição: “a espacialização dos espaços rompe a igualdade conjugal e institui a mulher

como criada” (Proust, 2003: 40).

De todo modo, quaisquer que sejam os motivos e/ou explicações, o ingresso da mulher no mercado de trabalho continua a ser uma luta constante e o desemprego entre mulheres ainda é maior do que entre os homens, sendo que, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 48,9% das mulheres estavam empregadas em 2002, contra 72,8% dos homens12.

No universo pesquisado, como vimos no gráfico 4 (Exerce alguma profissão?), 32,5% das entrevistadas não trabalham, mas no entanto possuem renda elevada, como veremos a

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Ver Joan Kelly, “Woman, history and theory” (Chicago: Univ. Of Chicago Press, 1984; Joan Scott, “Woman’s History: The Modern Period”, in: Past and Prest, 1983; Arakcy Martins Rodrigues, “Lugar e Imagem da mulher na indústria”, Cristina Bruschini, “O Uso de abordagens quantitativas em pesquisas sobre relações de gênero”, Mary G. Castro e Lena Lavinas, “Do Feminino ao gênero: a construção de um objeto.”, Elizabeth Souza Lobo, “O trabalho como linguagem, o gênero do trabalho”, In: Uma Questão de gênero, Rio de Janeiro, Rosa dos Tempos, 1992, entre outros.

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Síntese de indicadores sociais de 2002, pg. 97, disponível em http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/condicaodevida/indicadoresminimos/indic_sociais200 2.pdf, acesso em 28 de março de 2006.

seguir. Era preciso, portanto, investigar tanto os motivos desta não inserção no mercado de trabalho, quanto entender o fato da renda ser independente do exercício da profissão.

Como a pesquisa não tratava do desemprego, não foram esmiuçadas as causas da taxa de 32,5% de desempregadas, mas questionou-se fatores que poderiam levar a isso, como por exemplo, a escolaridade.

Mas, antes de procurarmos a relação entre os indicadores, faltava-nos saber como se distribui a renda entre as pesquisadas, como veremos a seguir.

Podemos perceber que as duas maiores porcentagens referem–se às faixas de renda de R$ 2601,00 a 5000,00 (21%) e mais de R$ 5000,00 (62%), o que nos permite categorizá-las como mulheres de classe média-alta e alta13.

De início, a pesquisa pretendia comparar as percepções sobre o corpo manifestadas por mulheres de classes sociais diferentes. Há pouca bibliografia sobre a percepção corporal de mulheres dos setores menos abastados. Boltanski (1979) investigou esta questão14; todavia, o fez antes da explosão da cultura do corpo nos anos de 1990.

No documento Corpo e identidade feminina (páginas 32-41)